Acórdão nº 5515/15.3T8OAZ-A.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 07 de Julho de 2016

Magistrado ResponsávelMARIA JOS
Data da Resolução07 de Julho de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 5515/15.3T8OAZ-A.P1 4.ª Secção Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:II1. B… veio em 23 de Dezembro de 2015 requerer exame médico de revisão de incapacidade para o trabalho, nos termos do disposto no artigo 145.º do CPT, identificando como entidade responsável a C… - Companhia de Seguros, S.A., por força de contrato de seguro com a mesma celebrado, e pedindo lhe seja deferido o pedido de realização de perícia médica para aferição do agravamento da incapacidade e consequente indemnização a suportar pela requerida seguradora.

Invoca em fundamento da sua pretensão, em suma: que nasceu no dia 04 de Março de 1967; que exerceu profissão por conta própria na área da construção civil e no dia 26 de Agosto de 1997 sofreu um acidente de trabalho ao dar uma queda ao descer umas escadas; que, para salvaguarda das situações de risco laboral, havia efectuado com a Companhia de Seguros D…, S.A., hoje integrada por fusão na C… – Companhia de Seguros SA, um seguro no Ramo Acidentes de Trabalho titulado pela apólice nº ……., tendo como objecto seguro a actividade laboral do próprio tomador do seguro, e em vigor na data do acidente, cobrindo a massa salarial anual de Esc. 1.440.000$00; que depois de internamentos e tratamentos que descreve, a seguradora lhe atribuiu uma Incapacidade Parcial Permanente de 37,5 % (0,25 x 1.5) e incapacidade para o trabalho habitual, aceitou o acidente como de trabalho, o nexo de causalidade entre o acidente e as lesões sofridas, prestou-lhe assistência médica e medicamentosa, pagou-lhe valores a título de incapacidades temporárias e passou a pagar-lhe 307.170$00 como pensão anual, desde 1999.11.25, pensão que ulteriormente veio a remir; que o sinistro foi regularizado ao abrigo da Lei 2127 – DL 360/71 e alterações pelo DL 459/79, tendo a seguradora aplicado as respectivas regras técnicas para fixação da incapacidade; que desde 2005 as mazelas do pé e perna esquerdos se têm agravado significativamente, causando crescente sofrimento intermitente, que forçam o sinistrado a claudicar e a sobrecarregar muito também o membro inferior direito, situação de agravamento progressivo que consubstancia e revela que a situação clínica do sinistrado se não estabilizou nos 10 anos subsequentes à Alta Clínica.

A requerida veio invocar que o incidente não pode ser admitido por se verificar a caducidade do direito do sinistrado, pois o incidente de revisão foi instaurado mais de 15 anos a contar da data da alta e do acordo de fixação da incapacidade e da pensão, que teve lugar em 25 de Novembro de 1999, sem que entretanto tenha sido deduzido qualquer outro incidente de revisão pois aplica-se o n.º 2 da Base XXII, da Lei n.º 2127. Invoca ainda que a Lei n.º 98/2009 apenas se aplica aos acidentes ocorridos a partir de 1 de Janeiro de 2010, como constitui jurisprudência pacífica e, à cautela, sustenta não ser este o tribunal competente pois à data do acidente os tribunais onde se resolveria a presente questão seriam os tribunais comuns.

Ouvido o requerente defendeu que não existe caducidade na medida em que, nem a data da alta, nem o grau de incapacidade, puderam ser reconhecidos judicialmente, pois o acidente nunca foi participado ao Tribunal de Trabalho, pelo que não está definido o momento a partir do qual se conta a caducidade, estando assim sujeito ao prazo ordinário de 20 anos. Alegou também que o agravamento da sua situação se iniciou em 2005 e o referido prazo de caducidade deixou de existir em 1 de Janeiro de 2010, que as normas previstas no n.º 2 da Base XXII, da Lei n.º 2127 e no artigo 25.º, n.º 2, da Lei n.º 100/97 de 13 de Setembro, foram declaradas inconstitucionais e que a seguradora não comunicou o acidente nem permitiu o referido controlo judicial, apesar de na data da alta já ter entrado em vigor a Lei n.º 100/97. Quanto à competência material, alegou que, atendendo à data da entrada em juízo do presente incidente de revisão, ao caso é aplicável o Código do Processo de Trabalho (CPT) com as alterações introduzidas pelo DL nº 295/2009, de 13.10 (artº 6º), concretamente o disposto no artigo 145º CPT e que nos termos do disposto no artº 85º, al. c) da Lei nº 3/99, de 13.1, que alterou a Lei 39/87, LOTJ de 23 de Dezembro, compete aos tribunais do trabalho conhecer em matéria cível das questões emergentes de acidentes de trabalho e doenças profissionais, não resultando daí qualquer diferenciação entre acidentes decorrentes de trabalho subordinado ou de trabalho independente, pelo que a partir de 1999.01.13 se devem aplicar também aos acidentes de trabalho por conta própria as normas atinentes aos Acidentes de Trabalho por conta de outrem por estar em causa o princípio da igualdade de tratamento consagrado na C.R.P., além de que o contrato de seguro do autor cumpria o estabelecido no DL 159/99, de 11 de Maio, sendo o Tribunal do Trabalho competente para a apreciação do pedido de revisão.

Foi em 2016.03.02 proferida decisão judicial em que se julgou improcedente a excepção da caducidade e, quanto à competência material, decidiu o seguinte: «[…] 1. Subsidiariamente, a requerida invoca a incompetência do tribunal pois na data do acidente a questão seria resolvida nos tribunais comuns.

  1. O requerente opôs-se a esta incompetência porque, atenta a data da entrada em juízo do incidente, é este o tribunal competente.

  2. Em nosso entendimento, temos que ter em conta a data da entrada do incidente em juízo na medida em que, pelo menos ao que apuramos, nunca existiu um processo judicial relativo a este acidente e, como tal, nos termos do artigo 126.º, n.º 1, alínea c), da LSJ, este é o tribunal competente.

  3. Pelo exposto, julgo improcedente a exceção de incompetência absoluta deste tribunal.

[…]» 2.

A seguradora, inconformada, interpôs recurso desta decisão e formulou, a terminar as respectivas alegações, as seguintes conclusões: “1ª) O recorrido, com a actividade de trabalhador por conta própria, e um seguro de “acidentes de trabalho de trabalhadores por conta própria”, com o nº ......., celebrado em 20/08/1997, sofreu um acidente de trabalho em 26/08/1997, tendo ficado com IPP de 37,5% desde a alta em 25/11/1999, com direito a uma pensão anual e vitalícia de 307.170$00, actualizada, posteriormente, remida através da entrega, em 2001, do capital de € 26.107,43, recebido sem reserva ou reparo.

  1. ) Sem qualquer outra notícia, veio o recorrido, em 2015, requerer o presente incidente, para que se siga “exame médico de revisão de incapacidade”, por alegado agravamento que, antes, jamais foi relatado.

  2. ) A Secção do Trabalho da Comarca de Aveiro é materialmente incompetente em razão da matéria para conhecer do presente incidente, pois que, ao tempo do acidente, vigorava o art. 85.º, alínea c) da LOTJ (Lei nº 3/99, de 13 de Janeiro) estabelecendo a competência dos Tribunais do Trabalho, o conhecimento em matéria cível, das questões emergentes de acidentes de trabalho.

  3. ) Acidente de trabalho, com a cobertura infortunística então legalmente prevista pressupunha uma relação juslaboral ou de subordinação económica – citadas Bases I, II da Lei nº 2127, de 3 de Agosto de 1965, vigente à data do acidente -, pressuposto que, no caso, não se verifica. Só com a entrada em vigor da Lei nº 100/97, cujo início de vigência foi diferido para 1.01.2000, como acima se disse, é que os acidentes de trabalho ocorridos com trabalhadores independentes passam a ser regidos, com as devidas adaptações, pela nova legislação, que só se aplica aos acidentes de trabalho ocorridos após a sua entrada em vigor.

  4. ) Assim, o incidente deveria ter sido liminarmente indeferido.

  5. ) À data da celebração do contrato de seguro dos autos e do acidente do recorrido vigorava o regime previsto na Lei 2127, de 3/08/1965 e o Decreto 360/71, de 21/08/1971, sendo acidente de trabalho o definido na sua Base V, sendo indiferente ao caso dos autos as modificações legais posteriormente verificadas, quer a Lei 100/97 e o DL 143/99, quer a actual Lei 98/2009.

  6. ) Embora a lei não regulasse os acidentes de trabalho dos trabalhadores por conta própria, o contrato de seguro visava suprir essa necessidade de cobertura desses profissionais, mas através de um acordo facultativo, sujeito à disponibilidade das partes e à sua inteira liberdade negocial.

  7. ) As partes convencionaram que a prestação do seguro seguiria o que se previa no regime obrigatório de reparação dos acidentes de trabalho, a saber, a Lei 2127 e o Decreto 360/71, na parte atinente à fixação das prestações.

  8. ) Para efeitos de uma eventual revisão da incapacidade, admitindo, sem conceder, que ela se pudesse conter no âmbito da cobertura, ela jamais poderia ter um regime mais favorável do que o resultava para os trabalhadores por conta de outrem.

  9. ) Não pode o recorrido contar com “sol na eira e chuva no nabal”, no sentido de aproveitar, no que lhe interessa, o regime legal de reparação de acidente de trabalho então em vigor para abrigar a sua pretensão, para logo o afastar quando (o que já não lhe agrada) se trata de fazer aplicar às regras do direito à revisão da incapacidade, afirmando-se que, nesse aspecto, já não vale o prazo preclusivo de 10 anos previsto na Base XXII, mas sim o prazo de prescrição ordinária do artº 309º do C. Civil (!).

  10. ) Muito menos que intua, ainda que implicitamente, a aplicação do actual regime legal da Lei 98/2009, de 4 de Setembro, de cujo artº 187º resulta a sua aplicação apenas aos acidentes de trabalho ocorridos após a sua entrada em vigor, e nunca ao acidente dos autos.

  11. ) O entendimento da 1ª instância fulminaria princípios constitucionais como o da confiança, da certeza das relações jurídicas, da segurança jurídica no Estado de Direito, com os quais se previnem as legítimas expectativas do cidadão que confiou na postura e no vínculo criado através das normas prescritas no ordenamento jurídico.

  12. ) Tal sucederia se fosse admitido que a cobertura de um contrato de seguro celebrado em 1997, e tendo ocorrido um acidente por ele...

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