Acórdão nº 2157/2007-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 27 de Março de 2007

Magistrado ResponsávelORLANDO NASCIMENTO
Data da Resolução27 de Março de 2007
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa.

  1. RELATÓRIO S.[…] SA instaurou contra, EPIFÂNIO […], providência cautelar de Apreensão de Veículo Automóvel, pedindo a apreensão do veículo automóvel Fiat, Stilo 1.9 JTD Dynami, com a matrícula […] TN, com fundamento em que no dia 23/05/2005, celebrou com o requerido um contrato que teve por objecto o financiamento de € 21.000,00, quantia destinada à aquisição do referido veículo.

    Como condição da celebração desse contrato e como garantia do seu bom cumprimento, foi exigido ao requerido a constituição de reserva de propriedade, a qual foi registada a favor da requerente.

    Assim, mantém-se na esfera jurídica da ora requerente a propriedade da viatura, só se transmitindo com o cumprimento do referido contrato, encontrando-se suspensa tal transferência até então.

    O requerido não pagou as prestações 2.ª a 6.ª, no valor unitário de € 481,34, pelo que a requerente lhe enviou uma carta, em 05/12/2005, concedendo-lhe um prazo suplementar de dez dias para pagamento.

    Decorrido esse prazo, o requerido não pagou nem entregou o veículo. Citado, o requerido deduziu oposição dizendo que o veículo em causa lhe foi furtado no dia 18/09/2006, do local onde o tinha estacionado, o que participou à P. S. P.

    O Tribunal a quo proferiu decisão indeferindo a providência cautelar requerida com fundamento, em síntese, em que a providência cautelar de apreensão de veículo a que se reporta o art.º 15.º do Dec. Lei n.º 54/75 de 12/02, é dependência de acção em que se peça a resolução do contrato de compra e venda, o que não é o caso dos autos em que está em causa um contrato de financiamento de uma aquisição sob a forma de um mútuo.

    Inconformada com essa decisão, a requerente dela interpôs recurso, recebido como agravo, pedindo a revogação da decisão recorrida e o decretamento da providência, formulando as seguintes conclusões: 1.ª O presente recurso vem interposto de decisão que indeferiu liminarmente a providência cautelar de apreensão de veículo automóvel, requerida nos termos do artigo 15° do Decreto-Lei n.º 54/75 de 12 de Fevereiro; 2.ª O Meritíssimo Juiz a quo julgou a mesma manifestamente improcedente e nos termos do disposto no artigo 234°, n.º 4 alínea b) e 234°-A n.º 1, indeferiu liminarmente o Requerimento Inicial; 3.ª A Requerente alegou sucintamente os seguintes factos: - No dia 23 de Maio de 2005 celebrou com o requerido o contrato de financiamento para aquisição de uma viatura de marca Fiat, Stilo 1.9 JTD Dynami, com a matrícula […] TN; - Como garantia do referido contrato foi inscrita a favor do mutuante reserva de propriedade sobre a mencionada viatura; - O requerido incumpriu as obrigações que assumiu em virtude do referido contrato, nomeadamente, não pagou as prestações convencionadas; 4.ª Entendeu o Meritíssimo Juiz a quo que não se encontravam reunidos os pressupostos para o decretamento da providência, nomeadamente não se verificava a existência de um contrato de compra e venda; 5.ª Ou seja, para o Meritíssimo Juiz a quo não basta que se verifique a existência de reserva de propriedade inscrita a favor da Requerente, nem que se verifique o incumprimento das obrigações que originaram a mesma, é necessário, também, que a referida reserva de propriedade seja garantia do cumprimento de um contrato de compra e venda resolvido, e não de qualquer outro; 6.ª Ora, salvo o devido respeito, discordamos deste entendimento que, em nossa opinião, não faz a correcta interpretação da Lei; 7.ª A reserva de propriedade, tradicionalmente uma garantia dos contratos de compra e venda, tem vindo, face à evolução verificada nas modalidades de contratação, a ser constituída como garantia dos contratos de mútuo, sobretudo, daqueles cuja finalidade e objecto é financiar um determinado bem, ou seja, quando existe uma interdependência entre o contrato de mútuo e o contrato de compra e venda; 8.ª Nestas situações, tem-se verificado uma sub-rogação do mutuante na posição jurídica do vendedor, isto é, o mutuante ao permitir que o comprador pague o preço ao vendedor, sub-roga-se no risco que este correria caso tivesse celebrado um contrato de compra e venda a prestações, bem como, nas garantias de que este poderia dispor, no caso, a reserva de propriedade; 9.ª Este entendimento encontra pleno acolhimento no artigo 591.º do Código Civil, bem como, no princípio da liberdade contratual estabelecido no artigo 405.º do Código Civil, uma vez que, não se vislumbram quaisquer objecções de natureza jurídica, moral ou de ordem pública relativamente ao facto de a reserva de propriedade ser constituída a favor do mutuante e não do vendedor; 10.ª Ora, a própria lei que regula o crédito ao consumo o admite no n.º 3 do seu artigo 6.º quando refere que "o contrato de crédito que tenha por objecto o financiamento da aquisição de bens ou serviços mediante pagamento em prestações deve indicar ainda: (…) j) O acordo sobre a reserva de propriedade".

    11.ª Entendimento este, que também tem sido sufragado em diversos acórdãos...

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