Acórdão nº 739/08-1 de Tribunal da Relação de Évora, 29 de Abril de 2008

Magistrado ResponsávelRIBEIRO CARDOSO
Data da Resolução29 de Abril de 2008
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam, precedendo conferência, na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - Relatório 1. Com data de 29 de Outubro de 2007, o senhor juiz de instrução criminal do Tribunal Judicial da Comarca de ..., proferiu o despacho que, na parte relevante, se transcreve: "Investiga-se nos presentes autos o crime de tráfico de estupefacientes, p. e p. pelo art. 21.º n.º1 e 24.º, alin. j) do DL n.º 15/93, de 22 de Janeiro.

O Ministério Público requereu a atribuição de especial complexidade nos termos dos art. 215.º n.º3 e 4 do CPP.

Dos arguidos, notificados para se pronunciarem, opôs-se o arguido J. M..

Cumpre apreciar: Os arguidos estão todos sujeitos à medida de coacção de prisão preventiva.

O tipo de crime indiciado é considerado à luz do art. 1.º, alin. m) do CPP como pertencente ao elenco dos ilícitos classificados como criminalidade altamente organizada.

Para além disso, compulsados os autos verifica-se que os arguidos são em número de 11 (1 português e 10 espanhóis), o modus operandi utilizado designadamente a carga/descarga em local de difícil acesso com a utilização de guinchos e veículos, um deles pesado de mercadorias, a quantidade de produto estupefaciente envolvido 3.059,7 kg, tudo aponta para a existência de preparação prévia e organizada da operação que, entretanto, se gorou, o que indicia poder existir uma organização que se dedica a essa actividade e com a qual os arguidos estarão ligados e que importa apurar.

De tudo o exposto decorre que o procedimento penal em curso se revela de especial complexidade o que declaro nos termos e para os efeitos do disposto no art. 215.º -3 e 4 do CPP." 2. Notificados na sua pessoa do despacho traduzido na sua própria língua, vieram os arguidos G.C., J.M., J.R. e J.V.

interpor recurso, nos termos constantes de fls. 3 4 a 107 destes autos recursivos, pedindo que seja declarada a nulidade do mesmo, por falta de fundamentação e violação do disposto no n.º4 do art. 215.º do CPP.

Extraíram da respectiva motivação do recurso que cada um deles interpôs em separado - não obstante terem sido subscritos pela mesma senhora advogada por eles constituída - as seguintes conclusões: 1 -Vem o presente recurso da douta decisão proferida pelo Mm°. Juiz de Direito do Tribunal "a quo" nos autos de processo de inquérito supra identificado, do Tribunal Judicial de Lagos, cuja cópia ora se junta em anexo se identifica como documento número um e se considera reproduzido para todos os efeitos legais.

2 - Não entende o aqui Recorrente a bondade do referido despacho e, com o mesmo não se conforma. Por tal razão apresenta o recurso cujo provimento determinará a realização da justiça 3 - Antes de mais, deve dizer-se que o aqui Recorrente não foi notificado nos termos e para os efeitos decorrentes do n.º 4 do artigo 215° do Código de Processo Penal.

4 - Notificado do aliás douto despacho de que ora se recorre o aqui Recorrente invocou a nulidade do mesmo.

5 - Deveria o aqui Recorrente ter sido ouvido e não foi... tal configura nulidade. Nulidade essa que foi arguida em tempo e por quem tem legitimidade. Nulidade essa que ora se reitera e cujas consequências se mostram determinadas na lei.

6 - O aqui Recorrente também entende que o despacho de que ora se recorre está ferido de nulidade por manifesta falta de fundamentação.

7 - Nos termos do disposto no n.º 4 do artigo 215° do Código de Processo Penal, a excepcional complexidade apenas pode ser declarada durante a primeira instância, por despacho fundamentado, oficiosamente ou a requerimento do Ministério Público, ouvidos o arguido e o assistente.

8 - Note-se que a lei refere despacho fundamentado. Fundamentação é o que não existe no despacho de que ora se recorre.

9 - Com o presente recurso o aqui Recorrente demonstrará que:

  1. A determinação da excepcional complexidade do processo implica um despacho devidamente fundamentado, o que in casu se não verifica, sendo o mesmo nulo.

  2. A determinação de excepcional complexidade implica a observação de regras restritas que não coloquem em questão a liberdade das pessoas, atenta única e exclusivamente razões de ordem material e humana, ou seja, falta de meios e insuficiência de profissionais.

  3. Por implicar o aumento da prisão preventiva deve ser observado caso a caso e não de forma generalista, sem concretização.

  4. Os presentes autos não são excepcionalmente complexos.

    10 - A excepcional complexidade do processo tem que ser avaliada caso a caso. Tem que se verificar em cada uma das situações em apreço. Tem que se fundamentar. Fundamentar implica apresentar razões válidas e coerentes, o que em nosso modesto entendimento e salvo o devido respeito não aconteceu, isto porque:

  5. O facto de estarmos perante onze arguidos não determina só por si a excepcional complexidade do processo.

  6. O local utilizado para a presente descarga, resulta da história dos processos desta natureza que é um local onde habitualmente se procede a este tipo de operações.

  7. Há mais de vinte anos que aquele local se mostra referenciado como local de descarga de tabaco e produto estupefaciente.

  8. Os próprios donos da propriedade já estiveram presos por crimes de idêntica natureza.

  9. Não é um local de difícil acesso, tem dois caminhos, um dos quais pode ser utilizado por qualquer pessoa e onde qualquer veículo automóvel pode circular sem qualquer problema.

  10. O modus operandi é igual ao utilizado em 90% das descargas efectuadas em toda a costa algarvia.

    11 - Assim, podemos concluir sem dificuldade que dos autos não resulta qualquer complexidade e que o despacho em referência apresenta como fundamentos a falta deles ou meras generalidades.

    12 - Assim, entende o aqui Recorrente que muito mal andou o Mm° Juiz do Tribunal a quo.

    13 - E mal andou porque no despacho constante de fls. 5305 dos autos:

  11. O Mm°. Juiz a quo interpretou mal o disposto no artigo n.º 4 do artigo 215° do Código de Processo Penal.

  12. Interpretou mal o disposto no artigo 1°, alínea m) do Código de processo Penal.

  13. Esqueceu-se que a declaração da especial complexidade do processo implica um aumento dos prazos da medida de coacção a que o ora Recorrente se encontra sujeito.

  14. Violou o disposto no artigo 28° da Constituição da República Portuguesa.

    E)Violou o disposto no artigo 32° da Constituição da República Portuguesa.

    14 - Assim, nos termos e ao abrigo do disposto no n°.4 do artigo 215° do Código de Processo Penal o aqui Recorrente, atenta a falta de fundamentação patenteada na leitura do aliás douto despacho de que ora se recorre deve ser o mesmo considerado nulo, com todas as consequências legais.

    15 - A fundamentação do despacho objecto do presente recurso e vaga imprecisa e violadora das mais elementares regras do direito.

    16 - Entende o aqui Recorrente que, para que se cumpra o direito e a justiça, necessário será declarar a falta de fundamentação do despacho objecto do presente recurso.

    17- Mas deverá declarar-se a nulidade do presente despacho por violação clara do disposto no n.º 4 do artigo 215° do Código de Processo Penal.

    18 - Mais entende o arguido, ora Recorrente, que se justifica, a imediata revogação do despacho de que ora se recorre, sob pena de violação dramática da Lei:

  15. Sob pena de violação dos direitos do ora Recorrente.

  16. Sob pena de violação do disposto no artigo 215°, n°. 4 do Código de Processo Penal.

  17. Sob pena de violação do disposto no artigo 1°. alínea m) do Código de Processo Penal.

  18. Sob pena de violação do espírito da Lei.

  19. Sob pena de violação das regras que norteiam a actuação do Tribunal.

  20. Sob pena de violação do disposto no artigo 28° da Constituição da República...

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