Acórdão nº 1974/12.4TBMAI.P2 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 28 de Março de 2017

Magistrado ResponsávelRODRIGUES PIRES
Data da Resolução28 de Março de 2017
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 1974/12.4 TBMAI.P2 Comarca do Porto – Póvoa de Varzim – Instância Central – 2ª secção cível – J3 Apelação Recorrentes: B… e mulher; “C…, Lda.” Relator: Eduardo Rodrigues Pires Adjuntos: Desembargadores Márcia Portela e Maria de Jesus Pereira Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto:RELATÓRIO Os autores B… e mulher D…, residentes na Rua …, n.º .., …, Maia, intentaram contra a ré “C…, Lda.”, com sede na Rua …, nº .., …, Maia, a presente ação sob a forma ordinária, peticionado que a ré seja condenada: - a ver declarada a transmissão para a ré do imóvel referido no artigo 1º da petição inicial, contra o pagamento pela ré do preço em falta de €327.211,45 (ou seja, os 35.000,000$00 - trinta e cinco milhões de escudos -), a que hoje corresponde €174.579,30 (cento e setenta e quatro mil quinhentos e setenta e nove euros e trinta cêntimos) - alínea b) da cláusula 3.ª – mais 30.600.000$00 (€152.632,15), valor correspondente e acordado referente ao aumento da cércea); - ou, subsidiariamente, a ver declarada a resolução do contrato–promessa por facto culposo e definitivo, imputável à ré tão somente, declarando-se, por conseguinte, perdido em favor dos autores os valores prestados, num total, atualmente, de €225.000,00, e pela conduta em manifesto abuso de direito, condenada ainda no dano contratual positivo correspondente a €327.211,45, de modo a recolocar os autores na situação que teriam, não fora essa injustificada resolução de contrato.

Para tanto, e em resumo, alegaram que autores e ré acordaram que aqueles prometeriam vender a esta, que prometia comprar, um terreno para construção, pelo preço de 80.000.000$00, acrescido de 50.000$00 por cada m2 a mais de construção legalmente aprovada, se a cércea viesse a ser ultrapassada, tendo a ré entregue aos autores 4.000.000$00 e aos autores ou a quem estes indicassem um andar de tipologia T4, no valor de 41.000.000$00, acrescendo ainda uma loja sita no prédio a construir, pelo preço de 35.000.000$00. A ré entregou aos autores 4.000.000$00 e o apartamento T4, mas recusa-se a fazer diligências para aprovar projeto de construção necessário para a marcação da escritura definitiva da venda do terreno. Os autores intentaram processo especial de fixação judicial de prazo, tendo a ré defendido que aguardava revisão de PDM para obter aumento de cércea de construção. Na sequência dessa ação, a ré deu entrada na respetiva Câmara Municipal de projeto de licenciamento, tendo sido notificada pela autarquia da necessidade de proceder a alterações ao projeto ou proceder à alteração do loteamento. Os autores promoveram a alteração do alvará de loteamento, que veio a ser aprovado em 18.10.2010, sendo agora licenciável o aumento da cércea em 2 pisos, cada um com a área de 306 m2, o que configura um aumento do preço do terreno em 30.600.000$00. Os autores promoveram a marcação de escritura pública a que a ré não compareceu, apesar de regulamente notificada. De novo interpelaram os autores a ré para o cumprimento.

Contestando e reconvindo, a ré invocou que o contrato em questão é uma mera promessa de venda obrigando os autores, mas não já a ré. Alega ainda que a ré ficou, mercê desse contrato, na posição de poder definir e requerer a aprovação do projeto de construção que mais lhe conviesse. Além disso, invoca que foi aposta nesse contrato condição ilegítima e nula, equivalente à do valor da permuta do terreno e da loja ser de 35.000.000$00 para os autores não pagarem sisa, o que torna o contrato-promessa nulo. Aduz ainda que apenas pagou aos autores 4.000.000$00 e não o apartamento que foi vendido pela ré a terceiros, sendo que, se se tratasse de entrega de um apartamento a terceiros tal teria de ser reduzido a escrito sob pena de nulidade por vício de forma. Invoca também que os autores alegaram ter celebrado acordo de cessão do crédito sobre a ré, entregando o apartamento a terceiros, o que sempre será nulo, por o contrato-promessa ser nulo e não existir fonte que legitime a cessão. Alega também que, aquando da promessa de venda, os autores sabiam que o terreno estava sujeito a loteamento que apenas permitia construção de R/C e andar, quando o prédio que a ré pretendia construir no imóvel era de R/C e quatro pisos, agindo os autores com má-fé. Contra a vontade da ré os autores promoveram a alteração do loteamento para construção de R/C e seis pisos e inviabilizaram a aprovação do pedido de licenciamento da ré para construção de R/C e quatro pisos no terreno, com o que a ré sofreu prejuízo correspondente à perda da rentabilidade de 4.000.000$00 que entregou aos autores, e aos custos do projeto de licenciamento, sendo que a ré não tem recursos financeiros para efetuar construção de prédio de R/C e seis pisos. Não é possível à ré adquirir o imóvel, tendo as circunstâncias em que as partes firmaram a promessa de venda sofrido alteração anormal, por culpa dos autores, pelo que o contrato terá de ter-se por resolvido.

Deduz, assim, a ré os seguintes pedidos reconvencionais: - ser o contrato-promessa de venda identificado nos autos conjuntamente com as suas cláusulas, declarado e reconhecido como nulo; - subsidiariamente, deve o mesmo contrato-promessa ser resolvido; - serem os autores condenados a indemnizarem a ré com as quantias identificadas nos artigos 173º, 175º, 193º, 194º e 200º da contestação, no valor global de 109.523,98€; - subsidiariamente, serem os autores condenados a indemnizarem a ré com as quantias identificadas nos artigos 175º, 193º, 194º e 196º, da contestação, no valor global de 89.572,06€; - serem os autores condenados como litigantes de má-fé em multa e condigna indemnização a favor da ré.

Replicaram os autores impugnando a factualidade alegada pela ré, aduzindo que, aquando da outorga do contrato a ré analisou o PDM da Maia, concluindo pela improcedência das exceções e pedidos reconvencionais formulados pela ré.

Foi proferido despacho saneador, com seleção da matéria de facto assente e organização da base instrutória.

Realizou-se audiência de julgamento, com observância de todo o formalismo legal.

Foi depois proferida sentença, em 24.7.2015, que julgou a ação parcialmente procedente e a reconvenção integralmente improcedente por não provada, e em consequência:

  1. Declarou resolvido o contrato-promessa datado de 21 de Março de 2001, mediante o qual os autores B… e D… declararam prometer vender à ré “C…, Lda.” o terreno para construção, designado por Lote 3, com a área de 954 m2, situado na Rua …, da freguesia de …, concelho da Maia, inscrito na respetiva matriz urbana sob o artigo 2018º e descrito sob o n.º 01108190392, pelo preço de Esc. 80.000.000$00, contrato este constante do documento junto a fls. 32 a 34 dos autos, cujo teor se dá por reproduzido.

  2. Declarou perdida a favor dos autores B… e D… a quantia prestada pela ré “C…, Lda.” equivalente a 4.000.000$00 (quatro milhões de escudos).

  3. Absolveu a ré “C…, Lda.” do que ademais é peticionado pelos autores B… e D….

  4. Absolveu os autores-reconvindos B… e D… de todos os pedidos contra si formulados pela ré-reconvinte “C…, Lda.” E) Com vista à apreciação da conduta processual da ré “C…, Lda.” e eventual condenação da mesma por litigância de má-fé, determinou que se notificassem as partes para, querendo, se pronunciarem, em 10 dias.

    Inconformados com o decidido, interpuseram recurso os autores que finalizaram as suas alegações com as seguintes conclusões: A) – Tendo em conta os factos provados - nºs 2, 3 – e teor da clausula 1ª do contrato, no sentido perceptível a um declaratário normal, interpretação que ao STJ não está vedada, por se tratar de análise do regime dos artigos 236 , nº 1 e 238, nº 1 ambos do C.Civil, o contrato prometido era de compra e venda de um terreno por dado valor – 80.000.000$00 -, valor fixado tendo em conta dada área de construção, sendo que seria reajustado, se fosse licenciada maior área de construção.

    A.1) – Contrariamente ao que se diz na douta sentença, o negócio não dependia da licença de construção, de que a Ré se desinteressou, sendo que a obtenção da mesma era antes elemento essencial do negócio, antes sim da determinação do montante devido a final.

    A.1.1) – O obstaculizar essa “condição”, que só ela poderia fazer verificar, e subsumia a conduta da mesma Ré no regime do artigo 275, nº 2 do C.C. é que permitiu considerar que havia um “não cumprimento definitivo imputável, à Ré” (sic) – fls.28 -.

    A.2) – A declaração negocial que a Ré não prestou é a de assumir o pagamento da quantia de €174.579,30 (cento e setenta e quatro mil quinhentos e setenta e nove euros e trinta cêntimos) - alínea b) da cláusula 3.ª – em falta bem como o valor do acréscimo de construção que vier a ser permitido, acima da cércea de r/c e 4 andares.

    Entendendo de forma diferente, a douta sentença interpretou erroneamente os artigos 830, 879, 880, 399, 883 e 763 do C.C.

    A não se entender que se pode decretar o suprimento da omitida declaração negocial, B) – Porque sinal é “quantia em dinheiro ou bem de outra natureza” – Prof. Calvão da Silva, in Sinal e contrato promessa, 10ª ed., pág. 94 e nota 86, como em nota 535 a pág. 298 de “Cumprimento e Sanção pecuniária compulsória” -, coisa corpórea “ – Antunes Varela, “Sobre o contrato-promessa”, pág. 100 e Acórdão do STJ, de 8.04.2008, proc. n.º 07A381 -, desde que corresponda ao que ao contraente competia realizar no contrato definitivo – Acórdão do STJ de 24.11.83, in BMJ. 331, 542. – sendo que, em caso de dúvida, dever entender–se como “de natureza confirmatória”, ou seja, dirigido a reforçar o vínculo negocial e a garantir o cumprimento das obrigações, no respeito pela palavra dada” – Calvão da Silva, in “Sinal ….., 10 ª ed., págs. 90 e 91.

    B.1) – mesmo que coisa entregue “em data posterior como garantia do seu cumprimento” - parafraseando a douta sentença e o autor ali citado, como Fernando de Gravato Morais - Contrato-Promessa em Geral, Contrato-Promessa em Especial. Coimbra, 2009, p. 197 e ss. e no aresto da Rel. Lxª de 18.03. 2003...

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