Acórdão nº 1697/16.5T9AVR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 07 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelERNESTO NASCIMENTO
Data da Resolução07 de Março de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo Comum Singular 1697/16.5T9AVR do Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro Juízo Local Criminal de Aveiro, J1 Relator - Ernesto Nascimento Adjunto – José Piedade Acordam, em conferência, na 2ª secção criminal do Tribunal da Relação do Porto I. Relatório I. 1. No processo identificado em epígrafe, foi o arguido B..., acusado, primeiro, pela prática de um crime de falsidade de testemunho, p. e p. pelo artigo 360.º/1 e 3 C Penal e, veio, depois, a ser condenado, como autor material de um crime de falsidade de testemunho p. e p pelo artigo 360.°/1 C Penal, na pena de 150 dias de multa ao quantitativo de € 6,00 diários num total de € 900,00.

  1. 2. Inconformado, com o assim decidido, interpôs recurso, o arguido – pugnando pela revogação da sentença e, pela sua absolvição - sustentando as conclusões que a seguir se transcrevem: 1. O recorrente foi condenado como autor do crime de falsidade de depoimento previsto e punido nos termos do artigo 360.°/1 C Penal, que tem como elementos objectivos constitutivos do tipo: . Que o agente preste declaração; Que agente o faça na qualidade de testemunha; . Que o depoimento seja prestado perante Tribunal, ou perante funcionário competente para receber o depoimento como meio de prova; Que o depoimento assim prestado seja falso.

    1. A douta acusação pública não descreve os factos que permitam o preenchimento completo daqueles elementos objectivos do tipo de crime de falsidade de testemunho no que respeita à conduta que localiza no dia 28 de Abril de 2014, pois ali omite o facto subsumível ao preenchimento da condição de que o depoimento tenha sido prestado perante funcionário competente para o receber como meio de prova.

    2. O Tribunal a quo alterou os factos em julgamento pela inserção de nova factualidade e alterou a descrita na douta acusação pública de "Porém, no dia 28 de Abril de 2014, pelas 19h15, nas instalações da PSP de Aveiro da inquirição do inquérito que deu origem origem aos supra referidos autos o mesmo declarou que", para "Porém, no dia 28 de Abril de 2014, pelas 19h15, nas instalações da PSP de Aveiro, perante o agente da PSP C..., no decurso da inquirição realizada no inquérito que deu origem aos supra referidos autos, o mesmo declarou que".

    3. A alteração permitiu o preenchimento do elemento objectivo do tipo incriminatório de ter sido o testemunho foi prestado perante "funcionário competente para o receber como meio de prova", com que permitiu que factualidade que não era criminalmente punível passasse a ser criminalmente relevante.

    4. Esta modificação constitui alteração substancial dos factos e não alteração não substancial, como (mal) entendeu o Tribunal de Primeira Instância, 6. Que interpretou a norma prevista no artigo 1.° alínea f) C P Penal no sentido de que não integra alteração substancial a inserção em julgamento de facto novo que não estando descrito na acusação pública, permite o preenchimento do tipo incriminatório, que sem tal nova factualidade estaria incompleto nos seus elementos objectivos, quando deveria ter feito a interpretação de que constitui alteração substancial dos factos a inserção de facto não descrito na acusação, que permite o preenchimento de elemento objectivo do tipo incriminatório que sem a alteração não estaria perfeito, convertendo conduta que não era criminalmente relevante e em conduta que passa a ser subsumível ao tipo incriminatório com tal modificação.

    5. O recorrente opôs-se àquela alteração factualidade, pelo que a douta sentença revogada não a devia ter relevado na condenação como o fez, com o que não deu aplicação à norma do artigo 359.°/1 C P Penal, quando o devia ter feito.

    6. A alteração dos factos operada pôs em causa a defesa estruturada pelo arguido, limitando-a, com o que violou a norma do artigo 32.°/1 da Constituição da República Portuguesa.

    7. A douta sentença recorrida condenou por factos diversos dos constantes da acusação, à margem da alteração permitida pelas normas dos artigos 358.° e 359.° C P Penal, no que incorreu na nulidade prevista no artigo 379.°/1 alínea b) do mesmo diploma legal.

    8. No conjunto de factos que invocou a douta acusação pública, dirigida ao recorrente, estruturou-se pela oposição entre duas declarações prestadas pelo arguido, concluindo pela verificação do crime de falsidade de testemunho em função dessa divergência, mas sem que tenha apontado uma desconformidade de qualquer dos testemunhos em causa com uma realidade efectiva.

    9. Tal estrutura impõe que em ambos os momentos as condutas sejam criminalmente censuráveis.

    10. Ora, dos factos que constam da douta acusação pública ocorridos em 28 de Abril de 2014 não consta descrito (sendo esse um elemento objectivo do tipo de crime de falsidade de testemunho) que o depoimento tivesse sido prestado perante funcionário competente para o recolher como meio de prova, pelo que não se pode dali afirmar que o depoente estivesse obrigado ao dever processual de verdade (sendo claramente distinto o plano da descrição fáctica da acusação e o plano do que nos trazem os meios de prova depois produzidos em julgamento).

    11. (assim no original) Dali resulta a ineptidão da acusação pública, pois mesmo que cabalmente provada não permitiria a condenação do recorrente pelo crime de falsidade de testemunho previsto na norma do artigo 360.°/1 C Penal.

    12. Excepto se à acusação sobrevier em aditamento a alteração de factos operada pelo Tribunal Recorrido, pela inserção do segmento "perante o agente da PSP C..., no decurso da inquirição realizada", alteração que sendo substancial não podia ter sido considerada na condenação.

    13. Impõe-se, por isso, a absolvição do recorrente.

  2. 3. Na resposta que apresentou o MP pugna pelo não provimento do recurso.

  3. Remetidos os autos a este tribunal, aqui o Exmo. Sr. Procurador Geral Adjunto emitiu parecer no sentido do não provimento do recurso.

    Na resposta o arguido reafirma a tese do recurso.

    Proferido despacho preliminar e colhidos os vistos legais, vieram os autos à conferência e dos correspondentes trabalhos resultou o presente Acórdão.

  4. Fundamentação III. 1. Tendo presente que o objecto dos recursos é balizado pelas conclusões da motivação apresentada pelo recorrente, não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas - a não ser que sejam de conhecimento oficioso - e, que nos recursos se apreciam questões e não razões, bem como, não visam criar decisões sobre matéria nova, sendo o seu âmbito delimitado pelo conteúdo do acto recorrido, então, a questão suscitada no presente é, tão só, a de saber se os autos evidenciam, ou não, a nulidade da sentença prevista no artigo 379.º/1 alínea b) C P Penal – condenação por factos diversos dos descritos na acusação.

  5. 2. Atentemos primeiramente no que dos autos consta.

    1. Acusado o arguido pela prática de um crime de falsidade de testemunho, perícia, interpretação ou tradução, p. e p. pelo artigo 360.°/1 e 3 C Penal; 2. na contestação pugnou pela sua absolvição, pois que, - faz parte do tipo legal de crime pelo qual o arguido vem acusado que o depoimento seja prestado perante Tribunal ou funcionário competente para receber o depoimento como meio de prova; - relativamente às declarações prestadas em inquérito, em momento algum da acusação se refere que o arguido prestou depoimento perante funcionário - apenas se refere que "no dia 28 de Abril de 2014, pelas 19h15, nas instalações da PSP de Aveiro em inquirição no inquérito que deu origem aos autos"; - assim a acusação não contém a descrição da factualidade bastante que permita dar relevo penal ao depoimento prestado; - para que a conduta descrita na acusação pública fosse penalmente relevante, importava que dela resultasse que ambos os depoimentos contraditórios fossem de subsumir às condições do tipo do artigo 360.°/1 C Penal, o que não sucede no que toca ao depoimento de 28 de Abril de 2014; ou, em alternativa, pelo menos se afirmasse na acusação pública uma realidade diferente do teor do depoimento prestado perante Juiz, em sede de audiência de julgamento; 3. no decurso da audiência de discussão e julgamento foi comunicado ao arguido a alteração dos factos da douta acusação, pela inserção dos seguintes: "Porém, no dia 28 de Abril de 2014, pelas 19 h15, nas instalações da PSP de Aveiro, perante o Agente da PSP C..., no decurso da inquirição do inquérito que deu origem aos supra referidos autos o mesmo declarou que" - sendo tal alteração, ali qualificada, pelo Tribunal, como não substancial, ao abrigo do disposto no artigo 358.°/1 C P Penal – alteração a que o arguido se opôs; 4. na sentença, no tocante à questão atinente com a alegada ausência de factualidade bastante que permita dar relevo penal ao depoimento prestado - por na acusação não referir, expressamente, que o depoimento, na PSP, foi prestado perante funcionário – foi decidido considerar sanada qualquer eventual irregularidade, face à alteração não substancial dos factos descritos na acusação, devidamente comunicada, no decurso da audiência de discussão e julgamento e, em sede de enquadramento jurídico dos factos deixou-se exarado o seguinte entendimento: “(…) o arguido vem acusada pela prática de um crime de falsas declarações previsto e punido pelo art. 360° n.° 1 e 3 do CP.

    Estabelece este artigo que é punido "quem, como testemunha, perito, técnico, tradutor ou intérprete, perante tribunal ou funcionário competente para receber como meio de prova, depoimento, relatório, informação ou tradução, prestar depoimento, apresentar relatório, der informações ou fizer traduções falsos...

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