Acórdão nº 1884/96.0JAPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Janeiro de 2017

Magistrado ResponsávelJORGE LANGWEG
Data da Resolução11 de Janeiro de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 1884/96.0JAPRT.P1 Data do acórdão: 11 de Janeiro de 2017 Relator: Jorge M. Langweg Adjunta: Maria Dolores da Silva e Sousa Origem: Comarca do Porto Instância Local do Porto | Secção Criminal Sumário: 1 - A lei exige o cumprimento da garantia constitucional e processual penal do contraditório no incidente de conversão da multa em prisão subsidiária, por força do disposto no artigo 61°, n.° 1, alínea b) do Código de Processo Penal e 32°, n.º 5 da Constituição da República Portuguesa: "o arguido goza, em especial, em qualquer fase do processo e salvas as excepções da lei, dos direitos de (…) Ser ouvido pelo tribunal (…) sempre que eles devam tomar qualquer decisão que pessoalmente o afecte.".

2 - A falta de audição do arguido no caso em que a lei comina essa obrigatoriedade, por colidir com direitos fundamentais de defesa – como é o caso -, constitui nulidade insuprível [artigo 119º, c), do Código de Processo Penal, interpretado extensivamente], passível de ser suscitada em fase de recurso, nos termos do disposto no artigo 410°, n.º 3 do mesmo texto legal.

Acordam os juízes do Tribunal da Relação do Portonos presentes autos acima identificados, em que figura como recorrente o arguido B…;I - RELATÓRIO1. O arguido interpôs recurso do despacho proferido nos autos em 14 de Julho de 2014, apenas notificado em 24 de Maio de 2016, com o teor seguidamente reproduzido: Dando aqui por integralmente reproduzidos os termos da douta promoção de fls. 744, por com os mesmos concordarmos, indefere-se o requerido a fls. 699.

Mais se indefere o requerido pagamento da pena de multa em prestações, bem como a requerida substituição da pena de multa por prestação de trabalho a favor da comunidade, por os pedidos se revelarem manifestamente extemporâneos.

Notifique, sendo com cópia de fls. 744.

Após trânsito em julgado do presente despacho, passe e entregue mandados de detenção contra o arguido para cumprimento da pena de prisão subsidiária fixada, podendo o arguido a todo o momento obstar ao cumprimento da prisão pagando a multa a que foi condenado.

(…)» 2.

Inconformado com o teor do despacho, o recorrente concluiu a motivação do seu recurso nos seguintes termos: «Por decisão proferida, de fls 493 a 502, foi o arguido condenado, pela prática de um crime de emissão de cheque sem provisão, na pena de 300 (trezentos) dias de multa, à taxa diária de 5,00€ (cinco euros), perfazendo o total de 1.5000,00€ (mil e quinhentos euros).

Por razões de incapacidade económica o recorrente não efectuou o correspondente pagamento.

Do douto despacho de 14/07/2014, conclui-se não serem conhecidos quaisquer bens ou rendimentos ao recorrente, susceptíveis de serem penhorados que determinou, de forma automática e, desde logo, errática, a conversão da pena única de multa não paga em 200 (duzentos) dias de prisão subsidiária.

Entretanto, por requerimento de fls 699 e seguintes, o recorrente confirmou e documentou a manutenção do seu estado económico/financeiro precário.

Aqui alegou e provou que tal omissão de pagamento lhe não era imputável.

Desatendendo a tais factos, por douto despacho de 06/07/2016, foram indeferidos todos os fundamentos aduzidos no referido requerimento de fls 699 e segs, bem como o requerido pagamento da multa em prestações e ainda a prestação de trabalho a favor da comunidade, por extemporaneidade.

Consequentemente, foi ordenada, após trânsito, a emissão de mandados de detenção para cumprimento pelo recorrente da pena de prisão subsidiária fixada.

Sem prejuízo de a, todo o momento, poder o recorrente obstar a tal cumprimento mediante o pagamento da multa a que foi condenado.

O que nos permite concluir, desde logo, que foi ordenado o cumprimento de prisão subsidiária sem se esgotar o apuramento da verdadeira situação económica do recorrente.

Acresce que, por outro lado, jamais chegou a sequer ser tentada a sua cobrança coerciva.

Também, resulta evidente dos autos que ao recorrente não foi dado o direito de se pronunciar sobre as causas do não pagamento da multa em que fora condenado.

Resulta, pois, que não foi por causa imputável ao arguido que a multa de 1.500,00€ (mil e quinhentos euros) não foi paga.

Já que as informações reunidas nos autos sobre a situação económica do recorrente evidenciam uma situação económica depauperada, o que exclui a imputabilidade ao arguido da causa do não pagamento multa.

Pelo que é ilegal a conversão em prisão subsidiária da multa, mostrando-se violado o disposto no art° 49°, n° 1, do Código Penal.

Ainda, a não audição do arguido sobre as causas do não pagamento voluntário é conduta violadora do disposto no art° 61°, n° 1, al b), do Código de Processo Penal.

Acabando, assim, a decisão por ordenar o cumprimento de prisão subsidiária quando não só era teoricamente possível a cobrança coerciva, como não foi analisada a possibilidade de suspensão da execução da prisão subsidiária, mostrando-se violado o estipulado no art° 49° n° 3 do Código Penal.

Motivos pelos quais o recorrente não pode conformar-se com aquele douto despacho de 06/07/2016.

Já que poderia este recorrente ''pagar o seu pecado'' por recurso a penas / sanções não privativas da liberdade.

Quais sejam, a prestação de trabalho a favor da comunidade ou o pagamento prestacional da multa em que foi condenado.

Devendo a aplicação da pena de prisão, sempre, ser a derradeira e residual solução da Lei.» 3. O Ministério Público, junto do Tribunal a quo, respondeu à motivação do recurso, de forma fundamentada, pugnando pela sua improcedência, extraindo-se do seu teor as seguintes passagens mais impressivas: «Pretende o arguido, ora recorrente, dizer, por um lado, ter sido ordenado o cumprimento da pena de prisão subsidiária sem se ter apurado a sua verdadeira situação económica ou tentada a cobrança coerciva da pena de multa, questionando nesta sede as informações fornecidas pelas autoridades policiais e, por outro, que antes de conversão da pena de multa em prisão subsidiária, o tribunal “a quo”, tem que proceder à audição do arguido para se poder pronunciar quanto às razões do não pagamento, procedimento que não foi cumprido em violação do disposto na al. b), do nº. 1, do art. 61º., do CPP, inviabilizando a conclusão de aquele não pagamento não lhe poder ser imputado, caso em que, por observância do disposto no nº. 3, do art. 49º., do Cód. Penal, a pena de prisão subsidiária deveria ter sido suspensa na sua execução, propondo-se o arguido fazer tal prova.

Sem razão, entendemos.

Salvo o devido respeito, a linha de raciocínio seguida pelo arguido, ora recorrente, revela-se contraditória, pois que, apesar de dizer que o tribunal “a quo” se bastou com informações policiais quanto à situação económica do seu agregado familiar, não identifica quais as diligências que foram omitidas na tentativa de identificar bens penhoráveis ou rendimentos e, acima de tudo, não concluí pela sua existência.

Ainda assim e, uma vez mais com o devido respeito, não se percebe quais as consequências que o arguido pretende retirar desse facto, pois que, apesar de notificado do teor da douta sentença proferida nestes autos, desinteressou-se do seu cumprimento na medida em que deixou de residir na morada dos autos sem disso dar conhecimento ao processo, inviabilizando dessa forma qualquer notificação pessoal.

Por outro lado, há que ter presente que o arguido só não foi ouvido quanto às razões do não pagamento da pena de multa por ser desconhecido o seu paradeiro.

Vejamos.

Dispõe o art. 61º., do Cód.Proc.Penal, soba a epígrafe, “Direitos e deveres processuais”, na parte que aqui importa considerar que e, citamos: “1-O arguido goza, em especial, em qualquer fase do processo e salvas as excepções da lei, dos direitos de: a)(…); b)Ser ouvido pelo tribunal ou pelo juiz de instrução sempre que eles devam tomar qualquer decisão que pessoalmente o afecte;” No caso em apreço, o arguido, ora recorrente, alega a violação do disposto na al. b), do nº. 1, do art. 61º., do CPP.

No entanto, o arguido não identificou os motivos para o tribunal não ter observado o estatuído em tal preceito legal, ou seja, o facto de ser desconhecido o paradeiro do arguido apesar das diligências levadas a cabo para o localizar.

Por seu turno estabelece o art. 113.º., do...

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