Acórdão nº 27258/15.8T8PRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 19 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelJER
Data da Resolução19 de Março de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

APELAÇÃO n.º 27258/15.8T8PRT.P1 SECÇÃO SOCIAL ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO I.RELATÓRIO I.1 B...

intentou a presente acção declarativa, como processo comum, emergente contrato individual de trabalho, contra C..., E.P.E., pedindo a que seja julgada procedente, em consequência:

  1. Considerando-se o contrato de trabalho celebrado entre a Autora e Ré, em 06 de janeiro e 2010, como um contrato de trabalho por tempo indeterminado, concomitantemente declarando-se a nulidade do contrato de trabalho celebrado a 04 de junho de 2011; b) Considerando-se como ilícito o despedimento levado a cabo pela Ré, e em consequência: c) Condenando-se a Ré a pagar à Autora a indemnização legal bem como demais créditos salariais, tudo computado em € 6.325,39 (podendo-se compensar a importância que a Autora já declarou ter recebido da Ré e que importa o valor de € 4.680,02), ou à reintegração da Autora, caso seja esta a sua escolha a efectuar até ao termo da discussão em Audiência Final de Julgamento; d) Condenando-se a Ré a pagar todas as remunerações que deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal que declare a ilicitude do despedimento.

    e) Condenando-se a Ré a pagar à Autora o trabalho suplementar prestado, na importância que se vier a apurar em sede de incidente de liquidação nos termos do art.º 378.º do CPC.

    Para sustentar os pedidos alegou, no essencial, que foi admitida, por contrato de trabalho a termo incerto celebrado a 06 de Janeiro de 2011, para desempenhar para a R. as funções de enfermeira em substituição de uma colega de trabalho temporariamente ausente, colega que, quando regressou ao serviço, foi integrada em unidade diversa daquela onde a A. sempre laborou.

    Em 04 de Junho de 2011, no dia imediatamente subsequente à cessação daquele primeiro contrato, celebrou um outro com a R., igualmente a termo incerto e para desempenhar as mesmas funções, mas desta vez mencionando-se como justificação a substituição um seu colega que, quando se ausentou temporariamente do C... e quando a este regressou, não trabalhava no serviço de cuidados paliativos, no qual a A., desde o início da contratação até à cessação do vínculo laboral, sempre cumpriu as suas funções de Enfermeira.

    Este contrato foi feito cessar por comunicação da Ré de 13 de Abril de 2015, com efeitos em 13 de junho de 2015, em virtude da extinção do motivo da contratação, ou seja, pelo suposto regresso do trabalhador enfermeiro.

    Defende que o segundo contrato de trabalho a termo incerto é nulo, pois foi uma fuga à convalidação num vínculo sem termo, caso típico de fraude à lei. Em consequência, o contrato de trabalho a termo incerto celebrado a 06 de Janeiro de 2011, convalidou-se num contrato de trabalho por tempo indeterminado.

    A Ré não pode invocar a caducidade do contrato de trabalho celebrado a 04 de Junho de 2011, por se estar perante um verdadeiro contrato de trabalho por tempo indeterminado. Ao fazê-lo, consubstanciou um despedimento ilícito.

    Finalmente, alegou ter direito ao pagamento de todo o trabalho suplementar que prestou e que não lhe foi pago pela Ré, mas não conseguir calcular o respectivo valor, dado os registos de ponto encontrarem-se na posse da Ré, dizendo que essa importância deverá ser apurada em sede de incidente de liquidação.

    Procedeu-se a audiência de partes, não se tendo logrado obter o acordo.

    Notificada para o efeito, a A Ré veio contestar, contrapondo que no primeiro contrato de trabalho firmado, a substituição foi direta e no segundo foi indireta, sendo que ambas as substituições são legalmente permitidas, aduzindo que na gestão de recursos humanos de enfermagem, estas substituições não podem deixar de ser implementadas nestes termos, por substituições indirectas, através de ‘mobilidade interna’ para a melhor eficácia dos serviços e integração harmoniosa dos trabalhadores, sempre que o concreto posto de trabalho temporariamente vago exija uma diferenciação que o profissional recrutado no exterior não detenha.

    Alega, ainda, que é uma entidade pública empresarial integrada na Administração indirecta do Ministério da Saúde, estando sujeita à legalidade substantiva e adjectiva de contratação de recursos humanos e ainda à legalidade da tutela administrativa. Os contratos de trabalho, mesmo a termo resolutivo não seguem integralmente as normas do Código do Trabalho no que concerne à conversão dos contratos, vigorando o princípio da inconvertibildade dos contratos de trabalho a termo resolutivo.

    A contratação de recursos humanos na saúde, nas Unidades hospitalares EPE, é fortemente condicionada, dependente de autorização casuística e fundamentada e obedece a procedimentos de recrutamento e selecção públicos, por efeitos da reforma do DL 233/2005, de 29-12. Sucede que a autora não foi opositora a qualquer procedimento de recrutamento e selecção, mas sim beneficiária de um convite directo associado à apresentação de uma candidatura que espontaneamente apresentara.

    Concluiu pugnando pela improcedência da acção, em consequência sendo absolvida dos pedidos formulados pela autora.

    Foi proferido despacho saneador.

    Foi fixado o valor da causa em € 12.270,90.

    Na consideração da causa não apresentar complexidade fáctica que tornasse necessário fixar a matéria sobre a qual cumpre ainda produzir prova, foi dispensada a fixação dos temas de prova, a que o artigo 596º do Código do Processo Civil.

    Procedeu-se a julgamento com observância do formalismo legal.

    I.2 Subsequentemente foi proferida sentença concluída com o dispositivo seguinte: «Pelo exposto, julgo a presente ação parcialmente procedente, por parcialmente provada, e, em consequência:

  2. Declaro que o contrato de trabalho celebrado entre a A., B..., e a R., C..., EPE, em 6 de janeiro de 2010 foi-o por tempo indeterminado; b) Declaro que o despedimento da A. levado a cabo pela R. foi ilícito; c) Condeno a R. a reintegrar a A.; d) Mais condeno a R. a pagar à A. todas as remunerações que esta deixou de auferir desde o despedimento até ao trânsito em julgado da presente sentença; e) Determino que, ao valor referido em d), sejam descontados € 3.964,63 (três mil novecentos e sessenta e quatro euros e sessenta e três cêntimos) que a A. já recebeu da R. a título de compensação pela cessação do contrato de trabalho; f) Absolvo a R. do restante peticionado; g) Condeno a A. e a R. nas custas do processo, na proporção de vinte por cento para a primeira e de oitenta por cento para a segunda.

    Registe e notifique.

    (..)».

    I.3 Inconformada com a sentença o Réu apresentou recurso de apelação, o qual foi admitido com o modo de subida e efeito adequados. As alegações foram sintetizadas nas conclusões seguintes: 1.ª À matéria de facto, com base no extracto indicado e na aceitação implícita que a douta sentença faz da matéria, importa, em reapreciação, aditar que «a autora foi contratada pela ré sem a adopção de uma via de concurso público»; 2ª A norma do artigo 143º nº1 do Código do Trabalho reporta-se a um posto de trabalho material e objectivamente considerado e é inaplicável, na imposição de um hiato temporal, à contratação a termo incerto por substituição indirecta de trabalhador ausente; 3ª Isso mesmo inculca a norma do art.º 143º nº 2 ao afastar, para a nova ausência do trabalhador substituído a imposição de qualquer hiato temporal; 4ª A douta sentença recorrida enferma de contradição quando reconhece como validamente fundada a contratação a termo incerto por substituição indirecta de trabalhador ausente, a partir da data da celebração do segundo contrato a termo incerto, reconhecendo a idoneidade desse motivo justificativo e mesmo assim sujeitando a situação de facto à imposição associada à chamada ‘contratação sucessiva’; 5ª A norma conjugada dos arts 143º nº 1 e 147º nºs 1 e 2 do Código do Trabalho de onde decorre que «se considera» como contrato por tempo indeterminado aquele cuja celebração se desvie das normas previstas nos arts 140º e segs não estabelece nenhuma situação de nulidade, originária ou outra, mas uma cominação da conversão do contrato; 6ª Não existe qualquer abuso de direito na invocação da ilegalidade do ‘momento’ do recrutamento do trabalhador antes está a ré plenamente sujeita ao princípio de legalidade nos termos do qual tem a obrigação legal de a invocar (tal como tinha o dever de a não ter cometido); 7ª O facto de a um contrato de trabalho celebrado ente um trabalhador e um hospital EPE se aplicar (à execução) o Código de Trabalho, não obsta, por ter sido esse o propósito do legislador, e vem sendo acolhido pelos Tribunais, que o ‘momento’ do ingresso, do recrutamento, esteja sujeito a norma de direito público, com a sua natureza administrativa própria; 8ª É inconstitucional a solução adoptada pelo Tribunal a quo, porquanto, não obstante o mérito intrínseco da sentença, se desvia do entendimento jurisprudencial dominante, conduzindo a que um contrato a termo incerto se converta num contrato de trabalho por tempo indeterminado perante uma entidade pública empresarial, situada no perímetro da Estado - integrando a sua Administração Indirecta; 9ª Tal jurisprudência estabelece com muita estabilidade que a contratação a termo (e a contratação em geral), com preterição da via de concurso no acesso ao emprego na Administração Pública em sentido amplo implica, pela violação da norma constitucional, a insusceptibilidade da conversão do contrato a termo em contrato por tempo indeterminado; 10ª «O entendimento sufragado na [douta sentença recorrida] colide, salvo melhor opinião, com o art. 47º, nº 2, da CRP na interpretação que, com força obrigatória geral, foi a acolhida pelo Tribunal Constitucional não apenas no Acórdão 368/2000, de 11.07.2000, mas também no Acórdão desse Tribunal 61/2004 (publicado no DR 1ª Série-A, de 27.02.04), que versa sobre situação em que era empregador um instituto público e em que já existia a figura legal do contrato de trabalho sem termo.

    - O princípio do primado do direito comunitário...

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