Acórdão nº 0711856 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 11 de Julho de 2007

Magistrado ResponsávelPAULO VALÉRIO
Data da Resolução11 de Julho de 2007
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

ACÓRDÃO (Tribunal da Relação) Recurso n.º 1856/07 Processo n.º …/02.9 PPPRT Acórdão em audiência na 1.ª secção criminal do Tribunal da Relação do Porto RELATÓRIO 1- Na ..ª vara criminal do Tribunal do Porto, no processo acima referido, foi o arguido B………. julgado em processo comum, com tribunal colectivo, e condenado pela prática, em autoria material e em concurso real de : -1 crime de maus-tratos a cônjuge p. e p. pelo art. 152°, n.°2 do Código Penal em que é ofendida C………., na pena de 2 anos de prisão; - 1 crime de maus-tratos a menor p. e p. pelo art. 152°, n.°l, alínea a) do Código Penal em que é ofendido D………., na pena de dois anos de prisão ; - 1 crime de maus-tratos a menor p. e p. pelo art. 152°, n.°l, alínea a) do Código Penal em que é ofendido E………., na pena de dois anos de prisão; - Em cúmulo jurídico de todas as referidas penas, condenado na pena única de 3 anos de prisão, suspensa na sua execução pelo período de 4 anos, sujeita, pela duração da suspensão, às seguintes condições, em conformidade com o preceituados nos artigos 50º, 52º, nº 1 e nº 2 do C. Penal: - Obter apoio clínico especializado junto do Gabinete de Apoio à Vítima (F……….), dando o seu consentimento prévio, por forma a desenvolver competências de relacionamento prosocial, com acompanhamento do Instituto de Reinserção Social; - Abster-se de interferir, por qualquer forma, na vida pessoal da assistente C………., apenas a podendo contactar dentro do estritamente necessário para zelar pelos interesses dos filhos de ambos, designadamente do ainda menor G………. .

Condenar o arguido a pagar a cada um dos ofendidos C………., D………. e E………. a quantia de € 5.000,00, como compensação pelos danos não patrimoniais que lhes causou.

2- Inconformado, interpôs recurso o arguido, concluindo a sua motivação do seguinte modo: Há insuficiência para a decisão da matéria de facto provada, no acórdão recorrido, já que não resulta da audiência de discussão e julgamento prova suficiente para que sejam dados como provados, e que devam ser considerados integradores para imputar ao arguido os três crimes de maus-tratos por que foi condenado; Há contradição insanável na, fundamentação, já que há factos dados como provados que contrariam frontalmente a prova produzida por documentos e testemunhal; Na maior parte dos factos relatados, que eventualmente serviriam de base à condenação, não estão balizados no tempo, não estão concretizados, e portanto, sempre haveria lugar à prescrição do procedimento criminal, e à falta de legitimidade processual (no caso das injúrias - a falta de constituição de assistente); Dos únicos factos que se encontram concretizados temporalmente, não foi feita prova suficiente para condenar o arguido nos crimes de maus-tratos; Eventualmente, a entender-se que houve prova, o que por mera hipótese se admite, o arguido apenas poderia ser condenado pelo crime de ofensas corporais simples; O valor das indemnizações cíveis a que, foi condenado o Recorrente, são manifestamente exageradas, face à falta de nexo de causalidade; Assim, houve violação do princípio "in dúbio pro reo ", e dos arts. 410°, n° 2, alíneas a) e b) e art. 68° do CódProcPenal, e arts. 113°, 115° e 118°, do Cód Penal.

4- Nesta Relação, o Exmo PGA, acompanhando o parecer do MP na 1.ª instância, pronunciou-se no sentido de ser negado provimento ao recurso do arguido 4- Foram colhidos os vistos legais e teve lugar a audiência de discussão e julgamento.

+FUNDAMENTAÇÃO Os factos Na 1.ª instância deram-se como provados os seguintes factos: 1- O arguido casou com a assistente C………. no dia 8 de Janeiro de 1983, tendo deste casamento nascido a 7 de Julho de 1983 o ofendido D………., a 5 de Agosto de 1986 o ofendido E………. e a 4 de Março de 1994 o G……….; 2- O casal viveu sempre na cidade do Porto, inicialmente na ………. e, posteriormente, até à separação, ocorrida em Março de 2003, na Rua ………., n.° .., .º esquerdo; 3- Pouco tempo após o início da vida em comum, no interior da residência do casal, o arguido começou a encetar discussões com a assistente, no decurso das quais a apelidava de "puta", "vaca", afirmando que a mesma tinha "amantes"; 4- Era também no decurso dessas discussões que o arguido desatava a agredir a assistente com bofetadas na cara, puxões de cabelo, a qual sofreu, durante aquele período de tempo, por vezes hematomas e equimoses que, no início e por vergonha, procurava esconder da pessoas suas conhecidas; 5- De igual modo o arguido agredia os seus filhos, D………. e E………., fazendo com que estes ofendidos crescessem num ambiente de intimidação; 6- Assim, com uma periodicidade praticamente semanal o arguido encetava discussões com os filhos D………. e E………. e, seguidamente, agredia-os, puxando-lhes os cabelos, batendo-lhes com os nós dos dedos na nuca, desferindo-lhes pancadas na parte lateral dos músculos dos braços e na parte lateral externa das coxas, deixando-o sem qualquer reacção; 7- Ao E………. o arguido ordenava também que retirasse os óculos e, seguidamente, desatava a agredi-lo, por vezes munido de um cinto; 8- Igualmente o arguido desferia pancadas nos objectos que cada um dos filhos mais gostava, procurando estragar a guitarra ao D………. e o computador ao E………., causando-lhes enorme receio por temerem ver-se privados de tais objectos; 9- No dia 21 de Dezembro de 2002, cerca das 18h20, no interior da residência do casal, sita na Rua ………., n.°.., .º esquerdo, na sequência de uma discussão por ele encetada, o arguido desferiu à assistente C………. uma bofetada que a atingiu na cara e no olho direito, causando-lhe dores; 10- Nesse mesmo dia 21 de Dezembro de 2002, cerca das 20h00, ainda no interior da mencionada residência do casal, o arguido iniciou mais uma discussão com a assistente C………., no decurso da qual afirmou que ela "tinha amantes", afirmando-lhe que a iria agredir; 11- Em dia não concretamente determinado mas situado no final do ano de 2002, quando o ofendido E………. se encontrava na via pública, junto à sua residência, a falar com amigos, o arguido abeirou-se dele, desatando a gritar-lhe ao mesmo tempo que descalçou os chinelos que trazia nos pés e arremessou-lhos, atingindo-o no tronco e na cabeça; 12- No dia 1 de Fevereiro de 2003, a hora não concretamente determinada, e também no interior da residência do casal, o arguido dirigindo-se à assistente C………. apelidou-a de "puta", mais declarando "isto não fica assim!".

13- No dia 3 de Fevereiro de 2003, a hora não concretamente determinada, no interior da residência do casal, o arguido dirigiu-se ao quarto do D………. e abanou com força o beliche onde a assistente C………. dormia, fazendo com que o mesmo se desconchabasse, sendo certo que nessa altura já não dormiam na mesma cama; 14- No dia 28 de Fevereiro de 2003, cerca das 8h00, no interior da residência do casal, o arguido encetou nova discussão com a assistente C………. no decurso da qual retirou as chaves de todos os compartimentos da casa por forma a impedir que ela se fechasse no interior dos mesmos; 15- Poucos dias volvidos e quando a assistente se encontrava no interior da casa de banho da residência do casal envergando apenas umas cuecas e um soutien o arguido abriu a porta - uma vez que havia previamente retirado as chaves da mesma impedindo que a assistente a trancasse quando ali se encontrava -, abeirou-se dela e tentou arrancar-lhe as cuecas, causando-lhe sentimentos de humilhação; 16- No dia 6 de Março de 2003, da parte da manhã, ainda no interior da residência do casal, o arguido quando se apercebeu que a assistente se encontrava na casa de banho acedeu ao interior deste cómodo e desatou a discutir com ela, afirmando-lhe que a porta da casa de banho deveria estar sempre aberta quando ela ali se encontrasse, ao mesmo tempo que lhe arrancou da cabeça uma toalha com que ela segurava o cabelo, puxando-lhe assim os cabelos; 17- Cerca das 22h30 do dia 8 de Março de 2003, sempre no interior da residência do casal, o arguido encetou nova discussão com a assistente C………., no decurso da qual atirou à cara desta uma costeleta de porco, causando-lhe um ferimento junto ao olho esquerdo; 18- Após este dia e não suportando mais esta situação a assistente e os filhos abandonaram a residência do casal; 19- No entanto, e pese embora esta separação, em ocasião que não foi possível apurar do mês de Novembro de 2003, altura em que tomou conhecimento da nova morada da assistente, o arguido passou a perseguir a assistente e os filhos, e, sempre que os encontrava, apelidava a ofendida de "puta", vaca" e que os filhos não eram dele, expressões estas que muito ofendiam a C………. .

20- Nessa mesma altura, o arguido passou a perseguir a assistente quando ela se deslocava para o local de trabalho, passando pela mesma de carro, e apelidando-a de prostituta.

21- De igual modo, desde ocasião que não foi possível apurar do mês de Novembro de 2003 e até Janeiro de 2005, com uma periodicidade quase diária, o arguido colocou-se frente à residência da ofendida sita na Rua ………., n.° …, .º, no Porto, procurando observar os movimentos da C………. e dos filhos, e fazendo-se ver pela ofendida, de forma a que esta se sentisse constrangida.

22- Durante o aludido período de tempo o arguido causou à assistente sofrimento ao nível físico, como consequência das agressões que o mesmo lhe infligiu, bem assim sofrimento profundo ao nível psíquico pela humilhação, nervosismo, constrangimento, desgosto, medo e vergonha a que o mesmo a sujeitou ao tratá-la da forma acima descrita, utilizando as expressões que acima se descreveram que a ofenderam na sua honra tendo-lhe causado instabilidade emocional, que se reflectiu na sua vida do dia a dia. A assistente sentiu-se insegura, nervosa, temerosa, incapacitada e limitada na sua liberdade de circulação, por constante receio de se deparar com o arguido. Foi submetida a tratamento medico - psiquiátrico, bem como a medicação anti depressiva como "Zoloft", "Olcadil", "Diazepam" "Remeron"; 23- A assistente ainda sente receio pela saúde e segurança, física e psicológica dos...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT