Acórdão nº 0827137 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 17 de Fevereiro de 2009

Magistrado ResponsávelCARLOS MOREIRA
Data da Resolução17 de Fevereiro de 2009
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo nº7137/08-8 ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DO PORTO 1.

B.......... instaurou contra C.........., e esposa D.........., acção declarativa, de condenação, com processo ordinário.

Pediu: - Seja declarada a nulidade da cedência da posição contratual da A. em simultâneo com o negócio de cessão de quotas da sociedade e aludida no artigo 11.º da petição inicial; - Sejam os RR. Condenados: a)- A restituírem à A. a fracção em causa; b)- No pagamento da quantia de € 2.000,00 por cada mês, a contar de 20 de Junho de 2000, ou da que seja considerada, a título de indemnização; c)- No pagamento da quantia de € 3.477,67 respeitante às contribuições para o condomínio vencidas, desde Novembro de 2001 até 24/04/2002, e bem como no valor respeitante às vencidas desde esta data e vincendas que vier a apurar-se, até efectiva entrega; d)- E nos juros legais até integral pagamento.

Alegou, para o efeito, em síntese: Que cedeu ao réus a sua posição contratual, como promitente compradora, em contrato promessa relativa a fracção autónoma que melhor identifica.

Que devido a incumprimento do referido contrato, por parte dos requeridos, desde Julho de 2000 que lhes tem vindo a ser solicitada a restituição do estabelecimento, o que eles recusam, prosseguindo normalmente a exploração lucrativa do estabelecimento, e na fracção da requerente.

Que o contrato promessa de cessão, é nulo por falta de intervenção da requerente, e a assinatura a rogo não se achar reconhecida notarialmente, como obriga o disposto nos artigos 373.º, n.ºs 1 e 4 do Código Civil e 154° do Código do Notariado.

Que tendo em conta a área ocupada - de cerca de 370,70 m2 -, com duas divisões, e o local - aglomerado habitacional e de grande movimento comercial - tem um valor locativo não inferior a € 2.000 mensais (que era, aliás, ao que a requerente sabe, o valor pago pela anterior locatária, e já há alguns anos), que a detenção da fracção pelos requeridos tem impossibilitado a requerente de auferir.

Que os requeridos não mais pagaram as prestações de condomínio, que, desde Novembro de 2001, ascendiam em 24/4/2002 a € 3.477,67, conforme reclamado pelo banco chamado, na qualidade de "proprietário formal".

Contestaram os réus.

Alegando, em síntese, que foi a autora e os seus filhos a incumprirem os contratos - o presente e o de cessão de quotas - pois que, para além do mais, não obtiveram licença de utilização do estabelecimento comercial sito na fracção ora em causa, como se comprometeram.

  1. Prosseguiu o processo os seus legais termos, tendo, a final, sido proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu os réus do pedido.

  2. Inconformada apelou a autora.

    Rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: 1ª A A. prometeu comprar ao E.........., Chamado, uma fracção autónoma em imóvel; 2ª Na sequência do pagamento do preço e da entrega pelo promitente vendedor das chaves, a A. considera-se sua possuidora, ao que o Chamado não se opôs; 3ª Pelo que, não tendo sido produzida qualquer prova em contrário, afigura-se que o quesito 2º poderá perfeitamente considerar-se provado; 4ª Ainda assim, a A. tinha o uso do imóvel, por lhe ter sido entregue pelo promitente vendedor; 5ª Pelo que, a sua transmissão para terceiro, carecia da sua intervenção; 6ª A assinatura do contrato a rogo, não reconhecida notarialmente, sem a intervenção da A., importa a nulidade, como forma mais ampla de ineficácia; 7ª Assistindo, assim, à A. o direito a pedir a sua restituição; 8ª Acresce que, da prova documental junta aos autos, resulta um valor locativo do prédio, e como tal se considera que os quesitos 8º e 9º, deverão ter resposta positiva; 9ª Bem como o quesito 10º, face ao doc. 4 junto com a petição inicial; 10ª Com a consequente condenação dos RR. nos respectivos pagamentos; 11ª Ou, ainda, a não se entender, que se relegue para liquidação em execução de sentença.

    12ª Consideram-se violadas as disposições dos art.s 220º, 287º, 289º, nº 1, 294º, 373º, nºs 1 e 4, do Cód. Civil; 154º, do Cód. do Notariado; 2º, nº 2, 661º, nº 2, do Cód. Proc. Civil.

  3. Sendo que, por via de regra: artºs 684º e 690º do CPC - de que o presente caso não constitui excepção - o teor das conclusões define o objecto do recurso, as questões essenciais decidendas são as seguintes: 1ª Alteração da decisão sobre a matéria de facto.

    2ª Consequências do não reconhecimento notarial da assinatura da autora, feita a seu rogo, aposta no contrato promessa.

    5.1 Primeira questão.

    5.1.1.

    Há que considerar que no nosso ordenamento vigora o princípio da liberdade de julgamento ou da livre convicção segundo o qual o tribunal aprecia livremente as provas, sem qualquer grau de hierarquização, e fixa a matéria de facto em sintonia com a sua prudente convicção firmada acerca de cada facto controvertido -artº655º do CPC.

    Perante o estatuído neste artigo pode concluir-se, por um lado, que a lei não considera o juiz como um autómato que se limita a aplicar critérios legais apriorísticos de valoração.

    Mas, por outro lado, também não lhe permite julgar apenas pela impressão que as provas produzidas pelos litigantes produziram no seu espírito.

    Antes lhe exigindo que julgue conforme a convicção que aquela prova determinou e cujo carácter racional se deve exprimir na correspondente motivação - cfr. J. Rodrigues Bastos, Notas ao CPC, 3º, 3ªed. 2001, p.175.

    Na verdade prova livre não quer dizer prova arbitrária, caprichosa ou irracional.

    Mas quer dizer prova apreciada em inteira liberdade pelo julgador, sem obediência a uma tabela ditada externamente, posto que em perfeita conformidade com as regras da lógica e as máximas da experiência - cfr. Alberto dos Reis, Anotado, 3ª ed. III, p.245.

    5.1.2.

    Por outro lado há que ter em conta que as decisões judiciais não pretendem constituir verdades ou certezas absolutas.

    Pois que às mesmas não subjazem dogmas e, por via de regra, provas de todo irrefutáveis, não se regendo a produção e análise da prova por critérios e meras operações lógico-matemáticas.

    Assim: «a verdade judicial é uma verdade relativa, não só porque resultante de um juízo em si mesmo passível de erro, mas também porque assenta em prova, como a testemunhal, cuja falibilidade constitui um conhecido dado psico-sociológico» - Cfr. Ac. do STJ de 11.12.2003, dgsi.pt, p.03B3893.

    Acresce que a convicção do juiz é uma convicção pessoal, sendo construída dialecticamente, para além dos dados objectivos fornecidos pelos documentos e outras...

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