Acórdão nº 87736/14.3YIPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 08 de Novembro de 2016

Magistrado ResponsávelFERNANDO SAM
Data da Resolução08 de Novembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 87736/14.3YIPRT.P1 Da Comarca do Porto – Instância Central de Vila Nova de Gaia – 3.ª Secção Cível – J2*Relator: Fernando Samões 1.º Adjunto: Dr. Vieira e Cunha 2.º Adjunto: Dr.ª Maria Eiró*Acordam no Tribunal da Relação do Porto – 2.ª Secção: I. Relatório B…, S.A., requereu procedimento de injunção contra C…, E.E.M, melhor identificadas no respectivo requerimento, apresentado em 23/6/2014, peticionando o pagamento da quantia de 108.476,29€, correspondente ao capital de 100.000,00€, juros de mora de 8.323,29€ e taxa de justiça paga no valor de 153,00€. Fundamenta tal pretensão no incumprimento de um contrato de “fornecimento de bens ou serviços” que celebrou, em 5/6/2013, com a requerida e na organização de um evento, na cidade …, denominado B…, a que procedeu em Julho desse ano, pelo preço de 100.000,00€, dos quais 50.000,00€ deviam ter sido pagos na data da assinatura do contrato e os restantes 50.000,00€ até ao dia 10/8/2013, mas que a requerida não pagou, apesar de interpelada para o efeito.

A requerida deduziu oposição, alegando encontrar-se em fase de liquidação, após dissolução aprovada pela Câmara Municipal D…, e invocando a nulidade do contrato por violação da Lei n.º 8/2012, de 21/2, vulgo Lei dos Compromissos, o que a impede de cumprir, concluindo pela improcedência da acção e pela sua absolvição do pedido.

Apresentados os autos à distribuição e distribuídos, em 22/10/2004, como acção de processo comum, a autora juntou resposta, onde aceita a confissão da ré, quer no que respeita ao contrato invocado quer ao seu incumprimento por esta, e invoca o abuso de direito relativamente à invocação da nulidade. No mesmo articulado, alegando dúvida sobre o sujeito da relação material controvertida, requereu a intervenção principal provocada do Município D…, pretendendo dirigir contra ele “subsidiariamente o pedido no caso de se verificar que foi transmitida a posição contratual da Ré C… no contrato”, e de E…, de F… e de G…, como administradores liquidatários da mesma ré, sendo ainda o primeiro o subscritor do contrato, a quem imputa violação dos deveres de diligência e de cuidado, contra quem pretende deduzir, “solidariamente, pedido subsidiário de condenação a pagar à Autora a quantia de €108.476,29, acrescida de juros vincendos até integral pagamento, correspondente aos danos sofridos por esta, caso a Ré C… seja impedida legalmente de pagar o serviço prestado pela Autora por os ora co-Réus terem violado a Lei dos Compromissos”.

Posteriormente, a autora veio desistir da intervenção principal provocada do Município D… e requerer a sua habilitação como cessionário da ré, em face da dissolução e liquidação desta, o que foi admitido por despacho de 14/9/2015, confirmado por acórdão desta Relação de 12/1/2016.

Deferido o requerimento da intervenção e citados os restantes chamados, apresentaram articulado, em separado, invocando, em síntese: - o E…, a excepção dilatória inominada da devida utilização do procedimento de injunção, a impossibilidade de o contrato, sendo nulo, produzir os efeitos pretendidos, o pagamento pela ré e, defendendo-se por impugnação, sustentando a sua irresponsabilidade, concluindo pela procedência da primeira excepção ou, subsidiariamente, pela improcedência da acção com a consequente absolvição do pedido; - o F…, a incompetência da jurisdição portuguesa, a preterição de tribunal arbitral e sustentado a sua irresponsabilidade, concluindo pela procedência das excepções, com a inerente absolvição da instância, ou pela sua absolvição do pedido; - o G…, a sua “ilegitimidade” por não ter tido intervenção no contrato em que se baseia a injunção e pugnando pelas sua irresponsabilidade, concluindo pela procedência daquela excepção e pela improcedência da acção.

Notificadas para se pronunciar sobre a excepção da utilização indevida do procedimento de injunção invocada pelo interveniente E…, as demais partes nada disseram.

E, por despacho de 23/6/2016, foi julgada “verificada a excepção dilatória inominada, de indevido com a consequente absolvição da R. da instância”.

Inconformada com o decidido, a autora/requerente interpôs recurso de apelação para este Tribunal e apresentou a sua alegação com as seguintes conclusões: “1. A injunção, enquanto meio célere e eficaz de cobrança de dívidas, tem actualmente dois campos de aplicação perfeitamente claros e distintos: o de cobrança de dívidas contratuais de baixo valor, independentemente da qualificação dos respectivos intervenientes e, o de cobrança de dívidas entre empresas, nascidas no âmbito das suas actividades profissionais, independentemente do valor, com a finalidade de impedir o estrangulamento e a asfixia da caixa e da tesouraria que afecta as empresas fornecedoras de bens e de serviços.

  1. Pelo facto de o caso em apreço respeitar ao procedimento de injunção com fundamento no atraso de pagamento de uma transacção comercial é necessário que se verifiquem os pressupostos previstos nos artigos 2º e 10º da Lei nº 62/2013, de 10 de Maio (“a que designámos “Lei das Transacções Comerciais”), à luz das definições previstas no artigo 3.º do mesmo diploma legal, a saber: (i) Constitua a remuneração, ou seja, uma contrapartida em dinheiro, tendo a jurisprudência vindo a frisar que tem de corresponder ao sentido estrito de obrigação pecuniária, como obrigação pecuniária directamente emergente de contrato; (ii) Correspectiva da prestação de um serviço ou do fornecimento de um bem (contrato oneroso); (iii) Em que ambas as partes, credor e devedor, sejam empresas.

  2. Os três requisitos estão verificados no caso em apreço. Começando pela natureza das partes, a Autora é uma empresa que se dedica profissionalmente à organização e implementação de regatas de iates profissionais e a Ré primitiva é uma empresa municipal.

  3. Em relação ao pedido, a obrigação peticionada corresponde à remuneração devida à Recorrente, isto é, ao preço dos seus serviços.

  4. Em relação à causa de pedir, a obrigação pecuniária emerge directamente do contrato celebrado entre as partes, em que a Ré se obrigou ao pagamento de 100.000€ contra a organização e a realização da regata.

  5. Entendeu, porém, a sentença recorrida que o contrato em causa nos autos “claramente não se trata de uma prestação de serviço”, mas antes de “um contrato mais complexo que um contrato de prestação de serviços, tanto assim que o mesmo pressupôs a intervenção de outros contratantes e obrigações conexas.” 7. Incorre a douta sentença recorrida em erro de facto e de direito na qualificação do contrato em causa nos autos. Em erro de facto, pois utiliza como argumento para afastar a qualificação do contrato como de prestação de serviços o facto de existirem “outros contraentes”, quando é manifesto pela leitura do próprio contrato que este só foi celebrado entre a Autora e a Ré (denominada no contrato como “parceiro local” por este obedecer a uma minuta internacional).

  6. Refere ainda a douta sentença recorrida como argumento para afastar a qualificação do contrato como de prestação de serviços que existiam outras obrigações conexas. É verdade. Mas...

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