Acórdão nº 470/09.1TAFLG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 28 de Setembro de 2016

Magistrado ResponsávelFRANCISCO MOTA RIBEIRO
Data da Resolução28 de Setembro de 2016
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 470/09.1TAFLG.P1 – 4.ª Secção Relator: Francisco Mota Ribeiro*Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação do Porto 1. RELATÓRIO 1.1 Por sentença de 19/05/2015, após realização da audiência de julgamento, no Proc.º nº 470/09.1TAFLG.P1 - que correu termos na Secção Criminal, J-1, da Instância Local de Felgueiras, Comarca do Porto Este, foi o arguido B… condenado pela prática de um crime de burla tributária agravada, previsto e punido pelo art.º 87º, nºs 1 e 2, do RGIT, na pena de 300 dias de multa, à taxa diária de € 7,00, e ainda condenado, juntamente com a sociedade C…, Unipessoal, Lda., a pagar ao demandante cível, Instituto da Segurança Social, IP, a quantia de € 9.285,89, acrescida de juros vencidos desde a citação e vincendos, calculados nos termos do art.º 16º do DL nº 411/91, de 17/10, e art.º 3º do DL nº 73/99, de 16/03, até efetivo e integral pagamento.

1.2.

De tal sentença interpôs o arguido recurso, apresentando motivação que termina com as seguintes conclusões: “1) – Entende o recorrente que a matéria de facto dada como provada é insuficiente para que o arguido, ora recorrente, seja condenado.

2) – Os elementos constitutivos do crime de burla tributária não se mostram preenchidos.

3) – Violou, assim, a douta sentença, o preceituado no art.º 87º do RGIT e nº 2 do art.º 410º do Código de Processo Penal.

Termos em que, concedendo-se provimento ao presente recurso, absolvendo-se o arguido dos factos e do crime que foi julgado e condenado, farão V. Exas. Inteira e sã justiça.” 1.3.

O recurso foi admitido pelo despacho de 08/07/2015, de fls. 753.

1.4.

O Ministério Público respondeu ao recurso, de fls. 759 a 776, concluindo pela sua improcedência, com as seguintes conclusões: 1 - Por sentença datada de 19 de maio de 2015, o arguido B… foi condenado como autor da prática de um crime de burla tributária agravada, previsto e punido pelo artigo 87º, nºs 1 e 2 do RGIT, na pena de 300 dias de multa, à taxa diária de € 7,00, num total de € 2.100,00; 2 – O recorrente considera que a decisão recorrida enferma do vício a que alude o artigo 410º, nº 2, al. a), do CPP (insuficiência para a decisão da matéria de facto provada).

3 – A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada deve resultar dos factos dados como assentes, isto é do texto da sentença/acórdão. “A insuficiência da matéria de facto para a decisão (art.º 410, nº 2, al. a), do CPP), implica a falta de factos provados que autorizam a ilação jurídica tirada; é uma lacuna de factos que se revela internamente, só a expensas da própria sentença, sempre no cotejo com a decisão (…)”.

4- A insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, deve resultar dos factos dados como assentes, isto é, do texto do acórdão.

Como se disse no recente Acórdão do STJ, de 6/10/2011, proferido no processo número 88/09PESN-L1S1, “A insuficiência da matéria de facto para a decisão (art.º 410º, nº 2, al. a), do CPP), implica a falta de factos provados que autorizam a ilação jurídica tirada; é uma lacuna de factos que se revela internamente, só a expensas da própria sentença, sempre no cotejo com a decisão (…)”.

5 – A insuficiência da matéria de facto provada significa que os factos apurados e constantes da decisão recorrida são insuficientes para a decisão de direito, do ponto de vista das várias soluções que se perfilem – absolvição, condenação, existência de causa de exclusão da ilicitude, da culpa ou da pena, circunstâncias relevantes para a determinação desta última, etc. - e isto porque o tribunal deixou de apurar ou de se pronunciar sobre factos relevantes alegados pela acusação ou pela defesa ou resultantes da discussão da causa, ou ainda porque não investigou factos que deviam ter sido apurados na audiência, vista a sua importância para a decisão, por exemplo, para a escolha ou determinação da pena.

6 – É a nosso ver evidente que o vício invocado pelo recorrente, com tal enquadramento jurídico (insuficiência para a decisão da matéria de facto provada – al. a) do nº 2 do art.º 410º do CPP) se não verifica, porque os factos dados como provados na douta sentença recorrida, permitem a ilação jurídica tirada, ou seja, a condenação do arguido pela prática de um crime de burla tributária.

7 - O crime de burla tributária, aqui em causa, está estruturado como um crime de resultado, aparecendo como um verdadeiro tipo de burla especial, em que o processo típico é de execução vinculada (e não livre), mas, simultaneamente, estabelece elementos integradores mais formais.

8 - São elementos constitutivos deste crime de burla tributária os seguintes: - Uso de erro ou engano sobre os factos, provocado por meios fraudulentos, como falsas declarações, falsificação ou viciação de documento fiscalmente relevante; - Que sejam aptos ou idóneos a determinar a administração tributária ou a administração da segurança social a efetuar atribuições patrimoniais das quais resulte enriquecimento do agente ou de terceiro.

- No caso do crime de burla tributária ser gravado pelo nº 2 do artigo 87º exige-se ainda que a atribuição patrimonial seja de valor elevado, isto é de valor superior a 50 UC, avaliadas à data da prática do facto – art.º 202º, al. a), do Código Penal, aplicável ex vi do art.º 3º, al. a), do RGIT, sendo que no caso o valor da UC para o triénio 2004-2006 foi de € 89,00 (acendendo 50 UC a € 4.450,00), tendo em 2007 se elevado a € 96,00 (passando então o valor elevado a cifrar-se acima dos € 4.800,00) – cfr. Art.º 6º do DL nº 212/89, de 30/06, (atualmente o valor da UC para vigorar no ano 2015 é de € 102,00, sendo assim considerado valor elevado o que excede o montante de € 5.100,00).

- Como escrevem Jorge Lopes de Sousa e M. Simas Santos, in Regime Geral das Infrações Tributárias Anotado, 2ª Edição, p. 547, aproxima-se este tipo legal do crime de burla previsto no art.º 217º do Código Penal, no entanto, não refere expressamente o erro ou engano provocado, elementos que, não obstante, estão presentes na referência aos meios fraudulentos, os suscetíveis de provocar astuciosamente o tal erro ou engano. De acordo com a configuração do tipo, exige-se o uso de um meio fraudulento “ativo”, ou seja, uma conduta astuciosa comissiva que diretamente induz o erro ou engano e não uma mera conduta omissiva do agente.

10 - Atenta a factualidade provada, verifica-se o preenchimento inequívoco dos elementos constitutivos do crime de burla tributária agravada em relação ao arguido.

11 – Afigura-se-nos não assistir qualquer razão ao...

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