Acórdão nº 00106983 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 21 de Março de 2001

Magistrado ResponsávelSANTOS CARVALHO
Data da Resolução21 de Março de 2001
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Rec. nº 10698/2000, 3ª Secção Acordam em conferência na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Lisboa: No presente processo comum com intervenção de tribunal singular, proveniente do 2º Juízo Criminal de Oeiras, onde tem o nº 1039/96.4PEOER, o arguido (N) vem acusado pela autoria de um crime de furto simples, p.p. no artº 203º do Código Penal, por, em 15 de Dezembro de 1996, ter retirado do interior do hipermercado "(J)" diversos objectos sem os pagar e deles ter feito coisa sua, contra a vontade do dono.

Contudo, no despacho liminar, o Mmº Juiz lavrou despacho em que, considerando a natureza semi-pública do crime em apreço e tendo em atenção que quem tinha feito a queixa crime era um mandatário não judicial, munido de procuração com poderes especiais para praticar uma certa categoria ou classe e actos, mas destituído de poderes especiais especificados, tal como, na sua opinião, exige o artº 49º, nº 3, do CPP, ordenou a notificação pessoal da ofendida para, no prazo de 15 dias, ratificar a queixa apresentada, por si, por mandatário judicial ou por mandatário não judicial munido de poderes especiais especificados, sob pena de rejeição da acusação deduzida e consequente arquivamento do processo.

Foi desse despacho que recorreu o Ministério Público e, da sua fundamentação, concluiu que (transcrição): 1) O despacho ora recorrido determinou o arquivamento dos autos por considerar que o Ministério Público carecia de legitimidade para o exercício da acção penal.

2) O Mmº Juiz "a quo" fundamentou tal decisão com a aplicação do Acórdão de fixação de jurisprudência nº 2/92, de 13/5, exigindo poderes especiais especificados ao mandatário da lesada, ao interpretar o artº 49, nº 3 do Código de Processo Penal.

3) Entendemos que o Ministério Publico tem legitimidade para a prossecução do processo porque foi eficazmente e tempestivamente exercido o direito de queixa, uma vez que o mandato conferido ao mandatário atribui-Ihe poderes para, entre outros actos, apresentar queixas crime por crimes de furto que ocorram nos estabelecimentos comerciais de que é proprietária.

4) A especificação dos poderes justifica se para garantir que a vontade do mandante/titular do direito de queixa seja verdadeiramente a de exercer esse direito no que diz respeito ao delito que concretamente é denunciado.

5) No caso dos autos não se verifica o perigo de desconformidade entre a queixa apresentada e a vontade da pessoa colectiva: 6) É razoável que a sociedade comercial, que explora economicamente um hipermercado pretenda que alguns dos seus funcionários exerçam, em seu nome, o direito de queixa por furtos ali praticados, e que o faça de modo genérico, por forma a abranger todas as situações em que esses delitos ocorram, dada a frequência da sua prática.

7) É o próprio Acórdão que admite poderem existir situações em que cessa a disposição do artº 49º, nº 3 do Código de Processo Penal, de exigência de poderes especiais especificados, por estar acautelada a verificação de divergência entre a vontade do lesado e aquela que é transmitida ao Tribunal pelo mandatário não judicial, uma vez que a ratio legis daquele preceito é tão somente esta garantia.

8) No caso sub judice a especificação feita na procuração é a adequada e satisfaz plenamente as exigências de certeza que o artº 49º, nº 3 do CPP manda que se verifiquem pelo que o Ministério Público tem legitimidade para a prossecução do processo porque foi eficazmente e tempestivamente exercido o direito de queixa.

9) Pelo que é neste sentido que o artº 49º, nº 3 deveria ter sido interpretado e aplicado ao caso.

10) Sendo a queixa perfeitamente válida, é legitima a promoção do processo pelo Ministério Público, pelo que inexiste fundamento para o arquivamento dos autos.

11) Tendo a decisão recorrida violado a norma contida nos artºs 48º, 49º, nº 3 do Código de Processo Penal.

Termos em que se requer que o recurso seja julgado procedente e seja, em consequência, a decisão judicial substituída por outra em que a queixa seja considerada válida, reconhecendo-se legitimidade ao Ministério Público para o exercício da acção penal e consequentemente proferido despacho de recebimento da acusação quanto ao crime de furto p.p. no artº 203 do CP seguindo o processado os trâmites legais subsequentes até final.

-X- O arguido respondeu ao recurso no sentido da sua não procedência e o Mmo. Juiz "a quo" sustentou o douto despacho recorrido.

Nesta Relação, o Exmo. Procurador Geral Adjunto pronunciou-se no sentido de que o recurso merecia provimento.

-X- Colhidos os vistos e realizada a conferência com o formalismo legal, cumpre decidir.

Dos autos verifica-se que no dia 15 de Dezembro de 1996, o arguido (N) retirou das prateleiras do hipermercado "(J)", em Alfragide, diversos artigos que escondeu debaixo de um blusão que vestia, tendo passado a caixa de pagamentos sem os pagar, pelo que foi detido por um agente de P.S.P.

No mesmo dia, foi apresentado um requerimento no Posto da P.S.P de...

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