Acórdão nº 8653/2006-3 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 07 de Fevereiro de 2007

Magistrado ResponsávelCARLOS DE SOUSA
Data da Resolução07 de Fevereiro de 2007
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Acordam em audiência no Tribunal da Relação de Lisboa: I - No presente processo comum (juiz singular), nº 458/01.0PAMTJ, do 3º Juízo do T. J. Comarca do Montijo, que o MºPº move contra os arguidos (C), (L) e outros, por sentença de 14/10/2004, foi julgada parcialmente procedente a acusação e, em consequência, decidiu-se, além do mais: condenar aqueles dois arguidos, (C) e (L), pela prática em co-autoria de um crime de exploração ilícita de jogo, p. e p. pelo artº 108º, nº 1, com referência aos artºs 1º, 3º e 4º, todos do D.L.nº 422/89, de 2/12, na redacção que lhe foi dada pelo D.L.nº 10/95, de 19/1, respectivamente: - o arguido (C) na pena de multa de 200 (duzentos) dias, à taxa diária de € 5 (cinco euros), o que perfaz o montante de € 1.000 (mil euros), a que corresponde a prisão subsidiária de 133 (cento e trinta e três) dias; e - o arguido (L) na pena de multa de 300 (trezentos) dias, à taxa diária € 10 (dez euros), o que perfaz o montante de € 3.000 (três mil euros), a que corresponde a prisão subsidiária de 200 (duzentos) dias.

Tendo ainda absolvido os outros dois arguidos (CA) e (AG), ids. nos autos).

II - A) Inconformado, recorre o arguido (L) para esta Relação, extraindo da sua motivação as seguintes conclusões (como se transcreve): « 1 - Uma decisão condenatória do acusado tem como premissa o alcance da certeza sobre a sua culpabilidade, não sendo bastante a dúvida ou a incerteza, por mais ténues que se afigurem.

Ao julgador impõe-se ...que evidencie os meios de prova em que assentou a sua convicção ...que expresse de forma clara qual foi o processo lógico-dedutivo que permitiu alcançar a certeza quanto à prática do facto, por forma a garantir a compreensão e razoabilidade do mesmo, tendo assim violado o disposto no Artº 127º CPP; 2 - Em Direito Processual Penal vigora o princípio da prova plena em desfavor do arguido e não basta a prova parcial ou indiciária da sua culpabilidade; 3 - Foi ainda violado o disposto no Artº 32º nº 2 da CRP, face a não ter sido respeitado o princípio in dúbio pro reo na actividade de produção de prova; 4 - Quanto ao erro notório na apreciação da prova, tende-se que o presente recurso não tem um carácter meramente impugnativo das questões que ao recorrente dizem respeito, mas num espírito mais amplo, de apreciação crítica a toda a evolução processual em causa; 5 - O recorrente vinha acusado de um crime de co-autoria material pela prática de um crime de exploração ilícita de jogo, p. p. no artº 108º, nº 1, com referência aos artºs 1º e 3º, nº 1, do Dec.-Lei Nº 422/89, de 2 Dez., alterado e republicado em anexo ao Dec.-Lei Nº 10/95, de 19 Jan., e não se tendo provado, quanto a este arguido, quaisquer factos que, objectiva e subjectivamente, preencham esse tipo de crime, impõe-se a absolvição do recorrente, do crime de que vinha acusado; NESTES TERMOS DEVERÁ SER CONCEDIDO PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, REVOGANDO-SE A SENTENÇA ORA RECORRIDA, COM O QUE SE FARÁ A MAIS LÍDIMA JUSTIÇA ! » * B) O digno Magistrado do Ministério Público respondeu, concluindo (sem articular) que a douta sentença recorrida se mostra "conforme à lei e ao direito", pelo que "deve ser integralmente confirmada", "negando-se provimento ao recurso".

* C) Após diligências (inúteis) para notificar pessoalmente da sentença um dos co-arguidos, o absolvido (CA) - com o que decorreram quase dois anos (OUT/04 a OUT/06 - cfr. fls. 216 a 254) - foram, finalmente, os autos remetidos a esta Relação, a Exmª PGA apôs o seu visto, reservando a sua posição para as suas alegações orais a produzir em audiência.

* III - Colhidos os vistos, cumpre decidir.

  1. Do âmbito do recurso.

Como é jurisprudência corrente, o âmbito do recurso é dado pelas conclusões do recorrente - por todos, Ac. STJ de 24/03/99 (C.J., Acs. STJ, VII, tomo I, p. 247), e resulta do princípio da cindibilidade dos recursos (artºs 403º e 412º, nº 1, do CPP).

Assim, o recorrente suscita o vício do erro notório na apreciação da prova - v. 1ª a 4ª conclusões - e, de acordo com o princípio in dúbio pro reo, pede a sua absolvição.

Implicitamente, coloca-se a questão da qualificação jurídico-penal dos factos (cfr. III da motivação), v.g. da prática pelo recorrente da contra-ordenação, modalidade afim dos jogos de fortuna ou azar, p. e p. pelos artºs 159º, nºs 1 e 2, 160º e 163º, nº 1, todos do DL 422/89, de 2/12 (red. DL 10/95, de 19/1) ? Ou antes do crime por que foi condenado, p. e p. pelos citados artºs 1º, 3º, 4º, nº 1, als. f) e g), e 108º do mesmo diploma legal ? No caso de se tratar da citada contra-ordenação, haverá que apurar se o respectivo procedimento se mostra extinto, por prescrição: prazo prescricional normal é de um ano - cfr. artº 27º al. b) do RGCO (D.L. 433/82, red. D.L. 244/95, de 14/9, D.L. 323/01, de 17/12 e Lei 109/01, de 24/12); pelo que já terá decorrido o prazo do nº 3 do artº 28º desse RGCO (prazo normal acrescido de metade, ressalvado o prazo suspensão da prescrição) ? Neste caso, deve a decisão aproveitar ao co-autor, (C), não recorrente (artº 402º, nº 2-a), do CPP) ? * B) Para ponderar e decidir tais questões, passamos a transcrever o texto da sentença recorrida na parte pertinente: « a) Descrição e Fundamentação Discutida a causa, o Tribunal tem como provados os seguintes factos: 1. Desde há cerca de 11 anos, o arguido (C) é proprietário do estabelecimento de café-pastelaria denominado "...", sito na Rua..., explorando-o directamente.

  1. Desde o início de Setembro de 2001, embora em data não concretamente apurada, com o acordo e consentimento do arguido (C), o arguido (L) colocou no estabelecimento, referido em 1., duas máquinas eléctricas de jogos de sua pertença para serem exploradas pelo arguido (C), as quais ficaram expostas ao público, até á sua apreensão em 14 de Outubro de 2001[1].

  2. Os lucros da sua exploração eram divididos entre os arguidos (C) e (L) na proporção de metade para cada um.

  3. Uma das máquinas é constituída por móvel preto com estrutura de madeira. Na parte superior tem um painel rectangular com os dizeres "Super Video IDSA", apresenta um ecrã vídeo protegido por vídeo, a que se segue uma consola com 6 botões de várias cores e 2 joysticks; na sua parte inferior apresenta dois dispositivos destinados à introdução de moedas, munidos de 1 ranhura cada, para moedas de 100$00, a que se segue o cofre respectivo.

  4. As máquina referida em 4. desenvolvia um jogo com as características de video-poker, designado de "P Block", diferindo em que em vez de cartas, aparece no ecrã, de forma aleatória e dispostos em linha, um conjunto de cinco figuras "quadrados" distribuídos por quatro cores (azul, amarelo, rosa e verde) sendo cada cor numerada de 1 a 13.

  5. Podiam aparecer 4 figuras com o nº 1, 4 figuras com o n.º 2, e assim sucessivamente até ao número 13, por cada cor.

  6. O número 1 corresponde ao ÁS e o número 13 ao Rei, sendo que os números intermédios correspondem às demais cartas do naipe de um baralho.

  7. Às cores azul, amarelo, rosa e verde correspondem, por convenção, os naipes de copas, espadas, ouros e paus, respectivamente.

  8. Após a introdução de moedas de 100$00, decide-se o número de apostas e dá-se início ao jogo através do accionamento da tecla "start" - um dos joysticks - surgindo logo, de modo simultâneo, de forma aleatória e dispostas em linha, na base do ecrã, as cinco figuras "quadrados", distribuídas por quatro cores, sendo cada cor numerada de 1 a 13.

  9. A fixação das figuras era feita pressionando o botão correspondente à figura escolhida, o que provocava o aparecimento automático de...

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