Acórdão nº 183/14.2PFPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 08 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelFRANCISCO MOTA RIBEIRO
Data da Resolução08 de Março de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 183/14.92PFPRT.P1 – 4.ª Secção Relator: Francisco Mota Ribeiro *Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto1. RELATÓRIO1.1 Por sentença de 31/05/2016, após realização da audiência de julgamento, no Proc.º nº 183/14.2PFRT, que correu termos na Secção de Pequena Criminalidade da Instância Local do Porto, Comarca do Porto, foi o arguido B…: a) Condenado na pena de 50 (cinquenta) dias de multa, à taxa diária de €5,50 (cinco euros e cinquenta cêntimos), o que perfaz um total de €275,00 (duzentos e setenta e cinco euros), pela prática, em 28/03/2014, de factos integradores de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez (TAS registada de 1,61 g/l, a que corresponde, após dedução do EMA, o valor apurado de 1,53 g/l), p. e p. pelo art.º 292.º, n.º 1, do Código Penal; b) Condenado, nos termos do art.º 69.º, nºs 1, al. a), e 2, do Código Penal, na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 3 (três) meses. ---- c) Foi ainda determinado que, na liquidação da pena de multa, deverá ser descontado um dia, atenta a detenção de fls. 6 e 7, nos termos do disposto no art.º 80º, n.º 2, do C. Penal.---- d) E ainda que “à pena acessória em que o arguido foi condenado, deverá ser descontado o período de 3 meses referente à injunção que o arguido cumpriu no âmbito da suspensão provisória do processo que lhe foi aplicada, declarando-se desta forma extinta a aludida pena acessória aplicada pelo cumprimento.” 1.2.

De tal sentença interpôs o Ministério Público recurso, apresentando motivação que termina com as seguintes conclusões: “1. Dispõe o artigo 80º do Código Penal que: "1. A detenção, a prisão preventiva e a obrigação de permanência na habitação sofridas pelo arguido são descontadas por inteiro no cumprimento da pena de prisão, ainda que tenham sido aplicadas em processo diferente daquele em que vier a ser condenado, quando o facto por que for condenado tenha sido praticado anteriormente à decisão final do processo no âmbito do qual as medidas foram aplicadas.

2. Se for aplicada pena de multa, a detenção, a prisão preventiva e a obrigação de permanência na habitação são descontadas à razão de um dia de privação da liberdade por, pelo menos, um dia de multa." 2. Nos presentes autos o arguido somente possui um dia de detenção que importa descontar, para ser considerado aquando da execução da pena de multa aplicada.

3. Ora, de acordo com o preceituado no nº 4 do artigo 282, do mesmo diploma normativo, em caso de incumprimento das injunções e regras de conduta as prestações feitas não podem ser repetidas.

4. A suspensão provisória do processo não envolve qualquer julgamento sobre o objeto do processo.

5. Trata-se de um despacho proferido numa fase inicial do inquérito e necessita, além do mais, da concordância do arguido.

6. Acresce que é uma decisão que não põe fim ao processo.

7. O fim do processo só ocorrerá no final do decurso do prazo da suspensão, caso a arguida cumpra as injunções ou regras de conduta fixadas, com despacho de arquivamento ou no caso contrário, o processo prossegue - artigo 282º, nºs 3 e 4, do Código de Processo Penal.

8. Referindo-se à pena acessória prevista no artigo 69°, do Código Penal, refere o Prof. Figueiredo Dias o seguinte: "Uma tal pena deveria ter como pressuposto formal a condenação do agente numa pena principal por crime cometido no exercício da condução, ou com utilização de veículo, ou cuja execução tivesse sido por este facilitada de forma relevante; e por pressuposto material a circunstância de, consideradas as circunstâncias do facto e da personalidade do agente, o exercício da condução se revelar especialmente censurável. Uma tal pena - possuidora de uma moldura penal específica - só não teria lugar quando o agente devesse sofrer, pelo mesmo facto, uma medida de segurança de interdição da faculdade de conduzir, sob a forma de cassação da licença de condução ou de interdição da sua concessão.

9. A injunção que foi fixada ao arguido aquando da suspensão provisória do processo, tem uma natureza completamente diferente da pena acessória de proibição de conduzir veículos com motor a que alude o artigo 69º do Código Penal e que aqui foi aplicada ao arguido num total de três meses.

10. Desde logo a lei refere-se como injunção de não conduzir e após condenação em pena acessória. Por outro lado, aquando da pena acessória temos comunicação para a entidade rodoviária, se a carta da arguida se encontrar no regime provisório, a mesma fica, por determinação do I.M.T. inabilitada para conduzir, uma vez que a mesma caduca automaticamente. Mais, se conduzir durante o período de cumprimento da pena acessória comete um crime. Ora, tais analogias não podem ser realizadas, nem aplicadas na injunção de proibição de conduzir veículos a motor. A única consequência para o arguido no incumprimento da mesma é o prosseguimento dos autos por incumprimento da injunção aplicada.

11. Mais se o arguido fosse detetado a conduzir no cumprimento da injunção de proibição de conduzir aplicada a título de suspensão provisória do processo certamente não seria acusada e julgada pela prática do crime de violação de proibições, conforme o que aconteceria caso o arguido fosse detetado a conduzir durante o cumprimento da pena acessória de proibição de conduzir veículos a motor aplicada por condenação transitada em julgado.

12. Neste sentido, Acórdão da Relação de Lisboa de 6/3/2012, proferido no âmbito do Proc. 282/09.2SILSB.L 1-5, disponível in www.dgsLpt, no qual se refere: a pena acessória de proibição de conduzir assenta no pressuposto formal de uma condenação do agente numa pena principal (nos termos elencados nas diversas alíneas do nº 1 do art.º 69º do Cód. Penal) e no pressuposto material de (em face das circunstâncias do facto e da personalidade do agente), o exercício da condução se revelar especialmente censurável, censurabilidade esta que, dentro do limite da culpa, responde às necessidades de prevenção geral de intimidação e de prevenção especial para emenda cívica do condutor imprudente ou leviano. De facto, é o conteúdo do facto de natureza ilícita que justifica a censura adicional dirigida ao arguido em função de razões de prevenção geral e especial e que constituem a razão de ser de aplicação da pena acessória." 13. Mais, a injunção a que o arguido se obrigou não lhe foi imposta, nem assumiu o carácter de pena ou sequer de sanção acessória.

14. O arguido fez a entrega da carta de forma voluntária, no âmbito do cumprimento de uma injunção com que concordou, tendo como finalidade a suspensão provisória do processo, nos termos do disposto no artigo 281º do Código de Processo Penal.

15. Ora, de acordo com o preceituado no n.º 4 do artigo 282°, do mesmo diploma normativo, em caso de incumprimento das injunções e regras de conduta as prestações feitas não podem ser repetidas.

16. Sempre se dirá que qualquer que seja a decisão a proferir e atendendo a que já foram proferidas decisões em sentidos opostos quanto à mesma questão pelos Tribunais das Relações, nomeadamente do Porto, Lisboa, Coimbra e Guimarães, tendo as mesmas transitado em julgado, a questão que aqui se suscita, salvo o devido respeito por opinião em contrário, poderá oportunamente ser colocada ao Supremo Tribunal de Justiça, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 437°, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Penal, uma vez que a título exemplificativo se dirá que caso o arguido seja julgado no J1 ou J2 deste Tribunal não lhe é efetuado qualquer desconto em situações semelhantes e se o for no J3 é realizado e tal situação deverá ser idêntica para todos a fim de todos os cidadãos beneficiarem do mesmo critério, uma vez que não é indiferente cumprir três meses e dez dias de pena acessória ou ter que cumprir dez dias.

17. No sentido que não deverá ser realizado o desconto, indica-se a título exemplificativo os Acórdãos do Tribunal da Relação de Lisboa 6 de março de 2012, 6 de junho de 2013 e 17 de dezembro de 2014, o Acórdão da Relação do Porto de 28 de maio de 2014 e o Acórdão do Tribunal da Relação do Porto de 13 de abril de 2016, todos disponíveis em www.dgsi.pt.

18. Em sentido oposto, ressaltando-se a título exemplificativo os Acórdãos do Tribunal da Relação do Porto de 19 de novembro de 2014 e 25 de março de 2015 e do Tribunal da Relação de Guimarães os Acórdão de 6 de janeiro de 2014 e 22 de setembro de 2014, todos disponíveis em www.dgsi.pt.

19. Entendemos que deve não deve ser realizado qualquer desconto na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados aplicada em concreto ao arguido.

20. Ora, não sendo realizado qualquer desconto, nos moldes descritos na pena acessória a mesma não se mostra cumprida, tendo que ser proferido despacho a determinar a entrega da carta de condução nos termos legais.” 1.3.

O recurso foi admitido pelo despacho de fls. 115.

1.4.

O arguido respondeu ao recurso, concluindo nos seguintes termos: 1) Não existe fundamento para o recurso interposto pelo Ministério Público; 2) O processo foi reaberto nos termos do artigo 282º, nº 3, por falta do cumprimento da injunção relativa ao pagamento de €400,00 a uma IPSS; 3) A pena acessória aplicada ao arguido foi igual à injunção aplicada anteriormente, no momento em que houve a suspensão do processo; 4) Posto isto, o arguido já cumpriu e já foi atingida a finalidade pretendida, juntamente com a necessidade de prevenção geral que é uma das funções do Direito Penal; 5) Como tal, como a injunção foi uma imposição feita ao arguido para poder beneficiar da suspensão provisória do processo, não faz qualquer sentido a sua repetição; 6) Além do mais, se assim fosse, estaria a ser violado o preceituado no artigo 282º, n.°4, e estaríamos perante uma dupla sanção pelo mesmo facto; 7) Neste sentido, o desconto deveria ser realizado assim corno mui doutamente a Mma. Juiz fez.” 1.5.

O Sr. Procurador-Geral Adjunto neste Tribunal da Relação, tendo-lhe os autos ido com vista, emitiu o seguinte parecer...

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