Acórdão nº 9613/09.4TBCSC.L1-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 05 de Julho de 2012

Magistrado ResponsávelJERÓNIMO FREITAS
Data da Resolução05 de Julho de 2012
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


I – RELATÓRIO I.1 No Tribunal de Tribunal de Família e Menores e de Comarca de Cascais, A , propôs acção declarativa de condenação, sob a forma de processo sumário, que veio a ser distribuída ao 4.º Juízo Cível, contra B ( ….SGPS, S.A) , C ,(… S.A) , D ( …S.A.) , E ( ….Aldeamentos Turísticos, S.A.) , F ( ….Restauração e Serviços, S.A. ) , G ( …SGPS, S.A.) , H ( …. Ténis, S.A.) , I ( … Hípico, S.A.) , J ( … Hotel, S.A.), L ( …, S.A.) , todas com sede na …. Cascais, pedindo a confirmação definitiva da decisão proferida em sede de providência cautelar comum, ordenando a retirada e cessação da exposição ao público do cartaz e a condenação das Rés a pagar à Autora a quantia de € 15.000,00, a título de indemnização por danos não patrimoniais.

Para tanto alegou, em resumo, que no mês de Setembro de 2009, foi colocado, em local visível junto à entrada da Quinta ..., um cartaz de grandes dimensões, em que se encontrava escrita a frase “Informa-se que se constituíram em incumpridores e devedores relapsos ao Grupo ….os abaixo nomeados:”, constando dele escrito o nome da Autora. Refere que a colocação do cartaz constituiu uma ofensa da honra e consideração devidas à Autora e aos seus direitos de personalidade, considerando o período superior a dois meses em que esteve exposto e ao número de pessoas por quem foi visto, o que lhe causou perturbação, grande desgosto e sentimento de revolta.

Termina dizendo que não é incumpridora nem devedora relapsa do Grupo …., e ainda que existisse uma dívida lícita e exigível, não seria lícito às Rés difamar a Autora da forma como o fizeram, razão pela qual peticiona a retirada definitiva do cartaz e o pagamento de uma indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos.

Contestando, vieram as Rés invocar em suma, a sua ilegitimidade e a ilegitimidade da Autora, acrescentando que o referido cartaz se encontra implantado dentro de propriedade privada, sendo visível apenas por quem entre na Quinta ... pelo portão norte, e não por quem circule fora da mesma.

Referem, ainda, que é falso que tenha sido perpetrada qualquer ofensa à honra e consideração da Autora, uma vez que esta é efectivamente devedora, de forma reiterada, das suas obrigações para com as sociedades da Quinta .... Tais obrigações resultam das escrituras públicas de servidão e de compra e venda da fracção cuja Autora é proprietária, e foram expressamente aceites por esta aquando da sua outorga.

Em sequência, deduz pedido reconvencional, no valor de € 22.360,59, pelo não pagamento de comparticipações, destinadas à manutenção dos arruamentos da Quinta ..., devidas em contrapartida da servidão, da qual o prédio da Autora beneficia, no valor mensal de metade do salário mínimo nacional mais elevado em vigor.

A A. respondeu, opondo-se à admissibilidade do pedido reconvencional e arguindo a excepção dilatória da ineptidão da reconvenção por falta ou ininteligibilidade do pedido e da causa de pedir.

Terminados os articulados foi proferido despacho saneador, no qual foi admitido o pedido reconvencional e julgadas improcedentes as excepções arguidas, quer pelas RR. quer pela A.

O tribunal a quo absteve-se de proceder à selecção da matéria de facto provada e à base instrutória, invocando ser manifesta a simplicidade da questão no plano dos factos, a tal não se tendo oposto as partes (art.º 265.º A, do CPC).

Procedeu-se à realização de audiência de discussão e julgamento, com a fixação dos factos que, face à prova produzida, resultaram provados.

Subsequentemente foi proferida sentença, decidindo julgar a acção e o pedido reconvencional procedentes e, consequentemente, condenando nos termos seguintes: a) “(..) as Rés …... a pagar à Autora A a quantia de € 4.000,00 (quatro mil euros), a título de indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos; b) Confirmo a decisão provisória proferida nos autos de providência cautelar comum n.º .../09.8TBCSC, do 3.º Juízo Cível desta Comarca, e condeno as Rés …... a retirar de forma definitiva o cartaz, sob pena de aplicação de uma sanção pecuniária compulsória, no montante de € 1.000,00 por cada dia de atraso no cumprimento; c) Condeno a Autora A a pagar à 3ª Ré. a quantia de € 8.109,86, relativa a facturas vencidas e não pagas, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4%, contados desde o vencimento das facturas até integral e efectivo pagamento.

  1. Condeno a Autora A a pagar à 3ª Ré …. a quantia de € 9.245,78, relativa a comparticipações devidas com prazo certo, não facturadas, incluindo o respectivo IVA, acrescida de juros de mora à taxa legal de 4%, contados desde o vencimento até integral e efectivo pagamento.

  2. Condeno, ainda, a Autora A no pagamento à 3ª Ré ….,das comparticipações devidas com prazo certo, não facturadas, vencidas na pendência da presente acção, incluindo o respectivo IVA, acrescidas de juros de mora à taxa legal de 4%, contados desde o vencimento até integral e efectivo pagamento, caso não sejam pagas na data do vencimento.

I.22 Inconformada com essa decisão as RR. vieram interpor recurso de apelação, na parte em que as condena no pagamento de indemnização à A. a título de danos não patrimoniais, o qual foi recebido com o efeito e modo de subida adequados. Com as alegações as recorrentes apresentaram as respectivas conclusões, delas constando o seguinte: I. Deveria ter-se dado como provado, pois, até porque constitui facto público e notório, do conhecimento comum, que: - o Estado tem, na internet, acessível a todos em qualquer parte do Mundo, uma lista de devedores à Fazenda Pública e à Segurança Social.

- nas mercearias, restaurantes e bares é usual afixar a lista de devedores; - nos prédios em regime de propriedade horizontal publicita-se à vista de todos a lista de condóminos incumpridores.

II.

Por não tê-lo feito, o Tribunal a quo violou as disposições conjugadas dos arts. 511º, 514º, 659º, nºs 2 e 3, do CPC, e dos arts. 341º, 349º e 351º do CC (estes últimos na parte em que o Tribunal, se não pelo art. 514º do CPC, poderia/deveria estabelecer a presunção de que assim é).

III.

Considera-se na sentença recorrida que o Senhor M.C. actuou e representou as sociedades, pelo simples facto de ser presidente do Conselho de Administração da sociedade B, logo, vinculando todas as sociedades.

  1. Não pode às RR. ser imputada uma actuação que não lhes pode ser assacada por não terem participado em qualquer decisão/deliberação, nem sequer terem a disposição do bem em causa.

  2. Nenhuma pessoa jurídica pode ser responsabilizada pelos actos de alguém que não a representa.

  3. Que não integra o seu Conselho de Administração – como é o caso de algumas das RR. -, nem sequer é detentor do seu capital social, como é o caso de todas as RR..

  4. Na sentença recorrida viola-se, pois, o disposto, designadamente, nos arts. 163º, 165º, 483º, 484º, 486º, 487º, todos do CC.

  5. A sentença recorrida contém, e bem, a condenação da A. no pedido reconvencional, assumindo-se, pois, que a A. é, desde há longos anos e se mantém, devedora de avultadas quantias à 3ª R., …..

  6. Ou seja, o teor do cartaz é verídico, no que à A. diz respeito.

  7. A existência de uma dívida decorrente da falta de pagamento das comparticipações a que se obrigou, é razão suficiente para se concluir pela ausência de ilicitude, XI. Desde logo porque a afirmação constante do cartaz corresponde à verdade material.

  8. A Verdade não pode ser difamatória.

  9. A Verdade não pode atentar contra a honra e consideração.

  10. O próprio Estado publicita a lista dos seus devedores, a menos que a situação contributiva se encontra regularizada, i.e., que se encontre pendente reclamação, recurso hierárquico ou impugnação judicial.

  11. Também nas mercearias, restaurantes e bares, como é do conhecimento público, é usual afixar a lista dos devedores.

  12. O mesmo se diga, como também é do conhecimento público, das listas que são afixadas nos átrios dos prédios em regime de propriedade horizontal relativamente aos condóminos faltosos.

  13. A própria Ordem dos Advogados, mimeticamente, tem no seu site um aviso, em letras “garrafais”, com um contador, em que se alerta para o facto de o Estado – pessoa jurídica -, ser devedor aos advogados de vários milhões de euros.

  14. E a divulgação na internet – v.g., lista de devedores à Fazenda pública e à segurança Social, e dívida do Estado aos advogados -, abrange todo o planeta, onde quer que se tenha acesso on line, XIX. E não apenas aos frequentadores da Quinta ..., que, por definição, é relativamente restrito.

  15. O próprio crime de difamação, p. e p. pelo art. 180º do CP, pressupõe a não punibilidade da conduta quando a imputação for feita para realizar interesses legítimos e o agente provar a verdade da imputação ou tiver tido fundamento sério para, em boa-fé, a reputar verdadeira.

  16. Ou seja, não pode haver lesão do direito à honra e consideração da A. se se afirmar e divulgar que a mesma é devedora e incumpridora relapsa, se, na realidade, a mesma deve há longos anos, mantendo a situação de incumprimento, em jeito de facto continuado ou permanente.

  17. A sentença recorrida, ao concluir pela ilicitude da conduta e pela lesão do direito à honra e consideração viola, pois, o disposto nos invocados arts. 70º e 484º do CC.

  18. A sentença recorrida condenou as RR. a pagar à A. uma indemnização pelos danos que supostamente lhe foram causados.

  19. O direito à indemnização da A. tem como causa de pedir a responsabilidade extracontratual das RR., mormente por força do disposto nos arts. 483º e ss., do CC.

  20. Sucede que, por força das regras do ónus da prova, cabia à A. provar os factos constitutivos do direito de que se arroga ser titular (art. 342º do CC).

  21. Ora, a A. não satisfez o onus probandi no que respeita à esmagadora maioria, para não dizer à totalidade, dos factos constitutivos do seu alegado direito.

  22. A A. não alegou os factos constitutivos do direito que invoca, XXVIII. Não fez prova dos mesmos, XXIX. Limitando-se a tecer considerações e a formular juízos conclusivos.

  23. E, como tal, a sentença...

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