Acórdão nº 414/09.0PAMAI.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 12 de Fevereiro de 2014

Magistrado ResponsávelMARIA DO CARMO SILVA DIAS
Data da Resolução12 de Fevereiro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

(proc. n º 414/09.0PAMAI.P1)*Acordam, em conferência, os Juízes do Tribunal da Relação do Porto:*I- RELATÓRIO No 2º Juízo do Tribunal Judicial da Maia, nos autos de processo comum (Tribunal Singular) nº 414/09.0PAMAI, foi proferida sentença, em 21.6.2013 (fls. 943 a 963 do 4º volume), constando do dispositivo o seguinte: Em face do exposto, e sem outras considerações, julgo a acusação pública deduzida procedente e, em consequência: - condeno o arguido B… na pena de 220 dias de multa, pela prática, em co-autoria, de um crime de ofensas à integridade física simples, p.p. no art. 143.º, n.º 1 do CP, à taxa diária de € 6,00, num total de € 1320,00 (mil trezentos e vinte euros).

- condeno o arguido C… na pena de 180 dias de multa, pela prática, em co-autoria, de um crime de ofensas à integridade física simples, p.p. no art. 143.º, n.º 1 do CP, à taxa diária de € 5,00, num total de € 900,00 (novecentos euros).

  1. julgo parcialmente procedente, o pedido de indemnização civil deduzido pelo assistente D… e, em consequência, condeno os arguidos a pagarem ao assistente a quantia de 2.000,00€ (dois mil euros) a titulo de danos não patrimoniais.

  2. condeno os arguidos nas custas criminais e demais encargos do processo, fixando a taxa de justiça, para cada um deles, em 3 UC (cf. art. 513.º e 514.º do CP); D) condeno os arguidos e o assistente nas custas do pedido de indemnização civil deduzido por este, na proporção do respectivo decaimento (cf. art. 523.º do CPP e 446.º do CPC); Após trânsito, remeta boletins.

    (…)*Não se conformando com a sentença, os arguidos C… e B… recorreram conjuntamente (fls. 972 a 1025 do 5º volume, estando o original a fls. 1029 a 1082), apresentando as seguintes conclusões: 1 -Na Audiência de 13/06/2013, aquando da designada leitura de Sentença, o Tribunal a quo por Despacho de alteração não substancial da matéria de facto constante de acta, considerou que «…Da prova produzida em audiência de julgamento resultou provado, para além do mais, que a conduta praticada pelos arguidos ocorreu nos seguintes moldes: No dia 27.04.2009, cerca das 00h30m, nas Festas …, em …, Maia, o arguido B… agrediu o assistente D… na face e na cabeça com um suporte metálico para copos e com um ferro de um guarda sol e o arguido C… desferiu-lhe murros por todo o corpo».

    2 – Ora, tal comunicação violou o disposto no artigo 358.º do CPP que estabelece «Se, no decurso da audiência, se verificar uma alteração não substancial dos factos descritos na acusação (…) com relevo para a decisão da causa, o presidente, oficiosamente ou a requerimento, comunica tal alteração ao arguido e concede-lhe, se ele o requerer, o tempo estritamente necessário para a preparação da defesa».

    3- Isto porque, o Tribunal a quo, mas tomou uma posição definitiva sobre os factos que introduziu no processo, considerando-os provados, antes de garantir aos arguidos o exercício da sua defesa e menosprezando qualquer possível defesa.

    4- E, apesar de ter concedido aos arguidos cinco dias para preparação da sua defesa, esta revelava-se absolutamente inútil, porquanto o Tribunal acabava de considerar provados os factos a cuja comunicação procedia, violando, assim, as garantias de defesa dos arguidos e o princípio constitucional da presunção de inocência destes.

    5- Em consequência da violação do disposto no artigo 358.º do CPP, na Sentença, o Tribunal condenou os arguidos por factos diversos dos constantes da acusação pelo que, a Douta sentença é nula, nos termos do disposto no artigo 379.º nº 1 alínea b) do CPP.

    6- Acresce que é inconstitucional a interpretação feita pelo Tribunal do artigo 358.º do CPP no sentido de que na comunicação ali prevista, pode o Tribunal considerar já provados os factos a alterar, por violação do disposto no artigo 32.º da CRP.

    SEM PRESCINDIR 7- O Tribunal a quo errou, também, na apreciação crítica que fez da prova produzida e que motivou a Decisão de provada relativa à matéria de facto constante dos Pontos, 1), 3), 5) e 13) da Sentença e de não provada da matéria constantes das alíneas E), F), G, H), I), J), K), L), N) e 0) da mesma Sentença, decisão com a qual os ora Recorrentes não concordam.

    8- Na verdade, e, desde logo, o Tribunal a quo, fundamentando-se no relatório pericial e nos registos clínicos do assistente que atestam a existências das lesões deste dadas como provadas, não relevou como devia, o facto de nos registos clínicos do assistente, de fls 60 e 61 constar também que o mesmo se mostrava «agressivo e alterado», aquando do seu atendimento no hospital.

    9- Quanto ao depoimento das testemunhas E… e F… – que não foram as únicas a presenciar os factos - pois também as testemunhas da defesa, G… e H…, os presenciaram - entendeu o Tribunal que são globalmente unânimes com o depoimento do assistente quanto à autoria dos factos, embora não uníssonas quanto aos concretos pormenores do modus operandi das agressões, o que no entender do Tribunal, «talvez tenha justificado a forma genérica como os factos se encontram retratados na acusação pública e que motivou o despacho dado em acta de 13.06».

    10 -Todavia, os depoimentos do assistente e das testemunhas E… e F… não se limitam a não ser uníssonas quanto ao modus operandi das agressões, pois, são mesmo dissonantes quanto à forma como os acontecimentos decorreram e acabaram.

    11- É que, no confronto entre os depoimentos, constata-se que a Testemunha E… - no depoimento prestado na audiência de 30/05/2013 e gravado desde o nº 00:00:01 até ao nº 00:30:26, com início às 11.53:43 e fim ás 12:24:10, disponível na aplicação informática em uso no Tribunal - descreve os acontecimentos, dizendo que o assistente pediu um prego e se prontificou a pagar mostrando uma nota de cinco euros e que foi imediatamente agredido pelo arguido B…, conforme a passagem entre os minutos 04:41 e 05:07, e ao minuto 5:25 12- Já a testemunha F…, no depoimento prestado na audiência de 31/05/2013 e gravado desde o nº 00:00:01 até ao nº 00:25:33, com início ás 12:25:35 e fim às 12:51:11 conforme respectiva acta, diz que o assistente deu uma pancada no balcão e perguntou se o prego vinha ou não vinha, atitude que originou ser imediatamente agredido pelo arguido B…, apesar de, no decorrer do seu depoimento acabar, por dizer que, afinal, não viu estes factos porque estava de costas, conforme respectivamente, as passagens entre os minutos 04:01 a 04:04, 06:03 a 06:21.

    13- Acresce que quanto ao decorrer dos acontecimentos, a testemunha E…, no seu depoimento já referido, descreve que quem chegou primeiro junto do assistente D…, foi o arguido B… que agrediu aquele com um ferro, e a seguir o arguido C…, que lhe desferiu murros e pontapés, conforme passagem entre os minutos 09:45 a 9:55, sendo que a testemunha F… refere que foi o arguido C… quem chegou primeiro junto do assistente e lhe desferiu murros e só depois, o arguido B…, que lhe deu com um ferro, conforme passagem entre os minutos 06:16 a 06:41.

    14- Por fim, a testemunha E…, no seu depoimento, nega a existência de quaisquer distúrbios após os factos relatados, conforme passagem entre os minutos 29:07 e 29:12 e a testemunha F…, descreve uma revolta dos populares originadas por um comentário alegadamente feito pela mulher do arguido C…, conforme passagem entre os minutos 20:05 e 20:16, pelo que, resulta da análise efectuada, que os depoimentos destas testemunhas não são de forma alguma «unânimes mas não totalmente uníssonos» - como entendeu o Tribunal - mas apresentam discrepâncias não menosprezáveis para a respectiva valorização.

    15-Acresce que, é inverosímil e contrária às regras da experiência e até da lógica, que um cliente se dirija a um estabelecimento, faça uma encomenda de um produto, se prontifique a pagar, exiba o dinheiro ou que um cliente pergunte se o prego que encomendou, vem ou não vem e seja imediatamente agredido, continuando essas agressões no exterior do estabelecimento.

    16- Mais acresce à total falta de lógica e de razoabilidade da versão dos acontecimentos relatados, o facto de estas testemunhas, tal como o assistente, negarem a existência de anteriores disputas, zangas ou desentendimentos entre o assistente e os arguidos, facto que à luz da experiência comum, torna as versões apresentadas ainda mais inverosímeis.

    17- Entendeu, ainda, o Tribunal que o assistente não poderia ter encetado a total destruição do estabelecimento dos arguidos, porque se mostrava prostrado após os acontecimentos de acordo com o depoimento das testemunhas I… e o agente da PSP, J…, sendo que, em rigor ao que, aliás, resulta alegado na contestação e foi referido quer pelos arguidos, quer pelas testemunhas, nunca ao assistente foi imputada a total destruição do estabelecimento.

    18-Acresce que, contraria as regras da lógica e a própria prova constante dos autos, a conclusão do Tribunal de que, se no final dos distúrbios, aquando da chegada da PSP, o assistente estava prostrado, então não podia ter efectuado ou participado no arremesso de objectos contra o estabelecimento, pois, como se constata da ficha clínica de fls 60 e 61, o estado de prostração do assistente rapidamente se transformou – novamente, diríamos nós – no estado «agressivo e alterado» com que o mesmo foi descrito à chegada ao hospital.

    19- Argumenta o Tribunal a quo que a especificação de um facto pelos arguidos em sede de declarações em audiência, não concretamente descrito na contestação, revela a desresponsabilização dos mesmos, pelos actos cometidos, entendendo também que «Aliás, é manifesto que os arguidos sentiram necessidade de explicar a lesão do olho do arguido que impressiona o homem comum, engendrando a historia da queda sobre os rodados pois que na descrição factual que se fez na contestação, não existia qualquer acto do arguido que despoletasse tal lesão…» 20- Ou seja, entende o Tribunal que não tendo os arguidos em sede de contestação concretizado uma das várias quedas do assistente - designadamente, uma queda sobre rodados da roulotte – e tendo esse facto sido concretamente descrito...

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