Acórdão nº 1118/07-2 de Tribunal da Relação de Guimarães, 17 de Setembro de 2007

Magistrado ResponsávelCRUZ BUCHO
Data da Resolução17 de Setembro de 2007
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, no Tribunal da Relação de Guimarães:*I – Relatório No Processo Comum Singular n.º 496/03.9TAEPS do 1º Juízo do Tribunal Judicial de Esposende, por despacho de 31 de Janeiro de 2007, foi decidido: «A) Absolver os arguidos MC, MM, e NG -, Lda. pela prática de um crime de abuso de confiança contra a segurança social, previsto e punível pelos arts. 107.º, e 105.º, n.º 1, do Regime Geral das Infracções Tributárias (RGIT), aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho, por que vinham acusados; B) Conhecer da excepção dilatória de violação do princípio da adesão e, em consequência, absolver os demandados de instância quanto ao pedido de indemnização cível contra si deduzido pelo Instituto de Solidariedade e Segurança Social.»*Inconformado com tal despacho, o Ministério Público e o Instituto de Segurança Social dele interpuseram recurso pedindo a sua revogação.

*São as seguintes as conclusões apresentadas pelo Ministério Publico (transcrição): 1. Confrontando o regime anterior (RGIT) com aquele que entrou em vigor no transacto dia 1 de Janeiro, para que se verifique um crime de abuso de confiança fiscal é sempre necessário, para além do decurso do prazo de 90 dias sobre o termo do prezo legal da entrega da prestação, existir o não pagamento na sequência de uma notificação para que o agente, em 30 dias, proceda ao pagamento da prestação comunicada à Administração Fiscal, acrescida de juros e do valor da coima aplicável; 2. A alínea b) do n.º 4 do artigo 105.° do RGIT não veio, propriamente, acrescentar nenhum elemento novo ao tipo legal do mesmo preceito, na sua redacção anterior à alteração operada pela Lei n,o 53-A/2006, de 29 de Dezembro, tendo-se limitado, como limitou, a alargar o âmbito de uma causa de exclusão da punibilidade que já se encontrava prevista no n.º 6 do mesmo artigo, embora com uma previsão mais restrita; 3. Para além disso, também nenhuma alteração foi, a nosso ver, introduzida no tipo-de-ilícito ou de culpa da norma em questão, que mantém todos os seus traços anteriores; 4. É quanto a nós inegável verificar-se, in casu, uma continuidade típica entre o artigo 105° do RGIT antes e depois da entrada em vigor da citada Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, e, por isso mesmo, uma sucessão de leis penais em sentido estrito, a resolver mediante a aplicação retroactiva da lex mitior - que, na ausência de outras alterações relevantes ao regime punitivo dos crimes fiscais, é inevitavelmente a que agora se encontra em vigor; 5. Concluímos dizendo que a Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, operou, relativamente ao artigo 105° do RGIT, uma sucessão de leis penais em sentido estrito, a resolver pela aplicação retroactiva do novo regime penal do abuso de confiança fiscal, por ser o mais favorável.

  1. Como tal deve ser revogado o despacho recorrido e substituído por outro que, com nota de urgente, oficie à Direcção de Finanças do Distrito do Braga para que, nos termos previstos na nova alínea b) do n.º 4 do artigo 105° do RGIT, na redacção que a este preceito foi dada pela Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro, proceda à notificação dos arguidos para, no prazo de 30 dias, procederem ao pagamento das prestações tributárias por eles em dívida e aqui em causa, acrescidas dos respectivos juros moratórios e do valor da coima aplicável; 7. Declarando ainda suspenso os ulteriores termos do processo até que se mostre efectuada a notificação em questão e decorrido o -prazo legalmente previsto para a realização do pagamento aludido.» *Por seu turno o assistente remata a sua motivação com as seguintes conclusões (transcrição): «1.- No douto despacho recorrido, o Meritíssimo Juiz “a quo” entendeu absolver os arguidos de um crime de abuso de confiança contra a segurança social e, em consequência a absolvição do pedido de indemnização formulado pela segurança social.

  2. - Deveria ter-se procedido a uma correcta aplicação do disposto na Lei n.º 53-A/2006, de 29 de Dezembro que introduziu várias alterações ao Regime Geral das Infracções Tributárias aprovado pela Lei n.º 15/2001, de 5 de Junho.

  3. - Deveria ter-se procedido a uma correcta aplicação do disposto na alínea b) do n.º 4 do artigo 105° da Lei n.º 15/2006, de 5 de Junho.

  4. - Foi ignorado o disposto no n.º 4 do artigo 2° do Código Penal e n.º 4 do artigo 29° da Constituição da República Portuguesa, relativamente à aplicação da Lei mais favorável.

  5. - O Meritíssimo Juiz do Tribunal, "a quo", na douta sentença que ora se recorre, violou a alínea b) do n.º 4 do artigo 105° da Lei n.º 15/2006, de 05 de Junho, o n.º 4 do artigo 2° do Código Penal e o n.º 4 do artigo 29° da Constituição da Republica Portuguesa.

  6. Os arguidos, deveriam ser notificados, para, querendo, procederem, no prazo de 30 dias, ao pagamento das prestações tributárias em dívida, acrescidas dos juros respectivos e do valor das coimas aplicáveis junto da administração tributária, informando-os de que o mencionado pagamento determinará a extinção do presente procedimento criminal.

Termos em que, o douto despacho recorrido deverá ser revogado e substituído por outro, que notifique os arguidos, para, querendo, procederem, no prazo de 30 dias, ao pagamento das prestações tributárias em dívida, acrescidos dos juros respectivos e do valor das coimas aplicáveis junto da administração tributária, informando-os de que o mencionado pagamento determinará a extinção do presente procedimento criminal, com todas as ínsitas consequências.»*Os recursos foram admitidos, para o Tribunal da Relação de Guimarães, por despacho constante de fls. 362.

*Nesta Relação o Exmo Procurador-Geral Adjunto emitiu douto parecer pronunciando-se pela procedência do recurso interposto pelo Ministério Público.

*Efectuado exame preliminar e colhidos os vistos prosseguiram os autos para conferência.

*II- Fundamentação 1. É o seguinte o teor do despacho recorrido (transcrição): “ Entre a data da prática dos factos e a presente sucedem-se duas leis penais diferentes, no que concerne aos pressupostos de punição do crime de abuso de confiança contra a segurança social. Este fenómeno é regulado no art. 2.º do CP, cuja aplicação implica desde logo a destrinça entre situações de mutação do próprio tipo incriminador, que podem levar à conclusão da descriminalização da conduta, nos termos do n.º 2 do supracitado artigo, e outras, que partem de situações de continuidade normativo-típica, alterando-se...

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