Acórdão nº 8472/2006-1 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 13 de Fevereiro de 2007
Magistrado Responsável | CARLOS MOREIRA |
Data da Resolução | 13 de Fevereiro de 2007 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
ACORDAM NO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE LISBOA 1.
N, intentou a presente acção declarativa, com processo comum sob a forma ordinária, contra A e outros, acção declarativa, de condenação com processo ordinário.
Alegou, em síntese: Por escritura pública outorgada em 14.01.1993, a R. A vendeu ao A. a raiz ou nua propriedade da fracção autónoma designada pela letra "H", correspondente ao 3º andar, do prédio sito na Calçada da Graça, em Lisboa, pelo preço de 6.000.000$00.
Por escritura pública outorgada em 09.08.1995, a mesma R. A vendeu aos RR. a fracção supra descrita.
A R. A procedeu à venda de bens alheios, pelo que este último negócio jurídico enferma de nulidade absoluta.
Acresce que a R. A, desde o início de 1995, tem vindo a sofrer de anomalia psíquica e física, com frequentes perdas de memória, não compreendendo o que faz e porque o faz.
No dia 26.05.1995, os demais RR. foram buscar a R. A e levaram-na enganosamente ao notário, onde esta outorgou procuração irrevogável que incluía todas as suas propriedades.
A assinatura aposta na procuração não foi feita pela punho da R. A ou, pelo menos, não foi feita por aquela, sem que a sua mão fosse guiada por outrem, neste caso um dos mandatários.
A R. A, dada a doença de que foi acometida, não entendeu o sentido das declarações constantes da procuração, nem tinha o livre exercício da sua vontade.
E os RR. bem sabiam que a procuração não podia ser outorgada pela R. Armanda, por esta não se encontrar em condições mentais de o fazer.
A procuração contraria totalmente a vontade da R. A que não queria deixar, fosse o que fosse, aos restantes RR., com quem estava de relações cortadas.
Deste modo, a procuração é nula, sendo igualmente nulo ou pelo menos anulável o negócio celebrado pelos RR.
Pediu: a) seja declarado nula ou, se assim, não se entender, anulada ou revogada, a procuração outorgada em 26.05.1995; b) seja declarada nula a compra e venda outorgada em 09.08.1995; c) seja ordenado o cancelamento do registo de aquisição a favor dos RR., consubstanciado pela inscrição G-2, Ap. 25, de 10.08.1995 e d) sejam os RR. condenados por má fé, em multa e indemnização a favor do A.
A 1ª R. contestou, impugnando os factos alegados pelo A..
Em reconvenção, alegou, em síntese, que a R. se tornou vulnerável à influência de Isabel Ferreira, mãe do A., por esta ter feito tudo para se lhe tornar indispensável.
A R. celebrou a escritura de compra e venda com o A., por ter sido explorada a sua situação de necessidade e o seu estado de dependência por Isabel Ferreira, situação que só cessou no momento em que a R. foi viver com os sobrinhos, em 30.08.1985.
A compra e venda da nua propriedade é assim anulável.
Terminou, pedindo a improcedência da acção e a anulação da compra e venda da nua propriedade outorgada em 14.01.1993.
Os 2º a 11º RR. também apresentaram contestação, excepcionando a ilegitimidade do A. relativamente ao pedido de declaração de nulidade da procuração outorgada pela 1ª R. em 26.05.1995 e a ilegitimidade dos RR. Maria E, Maria L, Maria C e J, e impugnando no essencial os factos alegados pelo A.
Terminaram pela improcedência da acção e sua absolvição do pedido.
A A. replicou, impugnando os factos alegados pela 1ª R. em reconvenção e pugnando pela improcedência das excepções deduzidas pelos 2º a 11º RR.
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Prosseguiram os autos a sua legal tramitação, tendo sido desatendida a excepção de ilegitimidade activa e atendida a da ilegitimidade passiva pelo que foram julgadas partes ilegítimas alguns dos demandados, declarados habilitados os herdeiros de partes entretanto falecidas e, a final, proferida sentença que: a)- declarou nula a compra e venda da fracção autónoma outorgada em 09.08.1995, no Cartório Notarial de Benavente, entre a falecida R. Armanda Oliveira e Sousa, representada no acto pelo falecido R. J, e os RR. JJ, Maria J, E e JM e Sousa e b)- Ordenou o cancelamento do registo de aquisição da referida fracção a favor dos RR. JJ, Maria J, E e JM, consubstanciado pela inscrição G-2, Ap. 25, de 10.08.1995.
c)- Tendo, no mais, absolvido os RR. do pedido inicial e absolvido o A. do pedido reconvencional.
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Inconformados recorreram os réus.
Rematando as suas alegações com as seguintes CONCLUSÕES, na parte pertinente:
a) Perante os factos supra-referidos os R.R. JJ, Maria J, JM e E têm de ser havidos como terceiros registais pois a aquisição a que procederam foi de boa fé, a título oneroso, baseada na prévia inscrição a favor da transmitente e com subsequente e imediata inscrição no registo do seu próprio título de aquisição; b) Porque assim é gozam da presunção do registo consagrada no artigo 7º e 17º nº 2 do Código de Registo Predial; c) Tais presunções são pois inatacáveis e traduzem-se numa aquisição do direito registado por força do próprio registo, ou seja, numa aquisição tabular ou, preferindo-se, num registo aquisitivo.
d) Assim, o registo efectuado pelos 4º, 6º, 8º e 10º R.R.
torna-se definitivo e é inatacável; e) A tal não obsta o facto de não terem decorrido entre tal registo e o registo de acção o prazo de três anos previsto no nº 2 do artigo 291º do Código Civil; f) É que o artigo 291º do Código Civil nada tem a ver com as presunções aplicando-se apenas quando o terceiro de boa fé não tenha agido com base no registo, ou seja, quando tal negócio nulo ou anulável previsto em lei civil não tiver sido registado; g) Ou, preferindo-se, quando a aquisição não for apoiada no registo anterior a favor do transmitente, já que o subadquirente a que se refere o artigo 291º do Código Civil não é um verdadeiro terceiro registal; h) No caso vertente constata-se que o negócio celebrado pelos 4º, 6º, 8º e 10º R.R., ora Recorrentes, assentou, como dito ficou, no registo anterior sem qualquer vício celebrado a favor da transmitente R. D. Armanda pelo que o regime do artigo 291º do Código Civil, e designadamente do seu nº 2, não lhes é aplicável por revestirem a qualidade de terceiros registais tendo-se baseado em registo anterior do transmitente; i) Em resumo o registo efectuado pelos R.R. adquirentes traduz um registo aquisitivo ou uma aquisição tabular pelo que estes beneficiam do efeito substantivo do registo o qual não pode ser prejudicado; j) O que, de resto, se torna evidente já que o legislador não prevê qualquer "período de carência" para a nulidade registal pelo que também não faria sentido que a previsse para a nulidade substantiva, manifestamente menos grave; k) Assim, a nulidade da segunda venda não pode ser oposta aos 4º, 6º, 8º e 10º R.R. pelo não decurso do prazo de três anos (nº 2 do artigo 291º do Cód. Civil) e consequentemente a douta decisão recorrida não poderia ter declarado a nulidade da venda da referida fracção "H" nem o cancelamento do respectivo registo; l) Decidindo em sentido inverso, declarando nula a compra e venda dessa fracção "H" entre a R. D. A e os citados 4º, 6º, 8º e 10º R.R. e ordenando o cancelamento do registo de aquisição, a douta decisão recorrida violou o disposto nos artigos 5º, 6º, 7º, 17º nº 2 e 122º do Código de Predial e os nºs 1 e 2 do artigo 291º do Código Civil; m) Ainda que assim se não entendesse, o que só sem conceder se refere, reportando-se a transacção efectuada entre o A. N e a R. D. A apenas à raiz ou nua propriedade da fracção em causa, porque não vem demonstrado que as partes não concluiriam o negócio sem a parte viciada, deveria ter o douto Tribunal "a quo" procedido à redução do negócio à parte não viciada, ou seja, ao usufruto da fracção adquirida, reconhecendo tal qualidade aos R.R. adquirentes; n) Não o entendendo assim, a douta decisão recorrida violou o disposto no artigo 292º do Código Civil; o) Sempre sem conceder, e a entender-se que a hipótese é de conversão, e não de redução, da matéria de facto constante dos quesitos 10º, 14º, 27º e 31º extrai-se directamente, ou ao menos por presunção de facto, que a vontade quer da R. D. A, quer dos 4º, 6º, 8º e 10º R.R. sempre seria a de a não se poder realizar a compra e venda da fracção...
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