Acórdão nº 628/11.3TTBCL.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 05 de Novembro de 2012

Magistrado ResponsávelMACHADO DA SILVA
Data da Resolução05 de Novembro de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Reg. nº 1712.

Proc. nº 628/11.3TTBCL.

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto: 1. B… intentou a presente ação, com processo comum, contra C…, CRL, pedindo o pagamento da quantia global de € 13.455,87.

Para tanto, alegou ser professor do quadro da Escola … (estando reformado desde 26/08/10), sendo que, a partir de outubro de 1984, passou a exercer funções de docente na ré, em regime de acumulação, o que sucedeu até ao ano letivo de 2010/2011, auferindo € 339,58 mensais.

A partir de setembro de 2010, a R. deixou de lhe pagar os respetivos salários, bem como de efetuar os competentes descontos para a Segurança Social, razão pela qual, em março de 2011, resolveu o contrato de trabalho que com a mesma mantinha.

Pediu, assim, o pagamento de € 13.243,62, a título de indemnização por antiguidade, e os restantes € 212,25 de férias, subsídio de férias e de Natal proporcionais ao trabalho prestado no ano de 2011 (já que, entretanto, a ré liquidou os restantes créditos em dívida).

+++ Designado dia para realização de audiência de partes, não foi possível qualquer conciliação, tendo, porém, ficado assente que, com exceção do montante indemnizatório peticionado, todos os demais créditos se mostram liquidados – cf. ata de fls. 42/43.

+++ A ré contestou, alegando desde logo que o autor só lhe comunicou a sua passagem à situação de forma antecipada da função pública, a partir de setembro de 2010, sem contudo apresentar qualquer documento comprovativo dessa mesma situação.

Mais alega ter solicitado ao autor, por diversas vezes, documento que lhe permitisse lecionar na situação de aposentado, o que também não foi entregue.

Por fim, refere ter já liquidado ao autor todos os créditos que ao mesmo eram devidos (como ficou assente em sede de audiência de partes), sendo que o mesmo se mostra legalmente impossibilitado de continuar a lecionar, pelo que nenhuma indemnização lhe assiste.

+++ O autor respondeu nos moldes já alegados na PI, invocando, porém, a figura jurídica do abuso do direito e peticionando a condenação da ré como litigante de má-fé.

+++ Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi, posteriormente, proferida sentença, julgando improcedente a ação e absolvendo a R. do pedido.

+++ Inconformada com esta decisão, dela recorreu o A., formulando as seguintes conclusões: 1.

Vem o presente recurso interposto da decisão final que pôs termo ao processo em 1ª Instância e que julgou improcedente a ação.

  1. O Decreto-Lei n.° 137/2010, de 28 de dezembro, ao contrário do defendido na sentença, não tem qualquer aplicabilidade neste caso.

  2. O n.° 1 do artigo 78° do Estatuto da Aposentação, na redação que lhe foi dada pelo artigo 6° do Decreto-Lei n.° 137/2010, proíbe que aposentados exerçam funções públicas nos organismos públicos constantes do seu elenco.

  3. Este dispositivo legal tem caráter imperativo e é taxativo na definição dos organismos ou entes públicos abrangidos na sua previsão.

  4. A recorrida é uma cooperativa de ensino, de natureza privada, que não cabe no conceito de organismo público definido no artigo 78°, n.° 1, do Estatuto da Aposentação.

  5. Este facto é expressamente reconhecido na sentença recorrida.

  6. Se assim é, a definição das funções exercidas pelo recorrente é desnecessária, porquanto as mesmas nunca terão a virtualidade de fazer recair sobre a relação laboral sub judicio o regime previsto no Estatuto da Aposentação.

  7. O Decreto-Lei n.° 137/2010, em análise, destinou-se à aprovação de um conjunto de medidas adicionais de redução da despesa pública com vista à consolidação orçamental prevista no Programa de Estabilidade e Crescimento para 2010-2013.

  8. O Decreto-Lei n.° 137/2010 visou, ao alterar a redação do artigo 78° do Estatuto da Aposentação, impedir que reformados cuja pensão de reforma é paga pela Caixa Geral de Aposentações acumulassem à pensão retribuições derivadas do exercício de funções públicas, a serem também pagas pelo Estado, tudo no sentido de redução da despesa pública.

  9. Enquanto ao serviço da recorrida, o recorrente não recebe qualquer remuneração do Estado, que por isso não se vê na contingência de pagar simultaneamente ao recorrente salário e pensão de reforma.

  10. A sentença recorrida é contraditória nesta matéria, porquanto refere que (página 8, 6° parágrafo): "Note-se que, para o diploma referente ao estatuto da aposentação, o que é determinante – e suficiente – para despoletar a aplicação do regime nele previsto é que os serviços sejam prestados total ou parcialmente, presencialmente ou à distância, pelo aposentado e que esses serviços tenham um custo para a entidade pública, independentemente do destino da remuneração" (sublinhado nosso).

  11. A sentença recorrida, contradizendo os seus próprios termos, estabelece como critério de aplicação do regime do Estatuto da Aposentação o custo que possa ter para a entidade pública, que a recorrida não é.

  12. Da mesma forma, a sentença recorrida sustenta que, independentemente de tudo o resto, o recorrente sempre teria, no limite, de optar entre receber a reforma ou o salário, o que não fez, pelo que o seu contrato de trabalho não se poderia manter a partir de 01/01/2011; para, na sequência disso e de forma novamente totalmente contraditória concluir que o recorrente tinha direito a receber as retribuições em falta.

  13. Para além disso a recorrida atua em manifesto abuso de direito.

  14. Sabendo da entrada em vigor do Decreto-Lei n.° 137/2010, que na tese da recorrida e da sentença implicariam a impossibilidade de manutenção do contrato de trabalho em vigor, a recorrida não fez caducar o contrato de trabalho, omitindo essa informação e continuando a receber o trabalho do recorrente sem lhe pagar nada por isso.

  15. Está dado como provado que a recorrida sabia da situação de aposentado do recorrente, que lhe foi comunicada e nada fez após a entrada em vigor do Decreto-Lei n.° 137/2010.

  16. O recorrente estava convencido que o seu contrato de trabalho era válido e estava em vigor, tendo a expectativa de continuar a lecionar até final do ano letivo em curso. E tanto assim que foi o recorrente quem resolveu o contrato, nada fazendo a recorrida no sentido de fazer cessar a relação contratual.

  17. A recorrida manteve o recorrente ao seu serviço todos os meses em que perdurou a falta de pagamento de salários (setembro de 2010 a março de 2011) e, pese embora sem lhe pagar a retribuição, criando-lhe a séria convicção da manutenção da relação laboral.

  18. Aquando da receção da carta de resolução do contrato de trabalho por iniciativa do recorrente, a recorrida efetuou o pagamento dos salários em atraso, quando em rigor, a obter vencimento a sua tese, até nada teria de pagar ao recorrente porque este não podia acumular o vencimento à pensão que recebia e recebeu nesse período.

  19. Só em sede judicial, na contestação, quando confrontada com a justa causa invocada, vem a recorrida alegar uma pretensa caducidade do contrato celebrado com o recorrente em virtude da entrada em vigor do Decreto-Lei n.° 137/2010.

  20. A recorrida coloca-se claramente numa posição típica de venire contra factum proprium, que constitui inequivocamente abuso de direito, facto que não foi, como deveria ter sido, reconhecido na sentença.

  21. Sustentar-se que a recorrida não podia ter feito caducar o contrato pois, sabendo da aposentação, não recebeu do recorrente nenhum papel a dizer isso mesmo, não impede o funcionamento do instituto do abuso de direito, apenas o agrava.

  22. Assim, ao recorrente assistia todo o direito de resolver o seu contrato de trabalho com justa causa, com direito a indemnização.

  23. Todos os factos que consubstanciam a resolução com justa causa estão dados como provados e constam da matéria de facto assente nos autos.

  24. Sendo que toda a situação criada é imputável à recorrida a título de culpa, tornando os seus comportamentos imediata e definitivamente impossível a manutenção do vínculo laboral do recorrente, que o resolveu com justa causa de forma legal, devendo por isso ser indemnizado nos termos legais peticionados nos autos.

  25. Destarte...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT