Acórdão nº 335/04.3IDPRT-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 23 de Setembro de 2015

Magistrado ResponsávelF
Data da Resolução23 de Setembro de 2015
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 335/04.3IDPRT-A.P1 Porto Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto (2ª secção criminal) I. RELATÓRIO No processo comum singular nº 335/04.3IDPRT, da Instância Local do Porto, Secção Criminal, Juiz 5, da comarca do Porto, foi determinada a suspensão do processo criminal, nos termos do artigo 47.º, n.º 1, do Regime Geral das Infrações Tributárias (doravante designado apenas por RGIT), por despacho judicial datado de 10 de fevereiro de 2015, com o seguinte teor: “Requerimentos de fls. 954 a 956 e 1033 a 1035: Compulsados os presentes autos, constata-se que os arguidos, B… e C…, encontra-se pronunciados, em autoria material, pela prática de um crime de abuso de confiança fiscal, p. e p. pelo art. 105.º, nºs 1 e 2 do R.G.I.T., aprovado pela Lei nº 15/2001, de 5-6.

Ora, conforme decorre de fls. 957 a 993 e 1042 a 1068, encontra-se no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, um processo de oposição à execução fiscal, sob o nº …………4247, em que se discute a situação tributária de cuja definição depende a qualificação criminal dos factos imputados nos presentes autos ao arguido, B….

Atento o exposto, e face ao disposto no art. 47.º, nº 1 do R.G.I.T., defiro o requerido pelo arguido, B…, e, em consequência, suspendo o presente processo penal tributário, ficando igualmente suspenso o prazo de prescrição do procedimento criminal, conforme decorre do estatuído no art. 21º, nº 4 do R.G.I.T., até se verificar o trânsito em julgado da sentença que vier a ser proferida em tal processo de oposição à execução.

Notifique.”*Inconformado, o Ministério Público interpôs recurso, apresentando a competente motivação, que remata com as seguintes conclusões: i. “Em 29/09/2006 foi deduzida acusação contra o arguido B… imputando-lhe, a prática de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelo art. 105º, 1 e 2 do Regime Geral das Infrações Tributárias (R.G.I.T.).

ii. A materialidade imputada ao arguido consiste na não entrega dos montantes devidos ao Fisco a título de I.R.S. retido nos salários de trabalhadores.

iii. Os tributos, nos termos do disposto no art. 91º, com referência aos artigos 92º e 94º, todos do CIRS, na redação dada pela Lei n.º 39-B/94, de 27 de Dezembro, deveriam ter sido entregues até ao dia 20 do mês seguinte a que respeitavam, ou seja, in casu, até ao dia 20 de janeiro de 2003. Tais prestações, contudo, não foram entregues nessa data nem nos 90 dias subsequentes.

iv. O recurso é interposto do despacho judicial de fls. 1072 e 1073, datado de 10/02/2015, e notificado ao Ministério Público em 12/02/2015, no qual se determinou a suspensão do processo penal tributário até ao trânsito em julgado da decisão que vier a ser proferida sobre a oposição deduzida pelo aqui arguido (e aí oponente) B…, no âmbito do Processo de Execução Fiscal n.º …………4247, que corre termos no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, por se ter entendido que nesse processo se discute situação tributária de cuja definição depende a qualificação criminal dos factos imputados nestes autos.

v. De acordo com o disposto no art. 204º do CPPT existe um numerus clausus de fundamentos que podem sustentar a oposição deduzida na execução fiscal, sendo certo que nem todos são necessariamente integrantes do pressuposto material exigido pelo art. 47º, 1 R.G.I.T., a saber, a capacidade de influir na qualificação criminal dos factos imputados no processo penal.

vi. Não será, assim, a mera oposição formulada na execução que terá a virtualidade de acionar o mecanismo no art. 47º, 1 C.P., importando analisar cuidadamente como se manifesta a questão suscitada no âmbito do processo penal vii. O conteúdo do conceito de “questão prejudicial”, integrado à luz do princípio da suficiência do processo penal, impõe que se conclua que a necessidade legal de efetuar a suspensão do processo penal fiscal, como decorrência da interposição de oposição à execução fiscal, reduzir-se-á às situações em que se mostra imprescindível à decisão da verificação dos elementos típicos da infração penal-fiscal, de tal forma que se arvora à categoria de um precedente lógico-jurídico, de natureza autónoma e determinante da forma como a questão prejudicada vai ser conhecida.

viii. A finalidade da oposição deduzida pelo arguido B… é a anulação dos efeitos da reversão que determinou a sua posição de executado, pelo que o conjunto de argumentos aí invocados serve um só propósito: evitar que o seu património responda pelas dívidas da sociedade D…, Lda., da qual a administração fiscal o tem por legal representante.

ix. São os argumentos de facto, independentemente da relevância jurídica que o próprio lhes atribui, que o arguido faz elencar na oposição que deverão ser atendidos pelo tribunal para delimitar qual a questão prejudicial e a adequação da referida oposição para fazer desencadear o efeito de suspensão do processo penal x. A alegada inconstitucionalidade da reversão das coimas, a suficiência do património da executada, a nulidade da citação (para a execução, note-se), a falta de fundamentação do despacho de reversão ou a falta dos pressupostos legais para a reversão da execução não têm a mais ínfima relevância para a questão jurídico-penal que se trata nestes autos e que se configura na prática de um crime de abuso de confiança fiscal.

xi. Assim se decidiu no AcRC de 03/07/2013, proferido no Proc. n.º 17/08.7IDLRA, em cujo sumário se pode ler: “A oposição à execução fiscal, com fundamento na falta dos pressupostos legais da responsabilidade subsidiaria efectivada por reversão (art. 23º da Lei Geral Tributária), não determina a suspensão do processo penal previsto no art. 47º do R.G.I.T.” xxii. A eventual prescrição da prestação tributaria, analisada à luz das normas do ordenamento jurídico-tributário, não tem qualquer influência na punibilidade da conduta criminosa imputada ao arguido, que será analisada no estrito âmbito da disciplina jurídico-penal: uma eventual prescrição das obrigações fiscais de entrega das quantias retidas e não entregues nos cofres do Estado a título de I.R.S. devido pelos trabalhadores da sociedade D…, Lda., não interfere de qualquer forma na qualificação jurídico-criminal dos factos que integram o objeto destes autos.

xiii. Quanto às questões relacionadas com a liquidação do imposto e, mais precisamente, com a respetiva notificação, o arguido não as deixa de colocar no âmbito da relevância que estas têm na fundamentação da reversão, pelo que não será de extrapolar qualquer efeito para a qualificação jurídico-penal dos factos que integram o objeto dos autos.

xiv. Na oposição deduzida pelo arguido não se mostram alegados factos que, desde logo, integrem as alíneas h) ou i) do n.º 1 do art. 205º CPPT, uma vez que havia já sido apresentada a impugnação das liquidações em fase anterior (o que suscitou a suspensão da fase de instrução), pelo que foi efetivamente exercido o direito de impugnação do ato de liquidação, donde a suposta ilegalidade de tal liquidação não constituir fundamento válido da oposição e, portanto, não poder ser conhecida por esta via.

xv. O arguido não invoca na oposição a falta de notificação das liquidações do tributo no prazo de caducidade, limitando-se a referir que não foram notificadas, questão que fica aquém daquela outra que o 205º, 1, e) CPPT contempla.

xvi. A tudo acresce que na oposição não são minimamente identificadas as prestações a que se referem as liquidações alegadamente não notificadas, sendo certo que o processo de execução fiscal integra diversas liquidações, referentes a variados impostos (I.R.S., IRC, I.V.A.), ficando por saber a quais concretamente se refere a oposição.

xvii. Nessa medida a oposição não contém em si elementos que permitam concluir que se dirige às liquidações das prestações tributárias que estão em causa nos presentes autos de processo comum singular.

xviii. Para que se entendesse estar perfeitamente delimitada uma questão prejudicial que justificasse a suspensão dos termos do processo crime impunha-se, no mínimo, que ficasse estabelecida a identidade do tributo “impugnado” com o I.R.S. retido e não entregue nos cofres do Estado, que se refere na acusação. Tal, contudo, não acontece.

xix. A delimitação da questão a decidir é tão deficitária, incipiente, vaga e imprecisa, que não habilita o tribunal a aquilatar da efetiva verificação dos pressupostos do art. 47º, 1 R.G.I.T.

xx. Nessa medida, a decisão que decidiu suspender o processo penal não assentou num conhecimento suficiente do âmbito da alegada questão prejudicial, pelo que não estava em poder de elementos que permitissem afirmar a verificação da previsão normativa do referido art. 47º R.G.I.T.

xxi. Pelo exposto, por não estarem demonstrados os pressupostos do art. 47º, 1 R.G.I.T., máxime, no que respeita à determinação de que na oposição deduzida pelo arguido se discute situação tributária de cuja definição depende a qualificação criminal dos factos imputado, o despacho recorrido fez uma errada aplicação do direito, assim violando o disposto no referido art. 47º, 1 R.G.I.T. e no art. 7º C.P.P., pelo que deverá ser revogado.

xxii. Em 29/09/2006 foi deduzida acusação contra o arguido B… imputando-lhe, a prática de um crime de abuso de confiança fiscal, previsto e punido pelo art. 105º, 1 e 2 do Regime Geral das Infrações Tributárias (R.G.I.T.).

xxiii. A materialidade imputada ao arguido consiste na não entrega dos montantes devidos ao Fisco a título de I.R.S. retido nos salários de trabalhadores.

xxiv. Os tributos, nos termos do disposto no art. 91º, com referência aos artigos 92º e 94º, todos do CIRS, na redação dada pela Lei n.º 39-B/94, de 27 de Dezembro, deveriam ter sido entregues até ao dia 20 do mês seguinte a que respeitavam, ou seja, in casu, até ao dia 20 de janeiro de 2003. Tais prestações, contudo, não foram entregues nessa data nem nos 90 dias subsequentes.

xxv. O recurso é interposto do despacho judicial de fls. 1072 e 1073, datado de 10/02/2015, e notificado ao Ministério Público em...

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