Acórdão nº 18664/15.9YIPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 08 de Março de 2018

Magistrado ResponsávelFILIPE CARO
Data da Resolução08 de Março de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 18664/15.9YIPRT.P1 – 3ª Secção (apelação) Comarca do Porto – Juízo Central Cível Relator: Filipe Caroço Adj. Desemb. Judite Pires Adj. Desemb. Aristides Rodrigues de Almeida Acordam no Tribunal da Relação do Porto I.

B..., S.A.”, com sede na ..., nº .., .º, escritório ..., Porto, apresentou requerimento de injunção contra “C..., S.A.”, com sede na Rua ..., nº ., ..., ..., Torres Vedras, requerimento que aperfeiçoou posteriormente, alegando essencialmente que, na sua qualidade de seguradora, celebrou com a R., sua cliente, um seguro de crédito, no ano de 2005, pelo qual assumiu o pagamento de indemnização pelos prejuízos que a última sofresse em consequência da falta de pagamento pelos devedores dos seus créditos seguros.

No âmbito do contrato, a A. liquidou dois sinistros, um relativo a D..., LTD, no valor de € 27.146,00, e outro relativo a E..., no valor de € 32.883,49, no total de € 60.029,49 que a R. deve pagar e ainda não pagou à A.

Tais quantias foram adiantadas à R. em virtude:

  1. De uma declaração desta de um Aviso de Ameaça de Sinistro (AAS) sobre o seu cliente D..., Ltd., com sede social em Inglaterra, referente a faturas não pagas no montante de € 120.179,56.

  2. De uma declaração desta de um Aviso de Ameaça de Sinistro (AAS) sobre o seu cliente E..., com sede social em França, referente a faturas não pagas no valor de € 167.028,82.

    No caso referido em a), a A. interpelou aquele cliente da R. para proceder ao pagamento da dívida, ao que este alegou nada lhe dever, já que havia encomendado, comprado e pagado as mercadorias, de que a R. reclamava o pagamento, à empresa espanhola F..., SL., sediada em Valência.

    Deu-se conhecimento desta alegação à R., solicitando-lhe a A. que se pronunciasse sobre se pretendia ou não que fosse intentada a ação judicial contra o devedor inglês. Como a R. não tomou qualquer posição junto da A., foi reiterada a referida comunicação, com a advertência de que se não existisse resposta sobre o sentido de interpor ou não a referida ação, no prazo de 10 dias, esta procederia ao encerramento do processo, considerando-o cancelado para efeitos do contrato de seguro. Dado que nesse prazo a R. não informou a A. se pretendia ou não avançar judicialmente contra o referido cliente, o processo desencadeado pelo referido Aviso de Ameaça de Sinistro, tal como devidamente informado, foi cancelado.

    Assim, não se tendo verificado qualquer causa constitutiva do sinistro referido em a), entende a A. que a R. deve devolver a quantia que lhe adiantou e despesas, no valor de € 27.146,00. Não tendo a R. prestado a colaboração solicitada para levar a cabo as ações de recuperação do crédito, há um incumprimento contratual que leva à exclusão do sinistro e à restituição do valor prestado, por enriquecimento sem causa.

    No caso da al. b), foi intentada ação judicial contra o suposto cliente devedor, mas o Tribunal francês absolveu o cliente da R. do pedido de pagamento efetuado, com o fundamento de que a relação comercial teria sido efetuada entre esse cliente e a sociedade de direito espanhol F..., que terá encomendado a mercadoria à R. Esta foi depois informada do resultado dessa sentença e da sua condenação no pedido reconvencional efetuado pelo pretenso cliente devedor, e do conselho dado pelo advogado de França de que não haveria matéria para recorrer da sentença, dada a falta de prova. Foi, ainda, solicitado pela A. que a R. contactasse diretamente a referida sociedade de advogados para os efeitos indicados, mas não houve qualquer contacto da R. sobre o assunto em questão e a sentença transitou em julgado. Daí que não exista qualquer dívida do cliente E... à R., assistindo à A. o direito a reembolsar a quantia entregue a título de adiantamento indemnizatório, acrescida de despesas, conforme a apólice, no total de € 32.883,49, sob pena de enriquecimento sem causa.

    Qualificando os factos, entende a A. que na primeira situação há um manifesto incumprimento contratual por parte da R., consubstanciado na falta de colaboração desta que impede a A. de recuperar o crédito junto do cliente devedor da R., na segunda situação houve uma decisão judicial que julgou o crédito da R. inexistente, o que significa que ao abrigo das condições gerais do contrato esta tem de devolver a indemnização adiantada.

    Acrescenta a A. que, ainda na vigência do contrato, foram emitidas 6 liquidações de sinistro a favor da R. referentes a G..., Lda., no valor global de € 7.487,66 que reteve.

    Pelo que o saldo a favor da A. ascende ao capital de € 52.541,83€ (€ 60.029,49 - € 7.487,66).

    Concluiu que o saldo a seu favor ascende ao referido capital de € 52.541,83 (60.029,49€ -7.487,66€) a que acrescem os respetivos juros de mora comerciais vencidos no valor de € 3.636,69 e vincendos, que a R. se recusa a pagar, apesar de interpelada para o efeito.

    Faz culminar o seu articulado com o seguinte pedido: «NESTES TERMOS E NOS MELHORES DE DIREITO, DEVE A PRESENTE ACÇÃO SER JULGADA PROCEDENTE, POR PROVADA, E EM CONSEQUÊNCIA SER A RÉ CONDENADA A PAGAR À AUTORA A QUANTIA DE 52.541,83€, ACRESCIDA DE JUROS DE MORA VENCIDOS, ÀS TAXAS COMERCIAIS EM VIGOR, CONTADOS DESDE A DATA DE INTERPELAÇÃO DA R. NO MONTANTE DE 3.636,69€, O QUE PERFAZ 56.178,52€ A QUE ACRESCEM OS JUROS VINCENDOS ATÉ EFECTIVO E INTEGRAL PAGAMENTO.» (sic) Citada, a R. deduziu oposição, na qual, a título de exceção, invocou a ineptidão da petição inicial por manifesta falta de causa de pedir.[1] Mais invocou a R. a existência de uma causa prejudicial fundada numa queixa-crime que apresentou no ano de 2010 contra os supostos autores de burla que a vitimou, entre os quais se contam os gerentes da E... e da D..., devendo aguardar-se a decisão final a proferir nesse processo nº 1065/10.2TATVD, pendente na 2ª delegação do Tribunal de Torres Vedras.

    Por impugnação, opôs-se parcialmente aos factos alegados no requerimento inicial que discriminou e defendeu que a A. deve responder pela totalidade do risco coberto na verificação dos dois sinistros de crédito, no valor de € 60.000,00 para cada uma das empresas, pelo que, além de nada dever ser devolvido pela R., deve a A. pagar-lhe os valores ainda em falta, face ao não pagamento dos produtos do seu comércio que lhes vendeu e que aquelas não pagaram.

    Alegou que os referidos negócios foram efetuados com as ditas sociedades de direito inglês e francês através de um tal H..., que se apresentou à R. como legal representante da F..., S.L. propondo-se intermediar as vendas, tendo ficado acordado que a mercadoria seria enviada aos ditos “clientes” pela R. através da sua empresa de transporte de mercadorias e que os produtos fornecidos seriam faturados por ela às duas sociedades destinatárias, assim tendo acontecido com sucessivas remessas ao longo do ano de 2005, cada uma delas acompanhada da respetiva fatura.

    Diz ainda que agiram todas aquelas empresas (clientes e F...) em conluio para prejudicarem a R., que receberam as mercadorias e não as pagaram, bem sabendo que era a ela quer estavam obrigadas a fazer o pagamento.

    Em reconvenção, alega a R. que a reconvinda reteve injustificadamente os pagamentos no referido valor total de € 7.487,66.

    Como a A. não tem qualquer crédito sobre a R. e está obrigada a indemnizar a reconvinte com € 60.000,00 por cada um dos dois créditos em causa, tendo pago apenas € 27.000,00 por cada um, deve pagar à ora Reconvinte, a parte remanescente do valor contratado no montante de € 33.000,00 por cada sinistro, no total de € 66.000,00 (€ 33.000 x 2).

    Termina assim: «Nestes termos, deverá a Requerida ser absolvida da instância, face à procedência da invocada exceção dilatória.

    Caso assim não se considere, dever-se-á considerar a existência de uma causa prejudicial, com fundamento nas razões expostas, e requer-se a V. Ex.ª se digne ordenar a suspensão da presente acção até que seja proferida decisão no processo que sob o n.º 1065/10.2TATVD corre termos na 2ª Delegação do Tribunal de Lisboa Norte – Torres Vedras Caso assim não se entenda, deverá a A. ser absolvida do pedido por falta de fundamento da A.

    Mais se requer a condenação da Reconvinda no pedido reconvencional e, consequentemente, deverá a mesma ser condenada a pagar à Requerida e ora Reconvinte a quantia de € 73.487,66, sendo que € 66.000,00 respeitam à parte do risco transferido nos fornecimentos à “D...” e à “E...” e não pago (já descontados os € 54.000 já pagos) e € 7.487,66 às retenções indevidas efetuadas pela Reconvinda no sinistro da “G...”, a que acrescem os respetivos juros vencidos e vincendos até integral pagamento à taxa de juro aplicável subsidiariamente às sociedades comerciais.

    » (sic) A A. replicou. Defendeu que não há falta de causa de pedir e que não existe causa prejudicial.

    Quanto ao mais deixou expresso o que, essencialmente, viria a descrever na petição inicial aperfeiçoada.

    Opôs-se à reconvenção com os fundamentos da ação, assim negando a procedência daquela por não ter a Reconvinte qualquer crédito sobre a A. (que não seja o crédito no valor de € 7.487,66, a compensar com o crédito (mais elevado) da demandante.

    Defendeu a improcedência da reconvenção.

    Ainda antes do aperfeiçoamento da petição inicial, a R. apresentou novo articulado, no qual, em súmula, afirma jamais ter a A.

    entregado, explicado ou informado a R. quanto aos termos do seguro celebrado entre as partes, sendo tal apólice um contrato de adesão.

    *Dispensada a audiência prévia e admitida a reconvenção, foi proferido despacho saneador, no qual se julgou prejudicada a apreciação da exceção de ineptidão da petição inicial, por falta de causa de pedir, por se ter efetuado a sua concretização na nova petição inicial que a A. apresentou.

    O tribunal negou também a existência de qualquer causa prejudicial ao normal andamento da ação cuja suspensão negou.

    Definidos o objeto do litígio e os temas de prova, o processo seguiu para audiência final, após a qual foi proferida sentença com o seguinte segmento decisório, ipsis verbis: «Pelo exposto, I- Julgo a presente...

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