Acórdão nº 729/05.7GDVFR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 23 de Maio de 2012

Magistrado ResponsávelMARIA DEOLINDA DIONÍSIO
Data da Resolução23 de Maio de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Processo n.º 729/05.7GDVFR.P1 Relatora: Maria Deolinda Dionísio Adjunto: Moreira Ramos.

4ª Secção Acordam, em conferência, na 2ª Secção Criminal do Tribunal da Relação do Porto: I – RELATÓRIO Por sentença proferida no processo comum com intervenção de tribunal singular, n.º 729/05.7GDVFR.P1, do 2º Juízo Criminal de Santa Maria da Feira, foi o arguido B…..

, com os demais sinais dos autos, condenado pela prática do crime de homicídio negligente, p. e p. pelo art. 137º n.º 1, do Cód. Penal, na pena de 7 (sete) meses de prisão, cuja execução foi suspensa por igual período, e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de 6 (seis) meses.

Inconformado com a aplicação desta pena acessória, o arguido interpôs recurso, terminando a sua douta motivação com as seguintes conclusões que se transcrevem: “1 - O Arguido apenas foi acusado por um crime de homicídio negligente e só por ele foi condenado, como não podia deixar de ser. Como a este crime não corresponde actualmente, e à data em que ocorreram os factos, qualquer sanção acessória, por tal não caber na previsão do artigo 69º do C. Penal, terá de se concluir pela revogação da sanção acessória imposta ao arguido; 2 - A sentença não decidiu a aplicação da inibição de conduzir prevista no C. Estrada. Para a aplicação dessa pena acessória de proibição de conduzir, o Tribunal recorrido encontrou fundamento no artigo 69º, n.º l, al. b) do C. Penal. Porém, essa norma não se aplica ao caso; 3 - Quando a lei fala em crime cometido com a utilização de veículo não pode estar a referir-se à mera condução de veículo, a crime resultante de condução defeituosa, porque se assim fosse não haveria espaço para aplicação da exigência cumulativa e cuja execução tiver sido por esta facilitada de forma relevante.

4 - O artigo 69º, n.º l, al. b) do C. Penal, só pode referir-se a crimes que nada têm "a ver com a condução defeituosa", a crimes que o arguido decidiu cometer, isto é, dolosos, utilizando como instrumento o veículo, e facilitando este de forma relevante a execução do crime.

5 - Pelo que, no entender do recorrente não há fundamento para a aplicação ao arguido da referida pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados, devendo a sentença recorrida nessa parte ser revogada.

6 - Porém, a manter-se a pena acessória de inibição de conduzir, deve, em nosso entender, tal pena também ser suspensa na sua execução uma vez que se verificam os pressupostos de que a lei faz depender a suspensão da execução de penas - artigo 50º do C. Penal e 142º do C. Estrada.

7 - O tribunal a quo fez um juízo de prognose sobre o comportamento futuro do arguido, suspendendo a execução da pena de prisão em conformidade com o que resultou dessa previsão; 8 - Não obstante a existência de negligência e serem assinaláveis as exigências de prevenção geral, o cumprimento da pena efectiva mostrava-se altamente desaconselhável do ponto de vista de ressocialização do delinquente, com nefastos reflexos na sua vida social, familiar e profissional, onde se mostra perfeitamente integrado.

9 - Acresce que, já decorreram mais de três anos e meio sobre a data dos factos sem que o arguido tivesse praticado, quer anterior quer posteriormente àquela data, qualquer ilícito criminal nem contra-ordenacional; 10 - Tais circunstâncias, levaram o tribunal a crer que a simples ameaça da pena e a censura do facto bastavam para o afastar da criminalidade e satisfazer as necessidades de reprovação e prevenção do crime, levando a que no futuro conduza com mais cuidado.

11 - Ora, o juízo de prognose favorável vale "mutatis mutandis", para a questão da suspensão da execução da sanção acessória de inibição de conduzir aplicada ao arguido; 12 - E nada impede que a sanção ou pena acessória siga o destino e a sorte da pena principal, consabido que o C. Penal apenas permite a suspensão das penas de prisão.

13 - Se o cumprimento efectivo da pena mostrou-se desaconselhável do ponto de vista de ressocialização do delinquente, com nefastos reflexos da sua vida social, familiar e profissional, onde se mostra perfeitamente integrado, também o cumprimento efectivo da sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de 7 meses terá os mesmos efeitos negativos para o arguido.

14 - Além de que está ao alcance do Tribunal, se entender conveniente e adequado à realização das finalidades da punição, a faculdade de condicionar a suspensão da execução da sanção acessória de inibição de conduzir a prestação de caução de boa conduta, ou frequência de acções de formação, ou ainda à cooperação em campanhas de prevenção rodoviária.

15 - Sendo que, em nosso modesto entender, a cooperação em campanhas de prevenção rodoviária se mostrará de maior utilidade quer para o recorrente quer para a nossa sociedade do que a privação pura e simples da faculdade de conduzir.

16 - A douta sentença recorrida fez uma incorrecta interpretação dos artigos 50º, 69º e 137º do C. Penal e artigo 142º do C. Estrada.” Termina, pedindo a revogação da sentença na parte em que aplicou a “sanção acessória”[1] prevista no art. 69º, n.º 1 a), do Cód. Penal, ou, subsidiariamente, a suspensão da execução desta pelo período de 1 (um) ano, ainda que sob condição.

*Houve resposta do Ministério Público que, sem sumariar conclusões, sustenta a manutenção da decisão recorrida por, em síntese, entender que a utilização de veículo facilitou de forma relevante o cometimento do crime, ainda que isso implique a aplicabilidade da norma a todos os crimes de homicídio e ofensa à integridade física negligentes cometidos no exercício da condução, pese embora a jurisprudência existente em sentido contrário, e que a pena acessória de proibição de conduzir, fixada ao abrigo do disposto no art. 69º, do Cód. Penal, não admite a suspensão da sua execução.

O recurso foi admitido por despacho de fls. 488 e, nesta instância, o Ex.mo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer onde, além do mais, destacou a existência de nulidades da decisão por:

  1. O arguido ter sido condenado na pena acessória impugnada com base em normativo que não constava da acusação e sem que previamente tivesse sido cumprido o disposto no art. 358º, do Cód. Proc. Penal; b) Omissão de pronúncia relativamente ao procedimento contra-ordenacional imputado e não concretamente decidido.

    Sufragou, porém, que as mesmas poderão ser supridas nesta Relação declarando-se prescrito o procedimento contra-ordenacional e dando cumprimento ao disposto no art. 424º n.º 3, do Cód. Proc. Penal, ou revogando-se a pena acessória por ser inaplicável ao caso.

    Conclui, em consequência, pela procedência do recurso.

    *Deu-se...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT