Acórdão nº 160/1999.L2-6 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 20 de Setembro de 2012

Magistrado ResponsávelJERÓNIMO FREITAS
Data da Resolução20 de Setembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


  1. RELATÓRIO I.1.

    Respeitam os presentes autos de expropriação por utilidade pública, que correu termos no Tribunal do Montijo, 3.º Juízo, em que é expropriante Luso(…), S.A., e expropriada, S P S, LDA, tendo por objecto a parcela 125.

    Por despacho de 09.11.2001 (fls. 382), foi adjudicada à expropriante (…) a propriedade da parcela n.º 125, com a área total de 24.100,00 m2, correspondente à totalidade do prédio, marinha de sal, denominado "C... e V...", que confronta a Norte com a Ribeira do Samouco, a Sul com Marinhas 14 e 16, a Nascente com Marinha Parcla e do Poente com Esteiro da Hidráulica, sito na freguesia e concelho de Alcochete, descrito na Conservatória do Registo Predial de Alcochete sob o n.º ..., daquela freguesia (antigo n.º ..., a fls. 83, do Livro B-5), e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ..., pertencente a «S P S, Lda».

    Dessa decisão (fls. 382/383) foi interposto recurso de agravo pela expropriada (fls. 547), o qual foi admitido para subir a final e com efeito devolutivo (fls. 749).

    A expropriada e a expropriante, inconformadas com a decisão arbitral constante de fls. 118 a 123 dos autos, dela vieram interpor os competentes recursos (respectivamente, a fls. 550 a 588 e de fls. 670 a 681), os quais foram admitidos (despacho de fis. 749).

    Notificadas as partes dos recursos respectivamente interpostos, quer a expropriada quer a expropriante apresentaram as suas respostas (a fls. 729 a 731 e fls. 807 a 829).

    Em seguida procedeu-se à avaliação prevista no art.º 59.º n.º 2, do DL n.º 438/91, tendo os Senhores Peritos do Tribunal, da expropriante e da expropriada apresentado nos autos os 3 relatórios periciais de fls. 1070 a 1207, um subscrito apenas por este último, outro por um dos peritos do Tribunal e pelo perito da expropriante e, um outro, pelos outros dois peritos do Tribunal.

    Foi deduzida reclamação pela expropriada, a qual foi atendida, em consequência tendo o relatório pericial objecto da mesma sido complementado em conformidade com o determinado.

    Não foram deduzidas quaisquer outras reclamações relativas ao relatório pericial complementado.

    Notificados para o efeito, a expropriante e a expropriada vieram juntar as suas alegações (respectivamente a fls. 1332 a 1354 e 1397 a 1427), as quais foram reciprocamente notificadas.

    Subsequentemente, foi proferida a sentença recorrida (fls. 1430 a 1446), julgando o recurso interposto pela expropriada parcialmente procedente e o recurso interposto pela expropriante improcedente, em consequência, fixando a indemnização devida à expropriada «S P S, Ldª» pela expropriante «Luso(…, S.A.» em € 80.404,47, pela expropriação da parcela n.º 125, valor a ser actualizado à data da decisão final do processo, de acordo com a evolução do índice de preços no consumidor, com exclusão da habitação.

    I.2 Inconformada com essa decisão veio a expropriante interpor o presente recurso de apelação, apresentando as respectivas alegações e conclusões, no essencial argumentando o seguinte: 1. O presente recurso tem como propósito demonstrar que a sentença recorrida, padece de vício de violação de lei e de erro de julgamento por desrespeito das disposições relevantes do CE que delimitam o cálculo do montante indemnizatório, designadamente os artigos 22.º e 26.º do CE de 91 e, ainda, por desconsideração das normas relativas ao valor da prova pericial, nomeadamente o artigo 515.º do CPC, e bem assim os artigos 388.º e 389.º do Código Civil, uma vez que se afastou do laudo pericial num único factor meramente técnico, descurando, designadamente, as condicionantes legais da zona onde se insere a parcela expropriada 2. Na verdade, o Tribunal a quo, depois de fundamentar, e bem, a preferência dada ao laudo pericial subscrito pelo Perito indicado pela expropriante e por m dos Srs. Peritos nomeados pelo Tribunal, afastou-se do mesmo num único factor – o preço médio ponderado de 1 kg de peixe – em prol dos dados estatísticos do INE, dados esses que, conforme explicitado nas presentes alegações, e expressamente reconhecido na sentença em crise, não têm aplicabilidade in casu.

    1. Trata-se, pois, de matéria puramente técnica, que foi ponderada e avaliada no laudo maioritário subscrito pelos Srs. Peritos do Tribunal e da expropriante, não existindo fundamentos sérios, de facto ou de direito, que justificassem tal divergência.

    2. Quanto a esta questão – que se reconduz ao tema da margem de livre decisão do Tribunal na apreciação da prova pericial produzida em processo de expropriação por utilidade pública – importa realçar que o processo de expropriação litigiosa não é uma acção declarativa, em que a fase de alegação dos factos está perfeitamente delimitada e concentrada nos articulados, mas um processo feito a um acto: a avaliação da coisa expropriada.

    3. Mais importante, no processo de expropriação litigiosa tem obrigatoriamente lugar, entre as diligências instrutórias, a avaliação, à qual o tribunal preside e que se destina, precisamente, a determinar o valor do bem expropriado, sendo esta avaliação considerada a “prova rainha”.

    4. Neste sentido, e sem esquecer o princípio da livre apreciação da prova, deve concluir-se que o Tribunal, na resposta a questões de ordem técnica ligadas a factores como quantidades, rendimentos, valores de mercado ou custos de produção, não pode prescindir daquilo que seja fornecido pelos peritos.

    5. Acresce que é muito significativa a Jurisprudência dos Tribunais Superiores quanto à questão da adesão à avaliação maioritária.

    6. No presente caso, relativamente à avaliação da parcela com base no rendimento para piscicultura extensiva, o Tribunal a quo começa por seguir o relatório maioritário, partindo de um valor de produção de 500kg/h/ano.

    7. Não obstante, no que respeita ao factor preço médio ponderado de 1 kg de peixe, o Tribunal a quo segue, inexplicavelmente, a estatística da pesca fornecida pelo INE, ou seja, os dados que anteriormente referira não serem aplicáveis ao caso em apreço, tendo em atenção as condicionantes legais específicas da zona.

    8. A verdade, porém, é que as referidas condicionantes legais não só limitam a capacidade de produção, designadamente as espécies em causa, como igualmente influenciam o preço, pois, como referem os Srs. Peritos, o valor comercial dos peixes criados em viveiro é inferior ao dos exemplares criados naturalmente, sendo, por outro lado, o seu tamanho mais reduzido.

    9. Ao exposto acresce que na determinação do referido preço médio o Tribunal a quo não tomou em consideração a seguinte realidade salientada pelos Srs. Peritos maioritários e evidenciada nos recentes acórdãos do Tribunal da Relação oportunamente citados: a tainha, sendo a espécie de valor comercial mais reduzido, é das espécies mais significativas em termos de produção na zona das Salinas do Samouco, ao contrário daquilo que sucede a nível nacional, pelo que o preço médio ponderado fornecido pelo INE nunca poderia traduzir a realidade da zona em questão.

    10. Face ao exposto, deve concluir-se que o Tribunal errou no julgamento da causa, uma vez que, sem pôr em causa o princípio da livre apreciação da prova, o Tribunal não pode substituir um juízo meramente técnico pelo seu próprio em matérias em que não está em causa qualquer divergência interpretativa acerca dos critérios legais para fixação da indemnização.

    11. Na verdade, o Tribunal a quo não suscita uma única questão de direito com relevância para o cálculo do valor do solo, ou qualquer outra razão válida que pusesse em causa a opinião técnica dos Srs. Peritos maioritários, padecendo, por tudo o exposto, a sentença recorrida de erro de julgamento.

      Conclui pugnando pela procedência da apelação e consequente fixação de novo valor indemnizatório.

      I.3 A recorrida expropriada apresentou contra-alegações, pugnando pela confirmação da sentença recorrida e, com as mesmas, requereu a ampliação do âmbito do recurso, invocando o art.º 684.º - A do CPC.

      Manifestou, ainda, nos termos e para os efeitos do artº 748º nº1 do CPC (na redacção dada pelo DL 180/96, de 25-9), que mantém interesse na subida do recurso de agravo por si interposto (fls. 547).

      Apresentou igualmente conclusões que, na parte relativa à ampliação do recurso, apresentam o teor seguinte: 1 - Para o caso de proceder a apelação da expropriante, o que por mera hipótese se admite, concluindo-se que deve seguir-se o preço de comercialização e os demais critérios fixados pelos peritos maioritários, fixando-se assim o valor de 175$00/m2 e de 256$00/m2, como indemnização, respectivamente para as partes seca (4 400 m2) e molhada da parcela (19 700 m2), argui-se a ilegalidade e nulidade da sentença, ampliando-se o objecto do recurso, nos termos de art.º 684.º-A, n.os 1 e 2, do Cód. Proc. Civil, por se basear em relatório viciado, no tocante à fundamentação dos pressupostos numéricos subjacentes ao cálculo do valor indemnizatório, e por se efectuar a aplicação de normas em sentido interpretativo inconstitucional.

      2 – O Tribunal a quo, ao ter avaliado somente a parte submersa da parcela segundo a actividade da piscicultura, incorreu em erro de julgamento uma vez que desconsiderou regra técnica de definição da área total de unidade de produção piscícola, adoptada pelo Instituto Nacional de Estatística e pela Direcção Geral das Pescas e Aquacultura, segundo a qual o estabelecimento de aquacultura abrange a totalidade de área afecta à produção, incluindo os tanques, muros, comportas e caminhos de circulação e acesso – portanto, é inaceitável que, em total desrespeito ao disposto no artigo 26.º do Código das Expropriações, se ignore a “cultura” predominante da parcela, autonomizando-se uma sua parte, a fim de se lhe atribuir uma indemnização inferior à atribuída à restante parte da parcela, como se defendeu no laudo maioritário e se aceitou na sentença; 3 - O Tribunal a quo aderiu ao valor de produção piscícola (500kg/ha/ano) proposto no laudo maioritário, pois, erradamente, aceitou como verdadeiro que a parcela expropriada ao...

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