Acórdão nº 5692/09.2TBMTS.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 26 de Junho de 2012

Magistrado ResponsávelRODRIGUES PIRES
Data da Resolução26 de Junho de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Proc. nº 5692/09. 2 TBMTS.P1 Tribunal Judicial de Matosinhos – 5º Juízo Cível Apelação Recorrente: “B…, UCRL” Recorrida: “C…, SA” Relator: Eduardo Rodrigues Pires Adjuntos: Desembargadores Márcia Portela e Pinto dos Santos Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto: RELATÓRIO A autora “B…, UCRL”, com sede na Rua …, …, intentou a presente acção com processo ordinário contra a ré “C…, SA”, com sede em …, …, Braga, pedindo a condenação desta a: a) proceder à reparação dos defeitos e vícios de construção enunciados nos artigos 26º a 96º a PI; b) pagar, a título de sanção pecuniária compulsória, uma quantia não inferior a €1.500,00 (mil e quinhentos euros) por cada dia de atraso no cumprimento da decisão que venha a ser proferida.

Para tanto, alegou, em síntese: Em 2.1.2002, celebrou com a ré um contrato mediante o qual esta se obrigou a construir-lhe um empreendimento e respectivas infra-estruturas, no prazo de 24 meses, pelo preço global de €8.479.564,25 acrescido de IVA à taxa de 5%.

Tal obra ficou a sofrer de vários defeitos de construção, dos quais a ré foi procedendo à respectiva reparação até que, a partir de Março de 2006, deixou de aceitar quaisquer reclamações e passou a recusar a reparação dos defeitos denunciados, que, entretanto, se agravaram.

A ré contestou, impugnando os fundamentos aduzidos na petição inicial e excepcionando, além do mais, a caducidade do direito invocado pela autora quanto à reparação, dizendo que, apesar de a partir de 7.3.2006 ter deixado de atender às reclamações da autora e não mais realizar qualquer reparação, esta acção só foi proposta em 16.9.2009, portanto, mais de três anos depois.

A autora apresentou réplica, alegando que entre Março de 2006 e meados de 2009 autora e ré mantiveram negociações tendentes à reparação de todos os defeitos existentes na obra e, por isso, não procede a excepção da caducidade, para além de que a sua invocação sempre seria um exercício abusivo de direito porque a ré, com aquelas negociações, criou à autora a convicção de que seria encontrada uma solução extra-judicial, com o intuito, agora revelado, de permitir a passagem do tempo.

Foi proferido despacho saneador, seleccionada a matéria de facto assente e organizada a base instrutória.

Realizou-se audiência de julgamento com observância do legal formalismo, tendo o Tribunal respondido à matéria da base instrutória através do despacho de fls. 356 e segs., que não teve qualquer reclamação.

A autora apresentou alegações de direito.

Foi depois proferida sentença que julgou a acção improcedente e absolveu a ré do pedido formulado pela autora.

Inconformada, a autora interpôs recurso de apelação, tendo finalizado as suas alegações com as seguintes conclusões:

  1. O “thema decidendum” do presente recurso subsume-se à não verificação da excepção peremptória de caducidade, que o Tribunal “a quo” conheceu e deu por verificada, improcedendo, por essa via, a pretensão da recorrente, que pedia a condenação da recorrida a proceder à reparação dos defeitos e vícios de construção enunciados nos artigos 26º a 96º a PI; e a pagar, a título de sanção pecuniária compulsória, uma quantia não inferior a €1.500 (mil e quinhentos euros) por cada dia de atraso no cumprimento da decisão que venha a ser proferida.

  2. A obra construída pela recorrida/ré sofria de vários defeitos de construção, dos quais a mesma foi procedendo à respectiva reparação.

  3. No entanto, em Março de 2006, a recorrida/ré enviou à recorrente/autora, que recebeu, fax recusando a reparação de fissuras detectadas na obra, e, desde então, a recorrida/ré deixou de atender aos pedidos da recorrente/autora para reparação das fissuras existentes nos diversos blocos, não mais realizando qualquer reparação.

  4. A recorrente/autora requereu a notificação judicial avulsa da recorrida/ré para que esta procedesse à reparação das anomalias discriminadas no relatório da vistoria que foi recepcionada pela recorrida/ré, a 5/8/2009.

  5. E em 16/09/2009 deu entrada em tribunal da presente acção.

  6. A recorrida/ré, na sua contestação, invocou a excepção peremptória de caducidade do direito à reparação, invocando que, desde 7/3/2006, após envio do fax constante de fls., deixou de atender às reclamações da recorrente/autora e não mais realizar qualquer reparação e que a presente acção só foi proposta em 16/9/2009, portanto, mais de três anos depois.

    Sucede porém que, G) A recorrente/autora apresentou réplica, alegando que entre Março de 2006 e meados de 2009, recorrente/autora e recorrida/ré mantiveram negociações tendentes à reparação de todos os defeitos existentes na obra e, não procedendo, por isso, a excepção da caducidade, para além de que a sua invocação sempre seria um exercício abusivo de direito porque a recorrida/ré, participando naquelas negociações, criou à recorrente/autora a convicção de que seria encontrada uma solução extra-judicial para o diferendo, e revela-se que, afinal o fez com o intuito, agora revelado, de permitir a passagem do tempo.

  7. Na decisão que ora se recorre o tribunal “a quo” deu como provados os factos constantes na Base Instrutória, referentes aos defeitos existentes, e cuja reparação pretendia a recorrente/autora com a presente demanda.

  8. No entanto, na resposta ao quesito 78º, o Tribunal “a quo” deu apenas como provado que esteve agendada para o dia 25 de Março de 2009, uma reunião entre os representantes da autora (recorrente) e da ré (recorrida) para que fosse analisada “a saída” para o problema da B….

  9. Todavia, outra resposta deveria ter sido dada ao quesito 78º, ou seja, deveria ter sido declarado como integralmente ”provado” pois, atento o depoimento credível, que se encontra gravado na audiência de julgamento, CD – Minuto 00:03:58 a 00:31:19, a testemunha D…, refere expressamente a existência de reunião mantida entre as partes, em que estiveram presentes os responsáveis da recorrida/ré, com vista à resolução extrajudicial dos defeitos detectados (“fissurações nos azulejos”).

  10. Do depoimento da testemunha, facilmente se conclui que não obstante, o “abandono da obra” por parte da recorrida, certo é que atentas as relações existentes entre as partes, ao longo dos tempos foram existindo contactos no sentido de saber quais eram as causas do problema, e que a recorrida chegou a comprar material para proceder a novas reparações dos problemas existentes.

  11. Neste mesmo sentido vai o depoimento da testemunha E… (terceira testemunha), funcionário da recorrente, e cujo depoimento é credível, que se encontra gravado na audiência de julgamento, CD – Minuto 00:00:58 a 00:15:36, e que esteve presente na aludida reunião, e que corrobora inteiramente a existência de negociações e o reconhecimento da existência de defeitos que careciam de reparação por parte da recorrida.

  12. A recorrida/ré sempre criou a convicção de que iria proceder às reparações necessárias, aguardando apenas o relatório de vistoria, por forma a concretizar o seu âmbito de actuação, o que resulta, quer dos depoimentos das testemunhas presentes na reunião, aqui transcritos, quer do teor das declarações constantes do fax junto aos autos.

  13. O reconhecimento pelo empreiteiro da existência de defeitos e a tentativa frustrada de os reparar impedem a caducidade relativamente ao direito decorrente dos defeitos inicialmente notados, reiniciando-se novo prazo de caducidade quanto aos defeitos que subsistirem após a recusa em proceder a novas reparações, contrariamente ao entendimento proferido na sentença que ora se recorre.

  14. A manutenção das negociações até 2009 por parte da ré fez com que a mesma reconhecesse, que, mais não seja de forma tácita, a existência dos defeitos denunciados nas reclamações que foram sendo apresentadas depois de Março de 2006.

  15. Ademais é notório para apreciação da questão da caducidade, e da resposta ao quesito 78.º, o depoimento prestado pelas testemunhas Eng. D… e E…, demonstraram que a convicção criada pela recorrida/ré foi a de que, assim que determinada a causa procederia à reparação das mesmas, eventualmente com uma negociação com a recorrente/autora, mas que efectuaria a reparação.

  16. E, neste pressuposto, a acção foi instaurada dentro do prazo previsto no n.º 2 do art. 1225.º do CC.

  17. No fax enviado pela recorrida/ré à recorrente/autora não resulta o pretendido pela recorrida/ré, pois o fax refere claramente que “os representantes do dono da obra entenderam que antes de se proceder à reparação deveriam consultar os projectistas para que se pronunciassem sobre as suas causas de fissuração, os trabalhos estão parados, pelo que aguardamos que nos comuniquem como havia sido acordado, as conclusões dos projectistas sobre o assunto….. contudo analisaremos os trabalhos de reparação em tempo útil”. (v. doc. 4 da contestação).

  18. Não se pode concluir do mencionado supra que tenha existido uma recusa clara, pelo contrário, a recorrida/ré aguardava a indicação por parte da recorrente/autora do relatório dos projectistas sobre as causas das fissurações.

  19. Ademais, até Março de 2006, conforme resulta da factualidade inserta nas alíneas F) a H), e do depoimento das testemunhas a que já se aludiu, a recorrida/ré, na sequência de reclamações apresentadas pela recorrente/autora, procedeu a reparações nos diversos blocos que construiu, aguardando apenas a apresentação do relatório elaborado pelos projectistas, para reparar os defeitos constantes das reclamações apresentadas subsequentemente.

  20. Contra todas as legítimas expectativas geradas na recorrente/autora, a recorrida/ré recusou-se a assumir as reparações necessárias para eliminar os defeitos constantes deste relatório.

  21. Decisão tão mais contraditória, quando, disposta a solucionar estes problemas, aceitou negociar e adquiriu, até, material específico para atender às reparações que se revelavam necessárias.

  22. Ademais, criou na esfera jurídica da recorrente a convicção de que, com o prolongamento das negociações, e a necessidade de elaboração do relatório, com vista a averiguar quais as causas...

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