Acórdão nº 1988/11.1TVLSB-B.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 08 de Novembro de 2012

Magistrado ResponsávelPEDRO MARTINS
Data da Resolução08 de Novembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo assinados: “A” (= arrestante) requereu, em 05/06/2011, um arresto de bens contra “B” – ..., Lda (= arrestada), com sede na Rua ..., n.º ..., R/C, Esquerdo, 0000-000 Lisboa, por ter um crédito contra a mesma (resultante de um mútuo que lhe fez em 19/05/2010).

Por decisão de 15/06/2011, transitada em julgado, foi decretado esse arresto.

Em 18/07/2011, a “C” – Sociedade ..., Unipessoal, Lda (= embargante), também com sede na Rua ..., n.º ..., R/C, Esquerdo, 0000-000 Lisboa (e que se identificou no cabeçalho sem a referência a Unipessoal) veio deduzir os presentes embargos contra esse arresto, alegando, no essencial, que tinha adquirido esses bens à arrestada nos anos de 2008, 2009 e 2010 (invoca para o efeito algumas facturas de compras não documentadas) e que nada devia ao arrestante.

O arrestante contestou, querendo que fosse desconsiderada a personalidade jurídica da embargante, alegando para o efeito que: esta é uma sociedade unipessoal por quotas, ou seja, tem um sócio único que é o detentor da totalidade do seu capital social; sócio esse que é a sociedade arrestada; pelo que a embargante integra o património da arrestada, que assim é a proprietária indirecta ou última de todos os bens da embargante; e a isto não deve obstar o facto de embargante ter uma personalidade jurídica diferente da arrestada: a embargante não tem independência económica da arrestada, ambas representam uma só unidade económica cujos desígnios são dirigidos, em última instância, pela arrestada (como também se vê do relatório sobre a análise económica/ financeira da arrestada, em que ela faz uma análise da sua situação financeira tendo em consideração todos os seus activos e os seus passivos, entre os quais se destacam aqueles relativos à embargante; e onde se propõe, como uma das opções, “vender a totalidade da participada por um valor mínimo de 1.750.000€ e com o produto da venda liquidar os passivos da sociedade e da sua participada […]”).

A diferença de personalidade jurídica entre a arrestada e a embargante é apenas uma forma pela qual se concretiza materialmente a organização de um só património sob uma só direcção, i.e, o património da arrestada (invoca aqui o ac. do TRL de 31/05/2011 - 7857/06.0TBCSC.L1-7, da base de dados do ITIJ, de onde são todos os acórdãos citados sem indicação de outra fonte).

De seguida foi proferida decisão julgando improcedentes os embargos (e determinando a restituição dos bens e direitos cujo arresto foi concretizado ao arrestante, na qualidade de depositário dos mesmos).

A embargante recorre desta decisão, concluindo, em síntese contida numa das 52 conclusões [a que, neste acórdão, se acrescenta um parênteses recto], que: “i) A decisão ínsita na sentença vai para além do pedido e do objecto dos embargos de terceiro [porque mantém o arresto de bens de terceiro e o que foi pedido foi o arresto de bens da arrestada…]; ii) A decisão não indica quais as normas jurídicas com base nas quais aplica o instituto da desconsideração da personalidade jurídica; e iii) Ainda que a aplicação de tal instituto fosse admissível, não existiu qualquer conduta ilícita pela ou através da embargante”.

O arrestante contra-alegou defendendo a improcedência do recurso.

A arrestada não foi notificada das alegações da embargante porque, segundo o requerimento feito por ela, os mandatários constituídos por ambas as sociedades no presente processo são os mesmos, pelo que, ainda que formalmente pudesse considerar-se exigível a realização de tal notificação, a mesma constituiria acto inútil (fls. 285).

* Questões que cumpre solucionar: se se verifica alguma das nuli-dades implicitamente invocadas pela embargante [falta de fundamentação de direito e condenação em objecto diverso do pedido, art. 668/1b) e e) do CPC]; e se o arresto devia ter sido levantado (por não se verificarem os pressupostos da desconsideração da personalidade jurídica).

* Foram dados como provados os seguintes factos, para além daqueles que já resultam do relatório que antecede: 3. Os bens e direitos objecto do arresto foram adquiridos pela embargante à arrestada, nos anos de 2008, 2009 e 2010, e, consequentemente, foram retirados do imobilizado da arrestada e contabilizados pela embargante no respectivo mapa de reintegrações e amortizações. 4. A embargante não é nem nunca foi devedora de qualquer quantia ao arrestante.

  1. A arrestada adquiriu a totalidade das quotas da embargante, aquisição essa registada em 06/12/2007.

  2. A transformação da embargante em sociedade unipessoal por quotas foi registada em 04/06/2010.

  3. Em assembleia-geral extraordinária de 21/05/2011, [da arrestada, presidida pelo sócio “D”], os sócios da arrestada, “E”, “D” (o qual tam-bém ali representava o sócio “F”) e “G” [depois de analisada em pormenor a situação económico-financeira da arrestada e da sua participada embargante, com base no relatório entregue e estando claras as decisões a tomar (e disto tratava o 1º ponto da ordem dos trabalhos)], deliberaram autorizar a gerência a) na venda da empre-sa e/ou dos activos detidos pela arrestada e pela sua participada embargante [pelo melhor preço possível e com o produto da venda liquidar os passivos da arrestada e da sua participada embargante, com primazia para os passivos de curto e médio / longo prazo (Le-tras/Livranças e Empréstimos bancários)] e b) em representação da arrestada, a votar todas as deliberações necessárias para a execução do ora delineado ao nível da embargante, bem como outorgar todos os contratos, acordos, etc., necessários para a execução das delibe-rações ora tomadas [e este era o 2º ponto da ordem dos trabalhos].

[acrescentou-se. neste acórdão, as partes entre parênteses rectos, para mais completa síntese da acta da referida AG] 9. Os gerentes da embargante e da arrestada são os mesmos “E” e “D”.

* A fundamentação da decisão recorrida é a seguinte [de forma condensada e na parte com imediato relevo para a decisão das questões a solucionar]: “A arrestada é titular da totalidade das quotas da embargante pelo que existe, por essa circunstância, uma relação de domínio total entre ambas as sociedades (cfr. art. 489.º/1, do Código das Sociedades Comerciais).

Embora se trate de sujeitos de direito distintos, a arrestada, ao adquirir a totalidade das quotas da embargante, adquiriu também o domínio ou controlo societário desta última e, por conseguinte, o poder de determinar a gestão daquela. Na verdade, e apesar de se tratarem de duas entidades juridicamente distintas, há um único centro de decisão: os sócios da arrestada.

Acresce que, embora a embargante, como ser jurídico distinto da sua sócia única – no caso a arrestada - seja a titular dos respectivos bens sociais, a aquisição da totalidade das quotas numa sociedade equivale a uma aquisição indirecta do património social dessa empresa (vd...

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