Acórdão nº 35/05.7JELSB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelESTEVES MARQUES
Data da Resolução01 de Março de 2010
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

S Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: CONFIRMADA PARCIALMENTE Legislação Nacional: ARTIGOS 328º, 6 CPP E ARTº 9º DO DEC. LEI 39/95 DE 15/2 Sumário: 1. O prazo de trinta dias a que se refere o nº 6 do art.º 328º do CPP reporta-se apenas ao intervalo das sessões de audiência não sendo aplicável à fase da sentença.

  1. O momento relevante do ponto de vista do titular do direito ao recurso, para arguir a nulidade por deficiência de gravação da audiência, só pode ser coincidente com o momento em que é proferida a decisão de que se pretende recorrer, pois é esta que contém e fixa os elementos determinantes para formulação do juízo de interessado sobre o direito e o exercício do direito de recorrer.

    Decisão Texto Integral: Em processo comum colectivo do 3º Juízo do Tribunal Judicial da Figueira da Foz, por acórdão de 09.04.07, foi, para além do mais, decidido condenar cada um dos arguido A... e J..., como co-autores materiais de um crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. no artº 21º nº 1 do Dec. Lei 15/93, de 22/1, na pena de 6 anos e 6 meses de prisão.

    Inconformados os arguidos interpuseram recurso.

    O arguido J... formula as seguintes conclusões: “1.° - Ficou demonstrado em sede de matéria de facto considerada provada no douto acórdão a comprovada actividade delituosa do recorrente. Todavia, a melhor valoração da prova da acusação produzida em audiência (com especial relevo para o depoimento da principal testemunha de acusação inspector da Polícia Judiciária P... inquirido e contra-instado pelo Tribunal em 26 de Março de 2008), não poderia conduzir o douto Colectivo à decisão de mérito proferida, com o reconhecimento da culpabilidade do recorrente.

    1. - Na verdade, atento o depoimento da mencionada testemunhas de acusação, inspector da Polícia Judiciária (Cassete 1 e 2 nas já apontadas passagens – sobreditos 19, 20, 22, 23, 29 (o telefone com este número nunca foi encontrado) 51, 52, 53, 56, 153), que o douto acórdão reconhece como tendo sido “ um dos elemento da Polícia Judiciária que mais acompanhou a dita investigação” (a fls. 27 do douto acórdão), tendo prestado (ainda no dizer do douto mas recorrido acórdão “ um depoimento bastante importante pela visão de conjunto que permitiu obter dos “ antecedentes” da operação de apreensão de cocaína em causa nos presentes autos”- ibidem a fls. 28 do mesmo acórdão, não deveria servir “tout court" para a condenação do recorrente.

    2. Pelo que o acórdão recorrido violou, por erro interpretativo, o disposto nos artºs 127º e 355º do CPP, validando meras opiniões, convicções e hesitações da apontada testemunha de acusação, inspector da Polícia Judiciária, P... e conferindo-lhes foros de imparcialidade, a ponto de fundamentar esse mesmo depoimento como essencial para o Tribunal ter alicerçado a sua convicção extraída nos termos do apontado artº 127º do CPP.

    3. - Pelas apontadas razões, o recorrido e douto acórdão violou ainda, por manifesto erro interpretativo, o princípio "in dúbio pro reo" quanto ao recorrente, uma vez que nenhum nexo de causalidade - entre o facto e o sujeito activo - existe, no caso vertente, para se poder decretar a condenação do recorrente.

    4. - É que, restaria demonstrar que eventuais telefonemas em que interveio o recorrente (e a Polícia não pode jurar que era a voz do recorrente que escutava, pois nunca tinha falado com este) se relacionavam com a importação de 93,5 kilos de cocaína e não apenas com a importação do grão de bico.

    5. - Ora essa destrinça não logrou o douto acórdão fazer e por isso aludimos a violação da lei (citados artº 127º e 355º do CPP e violação do princípio de presunção de inocência do arguido em Processo Penal constitucionalmente consagrada – artº 32º nº2 da CRP revista).”.

    O arguido A... conclui a motivação pela seguinte forma: “1. Conforme se verifica pelo exame das actas de discussão e julgamento, nomeadamente a efectuada em 5 de Dezembro de 2008, na qual alguns arguidos, entre os quais o ora recorrente, usaram da palavra pela última vez, e a efectuada em 7 de Abril de 2009, na qual foi lido o Acórdão final, a audiência esteve interrompida por um período superior a 30 dias.

  2. Entre a sessão na qual se procedeu ao encerramento da produção de prova (5/12/2008) e leitura do Acórdão (7/4/2009) ocorreram vários adiamentos deste último no qual o Meritíssimo Juiz declarava sem efeito as datas que foram sendo aprazadas, "atendendo à evidente complexidade e vastidão do processo, bem como à necessidade de proceder a nova reunião de Colectivo (com a dificuldade acrescida de um dos respectivos membros ter sido entretanto movimentado para comarca geograficamente distante deste circulo judicial) " (fim de citação).

  3. Decorrendo do sentido literal do nº 6 do artº 328° do C.P.P. e tendo em conta o Acórdão de Fixação de Jurisprudência do STJ com o nº 11/2008, sobre o processo nº 4822/07-3 de 29/10/2008 publicado no DR. I Serie n° 239 de 11 de Dezembro de 2008, o adiamento da audiência de Julgamento por prazo superior a 30 dias implica a perda de eficácia da prova produzida com sujeição ao princípio da imediação.

  4. "Tal perda de eficácia ocorre independentemente da existência de documentação a que alude o artº 363° do C.P.P".

    1. Na verdade, o nº 6 do artº 328° já citado utiliza a palavra AUDIÊNCIA e não encerramento da discussão, sendo por isso aplicável o princípio romano "ubi lex non distinguit, nec nos distinguire debemos".

    2. Para além disso, o artº 365º nº 1 expressamente refere que a deliberação segue-se ao encerramento da discussão fixando-se, posteriormente, no artº 373º um prazo curto de 10 dias para a elaboração da sentença e a sua leitura e ainda assim, "atenta a especial complexidade da causa".

    3. Considera-se, no entanto, pela fundamentação deste Acórdão que existe idêntica razão de decidir.

    4. Com efeito a fls. 8704 do DR citado diz-se nesse Acórdão: 9º. "A proximidade temporal entre aquilo que o Juiz apreendeu por sua observação pessoal e o momento em que deverá avaliá-lo na sentença, é elemento decisivo para a preservação das vantagens do princípio, pois um intervalo de tempo excessivo entre a audiência e o Julgamento tornará difícil ao julgador conservar, com nitidez, na memória os elementos que o tenham impressionado na recepção da prova, junto da sua observação pessoal sujeita a desaparecer com o passar do tempo". (fim de citação) 10. Destas palavras se pode concluir que no Acórdão do STJ atrás citado, foi sopesado o tempo entre o encerramento da discussão e a leitura da sentença.

  5. E se é este o entendimento fixado neste acórdão, a sua fundamentação vai, neste caso vertente, ao encontro da situação existente. Isto é, de 5/12/2008 a 7/4/2009 distam precisamente 123 dias.

  6. Mesmo descontando o período de férias do Natal e da Pascoa, num total de 21 dias, ainda restam 102 dias, pelo que, de uma forma ou de outra, não poderemos deixar de colocar em crise a memória humana, especialmente para os pequenos pormenores que são sempre insusceptíveis de ficarem gravados, como a atitude de testemunhas e arguidos, seus tiques, nervosismo ou serenidade, firmeza ou hesitação, tempo de resposta e alterações fisionómicas e corporais.

  7. Mesmo admitindo uma memória mais duradoura por parte dos Meritíssimos julgadores, o que é certo é que o Advogado signatário não consegue, nem mesmo consultando os suportes técnicos lembrar-se, com a acuidade necessária, de todos os pormenores que conferem ou retiram credibilidade aos intervenientes na prova.

  8. Até porque, esta audiência de julgamento, do seu início (26/3/2088) até ao encerramento da produção de prova (5/12/2008) durou precisamente 284 dias, nos quais se efectuaram 12 sessões de julgamento.

  9. Lembramos que os próprios tribunais superiores, em jurisprudência uniforme, invocam a imediação de prova (e da qual estão arredados) para fundamentarem a sua recusa em sindicarem a livre convicção do julgador em primeira instância.

  10. Nestes termos deverá ser determinado "in casu" a revogação da decisão recorrida, ordenando-se o seu reenvio ao Tribunal da 1ª Instância, a fim de que reveja a decisão recorrida, ordenando a repetição do julgamento de 1ª instância.

  11. Ainda como questão prévia, constatou o recorrente que as suas declarações em audiência foram deficientemente gravadas sendo absolutamente impossível a sua transcrição, mínima que fosse.

  12. O mandatário do recorrente contactou os serviços do tribunal indagando se os suportes técnicos originais na posse do Tribunal se encontravam em condições de inteligibilidade e a resposta da senhora funcionária confirma a mesma situação, informando que o recorrente teria aproximado demasiado a boca do microfone.

  13. Seja como for, quer o recorrente quer o douto tribunal superior se acham impossibilitados de se socorrerem dessas gravações.

  14. Na verdade, o advogado signatário recorda-se de diversas afirmações e explicações sobre a matéria de facto que o recorrente produziu em audiência, mas acha-se impedido de as apresentar na sua motivação do Recurso.

  15. Nomeadamente, não pode o recorrente cumprir os ditames do nº 3 e 4 do artigo 412º do C.P.P., o que tem acarretado a rejeição dos recursos. Mas, se assim é, a exigência de transcrição de passagens das gravações será tão importante para o julgador como o é para o recorrente.

  16. Uma das provas que o recorrente considera imporem decisão diversa da recorrida - as suas declarações - não se acha documentada com consequências inerentes sobre a eficácia da prova recolhida.

  17. Jurisprudência uniforme em casos absolutamente similares tem entendido que se impõe a anulação do julgamento "in totum" com reenvio à primeira instância para a repetição do julgamento - vejam-se entre outros, Acórdãos nº 10168/05-9 e n° 10154/2002, ambos da 9ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa.

  18. O recorrente impugna os seguintes pontos da matéria de facto apurada no Acórdão recorrido.

  19. Ponto 6- Não corresponde à verdade que os contactos do recorrente, quer pessoalmente quer por telefone, tenham tido qualquer relação com importação...

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