Acórdão nº 1837/15.1YSVNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 30 de Março de 2016

Magistrado ResponsávelJORGE LANGWEG
Data da Resolução30 de Março de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 1837/15.1YSVNG.P1 Data do acórdão: 30 de Março de 2016 Relator: Jorge M. Langweg Adjunta: Maria dos Prazeres Silva Origem: Comarca do Porto Este Instância Local de Felgueiras | Secção Criminal Sumário: A decisão de autoridade administrativa que aplica uma sanção de admoestação é passível de impugnação judicial, ao abrigo do disposto no artigo 55º, nº 1, do RGCO.

Acordam os juízes, acima identificados, da 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto Nos presentes autos, em que figura como recorrente o arguido B….

I – RELATÓRIO1. A decisão recorrida não admitiu o recurso interposto pelo arguido B…, nos termos do disposto nos artigos 420º, nº 1, alínea b) e 414º, nº 2, do Código de Processo Penal, aplicáveis por força do disposto no artigo 41º, nº 1, do DL nº 433/82 e condenou o mesmo nas custas, fixando a taxa de justiça em 2 (duas) UC.

  1. O tribunal a quo decidiu nesses termos, com base na tese da não impugnabilidade judicial da decisão administrativa que se limita a proferir uma admoestação, baseando-se em diversa legislação, doutrina e jurisprudência.

  2. Inconformado, o arguido recorreu e formulou as seguintes conclusões da motivação de recurso: A admoestação envolve para o arguido efeitos negativos importantes, nomeadamente a acusação de um comportamento delituoso, o registo de um incidente contra-ordenacional que pode influenciar a apreciação de comportamentos eventualmente a acontecer num futuro incerto e a imputação de custas do procedimento que só por si são uma "coima" encapotada e uma receita injustificada para a autoridade administrativa se se verificar a inexistência da infracção.

    Trata-se de uma sanção substitutiva da coima, ponderada a gravidade e a culpa do agente, pressupondo que a conduta imputada seja uma infracção e que foi cometida com culpa.

    Se é facultado ao arguido a impugnação judicial de decisões, despachos e medidas decididas pelas autoridades administrativas durante o processo de contra-ordenação nos termos do n* 1 do art 55° do RGCO, não tem sentido não poder ser objecto dc recurso judicial a decisão final tomada no mesmo processo.

    A recusa da apreciação em sede de recurso violaria o direito constitucional da tutela jurisdicional efectiva dos administrados relativamente à defesa dos seus direitos e interesses (vide art 248° n° 4 da CRP).

    No artigo 20° da CRP prevê-se a tutela jurisdicional efectiva do acesso ao direito como norma fundamental da democracia.

    O art 6º da Convenção Europeia dos Direitos do Homem (DR 236 Lei 65/78 de 13 de Outubro) estabelece o mesmo princípio da Constituição Portuguesa.

    Não se podendo aceitar o argumento formal defendido na decisão sob recurso de que não é recorrível porque não consta no elenco das decisões recorríveis do artigo 59° do RGCO.

    Para efeito de susceptibilidade de recurso por impugnação judicial prevista no n° 1 do artigo 59° do RGCO só o entendimento da admoestação com o significado exposto no artigo anterior não colide com os princípios fundamentais constitucionalmente consagrados.

    A susceptibilidade de impugnação de decisões interlocutórias no processo dc contra- ordcnação prevista no n° 1 do art 55° do RGCO faz, por maioria de razão concluir pela recorribilidade da decisão final no mesmo processo.

    A norma do n° 1 do art 59° do RGCO deve ser interpretada no sentido dc autorizar o recurso de impugnação de qualquer decisão administrativa de condenação, incluindo necessariamente a admoestação.

    Só assim se assegura a unidade do sistema jurídico e uma interpretação conforme o princípio da tutela jurisdicional efectiva constitucionalmente consagrado nos arts 20º, n°1 e 268, n.° 4 da CRP.

    Ao interpretar a norma do art. 59.°, n.° 1 do RGCO no sentido de excluir o recurso de impugnação de decisões administrativas que aplicam admoestação, a decisão recorrida violou a norma do art. 59°, nº 1 do RGCO, bem como as normas dos arts. 20.°, n.° 1 e 268º, n.° 4 da CRP e o princípio da tutela jurisdicional efectiva nelas consagrado.

    São termos em que decidindo pela procedência das conclusões apresentadas e anulando a decisão recorrida ordenando-se a admissibilidade do recurso para o Tribunal de Vila Nova de Gaia da decisão proferida na contra-ordenação cm que o Recorrente foi sancionado, far-se-á Justiça.

  3. O recurso foi liminarmente admitido no tribunal a quo, subindo nos próprios autos, com o efeito legal.

  4. O Ministério Público respondeu à motivação de recurso, pugnando pela sua improcedência.

  5. Nesta instância, o Ministério Público emitiu parecer, pugnando pela procedência do recurso, destacando os argumentos aduzidos em defesa da recorribilidade da decisão administrativa [conforme a fundamentação do acórdão do Tribunal Constitucional n.° 299/2013 e do acórdão da Relação de Évora de 11.11.2010] ainda que se limite a aplicar admoestação – e, no caso, para além da admoestação o recorrente ter sido condenado no pagamento das custas, os quais considerou amplamente justificativos, sob o ponto de vista legal e constitucional, da possibilidade de se ter uma outra instância a pronunciar-se sobre a bondade de tal decisão.

  6. Não tendo sido requerida audiência, o processo foi à conferência, após os vistos legais, respeitando as formalidades legais [artigos 417º, 7 e 9, 418º, 1 e 419º, 1 e 3, c), todos, ainda do mesmo texto legal].

    Questões a decidir Do thema decidendum dos recursos: Para definir o âmbito dos recursos, a doutrina [1] e a jurisprudência [2] são pacíficas em considerar, à luz do disposto no artigo 412º, nº 1, do Código de Processo Penal, que o mesmo é definido pelas conclusões que o recorrente extraiu da sua motivação, sem prejuízo, forçosamente, do conhecimento das questões de conhecimento oficioso.

    A função do tribunal de recurso perante o objeto do recurso, quando possa conhecer de mérito, é a de proferir decisão que dê resposta cabal a todo o thema decidendum que foi colocado à apreciação do tribunal ad quem, mediante a formulação de um juízo de mérito.

    Atento o teor do relatório atrás produzido, importa decidir a questão substancial a seguir concretizada, que sintetiza as conclusões do recorrente, constituindo, assim, o thema decidendum: Erro em matéria de direito: Da não impugnabilidade judicial da decisão administrativa que se limita a proferir uma admoestação, o que viola o disposto no art. 59.°, n.° 1 do RGCO e...

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