Acórdão nº 882/12.3TTPRT.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 10 de Março de 2014
Magistrado Responsável | EDUARDO PETERSEN SILVA |
Data da Resolução | 10 de Março de 2014 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Processo nº 882/12.3TTPRT.P1 Apelação Relator: Eduardo Petersen Silva (reg. nº 343) Adjunto: Desembargadora Paula Maria Roberto Adjunto: Desembargadora Fernanda Soares Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: I. Relatório B…, residente no Porto, intentou a presente acção declarativa, com processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra “C…, S.A”, com sede em …, pedindo a condenação da ré a: a) Reconhecer a existência de um contrato de trabalho sem termo entre as partes desde 10 de Setembro de 2010; b) Reconhecer a ilicitude do despedimento; c) Reintegrar a autora nos seus quadros de pessoal, sem prejuízo de qualquer direito ou regalia ou, se assim optar, pelo pagamento de uma indemnização por antiguidade, no valor de 2.563,85 €; d) pagar à autora todas as retribuições que se vencerem até à data da sentença, ascendendo as vencidas a 569,73 €.
Alegou que celebrou com a ré um contrato a termo certo para o exercício de funções de cozinheira de 3ª, na cantina/refeitório da Escola …, que vigorou entre 10 de Setembro de 2009 e 18 de Junho de 2010. A ré voltou a contratá-la para exercer as mesmas funções na mesma escola, também por contrato a termo certo, o que aconteceu em 10 de Setembro de 2010 e até 31 de Maio de 2011, contrato que foi prolongado por mais 28 dias, altura em que cessou por caducidade, conforme invocado pela ré. A segunda contratação deu-se em violação do disposto no artigo 143º, n.º 1 do Código do Trabalho, devendo pois o segundo contrato celebrado ser considerado um contrato de trabalho sem termo e destarte ter a autor sido despedida ilicitamente.
Contestou a ré, pronunciando-se pela improcedência do pedido, e invocando em síntese que os contratos celebrados o foram para cumprimento de um contrato de prestação de serviços que celebrou com a Câmara Municipal …, com duração certa, não automaticamente renovável, e correspondente ao período escolar, com carácter sazonal, motivação que a autora não pôs em causa. Em função desse carácter sazonal do trabalho, não se aplica o disposto no nº 1 do artigo 143º do Código do Trabalho por força da excepção prevista no nº 2 alínea c) do mesmo preceito.
Juntou a Ré os contratos celebrados com a autora e com a Câmara Municipal ….
A autora respondeu invocando o carácter imperativo do nº 1 do artigo 143º do Código do Trabalho e que a motivação apresentada, a ser válida, permitiria à Ré manter no mesmo posto de trabalho, por anos a fio, o mesmo trabalhador, em contratações sucessivas a termo. Esta resposta não foi admitida nos autos, no despacho saneador.
Foi proferido despacho saneador e seleccionados, por remissão, os factos assentes e controvertidos.
Realizou-se audiência de julgamento na qual as partes chegaram a acordo sobre os factos provados, e seguidamente foi proferida sentença de cuja parte dispositiva consta: “Pelo exposto julgo a acção totalmente improcedente e, em consequência, absolvo a ré dos pedidos.
Sem custas por delas estar isenta a autora – artigo 4º, n.º 1, h) do RCJ”.
Inconformada, interpôs a Autora o presente recurso, apresentando a final as seguintes conclusões: 1 - A actividade empresarial da R. consiste na exploração de estabelecimentos de refeições por concessões a que concorre por concurso público (cf. facto 9) que são sempre limitadas no tempo e que, no caso das escolas, duram apenas o ano lectivo (de meados de Setembro de um ano a meados de Junho do ano seguinte), havendo pois um encerramento de 2 a 3 meses com desconhecimento sobre se a concessão irá ou não ser renovada para o ano seguinte.
2 - Simplesmente, se é assim, também cumpre concluir que a R. “vive” de concessões que são, por natureza, temporárias e que isso é, nada mais nada menos, que a sua actividade normal, não se estando aqui nem perante acréscimos excepcionais de serviço nem actividades sazonais.
3 - De outro modo e com base em pretensas actividades sazonais de serviço, a R. poderia estar durante anos sucessivos e sem limite de tempo a recorrer a trabalhadores contratados a prazo para o mesmo posto de trabalho, o que não terá sido certamente a intenção do legislador, que visou limitar a contratação a termo a circunstâncias excepcionais e limitadas no tempo – cf. o art. 140º do Cód. Trabalho e, quanto à sua interpretação, o art. 9º do Cód. Civil.
4 - E também não se diga que entre os dois espaços temporais não se mantém a mesma estrutura empresarial a que pertence o posto de trabalho, pois as normas dos n.º 1.º e 2.º da cláusula 127.ª do CCT aplicável ao sector salientam que «quando haja transmissão de exploração ou de estabelecimento, qualquer que seja o meio jurídico por que se opere, ainda que seja por concurso ou concurso público, os contratos de trabalho transmitem à entidade patronal adquirente ou com a entidade concedente da exploração relativamente aos trabalhadores que se encontrem ao serviço da exploração ou estabelecimento há mais de 90 dias…» e que «nos casos de transmissão da exploração em estabelecimentos de ensino, entende-se que os contratos de trabalho se transmitem aos novos adquirentes ou concessionantes, a partir do início da actividade do novo concessionário, mesmo que tenha acorrido uma suspensão da actividade por motivos escolares…» (o sublinhado é nosso).
5 - De facto, a interpretação da douta sentença permite a uma empresa como a R. contratar durante vinte anos um trabalhador a termo cuja execução se concretize no mesmo posto de trabalho, sem respeitar o conteúdo do art.º 143.º do CT, o que vai, com todo o respeito, contra o espírito da lei.
6 - O legislador constitucional consagrou o princípio da segurança no emprego, no art. 53° da Constituição da República, admitindo-se a título excepcional a celebração de contratos a termo, para suprir unicamente necessidades temporárias das empresas.
7 - E, embora a R. viva de concessões que são, por natureza, temporárias, é essa a sua actividade normal, não se estando aqui perante actividades sazonais nem acréscimos excepcionais de serviço.
8 - No caso, não está em causa, a admissibilidade da contratação a termo, mas a não observância de um intervalo mínimo entre os contratos, o que constitui matéria imperativa (podendo apenas ser alterada por Instrumento de Regulamentação Colectiva de Trabalho) – cf. art. 139º do Cód. Trabalho.
9 - A favor da tese ora exposta, recorre-se não só à natureza de todo o contrato ser, em princípio, de duração indeterminada por força do princípio constitucional da estabilidade no emprego, em que a aposição do termo resolutivo contraria esse valor e, por isso, reveste-se de carácter excepcional, só sendo lícita nos casos justificados por razões objectivas nos casos previstos na lei, com a menção expressa dos factos que integram o seu motivo justificativo e verificando-se a relação entre a invocada justificação e o termo...
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