Acórdão nº 2791/08.1TBPBL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 12 de Janeiro de 2010
Magistrado Responsável | ISA |
Data da Resolução | 12 de Janeiro de 2010 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Acordam neste Tribunal da Relação de Coimbra I- Relatório 1. O autor, A....
, intentou (22/12/2008) contra os réus, B....
e sua mulher C....
, todos com os melhores sinais dos autos, a presente acção especial para cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato (nos termos do DL 269/98, de 1/9), pedindo a condenação dos réus solidariamente entre si: 1) a pagarem-lhe a importância de € 1.093.64, acrescida de juros comerciais vencidos e vincendos até integral pagamento; 2) e, a título de indemnização acordada, pelo incumprimento contratual, a quantia de € 8.612.42, acrescida de juros que à taxa legal de 4% sobre ela se vencerem desde a citação e até integral pagamento.
Para o efeito, alegou, em síntese, o seguinte: O réu marido pretendeu adquirir um veículo automóvel ( X....., com matrícula 00-XX-00), tendo para o efeito contactado a firma D....
. Porém, como não dispunha ou não podia pagar de pronto o preço do referido veículo solicitou à dita firma que possibilitasse o aluguer do mesmo por um período de 84 meses com a colaboração ou intervenção do autor.
Assim, por contrato particular, datado de 10/12/2006, deu de aluguer ao réu o dito veículo - adquirindo-o previamente à D... -, por um prazo de 84 meses, sendo mensal a periodicidade dos alugueres, no montante de € 238,67 cada um (€ 193,52 de aluguer propriamente dito, mais € 40,64 de IVA à taxa aplicável e € 4,51 de prémio de seguro); sendo que o réu solicitou, ainda, a celebração de um seguro de vida Protecção Total, obrigando-se a pagar mensalmente o valor do respectivo prémio, juntamente com o valor do aluguer mensal acordado, que passou a ser de € 273,41 a partir de 10 de Janeiro de 2007, ou seja, do primeiro aluguer.
A falta de pagamento de qualquer dos ditos alugueres implicava a possibilidade de resolução do contrato, que se tornaria efectiva após comunicação em tal sentido feita ao réu que, por sua vez, seria obrigado a restituir o veículo - perdendo os alugueres até então pagos -, a pagar os alugueres em mora, o valor dos danos que o veículo apresentasse e, ainda, uma indemnização para fazer face aos prejuízos resultantes da sua desvalorização e do próprio incumprimento do contrato, a qual não seria inferior a 50% do valor total dos alugueres acordados.
Os alugueres deveriam ser pagos até ao dia 10 do mês a que respeitassem, por meio de transferência bancária, tendo o réu recebido o veículo, que passou a utilizar.
Porém, o réu não cumpriu com o ajustado, pois não pagou o 18.
º dos alugueres acordados, que se venceu em 10 de Maio de 2008, tendo feito a entrega do veiculo automóvel em 24 de Agosto de 2008, assinando na mesma data uma declaração dando o contrato como rescindido e dispensando o envio da carta de rescisão, assim se tendo operado a resolução contratual.
Por via da resolução operada, além de se ter constituído na obrigação de lhe restituir o veículo - o que já fez - o réu constituiu-se, igualmente, na obrigação de o indemnizar nos termos acordados.
Pelo que, assim, ficou o réu a dever-lhe os alugueres vencidos até à data da resolução (o 18.
º ao 21.
º, inclusive) e a indemnização livremente acordada, ou seja, 50% do valor dos alugueres que teriam de ser pagos caso o contrato tivesse sido cumprido até final.
Pelo pagamento de tais importâncias é também solidariamente responsável a ré mulher, dado que o aludido contrato foi celebrado pelo réu B... tendo em vista o proveito comum do casal dos RR., pois o sobredito veículo foi utilizado em proveito ou benefício comum do casal.
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Citados para o efeito, os RR. contestaram, quer por via de excepção, quer por via de impugnação.
Desde logo, invocaram a ilegitimidade passiva da ré mulher, com o fundamento do aludido contrato ter tido como partes exclusivas o A. e o R. marido, não tendo o mesmo sido celebrado tendo em vista o proveito comum do casal.
Depois, a invocaram a existência de erro na celebração do contrato com consequente anulabilidade do negócio, com o alegado fundamento de o réu ter assinado o contrato na convicção de estar a comprar uma viatura a crédito, com a possibilidade de passado o período de carência económica em que se encontrava poder amortizar o valor em dívida, jamais tendo pretendido efectuar um contrato de aluguer. O réu limitou-se a assinar e aceitar o clausulado que o grupo D... e o A. lhe apresentaram, aderindo a esse modelo, não o tendo discutido nem estipulado qualquer conteúdo.
Por outro lado, invocaram ainda o incumprimento do A., alegando que a rescisão do contrato não foi efectuada nos termos ali previstos, isto é, através de carta registada enviada para o último domicílio indicado pelo réu. Antes o Autor enviou dois funcionários que, junto da habitação dos réus, denegrindo a enxovalhando os seus nomes na localidade onde vivem, obrigaram o réu marido a entregar a viatura e a assinar a declaração junta aos autos. Não tendo sido feita nos termos contratualmente estipulados, a rescisão não existiu nem foi eficaz em relação ao réu, devendo por isso ser declarada nula.
Por fim, invocaram a existência de um contrato de adesão e o facto de as cláusulas n.
º 10 n.
º 3 e 4 (indemnização em caso de resolução) e 12 n.
º 4 das (perda da caução, em caso de rescisão) se integrarem no conceito de cláusulas abusivas, cujo conteúdo é manifestamente atentatório e contrário à boa-fé.
Concretizando, alegaram a que a cláusula 10.
ª n.
º 3 e 4 mais não é do que uma cláusula penal desproporcional e ilustrativa da desigualdade contratual entre as partes, prevendo uma indemnização arbitrariamente fixada pelo autor, pois se num primeiro momento a faz depender da desvalorização do veículo e do incumprimento do contrato, a verdade é que num segundo momento fixa sempre o valor mínimo dessa indemnização em pelo menos 50% do valor total dos alugueres referidos nas condições particulares, sem ser feita qualquer avaliação ao real desgaste do veículo e sem justificar os prejuízos resultantes do não cumprimento. Neste financiamento, onde todos os encargos que existem são suportados pelo réu, tal cláusula penal é, pois, desproporcional à luz do disposto no artigo 19.
º do DL 446/85, de 25/10.
Por seu turno, com base na cláusula 12.
ª n.
º 4 - segundo a qual em caso de rescisão ou denúncia, nos termos da cláusula 10.
ª o valor da caução reverterá na sua totalidade para o locador, sem prejuízo do referido no n.
º 4 da cláusula 10.
º - o autor acha-se no direito de se apropriar de € 3.360,00 e de a esse valor não imputar a indemnização que peticiona, sendo, por isso, manifestamente contrária à boa-fé e desproporcional à luz do disposto no artigo 19.
º do citado DL 446/85.
Desse modo, devem aquelas duas cláusulas ser consideradas como não escritas.
Por outro lado, e para o caso de não ser declarada a nulidade daquelas cláusulas defenderam ainda os RR. que, resultando das condições particulares do contrato que o total do aluguer fixo é de € 4.140,00, caso subsista ao autor o direito à indemnização peticionada esse valor seria de € 2.070,00 e não o que é peticionado.
Por outro lado ainda, na ausência de avaliação à desvalorização do veículo não é possível determinar o quantum indemnizatório, pelo que o valor da indemnização peticionada, além de mal calculado, é um valor imposto, arbitrário, calculado à revelia da desvalorização do veículo.
Sendo condescender, aludiram ainda que essa indemnização andará muito longe da franquia dos 50%, uma vez que, para além de sobre o veículo não ter existido qualquer avaliação para apurar o seu estado e a sua desvalorização, esta sempre existiu, apesar do cuidado e do uso cauteloso que o réu marido deu à viatura. Mas tendo a mesma sido recebida pelo autor e uma vez que não a inspeccionou e não peticiona qualquer valor a título de reparações ou danos que a mesma tenha apresentado, é possível concluir que foi entregue em bom estado de conservação.
Acresce que o R. entregou já € 3.360,00 a título de caução, referindo-se na cláusula 12.
ª n.
º 3 que a mesma responderá pelo pagamento de todas as importâncias ou indemnizações que o locatário haja de efectuar ou pagar, motivo porque qualquer quantia a que, eventualmente, o autor tenha direito, deverá ser imputada àquela caução.
Porém, tal indemnização pelo desgaste/desvalorização do veículo já está mais do que compensada pelo baixo preço pago pelo autor na aquisição da carrinha X....., uma vez que foi descontado o valor de €...
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