Acórdão nº 1210/16.4T8MAI-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 02 de Março de 2017
Magistrado Responsável | PAULA LEAL DE CARVALHO |
Data da Resolução | 02 de Março de 2017 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Procº nº 1210/16.4T8MAI-A.P1 Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 948) Adjuntos: Des. Jerónimo Freitas Des. Nelson Fernandes Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório B…, aos 01.03.2016 apresentou requerimento de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento com invocação de justa causa, de que foi alvo (art. 98º-C do CPT, na redação do DL 295/2009, de 13.10), contra C…, Ldª ocorrido aos 19.02.2016[1].
Frustrada a tentativa de conciliação que teve lugar na audiência de partes, a empregadora apresentou articulado a motivar o despedimento com invocação de justa causa (art. 98º-J do CPT), e juntou o procedimento disciplinar, reafirmando os factos constantes da decisão final deste e pugnando pela legalidade e fundamentação do despedimento do autor.
Termina pedindo que o tribunal conclua pela regularidade e licitude do despedimento com justa causa por iniciativa do empregador, considerando-se o mesmo motivado.
O trabalhador contestou invocando, no que releva ao recurso, que a Ré: invoca, no articulado motivador, um conjunto de factos inexistentes na decisão disciplinar, o que lhe é vedado pelo artigo 387.º/3 do CT/2009; alega de forma diferente os factos constantes do processo disciplinar que são os únicos atendíveis, pelo que fica sem alegação processualmente admissível; a acusação disciplinar é deficiente, vaga e genérica, composta por factos conclusivos, não contendo um único facto concreto suscetível de contraditório e de constituir infração disciplinar, pelo que são nulas.
Deduziu também pedido reconvencional.
Concluiu pedindo que o despedimento seja declarado ilícito, “com as consequências legais do pagamento das remunerações desde o despedimento e da indemnização de antiguidade, até decisão final”. Mais reclamou, no petitório, “uma compensação por danos não patrimoniais” [segundo diz em sede de fundamentação do pedido, por “a acusação disciplinar” de que foi vítima ser “injuriosa e caluniosa, altamente ofensiva da sua honra e brio profissionais e da sua personalidade”, o que lhe provocou os danos que invoca e aí referindo requere uma compensação não inferior a €5.000,00]. Reclamou ainda “juros legais desde a data do vencimento das correspondentes quantias”.
A Ré respondeu à contestação, não se pronunciando, todavia, sobre a fundamentação acima referida.
Por despacho de fls. 119 foi fixado o valor da ação, em €8.852,76.
Após despacho de aperfeiçoamento da contestação, cumprimento do mesmo pelo A. e resposta da Ré, que não relevam à matéria em discussão no recurso, foi, aos 19.10.2016, proferido despacho saneador/sentença que conheceu parcialmente do mérito, nos seguintes termos: “Por tudo o exposto, julga-se a presente ação parcialmente procedente e, em consequência: I – Declara-se ilícito o despedimento de B… promovido e perpetrado pela entidade empregadora “C…, Lda.”.
II – Condena-se a entidade empregadora a pagar ao trabalhador: 1 – A indemnização correspondente a 30 dias de retribuição base por cada ano completo ou fração de antiguidade, a título de indemnização em substituição da reintegração, que nesta data se computa em € 3.200,00, relegando-se a liquidação do restante para o respetivo incidente, nos termos dos artigos 609.º e 358.º do Código de Processo Civil; 2 – As retribuições que o trabalhador deixou de auferir desde 19.02.2016, até ao trânsito em julgado da presente decisão, devendo-se deduzir o subsídio de desemprego que o trabalhador eventualmente haja auferido no mesmo período de tempo, o qual deverá ser entregue pela ré à segurança social, cuja liquidação se relega para o respetivo incidente, nos termos dos artigos 609.º/2 e 358.º do Código de Processo Civil.
A responsabilidade por custas será determinada a final.
Registe e notifique.”.
Mais se determinou o prosseguimento dos autos “apenas para apreciação dos demais pedidos deduzidos na reconvenção, para o que importa produzir prova sobre os factos relacionados com as comissões, o prémio anual, o crédito de formação e os danos não patrimoniais sofridos.” Inconformado, o A. recorreu, tendo formulado, a final da sua alegação, a seguinte conclusão: “Única: A indemnização do artº 391º do CT, in casu deveria ser agravada, no mínimo de 40 dias por ano ou fração de antiguidade, pois que o despedimento não assentou em nenhum facto concreto, tudo não tendo passado de um expediente ilegítimo para pôr fora o trabalhador.
NESTES TERMOS, - DEVE O RECURSO SER JULGADO PROCEDENTE, COM AS CONSEQUÊNCIAS LEGAIS DE SE AGRAVAR A INDEMNIZAÇÃO DO ARTº 391º DO CT PARA 40 DIAS POR ANO OU FRAÇÃO DE ANTIGUIDADE.”.
Também inconformada, a Ré recorreu, tendo formulado, a final da sua alegação, as seguintes conclusões: “A - O presente recurso vem interposto do despacho saneador/sentença que decidiu julgar a acção, desde já, parcialmente procedente e declarar, em consequência, a ilicitude do despedimento do Autor promovido pela Ré.
B – Entende a Recorrente que os autos não continham, nesta fase os elementos necessários à prolação de uma decisão quanto à questão central da ilicitude do despedimento (decisão de mérito).
C - Desde logo, os factos alegados nos autos motivadores do despedimento implicavam a necessidade de produção de prova para a apreciação da questão da ilicitude do despedimento, por diversos motivos: a) por a nota de culpa dirigida ao Autor concretizar suficientemente, de forma circunstanciada, os factos que foram imputados ao trabalhador, e que constituem justa causa de despedimento; b) por o Autor não ter visto coarctado qualquer direito de defesa; c) e, ainda, por não ser exigível à Ré, uma maior especificação dos factos atendendo à situação concreta em que se inscreveu a actuação do trabalhador.
D - A Recorrente não se conforma com a decisão recorrida que declarou a ilicitude do despedimento, pois entende que a nota de culpa reúne os requisitos consagrados no artigo 353º, nº 1 do Código do Trabalho.
E - Na nota de culpa que remeteu ao trabalhador, a Recorrente relatou o núcleo essencial dos factos concretos, circunstanciadamente enunciados, susceptíveis de constituir justa causa de despedimento.
F - Refere-se na dita nota de culpa os factos e circunstâncias seguintes: » em 06 de Janeiro de 2016, teve o legal representante da arguente conhecimento de que o referido Arguido trocava e vendia informação negocial da empresa com um seu concorrente, a sociedade “D…” » um dos colaboradores que vasculhava documentação nas pastas das empresa, para a empresa, constatou que uma daquelas continha cotações de venda de produtos relacionados com a sociedade Arguente e, que tal informação estava a ser disponibilizada à concorrência.
» o funcionário intermediou negócios da Arguente com a concorrência.
» no período de suspensão, o funcionário acompanhou o representante da sociedade “D…” e, que junto dos clientes da “C…”, apresentou-se a vender o produto concorrencial daquele.
» terá perdido em frustração de negócios aportados para a sociedade, montantes superiores aos €13.500,00,00 (treze mil e quinhentos), nomeadamente nos produtos que, para colocação nos clientes, foram sujeitos aos seguintes descontos: a. E…, Lda. – desconto de € 5.500,00 (cinco mil e quinhentos euros); b. “F…” – desconto de € 4.500,00 (quatro mil e quinhentos euros); c. “G…” – desconto de € 3.500,00 (três mil e quinhentos euros) G - A Recorrente fez constar da nota de culpa que dirigiu ao Autor o núcleo essencial dos factos imputados ao trabalhador, com a concretização mínima necessária para o exercício de defesa do trabalhador, na sua plenitude, e que constituem justa causa do despedimento.
H - Entende a Recorrente que bastaria um facto apenas, da mencionada nota de culpa, para justificar o despedimento com justa causa, quando se refere, por exemplo: - no período de suspensão, o funcionário acompanhou o representante da sociedade “D…” e, que junto dos clientes da “C…”, apresentou-se a vender o produto concorrencial daquele. - Quanto a este facto é feita a concretização das circunstâncias de tempo – no período de suspensão -, e das circunstâncias de modo e lugar – o trabalhador acompanhou o representante da sociedade concorrente H… junto de clientes da C… -, com o objectivo de vender o produto concorrencial.
I - Tal concretização é suficiente, na óptica da Recorrente, para que se considere verificada uma descrição circunstanciada dos factos imputados ao trabalhador, que lhe permitia o cabal e pleno exercício de defesa.
J - Acresce que, o exercício do direito de defesa do trabalhador não foi minimamente violado, pois como se referiu supra, a nota de culpa deduzida que lhe foi entregue contém o núcleo essencial dos factos que lhe são imputados.
L- Acresce ainda que, não é exigível perante as concretas circunstâncias do caso, que a ora Recorrente tivesse feito maior especificação dos fundamentos da rescisão.
M - Para especificar os concretos negócios intermediados entre a Ré e a Autora, e a concreta informação negocial que o Autor trocou e vendeu às empresas da concorrência, a Ré encetou diligências junto destas empresas concorrentes, não tendo contudo, em tempo útil, obtido informação que lhe permitisse de forma mais detalhada fazer constar da nota de culpa.
N - Pelo que mal andou a decisão recorrida em declarar a ilicitude do despedimento, por entender não ter havido comunicação ao trabalhador dos factos que permitam a concretização do direito de defesa desta.
O - O Tribunal a quo tomou uma decisão com base num critério formal, sem ter tratado de apurar as concretas circunstâncias em que foi comunicada pelo réu à trabalhadora a cessação do contrato de serviço doméstico e, bem assim, se os actos praticados pelo Autor constituíam ou não justa causa de despedimento, pelo que não cumpriu o disposto no nº4 do artº 387º do Código do Trabalho.
P - Em todo o caso, não se verifica sequer um vício formal, pois na nota de culpa remeteu ao trabalhador, a Recorrente relatou o núcleo essencial dos factos concretos, circunstanciadamente enunciados...
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