Acórdão nº 2334/10.7TBGDM.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 27 de Fevereiro de 2014

Magistrado ResponsávelJOSÉ MANUEL DE ARAÚJO BARROS
Data da Resolução27 de Fevereiro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

2ª SECÇÃO CÍVEL – Processo nº 2334/10.7TBGDM.P1 Tribunal Judicial de Gondomar – 1º Juízo Cível SUMÁRIO (artigo 663º, nº 7, do Código de Processo Civil) I - Como condição necessária à aprovação de mútuo contraído junto de instituição bancária, o autor e a mulher subscreveram um seguro de vida (Ramo – Vida Grupo), com capital seguro igual ao do empréstimo, de modo a garantir, em caso de morte e invalidez (total ou permanente por doença ou acidente) dos mutuários, a liquidação do montante em dívida, do capital e dos juros vencidos, de acordo com as condições gerais e especiais da apólice, ficando cobertos os seguintes riscos: falecimento da pessoa segura; invalidez absoluta e definitiva por doença da pessoa segura; invalidez total e permanente por acidente da pessoa segura II - De acordo com as condições especiais da apólice desse seguro, “a pessoa segura é considerada em estado de invalidez absoluta e definitiva quando, em consequência de doença susceptível de constatação médica objectiva, fique total ou definitivamente incapacitada de exercer qualquer profissão e necessite de recorrer, de modo contínuo, à assistência de uma terceira pessoa para efectuar os actos normais da vida diária” III - Nos termos do artigo 8º do DL nº 446/85, de 25 de Outubro, aplicável aos contratos não negociados, «consideram-se excluídas dos contratos singulares: a) as cláusulas que não tenham sido comunicadas nos termos do artigo 5º; b) as cláusulas comunicadas com violação do dever de informação, de molde que não seja de esperar o seu conhecimento efectivo».

IV - A obrigação que recai sobre o tomador de, nos termos do artigo 4º, nº 1, do DL nº 176/95 (ora artigo 78º, nº 1, do DL nº 72/2008), informar “os segurados sobre as coberturas e exclusões contratadas, as obrigações e direitos em caso de sinistro e as alterações posteriores que ocorram neste âmbito, em conformidade com um espécimen elaborado pela seguradora”, tem uma eficácia confinada às relações dele com a seguradora, não valendo como uma transferência para o tomador da obrigação de informação para com o segurado, que a desresponsabilize perante este, impedindo-o de lhe opor a exclusão da cláusula não informada V - A parte da cláusula que, figurando nas condições especiais do seguro, faz depender a verificação do estado de invalidez absoluta e definitiva, em consequência de doença, não só da incapacidade definitiva de exercer qualquer profissão, mas também da necessidade de recorrer, de modo contínuo, à assistência de uma terceira pessoa para efectuar os actos normais da vida diária, pelo seu carácter anómalo, atento o tipo de contrato e os interesses que lhe subjazem, bem como o figurar em local pouco explícito do mesmo, surge num contexto em que qualquer mutuário só dificilmente se aperceberia das suas virtualidades descaracterizadoras, pelo que deve ser considerada uma cláusula-supresa, a excluir do contrato, conforme à previsão da alínea c) do artigo 8º do DL nº 446/85.

VI - A alusão desta alínea c) ao “contexto em que surjam” abarca circunstâncias de toda a ordem (que não só as referentes à conformação e aparência externa das cláusulas) que passem despercebidas a um contratante normal, colocado na posição do contratante real, nomeadamente as atinentes ao sentido da cláusula, ao conteúdo do contrato e aos condicionalismos que rodearam a adesão ao mesmo.

Acordam em conferência no Tribunal da Relação do Porto I RELATÓRIOB… intentou contra C…, SA, e D… – Companhia de Seguros, SA, acção declarativa comum de condenação, sob a forma ordinária, pedindo que: - seja reconhecida pelas rés a validade do acordo (contrato de adesão) estabelecido com o autor aquando da formalização do contrato de mútuo, bem como a reconhecerem a invalidez do autor com efeitos desde Maio de 2006; - sejam as rés condenadas a indemnizar o autor, nos termos contratuais, nomeadamente entregando à instituição de crédito beneficiária do seguro o capital em dívida, na quantia de 53.683,03 euros; - sejam as rés condenadas, solidariamente, a reembolsarem o autor das importâncias que entretanto lhe foram (e venham a ser) debitadas, ao mesmo título, na respectiva conta bancária, com efeitos a partir de Maio de 2006; - sejam as rés condenadas, solidariamente, a pagar ao autor os juros moratórios calculados (a liquidar em execução de sentença), à taxa legal, sobre as prestações entretanto debitadas e acima referidas (a partir de Maio de 2006), e contados até efectivo pagamento.

Fundamentou o seu pedido, em síntese, no faço de ter, conjuntamente com sua mulher, contraído um empréstimo perante a 1ª ré, para aquisição de um prédio, com hipoteca deste, e, na mesma altura, como condição necessária à aprovação do referido mútuo, autor e mulher terem subscrito um seguro de vida (ramo Vida Grupo), com capital seguro igual ao do empréstimo, sendo o autor e a mulher os seus beneficiários, de modo a garantir, em caso de morte ou invalidez (total ou permanente por doença ou acidente) dos mutuários, a liquidação do montante em dívida, do capital e dos juros vencidos. Este seguro foi-lhes apresentado pela 1ª ré como uma proposta de adesão daqueles a uma apólice de seguro de vida de grupo. Tendo o autor sido afectado por doença que o incapacitou total e definitivamente para o trabalho, viu todavia recusada pelas rés o accionamento do dito contrato, entendendo que, por força de cláusula do mesmo, para a verificação da situação de invalidez seria necessário que a pessoa segurada necessitasse de recorrer de modo contínuo à assistência de uma 3ª pessoa, por forma a realizar os actos normais da vida diária.

Regularmente citadas, apresentaram-se as rés a contestar. A ré D… impugnou parte dos factos, aceitando todavia o contrato e os seus precisos termos, cujo conteúdo teria sido oportunamente comunicado e explicado ao autor. Recusou a pretensão do autor, que segundo ela não está em condições de beneficiar do seguro. A ré C…, impugnando também parte dos factos, declinou qualquer responsabilidade na satisfação do pedido do autor.

Proferido despacho saneador, no qual se afirmou a validade e a regularidade da instância, e instruído o processo, realizou-se a audiência de discussão e julgamento.

Foi proferida sentença, que julgou a acção parcialmente procedente, reconhecendo a validade e eficácia do contrato de seguro do ramo vida titulado pela apólice nº ………., estabelecido com o autor (e mulher) aquando da formalização do contrato de mútuo a que se reportam os pontos 1º a 3º dos factos provados, e, no mais, absolvendo as rés do pedido, com custas a cargo do autor.

Inconformado, veio este interpor recurso, o qual foi admitido como sendo de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo. Juntou as respectivas alegações.

A ré D… contra-alegou.

Foram colhidos os vistos legais.

II FUNDAMENTAÇÃO1.FACTOS 1. Por escritura notarial de mútuo com hipoteca, outorgada em 29 de Julho de 1998, o autor e a mulher (E…) confessaram-se devedores do então “F…”, hoje “C…”, da quantia global de 13.500.000$00 (€67.337,72), tendo tal quantia sido creditada na conta do autor e da mulher junto da 1ª ré, na agência do “F…” …, no Porto, com o nº ………….., pelo produto do valor mutuado.

  1. O empréstimo concedido pela 1ª ré ao autor e à mulher destinou-se à aquisição de habitação própria e permanente, pelo montante de 10.900.000$00, hoje €54.500,00, bem como à realização de obras de beneficiação no imóvel adquirido, no valor de 2.600.000$00, hoje €13.000,00, tendo o referido mútuo sido efectuado pelo prazo de 30 (trinta) anos, a liquidar em 360 (trezentas e sessenta) prestações mensais, iguais e sucessivas (al. B) da matéria assente).

  2. Para garantia do pagamento da quantia mutuada, dos juros e das despesas que a 1ª ré houvesse de fazer, o autor e a mulher constituíram uma hipoteca voluntária sobre o imóvel objecto do referido financiamento (al. C) da matéria assente).

  3. Como condição necessária à aprovação do referido mútuo, o autor e a mulher subscreveram um “seguro de vida” (Ramo – Vida Grupo), com capital seguro igual ao do empréstimo, sendo o autor e a mulher seus beneficiários, de modo a garantir, em caso de morte e invalidez (total ou permanente por doença ou acidente) dos mutuários, a liquidação do montante em dívida, do capital e dos juros vencidos.

  4. Esse “seguro de vida” foi apresentado pela 1ª ré ao autor e à mulher e foi contratado com a aqui 2ª ré, subscrevendo os autores o contrato a que foi atribuído o nº ………..

  5. Em 19 de Maio de 2009 constava como capital de garantia (capital seguro) o valor de €54.133,50.

  6. A subscrição do dito “contrato de seguro” ocorreu nas instalações da 1ª ré.

  7. De acordo com as condições gerais e especiais da apólice nº 5.000.500, ficaram cobertos os seguintes riscos: - falecimento da pessoa segura; - invalidez absoluta e definitiva por doença da pessoa segura; - invalidez total e permanente por acidente da pessoa segura.

  8. De acordo com as condições especiais da apólice, por doença entende-se o seguinte: “entende-se por doença toda a alteração involuntária do estado de saúde da pessoa segura, não causada por acidente e susceptível de constatação médica objectiva”.

  9. Também de acordo com as condições especiais da apólice, por invalidez absoluta e definitiva por doença entende-se “a pessoa segura é considerada em estado de invalidez absoluta e definitiva quando, em consequência de doença susceptível de constatação médica objectiva, fique total ou definitivamente incapacitada de exercer qualquer profissão e necessite de recorrer, de modo contínuo, à assistência de uma terceira pessoa para efectuar os actos normais da vida diária”.

  10. De acordo com as condições especiais da apólice …......, para que se considere que existe uma situação de invalidez absoluta e definitiva da pessoa segura, por doença, é necessário que se verifiquem cumulativamente aquelas três situações referidas no ponto precedente.

  11. Ainda segundo as condições particulares da apólice, o beneficiário do seguro é o...

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