Acórdão nº 0732733 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 14 de Junho de 2007
Magistrado Responsável | JOSÉ FERRAZ |
Data da Resolução | 14 de Junho de 2007 |
Emissor | Court of Appeal of Porto (Portugal) |
Acordam no Tribunal da Relação do Porto 1) - Em processo de recuperação de empresa (nº ……/2002, do segundo Juízo do Tribunal de Comércio de Vila Nova de Gaia), instaurado pela requerente "B………………., S.A.", em 27 de Maio de 2002, foi determinado o prosseguimento da acção como processo de recuperação de empresa, por despacho de 01/10/2002, tendo sido convocada a assembleia de credores para 27 de Novembro de 2002.
Desde a publicação do anúncio da assembleia no Diário da República, em 25 de Outubro de 2002, decorreram mais de seis meses sem que a assembleia de credores deliberasse.
Pelo que, por sentença de 02.02.2004, transitada em julgado, proferida pelo referido ..º Juízo do Tribunal de Comércio de Vila Nova de Gaia, foi decretada a falência de "B……………., S.A.", pessoa colectiva nº 501 805 435, com sede na Rua …………., ….., …º, Habitação .., Porto.
Para a massa da falência foram apreendidos bens móveis e um bem imóvel.
Além de outros credores, o C………………., S.A., reclamou um crédito de € 1 147 853,69, garantido por hipoteca sobre o imóvel apreendido - "prédio urbano, descrito na Conservatória do Registo Predial de Felgueiras sob o número noventa e inscrito na matriz respectiva da freguesia de ……. (Felgueiras) no artigo 304" - até ao montante máximo de € 1 081 142,50.
Foram julgados reconhecidos os créditos reclamados.
Seguidamente foram esses créditos graduados, no que respeita ao imóvel apreendido, nos seguintes termos: "I - Pelo produto da venda do bem imóvel apreendido, dar-se-á pagamento: 1º - As custas da falência, as despesas da administração (cfr. crédito n.º 4) e todas as demais custas que devam ser suportadas pela massa falida saem precípuas; 2º - Do remanescente, dar-se-á pagamento aos créditos indicados sob os nºs. 6, 15, 16, 20, 21, 23 a 63, 65 a 95, 97 a 148, 150, 156, 165, 166, 168, 175, 227, 229, e 231 a 235, em pé de igualdade e rateadamente, se for necessário; 3º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito hipotecário do C…………….., S.A., no montante de € 1.081.142,50; 4º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito hipotecário do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social, no montante de € 1.858.585,20; 5º - Do remanescente, dar-se-á pagamento ao crédito privilegiado do Instituto de Gestão Financeira da Segurança Social no montante de € 563.506,16; 6º - Do remanescente, se remanescente houver, serão pagos, em pé de igualdade e em rateio, os restantes créditos".
Sendo os créditos mencionados graduados em 2º lugar (atrás referidos) os créditos laborais dos trabalhadores, emergentes dos contratos de trabalho com a sociedade falida e sua cessação.
2) - Discordando do sentenciado, quanto à graduação do seu crédito em 3º lugar, recorre o credor hipotecário - C……………, S.A.
Alegando, conclui: "I. A sentença de graduação de créditos graduou incorrectamente, os créditos dos ex-trabalhadores, ao considerá-los com preferência sobre o produto da venda do imóvel dado de hipoteca, em detrimento dos créditos garantidos pela hipoteca constituída sobre o prédio acima descrito.
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A data da falência da firma "B………… " deveria ser fixada em 25 de Junho de 2003.
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Data em que ocorreu a sua falência por força da aplicação do n.º 1 do artigo 53.° do CPEREF.
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Nunca, em 2 de Fevereiro de 2006, como fixado na Douta sentença recorrida.
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E, em 25 de Junho de 2003 não estava em vigor (nem tampouco publicada em Diário da República) a Lei n. ° 99/2003, de 27 de Agosto.
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Desta forma, o artigo 377.° do Código do Trabalho não é aplicável aos presentes autos.
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Já que, em 27 de Maio de 2002 a "B………… " apresentou-se a processo especial de recuperação de empresa ao abrigo do Decreto-Lei n.º 132/93, de 23 de Abril.
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E, em 1 de Outubro de 2002 foi proferido o despacho de prosseguimento da acção como processo de recuperação de empresa.
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O anúncio previsto no n.º 1 do artigo 43 do CPEREF foi publicado em Diário da República em 25 de Outubro de 2002.
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O n.º 1 do artigo 53.° do CPEREF estatuí que "Se a assembleia de credores não deliberar dentro dos seis meses subsequentes à data da publicação no Diário da República do anúncio a que se refere o n° 1 do artigo 43°, caducam os efeitos do despacho de prosseguimento da acção, devendo ser declarada, ao mesmo tempo, a falência da empresa".
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Conjugando tal preceito com a possibilidade de suspensão da instância nos termos do n.º 3 do artigo 10° do Decreto-Lei n.º 316/98, de 20 de Outubro, por um período máximo de quatro meses.
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Temos de concluir que a assembleia de credores teria de deliberar sobre a adopção, ou não, de uma medida de recuperação, em tese, até ao dia 25 de Agosto de 2003, sob pena de caducar o despacho de prosseguimento da acção e ser, de imediato, declarada a falência da requerente "B………… ".
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Nos presentes autos foi requerida, e deferida, a suspensão da instância nos termos do Decreto-Lei n.º 316/98, de 20 de Outubro pelo prazo de dois meses.
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Como tal, a assembleia de credores teria de deliberar sobre a adopção, ou não, de uma medida de recuperação até ao dia 25 de Junho de 2003, sob pena de caducidade do despacho de prosseguimento da acção proferido a 1 de Outubro de 2002 e, publicado em Diário da República em 25 de Outubro de 2002.
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Decorrido o prazo previsto na lei para a aprovação/proposição de uma medida de recuperação, não veio a ser aprovada qualquer medida que viabilizasse a sobrevivência da "B………….. ".
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Como consequência necessária e directa de tal facto, caducaram os efeitos do despacho de prosseguimento da acção e, dessa forma, a empresa requerente deveria ser (como foi), de imediato, declarada falida.
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A data da falência da firma "B………… " deve ser fixada em 25 de Junho de 2003, data em que não se encontrava em vigor o Código do Trabalho que apenas entrou em vigor a 1 de Dezembro de 2003.
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E, o facto que originou a declaração de falência da "B…………" - o decurso do prazo previsto no n.º 1 do artigo 53.° do CPEREF - ocorreu em 25 de Junho de 2003; XIX. Paralelamente, a segunda parte do n.º 1 do artigo 8.° do diploma preambular da Lei n.º 99/2003, de 27 de Agosto, estatuí que, o Código de Trabalho não é aplicável quanto "[ ... ]aos efeitos de factos ou situações totalmente passados anteriormente àquele momento" (leia-se momento de entrada em vigor do Código do Trabalho); XX. Deste modo, tendo ocorrido a data da falência da "B……….. " em 25 de Junho de 2003, o Código do Trabalho, designadamente o seu artigo 377.º, não é aplicável aos presentes autos.
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Assim sendo, por não ser aplicável aos presentes autos o artigo 377.º do Código do Trabalho, deve ser revogada a Douta sentença de graduação de créditos recorrida e substituída por outra que gradue o crédito hipotecário do recorrente à frente dos créditos reclamados pelos ex-trabalhadores da "B……….. ".
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Sem prescindir, a Douta sentença em crise faz uma análise incorrecta dos factos à luz do direito vigente anteriormente - leia-se as Leis n.º 17/86 de 14 de Junho e n.º 96/2001, de 20 de Agosto; XXIII. Pois o artigo 751º do Código Civil contém um princípio insusceptível de aplicação ao privilégio imobiliário geral, por este não incidir sobre bens determinados e pelo facto de, os privilégios imobiliários gerais não serem conhecidos aquando do início da vigência do actual Código Civil, XXIV. O que implica que, dizendo o n.º 3 do artigo 735º do Código Civil que os privilégios imobiliários são especiais, só a privilégios imobiliários especiais o artigo 751º se pode referir - e só estes! - preferindo, portanto, à hipoteca.
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De harmonia com a referência aos privilégios especiais feita no dito art.º 686, n.º 1.
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O legislador, não integrou os privilégios imobiliários gerais no regime do art.º 751º e, não procedeu à alteração do regime que tal determinaria no que respeita àqueles n.º 3 do art.º 735º e n.º 1 do art.º 686º - ambos do Código Civil -, deixando subsistir enormes dúvidas susceptíveis de provocar grave insegurança no comércio jurídico e concorrendo para defraudar legítimas expectativas dos credores hipotecários, por ele próprio criadas.
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A sentença recorrida ao decidir como decidiu, e ao fundamentar a decisão à luz do direito anteriormente vigente, veio pois a defraudar as legítimas expectativas do credor hipotecário, ora recorrente.
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Que, legitimamente, esperava a graduação do seu crédito à frente do crédito dos ex-trabalhadores; XXIX. Por tudo quanto ficou dito deve, igualmente, ser revogada a Douta sentença de graduação de créditos, e substituída por outra que gradue o crédito hipotecário do recorrente à frente dos créditos reclamados pelos ex-trabalhadores da "B…………."; XXX. Paralelamente, é entendimento do recorrente ser o artigo 377.° do Código do Trabalho inconstitucional por violação do artigo 2.° da Constituição da República Portuguesa, quando interpretado no sentido de o mesmo ser aplicável a processos de falência e/ou recuperação em curso instaurados ao abrigo do CPEREF.
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Tal inconstitucionalidade resulta, e deriva, do facto de o artigo 377.° do Código do Trabalho ter vindo instituir um ónus "surpresa" que, põe em causa a fiabilidade que o registo predial merece afectando, dessa forma, as legitimas e fundadas expectativas do recorrente, na qualidade de credor hipotecário, "apunhalando pelas costas" o princípio da confiança ínsito no principio do Estado de direito democrático, constituindo ainda uma lesão desproporcionada e aviltante do comércio jurídico.
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Como já referido nas conclusões que antecedem, decorreu o prazo de deliberação da assembleia de credores; XXXIII. Como tal, o recorrente previa que, a data da falência da firma "B……….. " fosse fixada em 25 de Junho de 2003.
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Data em que ocorreu a sua falência por força da aplicação do n. ° 1 do artigo 53. ° do CPEREF.
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E nunca, em 2 de Fevereiro de 2006, como fixado na Douta sentença recorrida! XXXVI. À data que o banco recorrente reputa como sendo a data da declaração de falência da "B………….. " - 25 de Junho de 2003 - não estava em vigor (nem tampouco publicada em Diário da República) a Lei n.º 99/2003, de 27 de...
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