Acórdão nº 207.06.7GCAB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 21 de Novembro de 2007

Magistrado ResponsávelGABRIEL CATARINO
Data da Resolução21 de Novembro de 2007
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam, na secção criminal, do Tribunal da Relação de Coimbra.

  1. - Relatório.

    Em dissídio com o julgado prolatado no processo supra epigrafado, em que na procedência da acusação alentada pelo Ministério Público contra A..

    ., casado, desempregado, nascido a 6 de Novembro de 1962, natural da freguesia de Benedita, concelho de Alcobaça, filho de Luís Faustino Castelhano e de Maria da Trindade Félix, residente na Rua D. Maria Pia, n.º 78, Venda da Rega, Benedita, o condenou "pela prática, em autoria material, na forma consumada, e em concurso real: a) - de um crime de condução perigosa de veículo rodoviário p. e p. pelos art.º 291.º n.º 1 al. b) e 69.º n.º 1 al. a) do Código Penal, na pena de 260 dias de multa, à taxa diária de € 5,00, no montante total de € 1.300,00 e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de sete meses; - de um crime de desobediência p. e p. pelo art.º 348.º n.º 1 al. b) do Código Penal, na pena de 95 dias de multa, à taxa diária de € 5,00, no montante total de € 475,00; - de um crime de desobediência p. e p. pelo art.º 348.º n.º 1 al. b) do Código Penal, na pena de 95 dias de multa, à taxa diária de € 5,00, no montante total de € 475,00; - b) condenar o arguido, em cúmulo jurídico, pela prática dos crimes referidos em a), na pena única de 380 dias de multa, à taxa diária de € 5,00, no montante total de € 1.900,00 e na pena acessória de proibição de conduzir veículos motorizados pelo período de sete meses; - c) condenar o arguido A... pela prática de uma contra-ordenação p. e p. pelo art.º 55.º n.º 1 e 3 do Código da Estrada na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 44/2005 de 23/02 e art.º 7.º da Portaria n.º 311-A/2005 de 24/03, na coima de € 200,00 e na sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de dois meses; - d) condenar o arguido pela prática de uma contra-ordenação p. e p. pelo art.º 4.º n.º 1 e 2 do Código da Estrada na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 44/2005 de 23/02, na coima de € 120,00; - e) condenar o arguido pela prática de uma contra-ordenação p. e p. pelo art.º 4.º n.º 3 do Código da Estrada na redacção que lhe foi dada pelo Decreto-Lei n.º 44/2005 de 23/02, na coima de € 500,00; - f) condenar o arguido, pela prática das contra-ordenações referidas de c) a e), na coima única de € 650,00 e na sanção acessória de inibição de conduzir pelo período de dois meses", recorre o Ministério Público, tendo rematado a motivação com que cevou o alor recursivo pela forma seguinte: " 1ª - Vem o presente recurso interposto da douta Sentença apenas na parte, em que respeitante à forma como nela se efectuou o cúmulo jurídico das coimas nas quais o arguido Nuno Feliz Castelhano viria a ser condenado; 2ª - O Direito Estradal/Rodoviário, previsto no Código da Estrada de Diplomas Regulamentares é um "direito especial" em relação ao "direito geral", enunciado no Regime Geral das Contra-Ordenações e Coimas, previsto no D.L. nº 433/82, de 27 de Outubro; 3ª - Na interpretação das referidas normas jurídicas, vigora o princípio "lex specialis derrogat lex legi generali "; 4ª - Existindo duas normas concorrentes potencialmente aplicáveis ao caso sub judice e no confronto entre ambas (artigo 19º, do D.L. nº 433/82, de 27/10 e 134º, nº 3, do Código da Estrada, aprovado pelo D.L. nº 44/2005, de 23 de Fevereiro), deve prevalecer a norma especial, dado que a mesma derroga a norma de carácter geral; 5ª - Destarte, deveria a douta Sentença a quo ter condenado o arguido A... na coima única de 820,00€ (oitocentos e vinte Euros), por interpretação e aplicação do disposto no artigo 134º, nº 3, do Código da Estrada; 6ª - Ao ter decidido de forma diversa da agora sustentada, violou a douta Sentença a quo, por aplicação indevida, o disposto no artigo 19º, do D.L. nº 433/82, de 27 de Outubro e, por inaplicação indevida, o disposto no artigo 134º, nº 3, do Código da Estrada; 7ª - Pelo que a douta Sentença a quo deverá ser substituída por outra que, nesta parte, condene o arguido A..., em cúmulo jurídico, material, na coima única referida na 5ª conclusão da presente motivação de recurso, pela prática das contra-ordenações enunciadas nas alíneas c) a e), do Dispositivo da douta Sentença a quo".

    Nesta instância, o Exmo. Senhor Procurador-geral Adjunto, emite diserto parecer em que opina pela improcedência do recurso, com a argumentação que a seguir se deixa transcrita, na parte interessante.

    "Ora, sobre o objecto de recurso, pese embora o muito devido e merecido respeito pela posição do Exmo. Procurador-Adjunto recorrente, a quem reconhecemos e louvamos pelo seu dinamismo e voluntarismo, deveremos porém desde já dizer que se nos afigura que a decisão não nos merece censura, o que significa que não acompanhamos o seu recurso.

    Entende o Ministério Público na 1.ª instância que o n.º 3 do artigo 134.º do Código da Estrada inviabiliza a efectivação de cúmulo jurídico às contra-ordenações, pelo que terá de operar-se sim é um cúmulo material.

    Julgamos porém, que não será essa a melhor hermenêutica a colher de tal normativo. Com efeito, sob a epígrafe, Concurso de infracções, prescreve o artigo 134.º do Código da Estrada: "I - Se o mesmo facto constituir simultaneamente crime e contra-ordenação, o agente é punido sempre a título de crime, sem prejuízo da aplicação da sanção acessória prevista para a contra-ordenação.

    2-A aplicação da sanção acessória, nos termos do número anterior, cabe ao tribunal competente para o julgamento do crime.

    3-As sanções aplicadas às contra-ordenações em concurso são sempre cumuladas materialmente.

    " Ora, temos para nós que o normativo deverá ser entendido no seu específico contexto, ou seja, para a hipótese de se verificar que os factos integram simultaneamente crime e contra-ordenação, devendo assim os mesmos ser punidos a título de crime, e perdendo por isso autonomia a contra-ordenação correspondente, mas, como desde logo se refere no n.º 1, ficando salvaguardada a aplicação complementar da sanção acessória de natureza contra-ordenacional prevista para a contra-ordenação, conferindo por sua vez o n.º 2 ao julgador criminal a respectiva competência para essa aplicação.

    O que o n.º 3 consagra pois, ao referir-se às "sanções aplicadas às contra-ordenações em concurso" é tão só um cúmulo material sim mas de SANÇÕES ACESSÓRIAS de contra-ordenações dos factos que, em concurso ideal, ficaram subsumidos pelos correspondentes crimes.

    Nada mais do que isso, pelo que, como é o caso sub judice, fora desse contexto de concurso entre crime e contra-ordenação, em autónoma e restrita matéria contraordenacional, nada obsta ao cúmulo jurídico do artigo 19º do D.L. n.º 433/82, de 27/10".

    A restrita questão que vem submetida, por via do recursos interposto, à apreciação deste tribunal cingir-se-ia em apurar se o artigo 134º do Código da Estrada, enquanto norma qualificada de especial, impõe ao tribunal a obrigação de acumular materialmente as coimas em que o autor da infracção haja sido condenado ou se, ao invés, consente a sua acumulação jurídica.

    A entrada em vigor das 15ª e 23ª alterações dos Código de Processo Penal e do Código Penal, operadas através das Leis nº 48/2007, de 29.08 e 04.09, respectivamente, provocaram modificações sensíveis no regime de apresentação e notificação de individuo detido em flagrante delito e que haja de ser sujeito a julgamento em processo sumário. A norma que cominava obrigatoriedade de as autoridades que procediam à detenção do autor do acto ilicito - artigo 387º, nº2 do Código de Processo Penal - foi alterada não sendo possível, no regime actual, as...

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