Acórdão nº 1622/10.7TBVNG.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 15 de Novembro de 2012
Magistrado Responsável | ARISTIDES RODRIGUES DE ALMEIDA |
Data da Resolução | 15 de Novembro de 2012 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Recurso de Apelação Processo n.º 1622/10.7TBVNG.P1 [2.ª Vara Mista de Vila Nova de Gaia] Acordam os Juízes da 3.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto: I.
B…, residente em …, Vila Nova de Gaia, instaurou contra C…, residente em …, Vila Nova de Gaia, acção declarativa de condenação sob a forma de processo ordinária, pedindo que a ré seja condenada a pagar-lhe uma indemnização pelos danos patrimoniais e lucros cessantes na quantia de €42.398,00, acrescida de juros desde à citação, e uma indemnização pelos danos não patrimoniais causados com o encerramento forçoso do estabelecimento comercial e a cessação unilateral e ilícita do contrato de arrendamento do imóvel onde era explorado o estabelecimento, em valor a liquidar pelo tribunal que não deverá ser inferior a €5.000,00, quantia a que deverão acrescer juros.
Para o efeito, alegou que em Outubro de 2002 adquiriu por trespasse um estabelecimento comercial de confeitaria, incluindo a posição de arrendatária do espaço onde se situava o estabelecimento, que é propriedade da ré; que em Outubro de 2004 foi trabalhar para fora e cedeu a terceiro a exploração temporária do estabelecimento; que em Março de 2005 a cessionária decidiu deixar a exploração do estabelecimento, entregando a chave ao funcionário da autora, o qual, sem informar a autora, entregou as chaves à senhoria, aqui ré; que esta aceitou as chaves sem consultar a autora; que depois a ré arrendou o espaço a outra pessoa; que em consequência foi privada da exploração do estabelecimento e do seu direito a o arrendamento de forma abusiva, tendo ficado impedida de obter qualquer rendimento da exploração do estabelecimento; que pagou a quantia de € 42.398,00 pelo trespasse, valor que continua a pagar sem ter a contrapartida da exploração lucrativa do estabelecimento; que sentiu revolta, perturbação e ansiedade pela quebra da sua expectativa de exercer no futuro a sua actividade naquele estabelecimento, não encontrando ocupação certa que lhe permita obter um rendimento como aquele que obteria caso mantivesse o seu estabelecimento a funcionar.
A acção foi contestada, pugnando-se pela improcedência total do pedido, mediante a alegação de que a matéria alegada pela autora não corresponde à verdade; que a pessoa que entregou a chave à ré era sócio da autora, explorando conjuntamente com esta o estabelecimento, tendo a entrega das chaves sido efectuada com o conhecimento da autora; que a autora não sofreu os danos invocados, tendo dado causa à cessação do arrendamento pelo não pagamento da renda.
Em reconvenção, a ré pediu que seja resolvido o contrato de arrendamento com fundamento na falta de pagamento da renda de Março de 2005 ou, caso assim não se entenda, que o contrato seja declarado resolvido em Abril de 2005 aquando da entrega da das chaves do imóvel e do próprio imóvel, devoluto de pessoas e bens.
Mediante requerimento da ré foi admitida a intervenção acessória nos autos de D…, o qual apresentou contestação, pugnando pela improcedência da acção.
Na réplica e tréplica, autora e ré pediram ainda, respectivamente, a condenação da outra como litigante de má-fé.
Devidamente tramitada e instruída, a acção prosseguiu até julgamento, findo o qual foi proferida sentença julgando a acção parcialmente procedente por provada e a reconvenção totalmente improcedente por não provada.
Em consonância, a ré foi condenada a pagar à autora a quantia de € 12.600,00 a título de danos patrimoniais, acrescida de juros à desde a citação até integral pagamento, e a quantia de € 5.000,00 a título de danos não patrimoniais, acrescida de juros desde a data da sentença até integral pagamento. A ré foi ainda condenada como litigante de má-fé no pagamento de 4UCs de multa e €500,00 de indemnização à autora. Por sua vez a autora foi absolvida do pedido reconvencional.
Do assim decidido, a ré interpôs recurso de apelação, terminando as respectivas alegações com as seguintes conclusões: a]O Tribunal “a quo” efectuou uma inadequada ponderação da prova e, consequentemente, fez uma errónea aplicação do direito aos factos.
b] Valorando depoimentos de testemunhas que, para além de nula razão de ciência, se moveram por razões subjectivas pessoais com o deliberado intuito de confirmar a tese da apelada c] Da análise dos depoimentos gravados deveria ter resultado como não provados a matéria constante do quesito 14ª no qual se pergunta se a entrega da chave feita pelo chamado à apelante foi sem conhecimento ou consentimento da autora; d] E os quesitos 32º, 33º, 34º, 35º e 40º da base instrutória deveriam ter sido dados como provados conforme decorre da confissão do chamado; e] De tais declarações também não resta alternativa que não seja dar como provada a matéria dos quesitos 32º, 33º, 34º, 35º, 39º e 40º da base instrutória e, consequentemente, não provado o quesito 12º e 14º; f] Apenas ao arrepio das regras da experiência se poderá dar os quesitos 33º e 34º por não provados face à confissão do chamado; g] As testemunhas arroladas pela autora, E…, F… e G… apenas conheciam o que a Autora lhes disse, visto nada terem presenciado no que concerne ao negócio celebrado entre autora e chamado e quanto às instruções que aquela deu a este para que a chave fosse entregue à senhoria, limitando os seus depoimentos à percepção que dizem ter da relação entre a autora e o chamado; h] Os seus depoimentos estão notoriamente toldados pela relação de amizade que têm com a autora, ficando as testemunhas pela confirmação do suposto sofrimento da apelada, mas não logrando nenhuma delas presenciar fosse o que fosse entre os aludidos sócios, quer no momento da celebração da sociedade irregular, quer no momento em que ela é dissolvida, com a entrega da chave e, posteriormente, com o acerto de contas que autora e chamado vieram a fazer.
i] As testemunhas arroladas pela Ré depuseram com rigor e isenção, salientando-se H…, que conhecia o chamado do tempo em que ele explorou o café dos autos, e que este sempre deu a entender ser o dono – ou sócio – do dito estabelecimento, chegando mesmo a abordar a testemunha para ser seu fornecedor. Sublinhando que o chamado se portava como dono e que na sua percepção seria ele o dono do estabelecimento.
j] Decorrendo de tal depoimento a prova dos quesitos 32º e 39º da base instrutória.
k] Só com base em juízo dedutivos e assentes nos depoimentos eivados de subjectividade das testemunhas arroladas pela Autora se poderá admitir que está provada a matéria dos quesito 23º, já que a A. nem prova fez de que a dívida existe, limitando-se a juntar aos autos cópias de umas letras de câmbio que para além de nem estarem sacadas, não são idóneas para demonstrar qualquer pagamento.
l]A prova testemunhal de que a A. tinha intenção desta em voltar para Portugal e explorar o café não se conjuga com a prova cabalmente feita de que a A. deu ordem para que a chave fosse entregue pelo chamado à senhoria, pelo que não poderia ser dada como minimamente provada a matéria vertida ao longo dos quesitos 23º a 31º e 37º a base instrutória.
m] A apelante, não teve qualquer actuação culposa, tendo-se limitado a receber a chave do locado, e não actuou com dolo ou, sequer, com mera culpa; n]Da sua conduta não decorreram quaisquer danos para a Autora; o] Não existem elementos de prova no que concerne ao quantum dos danos que a A. alega ter sofrido, motivados pela conduta da apelante; p]Apenas por juízo especulativo pode o Tribunal “a quo” fixar uma margem de lucro de € 150,00 mensais, quando o chamado e a testemunha M… – os únicos que têm noção da actividade em causa – foram peremptórias a afirmar que o café não dava lucro.
q]Se o lucro se cifrasse em € 150,00 mensais, obviamente a que A. ao fim de poucos meses cessaria a actividade, pois – decorre da experiência da vida – que é incomportável manter um negócio em que no final do mês a margem de lucro seja tão exígua! r] É totalmente desproporcionado o valor arbitrado pelo Tribunal a título de dano emergente.
s] O mesmo sucede relativamente ao quantum fixado para a indemnização por danos não patrimoniais, que não assentou em qualquer critério nem está sequer fundamentado.
t] O pedido reconvencional deveria ter sido julgado procedente pois a apelante invocou ter direito à resolução do contrato de arrendamento por falta de pagamento das rendas desde de Março de 2005 em diante.
u] Após a entrega das chaves do locado à senhoria a autora, desde Março de 2005, que não mais pagou qualquer renda; v] Não ocorreu qualquer caducidade do direito da Ré em pretender a resolução do contrato.
w]J amais a apelante pleiteou de má-fé ou, sequer, alegou qualquer facto que, conscientemente, admitisse que não correspondia à verdade.
x]A Apelante apenas se limitou a apresentar a sua versão, mas não uma versão ficcionada ou inventada.
y]A Apelante não deve ser condenada no pagamento de uma indemnização à A. – alegadamente para reembolso de pagamentos que a apelada nem sequer concretiza e cujo pagamento nem sequer está demonstrado – atenta a falta de cabimento legal.
z]A condenação por litigância de má-fé o reembolso das despesas – incluindo os honorários dos mandatários – não abrange todas as despesas realizadas pela parte contrária, mas apenas aquelas que derivem directamente da má-fé do litigante; aa]A A. não alegou que despesa teve em virtude da suposta litigância de má-fé que imputa à apelante porque, pura e simplesmente, tal não sucedeu.
bb]A apelante devia ter sido absolvida dos pedidos e a apelada condenada no pedido reconvencional; cc]A apelada faltou conscientemente à verdade.
Nestes termos … deve o … recurso de apelação ser provido, sendo revogada a … Sentença ..., determinando que a acção seja totalmente improcedente, sendo, em consequência, a … Apelante, absolvida do pedido; revogada a decisão de condenação da Apelante como litigante de má-fé; julgado procedente por provado o pedido reconvencional.
A recorrida não respondeu a estas alegações.
Após os vistos legais, cumpre decidir.
II.
Questões a resolver: Devidamente...
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