Acórdão nº 2286/08.3TBTVD.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 22 de Novembro de 2012
Magistrado Responsável | ANA DE AZEREDO COELHO |
Data da Resolução | 22 de Novembro de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
ACORDAM na 6ª secção do Tribunal da Relação de Lisboa: I) RELATÓRIO ANTÓNIO, com os sinais dos autos, instaurou acção declarativa de condenação contra JORGE, A... – ASISTENCIA SEGUROS Y REASEGUROS, SA, GABINETE PORTUGUÊS DA CARTA VERDE e V... ... PORTUGAL, pedindo a condenação dos Réus a pagarem-lhe indemnização por danos patrimoniais diversos decorrentes de acidente de viação.
Findos os articulados foi proferido despacho que julgou parte ilegítima a Ré A..., SA, a qual foi absolvida da instância.
O Autor desistiu da instância quanto à Ré V... ..., desistência que foi aceite e homologada.
Cumprido o demais legal procedeu-se a audiência de discussão e julgamento finda a qual foi proferida decisão de facto e, posteriormente, sentença que absolveu o Réu JORGE do pedido e condenou o Gabinete Português da Carta Verde a pagar ao Autor indemnização por danos sofridos, de entre as quais indemnização por danos não patrimoniais no montante de € 200.000,00.
Desta sentença interpôs recurso o Gabinete da Carta Verde apresentando as seguintes conclusões: «1- Nos presentes autos ficaram assentes os factos constantes das fls 4 a 15 da Douta Sentença (AA a CC), que se dão por reproduzidos.
2 – Tendo sido peticionado pelo A. Recorrido a quantia de € 250.000,00 a título de danos não patrimoniais foi fixada pela Douta Sentença a este título a quantia de € 200.000,00.
3 – Sendo que o presente Recurso respeita precisamente à verba fixada a este título.
4 – Face aos critérios legais e jurisprudenciais vigentes o referido valor é excessivo.
5 – Os danos não patrimoniais têm uma função compensatória, não reparatória : visam uma satisfação, mais que uma indemnização.
6 – A indemnização a título de danos não patrimoniais é fixada segundo critérios de equidade, nos termos dos art 494º e 496º do CC, atendendo aos padrões de indemnização geralmente adoptados pela Jurisprudência.
7 – Por um lado o valor fixado ao A. a título de danos não patrimoniais é muito, mas muito, superior ao fixado a esse mesmo título para casos de morte, sendo que o direito à vida é o bem supremo, abaixo dele se situando todos os outros.
8 – Fixar um montante por danos morais muito, mas muito superior ao atribuído pela perda da vida é excessivo, desproporcional e atentório do principio da igualdade.
9 – Por outro lado consultada a Jurisprudência verificamos que foi atribuído ao A. a título de danos não patrimoniais uma verba muito superior à praticada para sinistrados com o mesmo quadro clínico e muito mais jovens.
10 – Efectivamente o A. já tinha à data do acidente praticamente 60 anos (facto provado CC, fl 15), pelo que não pode ser compensado com valores muito superiores a sinistrados jovens com o mesmo quadro clínico.
11 – O A. encontra-se clinicamente estabilizado e necessita de apoio em algumas actividades da vida diária, não excedendo a necessidade de 8/horas por dia de apoio (facto provado AL, fl 11 da Sentença).
12 - Tendo relativa autonomia na sequência da adaptação da sua habitação e adaptação do seu veículo.
12 – E tem possibilidade de exercer actividade ou profissão remunerada que não implique deslocações (facto provado AV, fl 12).
13 – Por isso cremos que o valor fixado na Douta Sentença Recorrida a título de danos não patrimoniais (200.000,00 €) é excessivo e não respeita os critérios jurisprudenciais aplicáveis a casos semelhantes, sendo a indemnização superior à fixada para sinistrados com quadro clinico semelhante mas muito mais jovens.
14 – Em violação clara aos art 494º, 496º, 562º, 564º, 566º do CC e os princípios da equidade.
15- Tendo em conta a idade do A., os danos efectivamente sofridos, e decisões dos nossos Tribunais em situações semelhantes é justa e equitativa uma indemnização na ordem dos € 100.000,00, valores que têm vindo a ser fixados pelo S.T.J.
16- Sem perder a realidade económica e social do País , evitando rupturas com decisões precedentes para casos semelhantes , assegurando a previsibilidade e segurança do Direito.
17 – Evitando o subjectivismo e a existência de sentenças díspares para situações análogas.
18 – Não podemos ter a atribuição ao A. de um valor de indemnização por danos não patrimoniais muito superior ao fixado para situações semelhantes mas sinistrados muito mais jovens.
19 – Para assegurar a igualdade de tratamento e segurança jurídica.
20 – Aliás pela aplicação da actual Portaria 377/2008 de 26 de Maio, alterada pela Portaria 679/2009 de 25 de Junho, que estabeleceu critérios de indemnização objectivos e razoáveis para cálculo de valorização do dano corporal resulta uma indemnização de € 88.000,00.
21 – Devendo assim a indemnização fixada a este título ser reduzida de acordo com os critérios e valores usualmente adoptados pela Jurisprudência, sem esquecer o adiantamento por conta da indemnização já efectuado pela Seguradora de € 30.000,00 (facto provado CC).
Deve pois a sentença recorrida ser revogada na parte respeitante à indemnização decorrente de danos não patrimoniais e a mesma reduzida em conformidade com os parâmetros atrás definidos».
Foram apresentadas contra-alegações defendendo o bem fundado da decisão.
O recurso foi recebido como apelação, para subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo.
Corridos os vistos legais, cumpre apreciar e decidir.
II) OBJECTO DO RECURSO Tendo em atenção as conclusões da Recorrente e inexistindo questões de conhecimento oficioso - artigo 684.º, n.º 3, 685.º A, nº 1 e 3, com as excepções do artigo 660.º, n.º 2, in fine, ambos do CPC -, a única questão a decidir é a do montante da indemnização por danos não patrimoniais, sendo certo que o recorrente se refere ainda ao abatimento da quantia paga pela seguradora G... ....
III) FUNDAMENTAÇÃO 1.
FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO Não foi impugnada a decisão de facto, estando assentes nos autos os seguintes factos: A - No dia 5 de Maio de 2006, pelas 16:20 horas, o Réu Jorge conduzia a viatura ligeira de passageiros de marca OPEL, modelo Vectra, com a matrícula 0000 VM 00, na Auto-Estrada n.º 8, sentido Sul-Norte (art.º 1.º, admitido por acordo).
B - A via da Auto-Estrada n.º 8, no km 51, tem duas faixas de rodagem em cada sentido de marcha (art.º 2.º, admitido por acordo).
C - Ao chegar ao Km 51, o Réu Jorge iniciou uma ultrapassagem a um veículo pesado que circulava na faixa direita de rodagem, passando a circular na faixa da esquerda (art.º 3.º, admitido por acordo).
D - Na ocasião o Réu Jorge circulava a uma velocidade superior a 120 Km/hora (art.º 4.º, admitido por acordo).
E - Tanto à frente como atrás do Réu Jorge circulavam outros veículos, a mais de 120 Km/hora, pela faixa da esquerda, em ultrapassagem a veículos que circulavam mais lentamente na faixa da direita (art.º 5.º, admitido por acordo).
F - Após a ultrapassagem ao veículo pesado, o Réu Jorge guinou repentinamente para a faixa da direita (art.º 6.º, admitido por acordo).
G - Ao guinar para a faixa da direita, o Réu Jorge não abrandou a velocidade (art.º 7.º, admitido por acordo).
H - Ao guinar para a faixa da direita, o Réu Jorge não verificou se poderia fazê-lo sem perigo de embater noutros veículos que circulavam nessa faixa (art.º 8.º, admitido por acordo).
I - Na faixa direita de rodagem, um pouco mais à frente do veículo pesado ultrapassado pelo Réu Jorge, circulava o veículo ligeiro de passageiros de marca CITROEN, modelo AX, com a matrícula 00-00-DD, conduzido pelo Autor (art.º 9.º, admitido por acordo).
J - O Autor conduzia a uma velocidade aproximada de 100 Km/hora (art.º 10.º, admitido por acordo).
K - Assim que o Réu Jorge passou a circular na faixa da direita, deparou à sua frente com o veículo 00-00-DD (art.º 11.º, admitido por acordo).
L - Devido à diferença de velocidades dos dois veículos, o veículo conduzido pelo Réu Jorge aproximou-se rapidamente do veículo 00-00-DD (art.º 12.º, admitido por acordo).
M - O veículo conduzido pelo Réu Jorge embateu com muita força na traseira do veículo conduzido pelo Autor (art.º 13.º, admitido por acordo).
N - Devido à diferença de velocidades entre os dois veículos, o Réu Jorge não conseguiu evitar o embate (art.º 14.º, admitido por acordo).
O - O veículo conduzido pelo Autor tinha menor resistência ao embate que o conduzido pelo Réu Jorge (art.º 15.º, admitido por acordo).
P - Devido ao embate do veículo conduzido pelo Réu Jorge, o veículo conduzido pelo Autor deformou logo a sua parte traseira (art.º 16.º, admitido por acordo).
Q - Devido ao embate do veículo conduzido pelo Réu Jorge, o veículo conduzido pelo Autor despistou-se, indo bater na guarda lateral direita, vindo a imobilizar-se do lado esquerdo, a cerca de 200 metros do local do embate (art.ºs 17.º, 18.º e 19.º, admitidos por acordo).
R - O embate deveu-se exclusivamente ao facto do Réu Jorge mudar de faixa de rodagem na Auto-Estrada, de forma repentina, e sem antes se assegurar que o poderia fazer sem perigo de embater noutros veículos (art.º 20.º, admitido por acordo).
S- Por sentença proferida no âmbito do processo comum, com intervenção de tribunal singular, que correu termos no 1.º Juízo deste tribunal sob o n.º .../06.6GTTVD, datada de 21.05.2007, foram considerados provados, designadamente, os seguintes factos: “1. No dia 5 de Maio de 2006, cerca das 16H20, (…) Jorge conduzia a sua viatura ligeira de passageiros marca Opel, modelo Vectra, com a matrícula 0000 VM 00, na auto-estrada A8, sentido sul-norte; 2. Trata-se de uma auto-estrada que no local tem duas faixas de rodagem em cada sentido de marcha; 3. Ao chegar ao km 51, [Jorge] iniciou uma ultrapassagem a um veículo pesado que circulava na faixa direita de rodagem, pelo que passou a circular na faixa esquerda; 4. [Jorge] circulava a uma velocidade não concretamente apurada, mas superior a 120 KM/hora; 5. Tanto à frente como atrás de [Jorge] circulavam outros veículos, a mais de 120 kms hora, pela faixa esquerda, em ultrapassagem a veículos que circulavam mais lentamente do lado direito; 6. Após a ultrapassagem ao veículo pesado...
Para continuar a ler
PEÇA SUA AVALIAÇÃO