Acórdão nº 1210/08.8TBGMR.P1 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 31 de Maio de 2012

Magistrado ResponsávelLEONEL SERÔDIO
Data da Resolução31 de Maio de 2012
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Apelação n.º 1210/08.8TBGMR.P1 Relator – Leonel Serôdio – (235) Adjuntos – José Ferraz - Amaral Ferreira Acordam no Tribunal da Relação do Porto Relatório B… intentou ação declarativa com processo sumário contra C…, Lda pedindo a condenação da Ré no pagamento da quantia de € 9.315,73.

Para tanto alegou, em síntese, que adquiriu à Ré um veículo automóvel em estado novo, de matrícula ..-..-ZU, tendo a Ré garantido o bom funcionamento do veículo pelo prazo de 2 anos. Mais alega que o referido veículo veio a ficar com o motor e o turbo partidos, tendo a Ré recusado a repará-lo, obrigando-o a proceder à reparação a suas expensas, que importou a quantia de € 7.815,73. Alega ainda que esteve privado da utilização do seu veículo, solicitando, por isso, o pagamento de uma indemnização de € 1.500,00.

A Ré contestou, arguindo a excepção de caducidade do direito do autor e impugnou, na generalidade, os demais factos alegados.

O A respondeu à excepção de caducidade, propugnando pela sua improcedência.

O processo prosseguiu os seus termos e foi proferida sentença que julgou procedente a excepção de caducidade invocada pela Ré e absolveu-a do pedido.

O A. apelou e por acórdão desta Relação foi revogada a decisão proferida, na parte, em que julgou procedente a excepção da prescrição e ordenou a reformulação da base instrutória com aditamento de novos factos.

Dado cumprimento ao acórdão, realizou-se a audiência de discussão e julgamento e oportunamente foi proferida sentença que julgou parcialmente procedente a ação e condenou a Ré a pagar à A. a quantia de € 6.956,65 (seis mil e novecentos e cinquenta e seis euros e sessenta e cinco cêntimos).

A Ré apelou e terminou a sua alegação com as seguintes conclusões, que se transcrevem: 1. A douta sentença (…) objecto do presente recurso fez uma deficiente aplicação do direito e desconsiderou matéria de facto provada, que a ser tida em conta conduziria a uma solução diversa da proferida.

  1. Existe erro na interpretação do direito e na apreciação da matéria de facto tida provada.

  2. O caso “ sub iudice” encontra-se sujeito á regulação da Lei 24/96, na redacção que lhe foi conferida Lei 67/2003 de 08/04, nomeadamente do seu artº 4º.

  3. O vendedor que queira eximir-se da sua responsabilidade, tem a obrigação de efectuar a prova de que a causa concreta do mau funcionamento é posterior à entrega da coisa vendida.

  4. O A./Recorrido não deu oportunidade à Ré/Recorrente de examinar a viatura transaccionada e diagnosticar as razões da avaria que originou o seu mau funcionamento, tendo optado por repara-la numa outra oficina que não na recorrente, habilitada para esse efeito, apesar de lhe ter sido comunicado a necessidade de ver o veiculo para ver o veiculo para averiguar o que o mesmo tinha e necessitava.

  5. O artº 4º da Lei 24/96 possibilita ao consumidor/comprador a quem foi fornecida coisa com defeito, exigir, independentemente de culpa do fornecedor, a reparação da coisa, a sua substituição, a redução do preço ou a resolução do contrato, mas condiciona o exercício desse direito à inexistência de Abuso de Direito.

  6. E, ainda, conforme doutamente nos ensina o Prof. Romano Martinez, não pode ser efectuada uma leitura literal do nº 5 do artº 4 da Lei 67/2003 de 08/04, no sentido de nos levar a concluir pela possibilidade do exercício de qualquer dos direitos pelo consumidor, por esta interpretação não ser razoável. (cfr. Prof. ROMANO MARTINEZ, in Da Cessação do Contrato 2ª ed., pp 272-273) 8. A resolução do negócio ou a reparação por terceiro mesmo no âmbito de aplicação da directiva comunitária encontra-se na dependência da inviabilidade da reparação do defeito pelo vendedor.

  7. “O vendedor tem a obrigação de reparar a avaria ou o defeito, pois assegurou a conformidade da coisa, mas também tem o direito de ser ele a proporcionar ao comprador o resultado da obrigação, o que importa que lhe seja conferida a possibilidade de o exercer.” (sublinhado nosso) (cfr. Ac. TRP de 04/02/2010, em ITIJ/Net, Procº 1362/05.9TBGDM.P1, Relator Des. José Ferraz, na sua nota [7] pag. 10) in www.dgsi.pt.

  8. O A./Recorrido não logrou provar que a recorrente se recusou a cumprir a obrigação de reparar que lhe assistia e que teria recusado a aplicação de peças novas, nomeadamente o motor e o turbo.

  9. O comportamento do A./Recorrido configura o exercício abusivo da previsão do artº 334º do Código Civil.

  10. A sentença recorrida violou o nº 5 do artº 4º da lei 24/96, na redacção da Lei 67/2003 e ainda o artº 334º do C.C.” A final pede que se julgue procedente a apelação e se revogue a sentença recorrida, absolvendo-a do pedido.

    O A contra-alegou, pugnando pela confirmação da sentença recorrida.

    Fundamentação A questão a decidir é a de saber se a Ré vendedora está ou não obrigada a pagar ao A/comprador o custo da reparação do veículo objecto do contrato de compra e venda.

    Factos dados como provados na 1ª instância (transcrição): 1. Em 13/01/2007, o Autor comprou à Ré o veículo automóvel de marca Renault, modelo …, com a matrícula ..-..-ZU, na altura com 84.085 Kms, pelo preço de 33.000,00 euros (alínea A) dos factos assentes).

  11. A Ré prestou a garantia que consta do documento de fls. 21 dos autos, cujo teor aqui se considera reproduzido (alínea B) dos factos assentes).

  12. No dia 02/09/2007, aquando da viagem de regresso a Portugal, a cerca de 50 Kms de Zamora, o Autor ouviu um barulho estranho vindo do motor do veículo (resposta ao art. 1.º da base instrutória).

  13. Após tal barulho ter ocorrido, uma nuvem de fumo começou a sair pelo capot do veículo (resposta ao art. 2.º da base instrutória).

  14. O A. encostou de imediato o veículo à berma e chamou o reboque (resposta ao art. 3.ºda base instrutória).

  15. O veículo foi levado para a Renault – D…, Lda. (resposta ao art. 4.º da base instrutória).

  16. No dia 03/09/2007, o Autor comunicou à Ré que o veículo tinha sofrido uma avaria (alínea C) dos factos assentes).

  17. Após esta comunicação, a Ré informou o Autor que independentemente da posição que a Renault viesse a tomar quanto à reparação do veículo, ela própria assumiria a reparação, imediatamente (alínea D) dos factos assentes).

  18. Após esta comunicação, a Ré informou o Autor que este deveria efectuar uma reclamação junto da Renault, o que este fez (resposta ao art. 27.º da base instrutória).

  19. Analisado o veículo esta oficina informou o Autor que o mesmo tinha o motor partido, sendo necessário proceder à sua substituição bem como do turbo que ficara contaminado com os estragos provocados pelo motor (resposta ao art. 5.º da base instrutória).

  20. No dia 04/09/2007, o Autor deu essa informação à Ré, via telefone (resposta ao art. 6.º da base instrutória).

  21. Nessa mesma semana, o Autor dirigiu-se às instalações da R., reunindo-se com um funcionário da Ré para resolver o assunto (resposta ao art. 7.º da base instrutória).

  22. Posteriormente, uma vez que a Renault continuava a analisar as reclamações e o Autor estava impaciente com a falta de resposta, a Ré aconselhou-o a enviar uma carta à Renault de … (resposta ao art. 28.º da base instrutória).

  23. Após essa reunião, a Ré, por intermédio de um seu funcionário E…, ajudou o Autor a elaborar essa carta que é a que consta dos autos a fls. 63, cujo teor aqui se considera integralmente reproduzido, com a finalidade de assacar responsabilidades à Renault / … (oficina D…) pela situação criada, ao abrigo da garantia, o que esta recusou (resposta ao art. 8.º da base instrutória) 15. O Autor queria que a Ré procedesse ao pagamento da reparação (resposta ao art. 10.º da base instrutória) 16. A D…, entretanto, tinha pedido um novo motor e um novo turbo à fábrica para substituir o que tinha partido, facto que comunicou ao Autor, e este, por sua vez, avisou à Ré (resposta ao art. 12.º da base instrutória) 17. O Mandatário do Autor, e em nome deste, enviou à Ré a carta de fls. 22, registada e com aviso de recepção, cujo teor se considera aqui reproduzido, dizendo aguardar até ao dia 24/10/07 para a resolução do litígio pela via extrajudicial...

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