Acórdão nº 138/06.0GBSTR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 24 de Fevereiro de 2010

Magistrado ResponsávelGOMES DE SOUSA
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

A - Relatório: No Tribunal Judicial da Comarca da Sertã correu termos o processo comum singular supra numerado no qual é arguido F..

, divorciado, reformado, nascido em 29/…1955, em …. Sertã, titular do Bilhete de Identidade n.º…. emitido em 19/…/2003, filho de J. e de M., residente…., Sertã, e este foi, por sentença de 22-/…/ 2009: Condenado pela prática, em autoria material, de um crime de dano com violência, p. e p. pelo artigo 214.º, n.º 1, al. a) do Código Penal, na pena de 15 (quinze) meses de prisão.

Cuja execução foi suspensa, pelo período de 15 (quinze) meses, subordinada à condição de o arguido proceder, no referido período, ao fAssociação de Apoio às Crianças Infectadas pelo vírus da sida e suas Famílias” (Rua Pedro Calmon, n.º 29, 1300-455 Lisboa - tel: 213625771/2; fax: 217957423), comprovando nos autos esse pagamento.

E foram julgados os pedidos de indemnização civil deduzidos pelos demandantes A. e M. parcialmente procedentes por provados e, em consequência, condenado o demandado F a pagar: - ao demandante A a quantia de € 63,30 (sessenta e três euros e trinta cêntimos) a título de danos patrimoniais; e o montante de sendo € 600,00 (seiscentos euros) a título de danos não patrimoniais sofridos por aquele; - à demandante M. a quantia de € 3.483,67 (três mil quatrocentos e oitenta e três euros e sessenta e sete cêntimos) a título de danos patrimoniais; e o montante de € 250,00 (duzentos e cinquenta euros) a título de danos não patrimoniais sofridos por aquela;….

* A. e M. deduziram pedidos de indemnização cível contra o arguido F. nos termos exarados a fls. 123 e segs., peticionando a condenação deste a pagar-lhes o montante global de € 8.623,80, sendo € 2.500,00 a título de danos morais sofridos por cada um dos demandantes, € 63,30 a título de danos patrimoniais sofridos pelo demandante Américo e € 3.560,50 a título de danos patrimoniais sofridos pela demandante M.

* Inconformado, interpôs o arguido o presente recurso peticionando a sua absolvição ou, caso assim não se entenda, seja decretada a nulidade da sentença por violação do disposto no n° 2 do artigo 374° do Código de Processo Penal, com as seguintes conclusões: 1) A douta decisão ora impugnada incorreu, por um lado e salvo o devido respeito, num claudicante apuramento da matéria de facto provada e, por outro, numa tergiversante fundamentação que descurou o correcto entendimento dos princípios do in dubio pro reo e da livre convicção do julgador, ao ter dado como provados os factos 3 a 17, ali melhor descritos, que contradizem as declarações prestadas pelos ofendidos em sede de julgamento.

2) O ofendido A começou por referir que, no dia a que os factos se reportam, se tinha deslocado, juntamente com a sua esposa, à localidade do .. - a fim de aí entregar uma encomenda de velas ao sacristão, de seu nome J, o qual posteriormente transportou até casa, permanecendo à conversa com o mesmo - acrescentando que o recorrente passou de carro, dizendo «boa tarde» e que não lhe terá respondido porque estavam de relações cortadas.

3) O ofendido também refere que o recorrente passou uma segunda vez, repetindo o cumprimento, numa alegada intenção provocatória que tenta ilustrar ao declarar que todos estariam de relações cortadas com aquele.

4) Logo nesta ocasião, a testemunha JN juntou-se ao grupo que ali se encontrava e se, por um lado, quanto a este indivíduo, o ofendido não soube esclarecer se também ele se encontrava de relações cortadas com o recorrente, por outro, veio o próprio esclarecer o Tribunal que retribuiu o cumprimento ao recorrente, seu vizinho, não tendo falado em qualquer relacionamento tenso com o mesmo.

5) Isto é, o esforço que o ofendido nestes autos empreendeu no sentido de retratar o recorrente como uma pessoa de mau trato encontra aqui, desde logo, a sua primeira incongruência, não podendo igualmente deixar de causar estranheza o facto de o casal, unidos no medo e no suposto trauma que sofreram com a conduta do recorrente, tenham divergido num pormenor tão simples quanto este; de facto, a ofendida M assegurou veementemente que todos os que ali se encontravam estavam de relações cortadas com o recorrente.

6) O que é certo é que o recorrente tem casa na localidade onde se cruzou com os ofendidos; conhece os seus vizinhos e mantém relações cordiais com eles; até a testemunha J N veio dizer que nunca teve nenhuma questão com o arguido.

7) Por outro lado, resulta como conveniente o relato do ofendido de que, ao longo da sua vida, tenha consultado psiquiatras e andado em tratamento com «neurologistas» e, no entanto, seja peremptório em afirmar que só precisamente depois dos factos tenha voltado a consultar, por uma vez apenas como resulta dos autos um especialista dessa área; isto é, a contradição é patente.

8) Mais: após ter confirmado que foi desde uns alegados telefonemas ameaçadores - cuja autoria imputou ao arguido que ficou com receio deste, Américo Silva não soube explicar porque é que, após se ter cruzado em sentido contrário com o recorrente, já no caminho mais longo que tinha escolhido como forma de o evitar e já na subida até ao local onde tudo se terá alegadamente passado, não fez imediatamente marcha-atrás, na certeza de que, como diz, reconheceu o carro «logo cá do fundo», precisando a distância em «trezentos metros».

9) Resulta igualmente como estranho o facto de A não saber dizer se a sua esposa também reconheceu o automóvel; é que ficou claro, segundo o ofendido, que ambos trocaram abundantes impressões acerca da atitude anterior do seu cunhado e irmão, aqui recorrente e do medo que a mesma lhes tinha instilado.

10) Quanto à questão de saber porque é que não recuou, afastando-se do carro do Recorrente, o ofendido declara que não responde a essa pergunta; e quando é aventada a hipótese mais provável de, no instante em que supostamente se deu conta de que o carro que tinha avistado a trezentos metros - era realmente do arguido, ter-se prestado a avançar, qual atitude natural ou instintiva de fugir ao alegado perigo, A perde-se em congeminações acerca de transgressões estradais que, note-se, acabou por cometer.

11) E nem queira o ofendido convencer este Alto Tribunal que apenas não fez naquele primeiro instante o que acabou por fazer depois, apenas porque o recorrente estaria fora do seu automóvel; recorde-se que nas suas declarações, o mesmo alternou, conforme lhe conveio entre dizer que o recorrente estava dentro do carro tendo saído para agredir o casal e que já estaria fora, à beira do mesmo, tendo-se encaminhado para o lugar onde se encontravam.

12) Não pode deixar de causar dúvida mais que razoável, o facto de o ofendido ter tido tempo ou calma para parar o seu veículo a cinco metros do automóvel do recorrente, apitar e estar à espera que aquele o mesmo que, alegadamente, fazia ameaças por telefone ainda fosse cumpridor das normas de trânsito.

13) Por outro lado, a ofendida M afirmou que o ora recorrente terá mostrado um tom agressivo quando cumprimentou, por duas vezes, os seus vizinhos, que na povoação também já mencionada, se tinham juntado ao casal, permanecendo à conversa; e que terá sido a esse primeiro sinal de aviso que, pelo menos o seu marido, tomou a decisão de rumar à casa de ambos, …, pelo trajecto mais longo.

14) Não se compreende, pois, como é que tal sentimento de urgência ou de extremo alerta e cuidado se poderia compaginar com o vagar e o tempo que a mesma despendeu, já na estrada, no encontro que teve com uma conhecida sua, M L.

15) De resto, o seu marido teve a preocupação de, na versão que apresentou dos factos, acrescentar UID toque dramático a tal episódio, declarando que, por diversas vezes, aconselhou a ofendida a sair o mais rapidamente possível do local onde se encontravam.

16) Causará, pois, estranheza seguindo a lógica das declarações do ofendido - o facto de a ofendida lhe ter respondido que já não via a M L há muito tempo e que era sua intenção ali ficar mais UID pouco.

17) Tal como não se compreende porque é que logo no início do seu depoimento, a ofendida M tem a preocupação de mostrar UID suposto clima de tensão comum a todos os que ali se encontravam, para logo de seguida, asseverar que não sentiu medo e que se o tivesse sentido teria procurado refúgio em casa de alguém; deixando apenas para o momento em que privou à beira da estrada com a M L o supostamente verdadeiro sentimento de receio; a única altura em que, alegadamente, o seu «coração ficou preto» ...

18) Não pode deixar de ser legítima a interrogação no sentido de perceber como é que, ao ser feita a escolha por um trajecto mais longo, tenha a mesma perpassado um certo contexto em que o casal não adivinhava, nem pelas aparências, o medo UID do outro, relativamente ao Arguido.

19) Por outro lado, se A não tomou conta ao certo das escoriações que sofreu, tendo apenas referido o lado esquerdo do seu pescoço, já M afirma peremptoriamente que «o braço direito não ... não foi atingido»; tendo sido apenas no momento em que lhe foi feita a ressalva de poder não se ter apercebido de lesões no braço direito do marido, que entendeu por conveniente tornar as suas declarações mais consentâneas com o relatório médico-legal.

20) Quanto ao momento concretamente definido em que os ofendidos se encontraram com o recorrente na estrada, M. diz que viu um carro branco parado ao começo da subida e que só apenas mesmo junto a ele, conseguiu ver que era um Renault … - algo de que A já se teria dado conta a trezentos metros, apenas se preocupando em confirmar a matrícula da viatura.

21) A ofendida diz ainda que só notou realmente medo no seu marido quando o recorrente se dirigiu ao seu automóvel, isto depois de ambos, lado a lado, terem sido agredidos, de A ter trancado as portas do veículo, de ambos se terem cruzado em sentido contrário com o recorrente, de terem sido abordados pelo mesmo, por duas vezes na povoação do … e inclusivamente o senhor J, segundo a ofendida, lhes ter supostamente dito para terem cuidado, uma vez que o...

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