Acórdão nº 3/08.7YRCBR de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 18 de Novembro de 2008

Magistrado ResponsávelSILVIA PIRES
Data da Resolução18 de Novembro de 2008
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Requerentes: A...

B...

Requerida: C...

* Acordam na 3ª secção cível do Tribunal da Relação de Coimbra Os requerentes interpuseram a presente acção especial de revisão de sentença estrangeira, pedindo a revisão e a confirmação da sentença proferida em 21 de Setembro de 2007, pelo Tribunal das Sucessões, do Distrito de Nimba, República da Libéria, que decretou a adopção de D... pelos requerentes.

Pedem ainda, invocando o disposto no art.º 1988º, n.º 2, do C. Civil, que o adoptado passe a chamar-se E....

Citada a requerida não foi deduzida oposição.

Cumprido o disposto no art.º 1099º, nº 1, do C. P. Civil, o Magistrado do M.º P.º e os requerentes apresentaram alegações, defendendo o deferimento da pretensão formulada.

* Incompetência do tribunal para apreciação do pedido de alteração do nome do adoptado Com o pedido de revisão e confirmação de sentença estrangeira os requerentes cumulam um pedido de alteração do nome do adoptado, na sequência da adopção.

Nos termos do art.º 470º, do C. P. Civil, é possível a cumulação de pedidos, desde que sejam compatíveis e não se verifiquem as circunstâncias que impedem a coligação.

Uma das circunstâncias impeditivas da coligação é a da ofensa das regras de competência em razão da hierarquia (art.º 31º, n.º 1, do C. P. Civil), Ora, enquanto a competência para apreciação do pedido de revisão e confirmação da sentença estrangeira pertence a este tribunal da Relação (art.º 1095º, do C. P. Civil), já a competência para apreciação do pedido de mudança de nome na sequência de adopção pertence aos tribunais de 1ª instância (art.º 77º, n.º 1, da LOFTJ), pelo que os dois pedidos não podem ser cumulados, atenta a incompetência deste tribunal, em razão da hierarquia, para apreciar o último pedido.

Essa incompetência determina a absolvição da instância da requerida, relativamente ao pedido de alteração do nome do adoptado (art.º 101º e 288º, a), do C. P. Civil).

Relativamente ao pedido de revisão de sentença estrangeira, o tribunal é competente, o processo é o próprio, as partes são legítimas e inexistem quaisquer outras excepções ou nulidades que obstem ao conhecimento do mérito da causa.

* OS FACTOS Encontram-se provados os seguintes factos: I – B... (doc. de fls. 63).

II – A..., (doc. de fls. 65).

III – Os Requerentes casaram catolicamente um com o outro no dia 21.8.2005 (doc. de fls. 76).

IV – Por sentença proferida em 21 de Setembro de 2007, pelo Tribunal das Sucessões, do Distrito de Nimba, República da Libéria, foi proferida a seguinte decisão: Decisão Judicial Sobre a Adopção: Considerando que, o Sr. A... e a Sr.ª B..., de Scarlepea, Distrito de Nimba, República da Libéria, preencheram um requerimento perante este Tribunal, procurando a autorização para a ADOPÇÃO de D..., nascido a 20 de Outubro de 2006, em Buutuo, Distrito de Nimba, e tendo o Tribunal assentido, após a análise da declaração de aceitação assinada pelos requerentes por intermédio do seu representante legal, conclui-se a existência de factos suficientes que sustentam as alegações expostas no pedido dos requerentes e que a adopção da criança citada vai ao encontro do interesse e bem estar de D....

DECIDE-SE E ORDENA-SE, POR ESTE MEIO, que de aqui em diante o filho primogénito de F... e de G..., D..., deve para os devidos efeitos e propósitos ser a CRIANÇA ADOPTADA dos REQUERENTES supra mencionados, a criança citada deve ser conhecida, considerada e chamada de D..., e para efeitos de sucessão e demais fins legais, determina-se que o seu estatuto será o mesmo como se a criança tivesse nascido para os requerentes do compromisso do sagrado matrimónio.

DECIDE-SE E ORDENA-SE MAIS AINDA, POR ESTE MEIO, que o citado Decreto do Tribunal seja gravado e registado no gabinete dos registos das acções judiciais do Distrito de Nimba, República da Libéria.

(doc. de fls. 26 a 28).

V – Na altura em que foi proferida a sentença referida em IV, os requerentes encontravam-se na Libéria, em missão humanitária (facto alegado na p.i. e não impugnado).

* O DIREITO Estamos perante um caso de adopção internacional típica em que a heterogeneidade da situação jurídica resulta na transferência da criança do seu país de origem para o país dos adoptantes. Como vem sucedendo num ritmo crescente, numa manifestação dos actuais desequilíbrios geográficos e económicos entre os países pobres do sul e os países ricos do norte, da adopção internacional resulta normalmente a deslocação duma criança duma região do globo sub-desenvolvida para uma região com melhores índices de qualidade de vida.

Se a massificação deste fenómeno motivou já a intervenção limitativa dos legisladores nacionais [1], quer dos países de origem, quer dos países de destino da criança, e a realização de convenções internacionais bilaterais ou multilaterais [2], com vista a melhor controlar este tipo de adopções, a mudança radical do ambiente de vivência da criança, provocada pela sua transferência para um mundo completamente diferente daquele onde nasceu e começou a crescer, exige um reforço das cautelas na admissão ou validação concreta das adopções internacionais de modo a que não se registem desvios à promoção do superior interesse da criança [3].

Neste caso, encontramo-nos perante um pedido de revisão e confirmação de sentença proferida por tribunal da Libéria de adopção de criança liberiana por casal português, residente em Portugal e que, na altura em que foi proferida aquela sentença, se encontrava, temporariamente, na Libéria em missão humanitária.

Confirmar uma sentença estrangeira, após ter procedido à sua revisão, é reconhecer-lhe no Estado do foro, os efeitos que lhe cabem no Estado de origem como acto jurisdicional, nomeadamente efeitos constitutivos relativamente ao estado das pessoas.

O fundamento do reconhecimento das sentenças estrangeiras reside na necessidade de assegurar a estabilidade e a continuidade das situações jurídicas internacionais, o qual deve também ser perseguido através da consagração de normas de conflito que indiquem pelo método da escolha da conexão mais estreita ou mais significativa o direito material aplicável às situações plurilocalizadas [4].

O direito português admite desde a Reforma Judiciária de 1837 [5], o princípio segundo o qual as sentenças estrangeiras são admitidas a desenvolver na ordem jurídica do foro os efeitos que lhes competem no país de origem, desde que obedeçam...

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