Acórdão nº 937/13.7TTLSB.L1-4 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 12 de Fevereiro de 2014

Magistrado ResponsávelJERÓNIMO FREITAS
Data da Resolução12 de Fevereiro de 2014
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:

ACORDAM NA SECÇÃO SOCIAL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA I.RELATÓRIO I.1 No Tribunal do Trabalho de Lisboa, AA instaurou acção emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, contra BB, SA, pedindo, de acordo com o disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 233.º do C.I.R.E., que lhe sejam liquidados pela R.: a) Os valores não reconhecidos pela Exma. Administradora de Insolvência no valor de € 10.618,46 (dez mil seiscentos e dezoito euro e quarenta e seis cêntimos) b) O valor correspondente a 60% do montante do crédito reconhecido, e não contemplado no Plano de Insolvência, ou seja, € 6.310,80 (seis mil trezentos e dez euro e oitenta cêntimos).

Para sustentar os pedidos alega, no essencial, o seguinte: - Foi admitido como trabalhador da Ré em 1 de Julho de 2001, exercendo funções correspondentes à categoria profissional de Cozinheiro 2.ª.

- O referido contrato foi revogado pela Ré a 31 de Julho de 2011, em razão da situação de insolvência em que a Ré se encontrava, a qual foi declarada em 5 de Julho de 2011, por sentença judicial, transitada em julgado, proferida no Proc. n.º .../11.8TYLSB, a correr termos no 1.º Juízo do Tribunal do Comércio de Lisboa.

-O A., em 2 de Agosto de 2011, procedeu à respectiva reclamação de créditos, no montante de € 21 136,46.

- Em 2 de Dezembro de 2011, o A. recepcionou Sr.ª Administradora de Insolvência uma notificação, informando-o que do crédito reclamado não lhe era reconhecido o valor de € 10.618,46, pelo facto das importâncias recebidas a título de ajudas de custo não serem consideradas retribuição.

- Discordando, o A., nos termos do artigo 130.º do C.I.R.E. impugnou a lista de credores reconhecidos, através de requerimento dirigido ao processo, em 14 de Dezembro de 2011, fundamentando que o crédito reclamado deveria ser reconhecido na sua totalidade, pois as referidas ajudas de custo eram falsas ajudas de custo e portanto integradoras do seu vencimento.

- Em 12 de Janeiro de 2012 foi o A. notificado não só do dia designado para a realização da Assembleia de Credores, com vista à discussão e aprovação do Plano de Insolvência, mas também do Plano de Insolvência elaborado pela Sr.ª Administradora de Insolvência.

- O qual veio a ser aprovado com os votos da maioria, sendo que do mesmo resultou que dos créditos reconhecidos, no montante de € 10.518,00, o A. apenas receberia o valor equivalente a 40% (quarenta por cento), isto é, € 4.207,20, a ser paga em três prestações.

- O A. ficou a aguardar que o Tribunal do Comércio se pronunciasse acerca da impugnação à lista de credores reconhecidos, inclusive tendo siso solicitada urgência na apreciação, através de requerimento datado de 24 de Outubro de 2012.

- Em 20 de Novembro de 2012, o A. é notificado do Despacho de Encerramento do Processo de Insolvência, no qual se encontra plasmado que, nos termos da al. c) do n.º 1 do artigo 233.º do C.I.R.E., os credores da massa insolvente podem reclamar da devedora, os seus direitos não satisfeitos.

- Ainda assim ficou o A. a aguardar pela pronuncia da impugnação que deduzira.

- Até que, por Despacho datado de 28 de Janeiro de 2013, o A. toma conhecimento que o Tribunal havia declarado extinta aquela instância processual, sem que tenha tomado qualquer decisão relativa ao créditos não reconhecidos que havia impugnado.

-Nestes termos e de acordo com o disposto na alínea c) do n.º 1 do artigo 233.º do C.I.R.E., reclama o A. que sejam liquidados pela R. os montantes acima enunciados.

Citada a R, procedeu-se à realização de audiência de partes, mas sem que se tenha logrado obter o acordo.

A R. veio contestar, deduzindo defesa por excepção e defesa por impugnação.

Em sede de defesa por excepção começou por arguir a excepção de caso julgado, alegando, no essencial, o seguinte: - Os créditos peticionados pelo A. foram apreciados na ação referida, a qual já se encontra extinta.

- Apenas se mantiveram os créditos reconhecidos, nos termos do plano de insolvência.

- Tendo em conta que o processo de insolvência é um processo de execução universal, todos aqueles que detenham créditos sobre a pessoa insolvente apenas podem exercer os respetivos direitos no âmbito do processo de insolvência e apenas durante a pendência do mesmo, nunca depois.

- O A. também não recorreu das decisões em causa, o que não pode ser imputado a terceiros.

- Verifica-se que os sujeitos, o pedido e a causa de pedir são exatamente os mesmos tanto na presente ação, como no incidente de impugnação da lista de credores daquele processo de insolvência.

- Assim sendo, verifica-se a exceção de caso julgado, a qual implica a absolvição da instância, nos termos do disposto nos artigos 497.º, 498.º e 493.º, n.º 2 do CPC.

Ainda em sede de defesa por excepção, arguiu o seguinte: - a incompetência absoluta do Tribunal, na consideração de que, declarada a insolvência, a reclamação de créditos apenas pode ser conhecida no âmbito da insolvência e pelo tribunal que a declarou.

- a extinção dos créditos reclamados, por não terem sido reconhecidos no processo de insolvência, defendendo que em consequência não são atendíveis.

- a prescrição dos créditos reclamados, por ter decorrido mais de um ano entre a cessação do contrato de trabalho e a sua citação para a presente acção.

Por último, impugnou os factos alegados pelo A. para justificar a pretendida integração na retribuição dos valores que recebeu sob a designação de ajudas de custo.

O A respondeu à defesa por excepção.

I.2 Atingida a fase de saneamento, o Tribunal a quo procedeu à apreciação da excepção de caso julgado, proferindo decisão, onde consta, no que tange à fundamentação e dispositivo, o seguinte: -«(..) Com interesse para a decisão da excepção deduzida, mostra-se assente: 1. Por sentença transitada em julgado, proferida no 1.º Juízo do Tribunal do Comércio de Lisboa (proc. .../11.8TYLSB), foi a R declarada insolvente; 2. O aqui A reclamou naquele processo de insolvência os mesmos créditos que constituem o pedido desta acção; 3. Apenas parte do seu crédito foi ali reconhecido, tendo o A impugnado a correspondente lista de credores.

O caso julgado é uma excepção dilatória (artigo 494º, al. i), do CPC), que obsta a que o tribunal conheça do mérito da causa e dá lugar à absolvição da instância – artigo 493.º, n.º 2, do Código de Processo Civil.

A excepção de caso julgado tem por fim evitar que o tribunal seja colocado na alternativa de contradizer ou de reproduzir uma decisão anterior (artigo 497.º, n.º 3, do Código de Processo Civil).

O caso julgado caracteriza-se essencialmente pela não susceptibilidade de impugnação de uma decisão em razão do seu trânsito em julgado, que decorre, por seu turno, da não susceptibilidade de interposição de recurso ordinário ou de reclamação (artigo 677.º do Código de Processo Civil).

Assim, a noção de caso julgado decorre do conceito de trânsito em julgado que ocorre quando a decisão em causa já não seja susceptível de recurso ou de formulação de reclamação.

Com efeito, a autoridade do caso julgado exige que o seu conteúdo não seja colocado futuramente de modo relevante em situação de incerteza, pelas mesmas partes, no mesmo processo ou em processos diferentes.

A eficácia do caso julgado, na sua função negativa, impede que em posterior acção se volte a suscitar, no todo ou em parte, a questão decidida, o que se traduz na excepção do caso julgado.

Assim, a excepção dilatória do caso julgado pressupõe a repetição de uma causa depois de a primeira ter sido decidida por sentença que não admita recurso ordinário – artigos 493.º, n.º 2, 494.º, al. i) e 497.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil.

Repete-se a causa quando se propõe uma acção idêntica a outra quanto aos sujeitos, ao pedido e à causa de pedir (artigo 498º, n.º 1, do CPC).

Resulta, pois, do exposto que a infracção do caso julgado material depende de uma decisão contrariar uma outra que lhe seja anterior, transitada em julgado, proferida entre as mesmas partes, sobre o mesmo objecto, baseada na mesma causa de pedir (artigos 497.º, 498.º, 671.º e 672.º, todos do Código de Processo Civil...

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