Acórdão nº 657/11.7GAVNF.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 29 de Maio de 2013

Magistrado ResponsávelFRANCISCO MARCOLINO
Data da Resolução29 de Maio de 2013
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Recurso 657/11.7GAVNF * Acordam no Tribunal da Relação do Porto Nos autos de processo abreviado supra identificado, tramitado no 1º Juízo Criminal de Vila Nova de Famalicão, mediante acusação do MP veio a ser julgado o arguido B…..

, nascido em 13/08/1976, filho de C….. e de D….., residente na …. n.º …, …., Vila Nova de Famalicão, pela prática, em autoria material, de um crime de condução de veículo em estado de embriaguez, previsto e punido pelos art.ºs 292.º e 69.º, n.º1, alínea a), do C. Penal.

A final, na procedência da acusação, foi condenado na pena de sete meses de prisão, substituída por prisão em dias livres, fixada em 42 (quarenta e dois) períodos de 40 (quarenta) horas cada um; e ainda na pena acessória de inibição de conduzir quaisquer veículos com motor pelo período de sete meses.

Não conformado, o arguido interpôs recurso da sentença condenatória e, da respetiva motivação, extraiu as seguintes conclusões: 1. A douta sentença recorrida padece de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada (art.º 410º, n.º 2, al. a) do C. P. P.), por não esclarecer se o arguido foi submetido a exame de pesquisa de álcool no ar expirado, se era possível ou impossível a realização de tal exame, se era possível ou impossível o consentimento expresso do arguido na colheita de amostra de sangue e se ocorreu ou não um consentimento tácito na colheita da amostra de sangue.

  1. Verifica-se, assim o vício previsto na alínea a), do n.º 2 do artigo 410.º do C.P.P., pois, a factualidade dada como provada na sentença é insuficiente para fundamentar a solução de direito e, esse vício, verifica-se também quando o tribunal deixou de investigar toda a matéria de facto com interesse para a decisão final.

  2. Vício esse que também se verifica na douta sentença recorrida quando na matéria de facto provada apenas consta [(alíneas e) e f)] que o arguido está ausente em parte incerta, no estrangeiro e que não declara auferir quaisquer rendimentos. Ora, o tribunal deixou de investigar as condições pessoais do arguido, o que se traduz também em insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, integradora do mencionado vício da alínea a) do artigo 410.º, n.º 2, do C.P.P.

  3. Com efeito, prova essencial à boa decisão da causa, no caso de condenação e aplicação de pena, conforme resulta expressamente da própria lei (artigos 369º e ss. do C.P.P.), é a relativa aos antecedentes criminais do arguido, à sua personalidade e às suas condições pessoais. A lei prevê até a possibilidade de produção suplementar de prova, tendo em vista a determinação da espécie e da medida da sanção a aplicar, para o que, sendo necessário, poderá ser reaberta a audiência (artigo 371.º do C.P.P). E, se é certo que o julgamento decorreu sem que o arguido-recorrente estivesse presente, circunstância que pode ter dificultado o apuramento da factualidade atinente às suas condições pessoais e situação económica.

  4. Resulta dos princípios da investigação e da verdade material que ao tribunal cumpre investigar, independentemente da acusação e da defesa, com os limites previstos na lei, os factos sujeitos a julgamento, de forma a criar as bases necessárias para a decisão. O tribunal tem o poder-dever de, oficiosamente, socorrer-se do disposto no artigo 340º do C.P.P., para investigar os factos sujeitos a julgamento, procedendo, autonomamente, às diligências que, numa perspectiva objectiva, possam ser razoavelmente consideradas necessárias, de modo a se habilitar a proferir uma decisão justa, não lhe sendo consentido remeter-se a uma atitude passiva e meramente dependente da iniciativa probatória dos sujeitos processuais.

  5. Ora, o tribunal a quo não procedeu a qualquer diligência para suprir o seu défice de conhecimento, sendo certo que dependeu de sua decisão entender que não carecia da presença do arguido. E, apesar de não se tratar de exigir o impossível ou de impor que a sentença, sob pena de incorrer num vício de insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, tenha de conter todos os elementos que, idealmente, deveriam ser considerados na sempre árdua tarefa de determinação da pena. No caso vertente, todavia, ficou-se aquém do mínimo razoavelmente exigível, carecendo a sentença recorrida de elementos que habilitassem o tribunal a quo a, conscienciosamente, levar a bom termo o procedimento de determinação individualizada da pena, dentro dos parâmetros legais, seja quanto à pena principal, seja quanto à pena acessória - pois para ambas, e não apenas para fixação da razão diária da multa, releva o conhecimento de quem é, afinal, o arguido: quais as suas condições pessoais (o que faz, situação familiar, etc.) e a sua situação económica.

  6. Face à factualidade dada como provada em juízo e ao Direito aplicável, às actuais circunstâncias sócio profissionais do arguido, descritas na motivação, entende-se que a pena aplicada deveria ter sido suspensa. Pois, a pena de 7 (sete) meses de prisão, substituída por prisão em dias livres, fixada em 42 (quarenta e dois) de 40 (quarenta) horas cada. Mesmo tratando-se de uma pena de substituição, é manifestamente exagerada.

  7. O Tribunal a quo apreciou aquela possibilidade de suspender a execução da pena de prisão com base apenas nos antecedentes criminais do arguido que se reconduzem à prática de crimes sancionados com penas de multa e penas de prisão suspensas na sua execução.

  8. Ora, numa análise lógica do funcionamento do sistema jurídico-penal e das finalidades das penas, não faz sentido que o Tribunal aplique pena curta de prisão, mesmo tratando-se como se trata de uma pena de prisão por dias livres. Seria negar, de todo, o princípio da finalidade das penas, na sua vertente de reintegração do agente, como dispõe o artigo 40º, n.º l, do Código Penal. É, pois, manifestamente exagerada a aplicação ao arguido de uma pena privativa da liberdade com a duração de sete meses, mesmo substituída por prisão em dias livres, fixada em 42 (quarenta e dois) de 40 (quarenta) horas cada um e na sanção acessória de inibição de conduzir quaisquer veículos com motor pelo período de sete meses, atento, desde logo, o actual enquadramento sócio profissional do arguido recorrente, sendo nítida a violação do disposto no artigo 71.º, n.º l, do C. P. pelo menos, em termos de culpa, extraída dos elementos de prova referidos na sentença recorrida.

  9. Acresce, por um lado, que o afastamento absoluto do arguido do seu actual meio social, do seu agregado familiar e da sua actividade profissional, pode determinar a degradação das suas ligações com os outros elementos da comunidade onde se insere, bem como do estatuto económico do seu agregado, com evidentes prejuízos para o processo de reintegração. Por outro lado, a rotulagem com o estigma de criminoso é mais forte, inibidora e premente em face da reclusão mesmo por dias livres, factor que propicia a assunção de comportamentos marginais por interiorização desse papel ou, até, por influência de outros reclusos, e, no caso, encontrando-se o arguido emigrado em França, onde reside com a família, cujo sustento é garantido apenas com o produto do seu trabalho, dado que sua mulher é doméstica não tendo profissão como resulta da certidão de nascimento da filha de ambos, supra referida, a sua reclusão iria destruturar a sua família, já que, trabalhando em território Francês tal seria incompatível com a execução da pena de 7 (sete) meses de prisão, substituída por prisão em dias livres, fixada em 42 (quarenta e dois) de 40 (quarenta) horas cada.

  10. Por tudo, entende-se que a matéria de facto provada permite concluir que as necessidades de prevenção especial consentem que a pena de sete meses de prisão seja substituída por uma forma de execução que possibilite ao arguido manter ligação à comunidade de origem, facilitando o processo de ressocialização e amortizando os efeitos negativos que podem advir da entrada no sistema penitenciário.

  11. Assim, em nome da justiça e da equidade, impõe-se a aplicação de uma pena suspensa na sua execução, sujeita eventualmente a regime de prova, a qual realizaria as exigências decorrentes do fim preventivo especial, ligadas à reinserção social do delinquente e exigências decorrentes do fim preventivo geral, ligadas à contenção da criminalidade e à defesa da sociedade. Sendo que a pena aplicada não realiza nenhum dos seus fins, na medida em que, reafirma-se, a pena, para além de...

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