Acórdão nº 3378/15.8T8AVR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 05 de Fevereiro de 2018

Magistrado ResponsávelRUI PENHA
Data da Resolução05 de Fevereiro de 2018
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº 3378/15.8T8AVR.P1 Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto I. Relatório O B...., com sede na Rua ..., .., Coimbra, com patrocínio judiciário, veio intentar a presente acção declarativa de simples apreciação, com processo comum, contra o C...

, EPE , com sede na avenida ..., Aveiro.

Formula os seguintes pedidos: A) Ser reconhecido, aos médicos e médicas associados do B... Autor, o direito ao descanso compensatório emergente do trabalho noturno prestado nos serviços de urgência hospitalar e nas unidades de cuidados intensivos e intermédios, a que se reporta o nº 4 da cláusula 42ª do ACCE: - Nos exatos termos e condições definidas na deliberação da Comissão Paritária, de 16 de novembro de 2011, prevista na cláusula 52ª do ACT; - Tal regime jurídico de descanso compensatório deixou de vigorar no período compreendido entre 1 de janeiro de 2013 e 31 de dezembro de 2014, durante o qual vigorou o regime consagrado no nº 2 do artigo 22º-B do ESNS; - O regime de descanso compensatório previsto no nº 4 da cláusula 42ª do ACT, com o conteúdo material acima assinalado, recuperou a sua plena vigência a partir de 1 de janeiro de 2015; - Tal regime abrange, no âmbito dos serviços de urgência hospitalar e nas unidades de cuidados intensivos e intermédios, todo o trabalho médico, normal ou extraordinário, prestado no período compreendido entre as vinte horas de um dia e as oito horas do dia seguinte, desde que o período diário de trabalho seguinte, de acordo com o horário de trabalho do médico hospitalar, tenha lugar nas vinte e quatro horas subsequentes ao termo do período de trabalho noturno prestado; - O trabalhador médico hospitalar que goze, nos termos acima referidos, o descanso compensatório a que tem direito, não está obrigado a repor, no seu horário semanal de trabalho, as horas de descanso compensatórias gozadas; - A elaboração, organização e programação do horário individual de cada médico deve ter em conta o direito ao mencionado descanso compensatório; B) Ser reconhecido, aos médicos e médicas associados do B... Autor, o direito ao descanso compensatório emergente do trabalho prestado, em dias de descanso semanal e em dias feriados, nos serviços de urgência hospitalar e nas unidades de cuidados intensivos e intermédios, a que se reporta o nº 1 do artigo 13º do DL 62/79, nos seguintes termos e condições: - O referido regime jurídico visa compensar todo o trabalho médico, normal ou extraordinário, diurno ou noturno, qualquer que seja a sua duração, prestado em dias feriados e em dias de descanso semanal, obrigatório ou complementar, independentemente de tais dias de descanso semanal coincidirem ou não, respetivamente, com o domingo e o sábado; - O direito ao gozo de tal descanso compensatório, tratando-se de trabalho prestado em dias de descanso semanal, pressupõe que, na semana de trabalho em causa, o trabalhador médico já tenha assegurado, previamente, cinco dias de trabalho; - Mas, tratando-se de trabalho prestado em dia feriado, o direito ao gozo do referido descanso compensatório é independente do número de dias de trabalho prestados, na semana de trabalho em causa, pelo trabalhador médico; - O gozo do dia de descanso compensatório em causa implica, por natureza, o não cumprimento, na respetiva semana, de um dia de trabalho, pelo que o trabalhador médico apenas está obrigado a prestar, nessa semana, quatro dias de trabalho, em compensação do dia de trabalho a mais que assegurou na semana anterior; - Este regime jurídico nunca deixou de vigorar, incluindo nos anos de 2013 e de 2014, já que a sua plena aplicação nunca foi prejudicada ou condicionada pela norma constante do nº 2 do artigo 22º-B do ESNS, cujo objeto, diverso, tem a ver com imposição de um intervalo mínimo de descanso garantido, de onze horas, entre jornadas diárias consecutivas de trabalho; C) Ser o C... condenado a respeitar e a aplicar, na íntegra, aos trabalhadores médicos ao seu serviço, os regimes jurídicos de descanso compensatório médico acima referidos, nos seus exatos termos, e a absterem-se de, por qualquer via, os contrariarem e desrespeitarem.

Alega, em síntese: que a ré não cumpre regimes jurídicos consagrados no artigo 13º, nº 1, do DL 62/79 e na cláusula 42ª, nº 4, do ACT para os médicos com contrato individual de trabalho.

Realizou-se diligência de audiência das partes, saindo frustrada a conciliação.

A ré veio contestar, alegando que cumpre a legislação em vigor, de acordo com as orientações da ACSS.

Foi proferido saneador, que transitou em julgado, e dispensada a realização da audiência prévia e a enunciação dos temas da prova.

Fixou-se à acção o valor de € 30.000,01.

O B... autor apresentou requerimento informando que “relativamente à primeira questão – descanso compensatório por trabalho noturno – já houve acordo entre os sindicatos médicos e o Ministério da Saúde, acordo esse que conduziu à alteração do nº 4 do art. 42º do CCT, publicada no Boletim de Trabalho e Emprego nº 30 de 15/08/16. (…) Face ao exposto, considera-se prejudicada a discussão da primeira questão”.

Foi proferido despacho no qual se decidiu: “declara-se extinta, por inutilidade superveniente, a instância dos presentes autos relativamente ao pedido formulado sob a alínea A) da petição inicial.” Procedeu-se a julgamento, com gravação da prova pessoal produzida, tendo sido fixada a matéria de facto provada e não provada, conforme consta da acta de julgamento.

Foi proferida sentença, que julgou a acção improcedente, absolvendo a ré no pedido.

Inconformado interpôs o B... autor o presente recurso de apelação, concluindo: 1. A sentença recorrida julgou improcedente apelação com o fundamento de que o DL nº 62/79 de 30 de Março só é aplicável aos médicos com vínculo laboral público, ficando, assim, automaticamente prejudicada, em sede de Tribunal de Trabalho apreciação das condições em que é concedido o direito ao dia de descanso conferido pelo nº 1 do seu art. 13º; 2. Ao contrário do acórdão recorrido, o nosso entendimento é de que o DL 62/79 se aplica a todo o pessoal hospitalar, e necessariamente aos médicos, independentemente do seu vínculo laboral; 3. São dois os argumentos em que assenta a decisão recorrida: a) “O DL 62/79 tinha como destinatário o pessoal hospitalar, todo ele, na altura, vinculado à função pública, ao qual se aplicava o regime de trabalho desta, com as especificações aí previstas”; e b) A transformação do regime jurídico da gestão hospitalar ocorrida a partir da Lei nº 27/2002 de 8/11 e a transformação posterior da natureza jurídica dos hospitais em entidades públicas empresariais, permitiu que a partir desse ano passassem a co-existir, no serviço hospitalar, médicos com vinculo á função pública e outros com contrato individual de trabalho, tendo sido ao longo destes anos distinto o regime jurídico aplicável em função do vínculo laboral.

  1. Apesar da veracidade destes argumentos, eles assentam num manifesto equívoco.

  2. Um primeiro equívoco reside no facto de sendo diferentes a maioria dos diplomas que regulam o trabalho médico em CIT e em CTFP, tal não significa necessariamente dualidade de regimes, até porque são substancialmente idênticos.

  3. O facto de a maioria dos diplomas que regulam trabalho médico serem diferentes em função do vínculo decorre apenas e necessariamente de um aspecto formal, a natureza do vínculo laboral.

  4. O DL 62/79 pretende regular apenas situações específicas decorrentes da realidade hospitalar (funcionar 24 horas de segunda-feira a domingo) e, por isso, se refere na redacção do nº 1 do art. 1º: “...com as especificações estabelecidas no presente diploma”; 8. Ou seja, uma coisa é o regime de trabalho que vigorava à época para a função pública aplicável a todo o pessoal hospitalar; outra, bem diferente, um diploma para regulamentar as especificidades, instituído pelo próprio DL 62/79, que nada tinha a ver com o regime laboral então aplicável; 9. O outro equívoco decorre de não se poder analisar da mesma forma um diploma (DL 62/79) que visa regular uma realidade específica hospitalar, que abrange diferentes profissionais hospitalares e o regime jurídico-laboral dos médicos.

  5. Tendo havido alterações ao longo do tempo na natureza jurídica dos hospitais, nos dias de hoje o vínculo laboral do pessoal hospitalar tanto pode ser privado como público, mas as especificidades – trabalho noturno, ao domingo, feriado e dias de descanso – continuam a existir tal como sempre existiram; 11. Sendo substancialmente idêntica toda a regulamentação aplicável ao trabalho médico, seja em CIT seja em CTFP, (Ex: Código do Trabalho, acordos colectivos de trabalho, DL nº 266-D/12) não há qualquer justificação objectiva para que a única excepção seja o DL 62/79; 12. Ou o legislador fez uma interpretação da redacção do nº 1 do art. 13º do DL 62/79 em que a regulamentação das especificidades por ele reguladas é autónoma do regime de trabalho dos médicos, e, nesse caso, não há razões para os médicos com CIT ficarem excluídos da aplicação desta norma, assegurando-se também nesta matéria tratamento igual, tal como na restante regulamentação do trabalho médico, entre os médicos com CIT e CTFP; ou 13. Estamos perante uma omissão do legislador que sentindo a necessidade de regulamentar certas especificidades do trabalho hospitalar (trabalho noturno, aos domingos, feriados e dias de descanso semanal) as regulamentou para os médicos com vínculo público, esquecendo-se de o fazer relativamente aos médicos entretanto contratados através de um CIT, sendo certo que estes cumprem trabalho hospitalar nas mesmíssimas circunstâncias específicas daqueles; 14. Na primeira hipótese, está encontrada a resposta, o art. 13º, nº 1 do DL 62/79 aplica-se a todos os médicos independentemente...

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