Acórdão nº 6366/15.0T8PRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 27 de Setembro de 2016
Magistrado Responsável | ANABELA DIAS DA SILVA |
Data da Resolução | 27 de Setembro de 2016 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Apelação Processo n.º 6366/15.0 T8PRT.P1 Comarca do Porto – Porto - Instância Local – Secção Cível – J2 Recorrente – Banco B…, SA Recorrida – C… Sucursal En Espanha Relatora – Anabela Dias da Silva Adjuntas – Desemb. Ana Lucinda Cabral Desemb. Maria do Carmo Domingues Acordam no Tribunal da Relação do Porto (1.ªsecção cível) I – C… Sucursal En Espanha, com sede em Madrid, Espanha, intentou na Comarca do Porto – Porto - Instância Local – Secção Cível, a presente acção declarativa com processo comum contra o Banco B…, com sede no Porto, pedindo a condenação do réu no pagamento da quantia de €12.070,79 (doze mil e setenta euros e setenta e nove cêntimos), acrescida de juros mora a contar desde a interpelação para pagamento.
Alegou, para tanto, e em síntese, que no âmbito das relações comerciais que estabeleceu com D…, SA, só aceitou fornecer mercadorias à referida D… caso fosse emitida garantia bancária a seu favor. E, por isso, a D… contratualizou com o réu a celebração de um contrato de garantia bancária a favor da autora, tendo sido, em consequência, emitida pelo réu a favor da autora a garantia bancária n.º …-..-……..
Ora, desde finais de 2013 que a D… se encontra em incumprimento perante a autora, estando em dívida a quantia global de €12.070,79.
A autora em Novembro de 2013 solicitou ao réu, ao abrigo da garantia bancária emitida, o pagamento de tal quantia, mas o réu recusou o pagamento alegando que a D… se havia extinguido em Setembro de 2013, estando desobrigado de qualquer pagamento.
*O réu foi pessoal e regularmente citado e veio contestar pedindo a improcedência da acção.
Para tanto alegou, em síntese, que ocorreu a extinção do direito da autora, já que entende que o que contratualizou com a D… foi apenas uma garantia simples do tipo fiança*A autora veio responder reafirmando que o contrato em causa é um contrato de garantia bancária, autónomo e independente, do contrato base.
Termina pedindo a improcedência da excepção.
*Realizou audiência prévia, no âmbito da qual se tentou a conciliação das partes, sem êxito, após o que foi fixado o objecto do litígio.
Proferiu-se despacho saneador e após a junção aos autos de documentos julgados necessários, proferiu-se sentença que “…julgou a acção totalmente procedente por provada e em consequência condenou o Réu Banco B… a pagar à Autora C… Sucursal En Espanha a quantia de €12.070,79 (doze mil e setenta euros e setenta e nove cêntimos), acrescida de juros de mora desde a interpelação do Réu para pagamento”.
*Inconformado com tal decisão dela veio o réu recorrer de apelação, pedindo a sua revogação e substituição por outra que julgue a acção improcedente.
O apelante juntou aos autos as suas alegações que terminam com as seguintes conclusões: I. A recorrente não pode conformar-se com a decisão final, porquanto entende que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento, pretendendo através do presente recurso, obter a reforma de uma sentença injusta, inquinada por erro de julgamento, por estar em desconformidade com o direito e com a realidade dos factos.
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Ao contrário do entendimento do Mmo Juiz a quo, atendendo à prova documental, parece-nos no mínimo irrazoável que resulte provado que o contrato celebrado assume a natureza de garantia bancária autónoma.
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De facto, as garantias prestadas pelos bancos podem assumir diversas modalidades, entre as quais se inclui a fiança, sendo certo que o contrato celebrado e posto em crise não é uma garantia bancária autónoma, muito menos com cláusula “on first demand”.
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A fiança é uma figura jurídica facilmente confundível com as garantias bancárias autónomas, mas o que o apelante declarou contratar foi afiançar/garantir a satisfação de um crédito em caso de incumprimento do contrato base.
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Não sendo as garantias bancárias contratos típicos, só são legalmente admissíveis tendo em ponderação os princípios da liberdade contratual e da autonomia privada.
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Pelo que é perfeitamente admissível moldar o seu conteúdo, assumindo-se o contrato aqui controvertido, indiscutivelmente, como tendo a natureza de fiança.
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Sendo certo que o Banco soube expressar corretamente a sua vontade real, daí o recurso sistemático à palavra “fiança” no contrato.
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Tendo assim o contrato um mínimo de correspondência literal com a vontade real do apelante.
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Sendo de concluir que tendo o contrato a natureza de fiança, poderia o apelante recusar o pagamento com base no art.º 653.º do Código Civil, contrariamente ao entendido pelo douto Tribunal a quo.
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Enfermando assim a douta decisão recorrida de erro de julgamento nos termos do n.º 2 do art.º 639.º e estando em clara violação do disposto no art.º 9.º, 236.º e 653.º do Código Civil, pelo que deve a mesma ser revogada e substituída por outra que julgue a ação improcedente e ordene a absolvição do pedido.
*A autora juntou aos autos as suas contra-alegações onde pugna pela confirmação da decisão recorrida.
II – Da 1.ª instância chegam-nos assentes os seguintes factos:
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A autora é uma sociedade comercial que se dedica ao fabrico e venda de materiais para a actividade da construção civil, com escopo lucrativo.
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O réu é uma instituição financeira, que se dedica à actividade bancária com escopo lucrativo.
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No âmbito da actividade por si desenvolvida, é prática da autora exigir aos clientes com quem estabelece relações comerciais a prestação de garantias bancárias, para assegurar eventuais incumprimentos.
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Assim, no âmbito da actividade por si desenvolvida, a autora estabeleceu relações comerciais com a sociedade comercial D… SA, sociedade comercial, com sede na Rua …, freguesia de …, Lourinhã, contribuinte n.º … … ….
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E, para o efeito, apenas aceitou fornecer mercadorias à referida sociedade D…, SA, se a mesma contratasse com uma instituição bancária uma garantia bancária a favor da autora.
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Tendo a referida sociedade D…, SA, contratualizado com o réu a celebração de um contrato de garantia bancária a favor da autora.
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E, por conseguinte foi emitida pelo réu a favor da autora a garantia bancária n.º …-..-……., cuja cópia foi junta pelo réu, a fls. 61.
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Pelos finais do ano de 2013 a referida sociedade D…, SA, encontrava-se em incumprimento relativamente à autora das seguintes quantias, relativas a mercadorias fornecidas, e não pagas; - factura n.º ………, no valor de €4.145,56, emitida em 23.08.2012 e cujo pagamento deveria ter sido efectuado em 21.11.2012; - factura n.º …….., no valor de €2.428,04, emitida em 24.09.2012, e cujo pagamento deveria ter sido efectuado em 23.12.2012.
- factura n.º ………, no valor de €5.781,57, emitida em 08.10.2012, cujo pagamento deveria ter sido efectuado em 07.11.2012, e - factura nº …….., no valor de €822,96, emitida em 08.10.2012, cujo pagamento deveria ter sido efectuado em 07.11.2012, i) Posteriormente foram emitidas as seguintes nota de crédito a referida sociedade comercial D…, SA - nota de crédito n.º ………, no valor de €300,51, com data de €31.12.2012, - nota de crédito n.º ………, no valor de €502,95, com data de 16.01.2013, - nota de crédito n.º …….., no valor de €303,88, com data de 16.01.2013 – conforme documento n.º 1.
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Deste modo, a referida sociedade comercial encontrava-se em dívida para com a autora da quantia global de €12.070,79, (doc.1).
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Face do incumprimento da D…, SA, a autora, por carta datada de 28 de Novembro de 2013 dirigida ao réu...
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