Acórdão nº 2164/06.0TVPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Setembro de 2009

Magistrado ResponsávelJOSÉ CARVALHO
Data da Resolução15 de Setembro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: APELAÇÃO.

Decisão: ALTERADA A DECISÃO.

Indicações Eventuais: 2ª SECÇÃO - LIVRO 322 - FLS. 29.

Área Temática: .

Sumário: I- Por efeito das lesões sofridas a Autora não pode concluir o curso que frequentava. Essa impossibilidade traduz uma limitação à vontade e aos desejos de realização pessoal e profissional da Autora, impedindo-a de exercer o direito de escolha da profissão — o qual tem dignidade constitucional (art.° 47°, n° 1, da Constituição da República).

II- A impossibilidade do exercício desse direito integra um dano não patrimonial que, pela sua gravidade, merece a tutela do direito (art. 496°, n° 1).

III- Tendo em conta o grau de culpabilidade da sociedade, as circunstâncias em que o acidente ocorreu e a idade da Autora, afigura-se adequada ao ressarcimento deste dano a indemnização de 7.500 euros.

IV- As dores e padecimentos da Autora, bem como as bem como as cicatrizes de que ficou portadora integram também a categoria de danos não patrimoniais que pela sua gravidade merecem a tutela do direito.

V- Atendendo às dores sofridas, - grau 5 numa escala de sete graus de gravidade crescente - o longo período de internamento, as intervenções cirúrgicas a que foi submetida, as perturbações no sono e no humor, e as alterações na personalidade e no relacionamento com outros, mostra-se ajustada a indemnização fixada em instância: 25.000 euros.

Reclamações: Decisão Texto Integral: Proc. nº 2164/06.0TVPRT.P1 Apelação Recorrentes: B…………… e C………………., Lda.

Relator: José Carvalho Adjuntos: Desembargadores Rodrigues Pires e Canelas Brás.

Acordam na 1ª secção cível do Tribunal da Relação do Porto: B………….., residente na Rua …. nº …, …º Dtº ….., Porto, instaurou a presente acção de condenação, que correu termos sob a forma ordinária, contra C………… Ldª, com sede na Rua ………, lote …., loja ..º, 3030-163 Coimbra e D……………, com domicilio profissional na mesma morada pedindo que os RR sejam condenados de forma solidária a pagar à A. € 138.097,62 por danos patrimoniais e € 105.000,00 a titulo de indemnização por danos não patrimoniais.

Alegou para o efeito que no dia no dia 4 de Novembro de 2003 sofreu uma queda em altura quando descia por uma corda da cobertura de uma das bancadas do Estádio do Dragão, durante os ensaios que decorriam para o espectáculo do referido estádio, e que estava a ser organizado pela 1ª ré.

Em consequência de tal facto resultaram para a A. danos patrimoniais e não patrimoniais que a mesma ora reclama em juízo.

*Os Réus contestaram, arguindo a ilegitimidade passiva do R. D…………. e impugnando a matéria de facto articulada pela autora, sustentando que o acidente em causa ocorreu por culpa exclusiva da Autora.

*Saneado e condensado o processo, procedeu-se ao julgamento.

Após as respostas à matéria da base instrutória (despacho de fls. 236 a 240, com a rectificação de fls. 246), foi proferida sentença (fls. 250 a 268), que decidiu: a) Absolver o 2º Rº D………… do pedido formulado pela Autora; b) Condenar o 1º R. “C………., Ldª” a pagar à Autora B…………. a título de danos patrimoniais a quantia de € 50.000,00, acrescida dos juros vincendos á taxa legal desde a data da citação até integral pagamento; c) Condenar o 1º R. “C……….., Ldª” a pagar á Autora B…………. a titulo de danos não patrimoniais a quantia de € 20.000,00 (€ 7.500,00 + € 12.500,00), acrescida de juros à taxa legal desde a data da presente decisão até integral pagamento, absolvendo o 1º R. do demais peticionado.

d) Condenar em custas a A. e o 1º R., na proporção de 60% e 40%, respectivamente.

*Da sentença foram interpostos recursos pela Autora e pela R. “C…………., Lda.”.

A Autora concluía do seguinte modo as suas alegações: 1º Por decisão em primeira instância, foi a Ré condenada a pagar à A. e aqui recorrente a quantia de Euros; 50.000,00 a título de danos patrimoniais e de Euros; 20.000,00 a título de danos não patrimoniais, resultantes de uma queda em altura sofrida pela A., quando se encontrava a efectuar um “casting” para a Ré C………….., Lda, para ser seleccionada para participar no espectáculo de inauguração do Estádio do Dragão, o qual consistia na realização de uma descida por uma corda da cobertura das bancadas até ao chão.

2/ Foram dados como provados, entre outros, com relevo para a decisão, os factos acima descritos.

3/ Foi dado como provado que a A. sofreu diversas lesões e sequelas em consequência do acidente, tanto a nível físico, como psicológico, conforme resulta da douta sentença recorrida.

4/ O tribunal “a quo”, na douta sentença, na sua fundamentação, a fls. 257 e ss, considera, e bem, “que a actividade que ia ser praticada pela A.-rappel vertical- técnica para efectuar descida vertical de vários metros apenas com o auxílio de cordas, é perigosa pela natureza que lhe é especialmente imprimida e pelos meios utilizados e forma como são utilizados ( tenha-se presente que a descida, no caso em apreço, é efectuada apenas por uma corda, sendo esta controlada pelo aparelho designado por “gri-gri”) de modo que a !ª Ré ao incluir esta actividade no espectáculo que organizava ficou vinculado pelos danos que causar, excepto se demonstrar que empregou todas as providências exigidas pelas circunstâncias, com o fim de as prevenir.” 5/ Refere ainda que no caso em apreço, não existe um diploma legal que estabeleça as regras de procedimento da actividade de rappel, pelo que para apurar se a 1ª Ré tomou todas as medidas e precauções a prevenir os danos, teremos que olhar novamente para a matéria de facto dada como assente.

6/ Nesse seguimento, conclui-se ainda na douta sentença que “ Ora, no caso, facilmente se concluiu que a 1ª Ré, não provou factos capazes de demonstrar que empregou os meios e providências exigidas pelas circunstâncias para prevenir a queda da Autora. Pelo contrário, deu-se como assente que quando a Autora chegou ao solo não existia qualquer pessoa para aparar a mesma, nem existia no solo qualquer protecção para quedas, sendo certo que este equipamento era necessário, em termos de segurança, para o referido exercício, especialmente para quem o praticava pela primeira vez, como era o caso da A., e possivelmente por parte de muitas outras que ali se encontravam.” 7/ A A. aqui Recorrente concorda em absoluto com o acima transcrito da douta sentença.

  1. E como consequência do mencionado a Ré deve responder nos termos do artigo 493º do Código Civil, por actividade perigosa, com inversão do ónus da prova da culpa, que no caso cabia à Ré afastar.

  2. Assim sobre a Ré C…………., Lda, recaía a obrigação de garantir a segurança aos intervenientes no casting efectuado, devendo tomar as medidas de protecção adequadas, segundo o circunstancialismo envolvente, o que como referido não sucedeu, resultando na queda da A. desamparada no solo.

  3. Face ao cima exposto, a Ré C…………, Lda, é obrigada a reparar os danos sofridos pela A.

  4. A Ex.ma juíz “a quo”, por outro lado, entendeu que a A. aqui Recorrente também contribui para a ocorrência da queda, que originou os danos peticionados nos autos, uma vez que bastava ter parado de accionar a manete para interromper a descida em causa, contribuindo para a produção do dano, em concorrência de culpas com a Ré C……………, Lda., na proporção de 50 % para cada uma.

  5. A A., com o devido respeito, não pode concordar com tal entendimento.

  6. Conforme referido foi, e bem, considerado, que a actividade que ia ser praticada pela A.-rappel vertical- técnica para efectuar descida vertical de vários metros apenas com o auxílio de cordas, é perigosa pela natureza que lhe é especialmente imprimida e pelos meios utilizados e forma como são utilizados ( tenha-se presente que a descida, no caso em apreço, é efectuada apenas por uma corda, sendo esta controlada pelo aparelho designado por “grigri”) de modo que a !ª Ré ao incluir esta actividade no espectáculo que organizava ficou vinculado pelos danos que causar, excepto se demonstrar que empregou todas as providências exigidas pelas circunstâncias, com o fim de as prevenir.

  7. Foi ainda dado como provado que a 1ª Ré não tomou exigidas pelas circunstâncias, com o fim de as prevenir, uma vez que não só não logrou provar esse facto, como nestes autos foi provado que quando a Autora chegou ao solo não existia qualquer pessoa para aparar a mesma, nem existia no solo qualquer protecção para quedas, sendo certo que este equipamento era necessário, em termos de segurança, para o referido exercício, especialmente para quem o praticava pela primeira vez, como era o caso da A., e possivelmente por parte de muitas outras que ali se encontravam.

  8. Pelo acima referido e dado como provado na...

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