Acórdão nº 476/04.7TAPBL.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 01 de Abril de 2009
Magistrado Responsável | JORGE GON |
Data da Resolução | 01 de Abril de 2009 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
10 I – RELATÓRIO 1.
Nos autos de processo comum com intervenção do tribunal singular registados sob o n.º476/04.7TAPBL, a correr termos no 2.º Juízo de competência especializada criminal de Leiria, o arguido G... foi condenado, pela prática de um crime de desobediência p. e p. no art. 348.º n.º 1, alínea a), do Código Penal e artigo 166.º, n.º 3, do Código da Estrada, na pena de 9 meses de prisão.
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Inconformado, o arguido interpôs o presente recurso, formulando, na motivação, as seguintes conclusões (transcrição): 1- O presente recurso incide, inequivocamente sobre a escolha da pena, levada a cabo pelo douto tribunal recorrido.
2- Efectivamente, no entender do recorrente, salvaguardando o devido respeito, o douto tribunal recorrido, fundamentou a sua convicção alicerçando, que pelas "regras da experiência comum as pessoas lêem as decisões que lhes dizem respeito", daqui retirando que o requerente “agiu com pleno conhecimento e vontade de não entregar a carta conforme determinado”, “agindo pois com dolo directo.” 3- O douto tribunal a quo generalizou a sua convicção ao caso ora em apreço, não atendeu à especificidade do arguido possuir um baixo grau de instrução, e não colocou a hipótese do arguido não ter compreendido o sentido das palavras escritas. Dado que ler não é compreender, e uma vez que o douto tribunal a quo não se certificou se o arguido tinha compreendido o sentido da decisão, não podemos concluir com tal grau de certeza, o que o douto tribunal logrou alcançar, que o arguido "agiu com pleno conhecimento e vontade de não entregar a carta conforme determinado" .
4- Não se pode dar como provado, como deu o tribunal a quo, que o arguido tinha compreendido o determinado, dado que nunca fora perguntado ao arguido se este tinha ou não tinha compreendido a decisão, nem este respondeu o que quer que seja.
5- Por isso o douto tribunal a quo extraiu a sua conclusão com base na generalidade dos casos apreciados pelo douto tribunal.
6- Mas a convicção do tribunal a quo tem de se restringir ao caso concreto e não como fez à generalidade dos casos que apreciou.
7- Pelo que o tribunal a quo não pode concluir, como concluiu, que o arguido "agiu com pleno conhecimento e vontade de não entregar a carta conforme determinado" agindo pois com dolo directo.
8- Não se nega que não tenha entregue a carta, mas não se sabe se e arguido agiu com negligência, ou com dolo, ou sequer se tinha consciência que tinha de entregar a carta numa data certa.
9- O douto tribunal a quo dá como provada a inserção comunitária do requerente no mundo do trabalho.
10- De facto neste momento o arguido trabalha e é o único sustento de uma família composta pelo requerente e sua mãe, viúva e doente acamada.
11- O douto tribunal a quo na ponderação da substituição da pena de prisão só equacionou a possibilidade da substituição pela pena de multa e pela suspensão da execução da pena, não tendo equacionado a sua substituição pela Prestação de trabalho a favor da comunidade, art° 58° C.P., conforme acórdão de 21 de Junho de 2007 do S.T.J. citado no acórdão de 23/01/2008 do Tribunal da Relação de Coimbra, processo n.° 346/06.4GTA VR.C 1, o que conduz à nulidade da sentença, nos termos do art. 379.º, n.º1 c) do C.P.Penal.
12- De facto, a Prestação de trabalho a favor da comunidade tem exigências e actualiza práticas de reinserção social singulares, que a simples suspensão de execução da pena ou a pena de multa não consagram.
13- Desde a data dos factos originários da contra-ordenação n.º226391043 (24-5.:2002) e da decisão da mesma (14-7-03) até aos dias de hoje, o arguido vem mantendo uma conduta reveladora do seu efectivo arrependimento e da sua inequívoca capacidade para manter uma conduta lícita e socialmente aceitável, após um passado de condutas menos abonatórias, comprovado pela ausência de qualquer contra-ordenação.
14- A prisão efectiva porá em risco a sobrevivência económica e afectiva desta família, porá em risco o emprego do recorrente, o amparo de sua mãe e a sua inserção social ficarão irremediavelmente perdidos.
15- Dever-se-ia pois ter condenado o arguido em pena de prestação de trabalho a favor da comunidade, medida que o fará interiorizar os valores que a sociedade defende, sendo que a própria comunidade verá também ela nesta aplicação, a necessária consequência da sua conduta, tutelando-se assim as expectativas sociais de ver a norma aplicada com eficiência.
16- Ao não ter agido assim, não foi feito o exame crítico da situação, tendo levado a uma decisão injusta.
17-Assim por aplicação das normas 40.º, n.º1 e n.º 2, 58.º,70.º,71.º, n.º1 e 2 d) e e) do C.P. impõem-se que ao arguido seja aplicada pena não detentiva, mormente a prestação de trabalho a favor da comunidade.
Nestes termos e nos melhores de direito deve o presente recurso proceder, substituindo-se a pena de prisão pela pena não detentiva de trabalho a favor da comunidade.
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Respondeu o Ministério Público junto da 1.ª instância, concluindo do seguinte modo (transcrição): 1.º - Efectuado o julgamento foi proferida sentença que condenou o arguido G... na pena de nove meses de prisão pela prática, em 20.12.2003, de um crime de desobediência p. e p. no art. 348.º, n.º1, al. a), do C.P. e art. 166.º, n.º3 do C.E.
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- Em nosso entender o M. mo Juiz apreciou correctamente a prova produzida em audiência, retirando as conclusões lógicas que a matéria dada como provada impunha, fazendo apelo ao principio consagrado no artigo 127.º do CPP, sem olvidar que a audiência de julgamento obedece também ao princípio da imediação e encontra-se estreitamente ligado ao principio da oralidade.
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- De facto, é nosso parecer, tendo em atenção o depoimento prestado em audiência, sendo certo que o Tribunal especifica o que lhe mereceu credibilidade e explana claramente o seu raciocínio, que bem andou o M.mo Juiz ao condenar o arguido, nos termos acima assinalados.
Para tanto, atendeu ao depoimento da testemunha (agente de autoridade), bem como à prova documental, sendo certo que a convicção do julgador nesta primeira instância, em nosso entender, não se mostra contrária às regras da experiência, da lógica e conhecimentos científicos.
Em nosso entender, não se verificou pois erro da...
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