Acórdão nº 986/15.0TXPRT-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 07 de Julho de 2016

Magistrado ResponsávelFRANCISCO MARCOLINO
Data da Resolução07 de Julho de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Recurso 986/15.0TXPRT-A.P1*Acordam no Tribunal da Relação do Porto I – RELATÓRIO 1.

B…, economista, residente na Rua …, n.º …, Porto, foi condenado: - Por sentença de 23 de Abril de 2008, proferida nos autos de processo comum singular 238/07.0TABRG, que correu termos no extinto 2º Juízo Criminal de Braga, na pena de 80 dias de multa à taxa diária de 15€ (após decisão da Relação de Guimarães) pela prática de um crime de difamação agravado, p. e p. pelos art.ºs 180º e 184º do C. Penal. E foi ainda condenado a pagar ao Demandante a quantia de 2.000€. A pena foi declarada extinta por despacho de 22 de Maio de 2009 (fls. 83).

- Por sentença de 13 de Janeiro de 2009, proferida nos autos de processo comum singular 262/07.2PIPRT, que correu termos no 3º Juízo Criminal de Matosinhos, na pena de 1 anos e 3 meses de prisão, declarada suspensa pelo período de 3 anos (após decisão desta Relação), pela prática de 1 crime de maus tratos a cônjuge, p. e p. pelo art.º 152º do C. Penal. A pena foi declarada extinta por despacho de 7 de Março de 2012 (fls. 62).

  1. Em Outubro de 2015 requereu ao Tribunal de Execução das Penas do Porto, ao abrigo do disposto no art.º 12º da Lei 37/2015, “o cancelamento total das decisões que deveriam constar do certificado de registo criminal referente ao Requerente emitido para qualquer dos fins previstos no art.º 10º, n.ºs 5 e 6, da Lei n.º 37/2015, de 5 de Maio”.

    Fundamentou a pretensão com a seguinte factualidade, se assim se pode considerar o alegado: (…) “Mostram-se extintas as penas aplicadas ao Requerente (cf. Doc. 1).

    O Requerente cumpriu a obrigação de indemnizar o ofendido no que se refere ao processo que correu termos sob o n.º 238/07.0TABRG (doc. 2).

    Quanto ao processo que correu termos sob o processo n.º 262/07.2PIPRT, não foi aí fixada qualquer indemnização a pagar pelo Requerente à ofendida.

    As condutas pelas quais o Requerente foi condenado, que tiveram por ofendidos a sua ex-cônjuge e o respectivo mandatário, ocorreram no âmbito de um processo de divórcio muito conturbado, que lhe causou uma enorme perturbação e desequilíbrio emocional.

    O Requerente está profundamente arrependido pelas condutas então adoptadas e que, em condições normais, jamais teria tido.

    No período de tempo decorrido após a prática dos factos pelos quais foi condenado, quase 10 anos, o Requerente refez a sua vida pessoal, normalizando o seu relacionamento com a sua ex-cônjuge e mãe dos seus filhos.

    O Requerente mostra-se perfeitamente readaptado e integrado na vida em sociedade, tendo vindo a adoptar uma conduta exemplar como cidadão e pai de família.

    O Requerente foi entretanto afectado por um acidente cardiovascular que lhe determinou uma incapacidade permanente parcial de 60%.

    Após um longo período de reabilitação pretende agora o Requerente regressar, naturalmente com as suas limitações, ao mercado de trabalho.

    Para regressar ao mercado de trabalho, está o Requerente obrigado a apresentar o respectivo certificado do registo criminal elaborado para fins de emprego, público ou privado, ou para o exercício de profissão ou actividade para cujo exercício seja legalmente exigida a ausência de antecedentes criminais ou a avaliação da idoneidade das pessoas, elaborado nos termos e para os efeitos do disposto nos n.ºs 5 e 6 do artigo 10º da Lei n.º 37/2015, de 5 de Maio.

    Mostram-se, assim, verificados os requisitos de que depende o cancelamento provisório da transcrição no registo criminal nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 12º da Lei n.º 37/2015, de 5 de Maio”.

  2. O Requerente juntou documento comprovativo do pagamento da indemnização arbitrada no processo comum singular 238/07.0TABRG, que correu termos no extinto 2º Juízo Criminal de Braga (fls. 15).

  3. O Sr. Juiz lavrou o despacho de fls. 84, determinando: - Se solicite às autoridades policiais da área da residência do requerente informações sobre o seu comportamento, nomeadamente se há notícia de indícios da prática de novos crimes; - Se solicite, no prazo de 20 dias, a elaboração de relatório social à DGRS, remetendo para o efeito cópia do requerimento inicial e do CRC.

  4. Responderam: - A PSP (fls 95) informando que o visado tem mantido um comportamento normal e que dos seus ficheiros não consta qualquer ocorrência em que tenha sido interveniente; - A DGRS (fls. 88 e segs), com o envio de relatório, no qual conclui: “B… apresenta uma inserção sociofamiliar positiva, contando com uma atitude apoiante por parte da família.

    Licenciado em economia viu o percurso profissional prejudicado na sequência de um acidente vascular cerebral que sofreu em 2012, do qual resultaram sequelas que determinaram a atribuição de uma incapacidade multiuso numa percentagem de 60%, subsistindo desde então de pensão de invalidez.

    Tem vindo a recuperar das sequelas resultantes daquele problema de saúde e apresenta projeto de retomar atividade laboral, nomeadamente por conta de outros.

    B… revela capacidade para identificar e analisar situações sociais desadequadas e propósitos de manutenção de um modo de vida normativo, assegurando ter interiorizado o desvalor das condutas inerentes às condenações que sofreu, que enquadra em período específico e sem paralelo no seu percurso de vida.

    Mantém uma atitude dedicada aos filhos e normalizou o relacionamento com o ex-cônjuge sendo presentemente avaliada manutenção de relacionamento positivo entre ambos.

    Da informação recolhida não resultaram indicadores que contra-indiquem que seja satisfeita a pretensão do requerente”.

  5. Foram os autos continuados com vista e a Ex.ma Magistrada do MP lavrou o despacho de fls. 96: “Dispõe o art. 229° do CEP, e o art. 12º, e 10º, n.ºs 5 e 6 da Lei n.º 37/2015, de 05/05, quanto à necessidade da indicação de finalidade da intervenção judicial para obter uma aparência de CRC sem averbamentos, ou como é comummente referido, um CRC «limpo».

    O fundamento da existência de um registo criminal, onde é dada «publicidade» a terceiros, para os mais variados fins, da prática de crimes coexiste com a possibilidade de o próprio, já «reabilitado», poder sentir-se verdadeiramente inserido social e profissionalmente.

    Porém, não só tal implica actividade processual e intervenção judicial, como também funciona como «defesa» social.

    Assim, não basta um interesse genérico do requerente, mas um interesse concreto, específico e vinculado para o exercício de determinado cargo ou profissão.

    O Requerente não o indica, nem o tem, como o próprio admite.

    Pelo exposto, entendemos que não estão presentes todos os pressupostos para o que requer, pelo que não p. o seu deferimento”.

  6. Decidiu, então, o Sr. Juiz a quo: “Com base nos elementos documentais constantes dos autos e, bem assim, no relatório social de fls. 89 a 92, dão-se como assentes os seguintes factos com interesse para a decisão a proferir: 1) O requerente sofreu duas condenações, uma pena de multa e uma de prisão suspensa por 2 anos, respectivamente, pela prática de um crime de difamação, previsto e punido pelo artigo 180º, n.º1 e 184º do C. Penal, no processo comum nº 238/07.0TABRG e um crime de maus tratos a cônjuge, previsto e punido pelo artigo 152º, n.ºs 1, al. a) e 2 do C. Penal, no processo comum n.º 262/07.2PIPRT (por factos praticados em 2006.12.26; 2007.03.17). 2) A pena de multa aplicada foi declarada extinta, por pagamento, em 2009.05.22, devidamente transitado em julgado, conforme fls. 65 e ss.

    3) A pena de prisão foi, por cumprimento[1], declarada extinta por despacho de 2012.03.12 devidamente transitado em julgado, conforme fls. 20 e ss.

    4) Das supracitadas decisões condenatórias, apenas, a decisão proferida no processo nº 238/07.0TABRG impôs o pagamento da quantia indemnizatória de 2.000,00€.

    5) Dá-se, aqui, por integrado o teor do relatório social que consta a fls. 89 a 92.

    6) Igualmente, as autoridades policiais da área de residência habitual do arguido não têm notícias de ocorrências e ou prática de crimes em que o requerente seja interveniente.

    ** Cumpre apreciar e decidir.

    A inscrição de uma condenação penal no registo criminal constitui um efeito da prática de um crime que reflecte a articulação e o equilíbrio entre uma ordem jurídica que contempla a socialização dos delinquentes como finalidade do sancionamento penal com as exigências de defesa da comunidade perante os perigos de uma possível reincidência.

    E, sendo assim compete aos tribunais de execução de penas a concessão da reabilitação judicial, nos termos e para os efeitos previstos na alínea z) do artigo 138º do CEP e artigo 114º, nº 3, al. w) da Lei nº. 62/2013, de 26 de Agosto.

    Subjacente ao conceito de reabilitação (entendido como sinónimo de socialização do delinquente enquanto finalidade de prevenção especial positiva…) está a reposição da capacidade de direitos, afectada pelas condenações em penas...

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