Acórdão nº 3957/16.6T8MTS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 05 de Abril de 2017

Magistrado ResponsávelMARIA DOLORES DA SILVA E SOUSA
Data da Resolução05 de Abril de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Rec. Penal n.º 3957/16.6T8MTS.P1 Comarca do Porto.

Instância Local de Matosinhos Acordam, em Conferência, na 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto I.-Relatório.

Nos presentes autos foi lavrado auto pela PSP do Porto e levantado procedimento contraordenacional contra B…, melhor identificado a fls. 2 e 4, em consequência de no dia 18.06.2014, pelas 09:31h, na A.., sentido Norte/Sul Km, .../… … – Comarca Porto-Matosinhos -, conduzir o veículo automóvel ligeiro de passageiros, com matrícula ..-NJ-.., circulando na berma da auto-estrada, quando existia muito fluxo de trânsito, e sem motivo considerado de emergência que o justificasse, evitando o condicionamento do trânsito e retomando a via de trânsito, tudo nos termos do disposto no art. 17º, n.º1 do Código da Estrada, sancionável com coima de 60.00 a 300.00€, nos termos do art. 17º, n.º4 do mesmo diploma, e ainda com a sanção acessória de inibição de conduzir de 2 a 24 meses por força dos arts. 138º e 146º al. f) todos do CE.

Instruído o respectivo processo de contra-ordenação, o arguido após notificação efectuou o depósito de montante igual ao valor mínimo da coima, que se converteu automaticamente em pagamento, e no termo do processo foi proferida decisão [fls. 4 e 5], que determinou a aplicação da sanção acessória de inibição de conduzir, especialmente atenuada nos termos do art. 140º do CE., pelo período de 30 dias, devendo o arguido entregar o seu título de condução, no prazo e local abaixo indicados, sob pena de incorrer na prática de um crime de desobediência, nos termos do n.º3 do art. 160º do CE.

O arguido interpôs recurso de impugnação judicial desta decisão para a secção criminal da Instância Local de Matosinhos, Comarca do Porto, que manteve na íntegra a decisão administrativa.

Inconformado com a decisão daquele tribunal o arguido interpôs o presente recurso, onde formula as seguintes conclusões: 1.- O n.º 3 do art. 3.º do Decreto-Lei n.º 17/91, de 10/1, que "No início da audiência o tribunal avisa, sob pena de nulidade, quem tiver legitimidade para recorrer da sentença, de que pode requerer a documentação dos atos da audiência, a efectuar por súmula" - aviso que não foi efectuado, pelo que o julgamento é nulo.

  1. - Aquele diploma bem como o RGCO (art. 66.º) remetem para o Código de Processo Penal, como direito subsidiário (art. 2º do DL citado) e para o julgamento em processo comum (nº 7 do art. 13º ainda do mesmo DL).

  2. - Atentas aquelas normas, e o facto de não ter sido efectuado o aviso a que se refere a última norma citada, difícil é admitir que a audiência não esteja documentada (reduzida a escrito ou gravada).

  3. - Limitar à matéria de direito o recurso em processo contraordenacional viola dois princípios constitucionais, o do direito de defesa e o do processo equitativo (art. 20º e 32º da CRP), quando interpretadas no sentido de impedirem o recurso sobre a matéria de facto nos processos contraordenacionais.

  4. - Omitiu a decisão sob recurso qualquer pronuncia sobre a violação das garantias constitucionais de defesa, que se traduzem em atribuir fé ao auto de notícia em processo contraordenacional, nomeadamente por violação do princípio in dubio por reo, contrariando claramente o disposto no art. 32º n.º 10 da Constituição da Republica Portuguesa, questão levada a recurso (ver alínea B/ do requerimento de impugnação judicial da decisão administrativa).

  5. - A decisão sobre recurso mais não fez do que considerar o que constava do auto.

  6. - Não foi feita prova sobre o facto de o auto de notícia não se encontrar assinado por qualquer testemunha, para além do agente autuante, como impõe o art. 170º do Código da Estrada.

  7. Em face das duas versões contraditórias - a do agente autuante e a do recorrente - o Tribunal considerou apenas a versão do agente.

  8. - Ao arguido está vedada a possibilidade de que este Tribunal, em recurso, aprecie como efectivamente decorreu aquela audiência de julgamento, o que aqueles disseram, que impunha, se mais não fosse, a absolvição do arguido, de acordo com o princípio in dubio pro reo.

  9. - Em face das versões apresentadas pelo agente autuante e pelo arguido, e ao facto de não se encontrar assinado por qualquer testemunha o auto de notícia - apesar de não resultar do processo que tal não era possível - deveria o Tribunal ter ordenado, por sua iniciativa e com autonomia em relação às iniciativas da acusação e da defesa, proceder à realização de diligências probatórias necessárias para esclarecer os factos e para descobrir a verdade material (340º do CPPenal); 11.- Não o tendo feito, não investigou toda a matéria de facto contida no objecto do processo relevante para a decisão, e cujo apuramento conduziria a solução legal diferente.

  10. - Não o tendo feito, apenas restava ao Tribunal a possibilidade de julgar procedente a impugnação judicial da decisão administrativa, absolvendo o arguido da prática da contraordenação de que vinha acusado, com base no princípio in dubio pro reo.

  11. - Foram violadas as normas indicadas nestas conclusões.

    Termina pedindo a anulação da decisão e a procedência do recurso com a absolvição do arguido da prática da contra-ordenação de que foi acusado.

    *O recurso foi admitido por despacho constante a fls. 62.

    O Ministério Público apresentou resposta conforme fls. 65 a 69 que rematou com as seguintes conclusões: 1.- Do disposto nos artigos 66.º e 75.º, n.º 1, do RGCO resulta que não se aplicam os n.º 3 e n.º 4 do artigo 13.º, do Decreto-Lei n.º 17/91, de 10/01, nem o artigo 363.º do Código de Processo Penal à audiência de julgamento das contra-ordenações, não se verificando, desta forma, a nulidade arguida pelo recorrente.

  12. - As normas contidas nos artigos 66.º e 75.º, n.º 1, do RGCO que impedem o recurso da matéria de facto, não violam o direito de defesa constante do artigo 32.º, n.º 10, da Constituição da República Portuguesa, por neste último preceito se não incluir o direito a um duplo grau de jurisdição.

  13. - Considerando que convicção do Tribunal a quo não teve por base o auto de notícia, não se verifica qualquer omissão de pronúncia relativamente à violação das garantias de defesa do arguido.

  14. - Tendo o Tribunal a quo plasmado na sentença recorrida o modo como formou a sua convicção, através de um raciocínio lógico e ajustado à realidade, tendo sempre por referência as regras da experiência comum, não enferma a sentença recorrida de qualquer vício.

  15. - No decurso da audiência não foi requerida nem se mostrou necessária a realização de qualquer diligência de prova para a boa decisão da causa, pelo que, ao não se ordenar a respectiva realização, não se violou o princípio da investigação ou da verdade material.

  16. - Pelo que, deve a sentença recorrida ser mantida na íntegra, julgando-se improcedente o recurso de contra-ordenação e mantendo-se a decisão administrativa impugnada.

    *Neste Tribunal o Exmo. PGA emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso.

    Foi dado cumprimento ao disposto no art. 417º nº 2 do C.P.P. tendo o recorrente respondido conforme resposta de fls. 80 e 81, onde argumentou sob a nulidade invocada e a necessidade de realização de diligência probatória, ambas motivadas no seu recurso.

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