Acórdão nº 1079/08.2TVPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 07 de Julho de 2016

Magistrado ResponsávelMANUEL DOMINGOS FERNANDES
Data da Resolução07 de Julho de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 1079/08.2TVPRT.P1-Apelação Origem: Comarca do Porto-Inst. Central-1ª Secção Cível-J5 Relator: Manuel Fernandes 1º Adjunto Des. Caimoto Jácome 2º Adjunto Des. Sousa Lameira Sumário: I- A parte que pretenda beneficiar da ampliação do prazo prescricional estatuído no artigo 498.º, nº 3 do CCivil, atento o seu teor, alcance e sentido, tem o ónus de, por um lado, alegar que os factos praticados pela pessoa a quem pede a indemnização, além de constituírem um ilícito civil, constituem, igualmente, um ilícito criminal e, por outro, de concretizar, através dessa mesma alegação, os factos em causa.

II- Querendo o Autor imputar a Ré, enquanto instituição bancária, a prática de um crime de falsificação de documento previsto no artigo 256.º do Código Penal tem que alegar os factos indispensáveis ao preenchimento dos requisitos da responsabilidade jurídico-penal das pessoas colectivas a que se refere o artigo 11.º do Código Penal.

III- O prazo de prescrição previsto no n.º 3 do art.º 498.º do Código Civil é aplicável aos responsáveis meramente civis, designadamente ao comitente, desde que se alegue que o acto gerador dos danos indemnizáveis foi causado por facto ilícito criminal do comissário no âmbito da relação de comissão.

IV- Os prazos de prescrição, de direito a indemnização, por responsabilidade civil extracontratual, são os fixados, no artigo 498.º, n. 1, do CCivil V- Quando se determina que tal prazo, se conta do momento em que o lesado teve conhecimento do seu direito, quer significar-se, apenas, que se conta a partir da data em que conhecendo, a verificação dos pressupostos, que condicionam a responsabilidade, soube ter direito a indemnização pelos danos que sofreu e não, da consciência, da possibilidade legal, do ressarcimento.

I-RELATÓRIO Acordam no Tribunal da Relação do Porto: B…, residente Rua …, Nº …, …, Braga veio instaurar o presente processo comum de declaração, contra Réu-C…, Instituição Financeira de Crédito S.A., com domicílio na Avenida …, …, Lisboa.

*Na contestação a Ré veio invocar, além do mais, a excepção da prescrição.

Para tanto alegou que: - o Autor teve conhecimento em meados de 2001 do apontamento efectuado no Banco de Portugal-da existência de crédito em mora do Autor para com a Ré; - em data anterior a Setembro de 2002 o Autor deslocou-se ao Porto para contactar com funcionários da Ré, quando contra o mesmo foi instaurada execução por esta; - em Maio de 2005 foi proferida sentença nos autos de embargos de executado a julgar os mesmos improcedentes; - há mais de 5 anos que não acede a um crédito bancário, continuando nas listas do Banco de Portugal como utilizador de risco, impossibilitado de ter crédito em todo e qualquer banco.

Qualquer uma das apontadas causas com as quais o Autor justifica o seu pedido, decorreram há mais de 3 anos ou são do seu conhecimento há mais de 3 anos, pelo que nos termos do disposto no artigo 498.º do CCivil já prescreveu o seu direito indemnizatório.

*Respondeu o Autor à excepção assim deduzida nos termos de fls. 238 e segs., alegando em suma que: - De Setembro de 2001 até 09 de Fevereiro de 2006 (data do acórdão que decidiu o recurso interposto pela aqui R. da sentença de embargos proferida) apenas teve conhecimento de factos potenciadores do seu direito a ser indemnizado pela Ré.

- Só com tal aresto tendo tido conhecimento do direito a que alude o artigo 498.º do CCivil, face à factualidade que o mesmo ali manteve, apesar de ter ordenado a repetição de produção de prova, pois que, se os embargos procedessem, a inclusão na lista era justificada e não haveria ato ilícito imputável à Ré.

Conclui, assim, que o prazo de prescrição do artigo 489.º do CCivil só se iniciou em 09 de Fevereiro de 2006, para além de que ainda hoje os bens jurídicos tutelados e para os quais reclama indemnização continuam em crise, tendo pois a acção sido tempestivamente instaurada.

*A Srª juiz do processo, em despacho devidamente fundamentado, concluiu pela verificação da excepção da prescrição invocada pela Ré absolvendo-a do pedido contra ela formulado.

*Não se conformando com o assim decidido veio o Autor interpor o presente recurso concluindo as suas alegações pela forma seguinte: 1ª - O pedido de indemnização do Autor, aqui Recorrente, tem subjacente a prática de factos que consubstanciam o ilícito criminal de falsificação de documentos (art.°s 15°, 16°, 27°, 28°, 29°, 30°, 36°, 37°, 49°, 50°, 53°, 66° e 67° da PI).

  1. - Dispõe o art. 498.°, n° 3 do Código Civil que "Se o facto ilícito constituir crime para o qual a lei estabeleça prescrição sujeita a prazo mais longo, é este o prazo aplicável". Neste sentido também o Acórdão do STJ de 04.11.2008, proc. n.° 08A2342.

  2. - Nos temos conjugados do art. 11.°, n.°s 1, 2, 6 e 7 e art. 25ó.° n.° 1 e 3 do C e ainda do art. 11 8°, n° 1, alínea b), todos do Código Penal, o procedimento criminal que tenha subjacente o crime de falsificação de livrança extingue-se, por efeito de prescrição, logo que sobre a prática do crime tiverem decorrido dez anos.

  3. - Destarte, tendo em conta a data da consumação do crime que ocorreu em Setembro de 2002, data em que o Recorrido dá à execução as livranças emitidas ao abrigo de tais contratos, verifica-se que, no momento da propositura da acção (19 de Novembro de 2008), ainda não haviam decorridos 10 anos sobre a prática de tal ilícito.

  4. - Refira-se que, não conhecendo o Autor, à data da interposição da acção, os danos em toda a sua extensão, poderia optar, nos termos do art. 72.°, n.° 1, al. d) do CPP, pela dedução do pedido de indemnização civil em separado, perante os tribunais comuns e assim fez.

    Sem prescindir, 6ª - Os contratos supra-mencionados foram apresentados à Ré, aqui Requerida, através de um seu Agente, que actua enquanto comissário do Banco (art. 37° da PI).

  5. - Por sua vez, o comitente (Banco-Réu) não verificou, como deveria ter verificado, a veracidade quer dos contraentes, quer da informação e identidade aos mesmos atinentes (art. 37° da PI).

  6. - Perfilam-se, assim, dois factos ilícitos imputáveis a diferentes sujeitos. De um lado o crime de falsificação de documentos; de outra banda um ilícito decorrente do incumprimento das regras relativas à subscrição e execução dos contratos, os quais preenchem os pressupostos do art. 498.°, n.° 3 do CC.

  7. - Sem prescindir e, atendendo apenas ao "facto" que sustenta a causa pretendi, sempre se diga que estamos perante uma realização plúrima de diversas "acções" ' interpelação ao Autor para pagar dois contratos que não subscreveu, violação do dever de cuidado em relação à actuação dos seus comissários, interposição da acção executiva e persistência da posição na mesma assumida, violação do dever de cuidado mantendo o nome do Autor na central de riscos do Banco de Portugal.

  8. - Assim, será sempre a partir do cessar do "facto" que se conta o prazo prescricional, e o facto cessou apenas com o trânsito em julgado dos embargos, o que só ocorreu em Março de 2015.

    *Devidamente notificada contra-alegou a Ré concluindo pelo não provimento do recurso.

    *Corridos os vistos legais cumpre decidir.

    *II- FUNDAMENTOS O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da alegação do recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso-cfr. artigos 635.º, nº 4, e 639.º, nºs 1 e 2, do C.P.Civil.

    *No seguimento desta orientação é apenas uma a questão que importa apreciar e decidir: a)- saber se ocorreu, ou não, o prazo prescricional do direito indemnizatório exercido pelo Autor na presente acção.

    *A)- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A matéria de facto a ter em conta para a apreciação e decisão da questão acima enunciada é que resulta do relatório supra que aqui se dá por reproduzida, e ainda a que consta dos articulados apresentados pelas partes com relevo para aquela decisão e que no momento oportuno dela se lançará mão.

    *III. O DIREITO Como supra se referiu é apenas uma a questão que importa apreciar e decidir: a)- saber se ocorreu, ou não, o prazo prescricional do direito indemnizatório exercido pelo Autor na presente acção.

    O tribunal propendeu, como emerge da respectiva decisão, para o entendimento de que, efectivamente, se verificava a prescrição do referido direito indemnizatório.

    Deste entendimento dissente o Autor recorrente.

    Vejamos, então, de que lado está a razão.

    Antes de mais, importa começar por dizer que o instituto da prescrição tem o seu fundamento, como decorre dos ensinamentos do Mestre Manuel A. Domingues de Andrade[1], “na negligência do titular do direito em exercitá-lo durante o período de tempo indicado na lei. Negligência que faz presumir ter ele querido renunciar ao direito, ou pelo menos o torna (o titular) indigno de protecção jurídica (dormientibus non...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT