Acórdão nº 0111052 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 28 de Novembro de 2001

Magistrado ResponsávelCLEMENTE LIMA
Data da Resolução28 de Novembro de 2001
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam, precedendo audiência, na Relação do Porto: I1. Nos autos de processo comum (singular) n.º .../..., do -.º Juízo Criminal do Tribunal Judicial da comarca de....., o arguido, Carlos....., foi acusado, pelo Ministério Público, da prática de factos indiciariamente integradores de um crime de ofensa à integridade física por negligência, previsto e punível nos termos do disposto no art. 148.º n.º 1, com referência ao art. 144.º alíneas a) e d), do Código Penal, e, em concurso real, de um crime de omissão de auxílio p. e p. nos termos do disposto no art. 200.º n.ºs 1 e 2 do mesmo Código, bem como das contra ordenações p. e p. nos termos prevenidos nos arts. 24.º n.ºs 1 e 3, 25.º n.ºs 1, alínea f) e 2, 27.º, 35.º n.ºs 1 e 2 e 38.º, todos do Código da Estrada.

O ofendido, Vasco......, deduziu pedido de indemnização civil contra o «Gabinete Português de Certificado Internacional de Seguro (Gabinete Português Carta Verde)», no montante global de 96.924.671$00, para compensação dos danos patrimoniais e não patrimoniais resultantes do acidente dos autos.

O Hospital de.... deduziu contra o Gabinete Português Carta Verde, pedido de indemnização civil, no montante de 1.878.100$00, por assistência prestada à vitima do acidente.

O Gabinete Português Carta Verde apresentou contestação, na qual alegou a sua ilegitimidade e ainda impugnou, por desconhecimento, os factos alegados no requerimento do pedido.

O arguido não apresentou contestação.

Procedeu-se a julgamento, com registo dos actos de audiência, e veio a proferir-se Sentença (fls. 370 - 385), nos termos da qual o Tribunal a quo decidiu, no segmento que ao recurso importa: (a) condenar o arguido pela prática de um crime de ofensa à integridade física negligente p. e p. nos termos do disposto no art. 148.º n.ºs 1 e 3, do CP, na pena de sete meses de prisão. Pela prática de um crime de omissão de auxílio p. e p. nos termos do disposto no art.º 200.º n.ºs 1 e 2 do CP, na pena de seis meses de prisão; (b) condenar o arguido, em cúmulo, na pena única de dez meses de prisão, cuja execução se declarou suspensa pelo período de três anos, bem como na proibição de conduzir pelo período de seis meses; (c) condenar o arguido, pela prática da contra-ordenação ao disposto no art. 38.º n.º 1, do CE, na coima de 20.000$00, absolvendo-o das mais por que vinha acusado; (d) julgar parcialmente procedente, por provado, o pedido de indemnização civil formulado por Vasco....., condenando consequentemente o requerido Gabinete Português da Carta Verde, a pagar-lhe a quantia de 15.052.204$00, sendo 9.202.204$00 pelos danos patrimoniais, e 5.850.000$00 pelos danos não patrimoniais, acrescido de juros de mora à taxa de 7%, e desde as datas supra referidas; (e) julgar também parcialmente procedente o pedido formulado pelo Hospital....., condenando consequentemente o requerido a pagar-lhe a quantia global 1.690.290$00, acrescida de juros de mora, à taxa de 7%, desde a notificação do pedido e até integral pagamento.

  1. Interpuseram recurso daquela Decisão: 2.1. O «Gabinete Português de Certificado Internacional de Seguro (Gabinete Português Carta Verde)», que extrai da correspondente motivação as seguintes conclusões: 2.1.1. O acidente de viação dos autos ocorreu a um metro da berma direita, atento o sentido de marcha do Demandante civil, tendo os veículos embatido lateralmente.

    2.1.2. A forma como os veículos embateram significa que se o Demandante civil circulasse mais junto da berma direita poderia ter evitado o embate com o veículo conduzido pelo Arguido.

    2.1.3. Sobre o Demandante civil impendia o dever de circular o mais próximo possível da berma, conforme determina o n.º 2 do art. 88.º e n.º 1 do art. 13.º, ambos do Cód. da Estrada, o que não foi por si culposamente respeitado.

    2.1.4. O Tribunal a quo, atendendo a violação destes comandos, deveria ter considerado, de acordo com o disposto no n.º 1 do art. 570.º, do C. Civil, o grau de culpa de 10% do demandante civil para a concorrência do acidente de viação.

    2.1.5. Por outro lado, a circunstância de o Demandante civil não usar, no momento do acidente, o capacete de protecção devidamente ajustado e apertado, provocou um agravamento dos danos que não foi devidamente valorado, devendo essa valoração ser aumentada para 25%, o que implica um total de 35% do coeficiente de contribuição do Demandante para o agravamento dos danos, nos termos do art. 570.º n.º 1, do C. Civil.

    2.1.6. O ora Recorrente, no artigo 28.º da sua contestação, impugnou as alegadas despesas médicas, viagens e tratamentos, assim como impugnou a veracidade dos documentos que foram juntos para a sua comprovação.

    2.1.7. Não tendo sido efectuada prova testemunhal sobre estes factos e tendo sido impugnados os documentos apresentados, não poderia o Tribunal ter condenado o Recorrente no pagamento das referidas despesas que, consequentemente, não é devido.

    2.1.8. Por outro lado, e relativamente aos danos de natureza patrimonial decorrentes da perda de capacidade aquisitiva do Demandante, não deveria ter considerado como elemento de cálculo a idade de 71 anos, mas de 65 anos que é o limite de idade para a reforma, assim como não deveria ter considerado o montante de 200.000$00, como remuneração de referência.

    2.1.9. Não exercendo o Demandante civil nenhuma profissão remunerada e não tendo logrado fazer prova de que iria auferir uma remuneração mensal de 180.000$00, a remuneração de referência devia ser a do ordenado mínimo nacional vigente à data dos factos, de 58.900$00, pelo que atendendo ao grau de 15% de IPP, e à sua quota parte de culpa no agravamento dos danos, deveria a indemnização ter sido fixada em 3.510.000$00.

    2.1.10. Relativamente aos direitos de natureza não patrimonial, atendendo ao acima exposto, assim como ao facto de o Tribunal a quo ter valorado de forma exagerada o facto de o Demandante pretender vir a ser polícia, o que não se traduzia num projecto sério de vida, como demonstra o facto de conduzir sem licença de condução, não deveria a respectiva indemnização ser fixada em montante superior a 2.600.000$00.

    2.1.11. Relativamente ao pagamento das despesas hospitalares do Hospital de....., atendendo às conclusões acima formuladas, não poderia o ora Recorrente ter sido condenado a pagar um montante superior a 1.220.765$00.

    Pretende a revogação da Sentença recorrida e a consequente condenação e absolvição nos termos do exposto.

    2.2. O demandante, Vasco......, que extrai da correspondente motivação as seguintes conclusões: 2.2.1. Inexistindo nos autos qualquer referência ao modo como se comportou o capacete do Vasco na sua cabeça durante e na queda deste na estrada, nenhum nexo de causalidade se pode extrair do facto de o Vasco o trazer desapertado.

    2.2.2. Ninguém, com a prova que sobre isso se produziu, pode afirmar que o facto de ele estar desapertado é causal disto ou daquilo.

    2.2.3. As sequelas que determinam no recorrente uma IPP de 15% são de natureza lesional.

    2.2.4. Tais sequelas são avaliadas independentemente da repercussão na sua capacidade de ganho.

    2.2.5. A percentagem de 15% - atribuída pelo exame médico - dificilmente traduz a globalidade do dano (diz o IML).

    2.2.6. A verdadeira incapacidade do recorrente situa-se ao nível das sequelas funcionais, as quais, elencadas ao longo de todos os relatórios médicos, permitem classificar o Vasco como um computador a quem se extraiu a memória, uma pessoa que não pode nem deve tirar a carta de condução, uma pessoa que tem dificuldade no relacionamento interpessoal, um ser humano que vai toda a vida necessitar de assistência de outra pessoa, por que não consegue ser autónomo, independente, etc., etc..

    2.2.7. O relatório médico elaborado pelo psiquiatra Dr. Aníbal..... em nada colide com o exame do IML, antes o completa, antes o explica, antes o detalha, em três tipos de incapacidades para três tipos de profissões ou actividades diferentes, de tal forma que é o próprio exame do IML a reclamar, a sugerir uma leitura cuidada e atenta, no fundo, a admitir uma ajuda mais detalhada, a pedir uma avaliação personalizada, como dele se lê.

    2.2.8. A decisão recorrida violou o disposto nos arts. 483.º, 496.º, 562.º e 564.º do Código Civil e 374.º do C. P. Penal.

    Pretende a revogação da decisão recorrida e que a mesma seja substituída por outra que declare que o uso pelo...

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