Acórdão nº 1860/10.2TBPTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 13 de Dezembro de 2011

Magistrado ResponsávelANTÓNIO MANUEL RIBEIRO CARDOSO
Data da Resolução13 de Dezembro de 2011
EmissorTribunal da Relação de Évora

A CÂMARA MUNICIPAL DE LAGOA/MUNICÍPIO DE LAGOA intentou a presente acção com processo especial, contra M…, pedindo a condenação desta na restituição da posse do estabelecimento comercial que ilegalmente ocupa, com todas as consequências legais, e o pagamento do montante de € 13.800,00, relativo a contraprestações em dívida, acrescido de IVA e respectivos juros.

Como fundamento alegou que “promoveu hasta pública“ para concurso e exploração do estabelecimento comercial instalado e integrado no complexo das piscinas municipais de Lagoa. Por deliberação da Câmara Municipal de Lagoa foi adjudicada à R. a concessão e exploração do estabelecimento, a qual assumiu a exploração vinculada às condições da sua proposta, ao programa do concurso e ao contexto regulamentar e funcional do complexo das piscinas municipais de Lagoa e ao pagamento de uma contraprestação, não tendo efectuado nenhuma delas. Acresce que o procedimento concursal lavrou em lapso e, por esse motivo, a Câmara Municipal de Lagoa deliberou comunicar à R. o encerramento do estabelecimento, bem como deliberou anular a adjudicação e a abertura de novo procedimento para exploração do estabelecimento.

Citada, a Ré contestou invocando a incompetência material do tribunal judicial, por ser da competência dos tribunais administrativos dado que na acção se colocam questões respeitantes à atribuição de pessoas de direito público administrativo agindo nessas vestes e praticando actos de gestão pública, conexos com as suas competências.

A A. respondeu pugnando pela competência do tribunal.

No saneador, conhecendo-se da invocada excepção, foi a mesma julgada procedente e o tribunal declarado “materialmente incompetente para a apreciação de mérito das questões colocadas nos presentes autos, absolvendo o R. da instância proposta perante os Tribunais Comuns”.

Inconformada com esta decisão, interpôs a A.

o presente recurso de apelação impetrando a revogação da decisão e a sua substituição por outra que julgue o tribunal competente.

A R. não contra-alegou.

Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.

Formulou a apelante, nas alegações de recurso, as seguintes conclusões, as quais, como se sabe, delimitam o seu objecto [1] e, consequentemente, o âmbito do conhecimento deste tribunal: “1- O aqui Recorrente não entende, nem aceita a sentença proferida nos autos.

2- Entende o aqui Recorrente que o Tribunal Judicial da Comarca de Portimão é competente para apreciar a questão exposta nos autos.

3- Não se verifica a excepção dilatória de falta de competência dos Tribunal Judiciais.

4- A relação jurídica em causa nos presentes autos configura uma concessão de uso privado de um estabelecimento comercial, por tempo determinado, nos termos do concurso público aberto para o efeito, com a finalidade de exploração no âmbito de um complexo desportivo e de lazer e, nessa conformidade, constituir meio de rendibilização e de receita para a autarquia, aqui Recorrente, não podendo ser qualificado, pela sua natureza e efeitos como contrato administrativo.

5- Não estamos, assim, perante contrato administrativo, ou concessão administrativa.

6- Mais é notório que o aqui Recorrente não estava investido de "jus imperii".

7- Clara é a violação ao disposto nos artigos 211º, nº. 1 da CRP, 66º do CPC e, ainda 18º, nº 1 da LOFTJ.

8- Foram mal interpretadas as competências dos Tribunais Comuns 9- Mais é evidente a má interpretação do disposto no artigo 494º do CPC.

10- Assim, em respeito ao disposto nos 211º, nº 1 da CRP, 66º do CPC e, ainda 18º, nº. 1 da LOFTJ, deverá ser considerado competente para julgar os presentes autos o Tribunal Judicial da Comarca de Portimão.” ÂMBITO DO RECURSO – DELIMITAÇÃO Face às conclusões formuladas a questão submetida à nossa apreciação consiste, tão só, em saber se os tribunais comuns são os competentes para conhecer da presente acção.

Entendeu o tribunal “a quo” que o caso dos autos se insere no âmbito das atribuições e competências da Câmara Municipal, tratando-se, por conseguinte de actos de gestão pública, estando a mesma e nessa medida “subordinada a regras de direito público, pressupondo que actue com observância dos procedimentos legais, tais como os referentes a actos de concurso público, para atribuição de concessão e exploração de estabelecimentos, como é o caso dos autos”.

Vejamos.

Estabelece o art. 66º do Código de Processo Civil, traduzindo em lei ordinária a norma do art. 211º, nº 1 da CRP [2], que “são da competência dos tribunais judiciais as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional”.

Também o art. o 26.º n.º 1 da LOFTJ estabelece que os tribunais judiciais têm competência para as causas que não sejam atribuídas a outra ordem jurisdicional.

Temos assim que a competência dos tribunais judiciais é residual, ou seja, a eles cabe conhecer de todas as matérias que não forem especificamente atribuídas pela lei a outra jurisdição.

Entendeu o tribunal “a quo” que a competência para a presente acção era dos tribunais administrativos.

Impõe-se assim, para aferição do acerto desta decisão, e face ao estabelecido naquelas normas, averiguar se está legalmente atribuída aos tribunais administrativos a competência para conhecer da relação jurídica em causa nesta acção.

Nos termos do art. 212º, nº 3 da CRP, “compete aos tribunais administrativos… o julgamento das acções e recursos contenciosos que tenham por objecto dirimir os litígios emergentes das relações jurídicas administrativas…”.

“Esta qualificação transporta duas dimensões caracterizadoras: (1) as acções e recursos incidem sobre relações jurídicas em que, pelo menos, um dos sujeitos é titular, funcionário ou agente de um órgão do poder público (especialmente da administração), (2) as relações jurídicas controvertidas são reguladas, sob o ponto de vista material, pelo direito administrativo ou fiscal. Em termos negativos, isto significa que não estão aqui em causa litígios de natureza...

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