Acórdão nº 135/15.5T8PRD.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Outubro de 2016

Magistrado ResponsávelESTELITA MENDON
Data da Resolução11 de Outubro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 135/15.5T8PRD.P1*Recorrente: B… Recorrido: C…* Acordam na 2ª secção do Tribunal da Relação do Porto: *B…, residente na Rua …, .., … Penafiel, intentou a presente acção declarativa com processo comum contra C…, residente na Rua …, .., …, Penafiel, D…, residente na Rua …, …, …, Paredes, E…, residente na Rua …, …, …, Paredes, F…, residente no lugar …, …, Penafiel e G…, residente no lugar …, …, Penafiel, pedindo se declare que é filha de G…, e que se ordene o averbamento da paternidade no seu assento de nascimento.

Invocou para fundar a sua pretensão, em síntese, que: - os réus são os únicos herdeiros de G…, o qual faleceu em 21/06/2012; - a autora nasceu em 04/02/1959 e foi registada apenas como filha de H…; - durante os primeiros cento e vinte dias dos trezentos que antecederam o nascimento da autora, a mãe da autora manteve relações sexuais com G…, não tendo tido, nesse período, qualquer outro parceiro sexual; - em consequência desse relacionamento, a mãe da autora engravidou, gravidez de que veio a nascer a autora; - os pais de G… sempre trataram a autora como neta; - a autora tomou conhecimento de que o G… era seu pai quando a mãe a informou desse facto, o que ocorreu após a morte daquele em 21/06/2012.

Os réus, pessoal e regularmente citados, não apresentaram contestação.

Foi proferido despacho saneador e fixado o objecto do litígio e os temas da prova.

Procedeu-se à audiência de julgamento com observância do formalismo legal.

A final foi proferida a seguinte decisão:“DECISÃO:Face ao exposto, julgo verificada a excepção de caducidade em relação à presente acção e, em consequência, absolvo os réus do pedido”.

Desta decisão apelou B… oferecendo alegações e formulando as seguintes CONCLUSÕES: 1- O âmbito do presente recurso é delimitado á matéria civil e a questão suscitada consiste, pois, exclusivamente em determinar se a acção de investigação da paternidade intentada pela A. é tempestiva, ou caducou como decidiu a decisão recorrida.

2- Entende a Autora recorrente, salvo sempre o devido respeito por opinião contrária, que o prazo para propositura da acção de investigação de paternidade previsto no art. 1817º, nº 1, aplicável ex vi pelo art. 1873º, ambos do Código Civil, constitui uma restrição não justificada, desproporcionada e não admissível constitucionalmente, por violação dos arts. 18.º, n.ºs 2 e 3, 26.º, n.º 1, e 36.º, n.º 1, da CRP, já que coarcta o direito do investigante em saber de quem descende, 3- A estipulação de um prazo de caducidade, ainda que mais alargado, constante do artigo 1817.º, n.º 1, na redacção da Lei n.º 14/2009, não deixa de constituir uma restrição objectiva do direito ao conhecimento e reconhecimento da paternidade, enquanto direito fundamental, sendo que por imperativo do art. 18.º, n.º 2, da CRP, só são admissíveis restrições a esses direitos quando necessárias para salvaguardar direitos e interesses constitucionalmente protegidos, acrescentando o n.º 3 que elas têm de revestir carácter geral e abstracto e não podem ter efeito retroactivo, nem diminuir a extensão e o conteúdo essencial dos preceitos constitucionais – no mesmo sentido, cf. o Acórdão do STJ, de 21092010 (Proc. n.º 4/07.2TBEPS.G1.S1).

4- O «direito à identidade pessoal» e o «direito à integridade pessoal» ganharam hoje uma dimensão nova que não pode ser desvalorizada, 5- Já que, no fundo, a identidade pessoal, caracterizadora de cada pessoa, enquanto ser único e irrepetível, que se diferencia de todos os outros, ramifica-se em vários ângulos, nomeadamente no direito fundamental ao reconhecimento da paternidade e da maternidade. E esse direito que tem de sobrelevar a qualquer tipo de prazo ordinário que coarcte o direito de cada um de nós saber quem é e de onde vem, quais os seus antecedentes, onde estão as raízes familiares, geográficas, culturais e também genéticas.

6- Deste modo, o art. 1817º, nº 1, aplicável ex vi pelo art. 1873º, ambos do Código Civil, ao estabelecer um prazo de 10 anos para a propositura da presente acção é materialmente inconstitucional - cfr inter alia no sentido da inconstitucionalidade dos prazos os Ac STJ de 21 de Setembro de 2009 (Relator Sebastião Póvoas), de 10 de Janeiro de 2012 (relator Moreira Alves), de 14 de Janeiro de 2014 (Relator Martins de Sousa), de 16 de Setembro de 2014 (Relator Hélder Roque), in www.dgsi.pt.

7- A douta sentença recorrida ao interpretar o supra citado art. 1817º, nº 1 do Código Civil, no sentido de estabelecer esse prazo aí fixado como prazo limite para a propositura de uma acção de investigação de paternidade é inconstitucional, pois viola, deste modo, os arts. 18.º, n.ºs 2 e 3, 26.º, n.º 1, e 36.º, n.º 1, da CRP, acarretando uma nulidade da decisão proferida.

8- Mesmo no novo regime jurídico, designadamente no segmento que consigna o referido prazo de 10 anos para a interposição de acções de investigação de paternidade, na redacção da Lei n.º 14/2009, em contraponto com o prazo anteriormente fixado de 2 anos e que foi declarado inconstitucional com força obrigatória e geral, foi já declarado inconstitucional por diversas vezes pelo Supremo Tribunal de Justiça, nomeadamente nos Acs. de 13213 (Rev. nº 214/12.0TBVVD.G1.S1 – Rel. Salreta Pereira), de 9413 (Rev. nº 187/09.7TBPFR.P1.S1 – Rel. Fonseca Ramos), de 181213 (Rev. nº 3579/11.8TBBCL.S1 – Rel. Pires da Rosa), de 18205 (Rev. nº 4293/10.7TBSTS.P1.S1 – Rel. Fonseca Ramos) ou de 14215 (Rev. nº 692/11.5TBPTG.E1.S1 – Rel. Júlio Gomes).

9- Nesse sentido decidiu já este venerando Tribunal da Relação do Porto, em 03/06/2014, por acórdão proferido no processo nº 1261/12.8TBSTS.P1 e subscrito, por unanimidade, pelos senhores Juízes Desembargadores que sumariaram: O direito fundamental à identidade pessoal (artº 26º, nº1, da CRP), na dimensão do direito ao conhecimento e...

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